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ATLETA INVISÍVEL

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PROJETO INVISÍVEL

PROJETO INVISÍVEL

"Contanto que perseveremos e resistamos,

teremos tudo que quisermos."

- Mike Tyson

ESPORTES PARALÍMPICOS, UMA PAIXÃO POUCO LEMBRADA: CONHEÇA A HISTÓRIA DE JOVANE GUISSONE, ATLETA DE ESGRIMA, MEDALHISTA NAS PARALIMPÍADAS TOKYO 2020

Com a realização das Paralimpíadas em 2021, fica evidente o quanto a modalidade dos esportes adaptados permanece esquecida durante o período fora do ciclo olímpico

Por Gustavo Segata e Matheus Severo

Imagem/Reprodução: CPB

A cada quatro anos acontecem as Paralimpíadas. Seguindo o embalo olímpico, é o momento que lembramos e até conhecemos muitos atletas que representam nosso país no maior evento esportivo das categorias para deficientes. Mas a verdade é que, diferente de grande parte das modalidades olímpicas, a visibilidade de esportes paralímpicos e seus atletas deixa muito a desejar fora desse período. Este ano tivemos as Paralimpíadas de Tóquio e os representantes do Rio Grande do Sul fizeram história. Entre eles, temos o medalhista Jovane Guissone, que mesmo com todas as suas dificuldades e limitações, conseguiu enxergar uma luz na sua vida dentro do esporte.

Gaúcho, 38 anos, com três filhos e duas medalhas no peito. Esse é o Jovane, atleta de esgrima em cadeira de rodas. Ele que é natural de Barros Cassal, atualmente mora na cidade de Esteio, na região metropolitana de Porto Alegre, realizou mais um grande sonho: participar novamente de uma Paralimpíada. “Um atleta se classificar para uma Paralimpíada é um sonho, mas quando ele conquista uma medalha Olímpica é um sucesso! Tudo o que ele fez para chegar onde chegou, mostra que deu certo” - explica

o medalhista de ouro em Londres 2012. Esse ano, Jovane foi brilhar no outro lado do mundo: foi um dos onze gaúchos na delegação brasileira para as Paralimpíadas de Tóquio. Do Japão, voltou com a segunda melhor marca de sua carreira, uma medalha de prata, e ajudou o Brasil a ficar na melhor colocação da história das participações do país na competição.

Entre os atletas paralímpicos, Jovane é um dos que nasceram sem deficiências. Gostava muito de jogar futebol com seus irmãos durante sua infância, mas acabou ficando paraplégico aos 21 anos de idade após reagir a um assalto. Apenas quatro anos depois, teve seu primeiro contato com os esportes adaptados, se profissionalizando na esgrima em cadeira de rodas.

“O esporte pra mim é vida, não sei viver sem esporte. Eu sou muito feliz porque faço o que gosto e posso levar nossa bandeira

no lugar mais alto do pódio.”

Apesar da relevância enorme das Paralimpíadas, ela acaba representando muito pouco a batalha dos atletas fora do ciclo olímpico. Jovane define sua rotina de treinos que, de segunda à sexta, começa às 9 horas e vai até as 14 horas, com preparação física, fisioterapia e muita esgrima. Além disso, o atleta exalta a realização das competições nacionais e internacionais, as quais seu rendimento o possibilitou ficar na primeira colocação no ranking brasileiro e consequentemente defender o país no Japão.

Relação mídia X esportes paralímpicos

Não precisa ser nenhum analista de dados para perceber como o esporte paralímpico tem pouco espaço na mídia brasileira. Apenas sentando em frente a televisão, percebemos como os esportes praticados por atletas sem comorbidades possuem maior espaço nas emissoras e veículos de comunicação. Se falarmos de futebol, automaticamente já pensamos em Neymar, Marta, Cristiano Ronaldo, Alex Morgan e Messi, porém dificilmente pensamos em atletas de futebol para cegos como o brasileiro Ricardinho. Tudo isso acaba por acarretar diversos problemas como: a falta de investimentos nesses esportes, pouca visibilidade para esses atletas e a ausência de uma representatividade para crianças que futuramente poderiam ser grandes esportistas paralímpicos ou apenas para enxergarem que existem pessoas como elas conquistando o mundo.

Ainda que insatisfatória, a visibilidade do movimento paralímpico começou com um crescimento no Brasil após 2004, principalmente na mídia televisiva. Até então, a mídia escrita era a única que se interessava. O marco da entrada e de maiores visualizações aos esportes paralímpicos foi os Jogos Paralímpicos de 2004 e 2008, a importância dada pela mídia foi maior. A maior emissora do país, a Globo, exerceu uma grande cobertura, através do SporTV. Porém, mesmo assim não são números que agradam muito. A Olimpíadas de Tokyo 2020 teve uma cobertura espetacular pela Globo, ganhando espaço em toda a programação da noite, mas não foi o mesmo que vimos nas Paralimpíadas. Apenas o SporTV trazia os jogos (nem todos) para os telespectadores, muitas pessoas não sabem que o Brasil quebrou diversos recordes e no quadro geral de medalhas terminou a competição em sétimo lugar com um total de 72 medalhas, sendo 22 de ouro.

Visão de Jovane na relação mídia X esportes paralímpicos

O atleta comenta como é incrível a sensação de estar competindo dentro do Brasil, pois os torcedores interagem muito com eles, nas Paralimpíadas Rio 2016 isso foi muito perceptível. Por isso a importância de manter o povo brasileiro próximo aos atletas, “ quando a mídia mostra os esportes paralímpicos, com certeza mais gente vê e vem pro esporte Paralímpico, tanto o nosso povo brasileiro, quanto os demais”. A própria procura pelos atletas, praticamente acontecem apenas nos anos olímpicos, neste momento que suas histórias são contadas, porém esquecidas logo após. “Vejo muito isso, no ano de olimpíada e Paralimpíadas, o pessoal das mídias procuram sim muitos atletas, porque não são sempre lembrados. E a falta de investimento prejudica sim na carreira de um atleta, pois dependemos de investimentos para competir, viajar e jogar”. O impacto vai muito além de apenas não transmitir os jogos como forma de entretenimento para as pessoas.

Jovane comenta sobre suas principais conquistas da carreira, sem deixar de mostrar o quanto sua família é importante. “Foram várias conquistas na minha vida: o nascimento do meu filho Jovane Júnior, a medalha de ouro em Londres 2012 e, em 2021, o nascimento das minhas gêmeas Alícia e Cecília e a conquista da medalha de prata em Tóquio”. Sozinho o atleta provavelmente não chegaria a lugar nenhum, perdeu movimentos no seu corpo, suas pernas o abandonaram, mas não o impediu de seguir em frente, lutando pelos seus sonhos. Jovane ganhou luz, uma linda família e uma grande história de superação dentro do esporte.

Imagem/Reprodução: Arquivo pessoal

RESPONSABILIDADE PARA MUDANÇA: UMA VIDA MARCANDO PESSOAS E HISTÓRIAS COM O FUTEBOL FEMININO

Com passagem em mais de 10 clubes, Thessa é sinônimo de luta, exemplo e cuidado com as futuras jogadoras do Brasil

Por Eduarda Zini e Roberta Montiel

Imagem/Reprodução: Arquivo pessoal

Ela é ágil, sabe se posicionar e marcar muito bem; tem cabelo cacheado, com algumas mechas loiras, mas não grossas; fica muito bem de vermelho e está sempre com sua chuteira nos pés, propriamente de uma jogadora de futebol feminino; e parece extremamente feliz com a profissão escolhida. Nasceu em Jundiaí, interior de São Paulo; formada em marketing; gentil, divertida e de um coração enorme. Nos referimos a Thessa Tayna de Paula, 34 anos, uma jogadora de futebol que atua como volante no time Sport Club Internacional em Porto Alegre.

Começou sua vida no futebol com apenas 11 anos de idade e sem pretensão. Na verdade, foi descoberta por um professor do centro esportivo da cidade onde estava acostumada a jogar diversos esportes, como o vôlei. De imediato, o convite feito pelo professor foi negado, pois ela não sabia que existia a modalidade de futebol feminino e até então não tinha a aprovação da mãe.

"Eu falei que não, não conhecia o professor,

tinha só dez anos e um cara me chama do nada pra jogar?!"

Um tempo depois, o professor a viu novamente jogando e decidiu conversar com a dona Elani de Paula, mãe da Thessa. Ela aceitou na hora, disse que tudo bem se sua filha quisesse jogar, e como o professor ia dar futebol feminino neste mesmo centro esportivo, foi jogada certa! E assim, foi o início de quase 20 anos de carreira.

Com apenas 15 anos, começou sua vida profissional no futebol e durante este tempo ficou na sua cidade por seis anos, disputando campeonatos municipais. Depois desse período, ganhou uma bolsa de estudos em Jaguariúna para cursar fisioterapia. Mas, para quem pensou que sua carreira terminaria por ali, estava enganado. Thessa foi convocada pela primeira vez, na categoria de base sub-20 para a seleção brasileira.

“Foi quando eu fui convocada pela primeira vez,

na categoria de base sub-20, aí sim eu percebi que dava

pra ser muito mais do que eu gosto de fazer."

Como sempre teve o apoio dos familiares e amigos, a trajetória não foi tão difícil, somente quando a paravam para perguntar "mas isso é trabalho?". A jogadora ainda conta que quando volta para a sua cidade, as camisetas do time atual vão embora na mesma hora e que é de lei ter também o futebol com os amigos mais próximos.

O sonho do seu pai sempre foi ser jogador de futebol, ele a acompanhou muito durante o começo desta grande trajetória, mas infelizmente faleceu e não conseguiu ver tudo o que Thessa alcançou e mudou no futebol feminino. Por outro lado, dona Elani, esteve com ela em todos os jogos e sempre faz farra quando a jogadora entra em campo, avisando que "aquela lá" é a sua filha.

“A minha mãe me acompanha até hoje,

é apaixonada por futebol feminino. Além de mim,

acompanha todas as minhas amigas também!"

Dentro do campo, a jogadora conta que nunca teve nenhum problema. Ela fez parte dos times do Paulista de Jundiaí (2000/2004), Guarani (2001), Jaguariúna Motorola (2005/2006), Saad Esporte Clube (2007/2009), que é um dos pioneiros do futebol feminino, no Vasco (2009/2012), Foz Cataratas (2013), Centro Olímpico (2013/2014), São José do Rio Preto (2015), Santos (2015/2016), Audax (2017), e por último, no Sport Clube Internacional (2017), onde está atualmente, na capital dos gaúchos.

"Estou há cinco temporadas já, desde 2017.

Nessas, perdemos um gauchão em 2018, e tomara que a gente

ganhe o próximo, se for contra eles é melhor ainda!"

Quando olha para trás, acredita ver uma mudança drástica no futebol feminino, pois com o tempo a modalidade ganhou mais atenção e teve uma evolução, tanto na mudança de clubes, quanto na estrutura de federações e confederações. - “Eu vejo uma mudança drástica de cinco anos pra cá, não falo nem de quando eu comecei. Com essa obrigatoriedade (do futebol feminino nos clubes), fez com que as coisas melhorassem a modalidade, porque criou mais visibilidade. Eu comecei em São Paulo, e lá o futebol feminino já acontecia, mas se for ver no contexto Brasil, a evolução é gritante.”

No que uma pandemia pode afetar uma jogadora de futebol

No final de 2019, uma epidemia do novo coronavírus iniciou em Wuhan, na China, e rapidamente se espalhou para o mundo. A Organização Mundial de Saúde (OMS) determinou no dia 11 de março de 2020, a Covid-19 como uma pandemia. Com isso, escolas, bares, restaurantes, shoppings e, principalmente, estádios de futebol fecharam.

Logo em seguida, no dia 16 de março, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) decidiu suspender, por prazo indeterminado, as competições nacionais sob sua coordenação que estavam em andamento, como a Copa do Brasil, Campeonatos Brasileiros Femininos A1 e A2, Campeonato Brasileiro Sub-17 e Copa do Brasil Sub-20. E após isso, a Federação Gaúcha de Futebol (FGF) também suspendeu o Campeonato Gaúcho, inicialmente por 15 dias, mas esse prazo acabou se estendendo.

Dessa forma, os times pararam e as jogadoras foram obrigadas a ficarem de quarentena em casa, o que acabou prejudicando o trabalho que vinha sendo desenvolvido pelos treinadores dos clubes.

"Eu me lesionei em 2019, tive uma lesão no joelho e eu estava

em um processo de recuperação. Então, quando fechou tudo,

eu não tinha como continuar fazendo a minha recuperação

ficar 100% para quando a gente voltasse para os jogos."

2020 foi um ano difícil e, principalmente, desafiador para Thessa. A pandemia trouxe uma série de problemas para a atleta, que precisava cuidar da sua lesão. Foram quatro longos meses em casa, sem poder sair para a fisioterapia e tentando resolver com exercícios que pudessem ser feitos por ela mesma.

Em julho, quando os treinos retomaram, houve uma dificuldade por parte da jogadora para ter o mesmo nível que as colegas, pois não estava com o mesmo condicionamento físico de antes.

"O ano de 2020 para mim foi muito ruim,

eu não conseguia jogar, não conseguia estar no mesmo nível

das meninas, foi bem complicado."

Um futuro fora dos gramados, mas dentro do futebol

Jogadora de futebol, profissional de marketing e empreendedora, Thessa afirma já estar perto da sua aposentadoria. Sua última temporada com o Internacional acaba no fim do ano, e segundo a jogadora, uma das únicas coisas que faltaram na sua trajetória, foi o título da Libertadores.

"É um desejo meu, eu gostaria de aposentar no Inter.

Acredito não querer ir para outro lugar, quero encerrar por aqui."

Os planos para o futuro já estão certos: fazer tudo o que ela pode pela modalidade e ajudar muitas garotas a realizarem o sonho de jogar futebol. A princípio, trabalhar na parte técnica não é uma opção, pois Thessa conta ser muito chata para isso.

"Eu gosto muito da supervisão, da gestão do futebol.

Eu estou tentando entrar na área de captação e acredito que

o futebol feminino precisa muito disso. "

Além disso, Thessa diz que é necessário ter pé no chão neste mundo do futebol feminino e o recado que deixa para as futuras jogadoras é que "o futebol feminino não está pronto, ainda é preciso ter calma, pois as coisas irão acontecer, mas não é com pressa e sim com responsabilidade.”

Imagem/Reprodução: Arquivo pessoal

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