Jornal Lampião - edição 14

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Jornal Laboratório I Comunicação Social - Jornalismo I UFOP I Ano 4 - Edição Nº 14 - Maio de 2014

Do assédio ao dano: a jornada das mulheres vítimas de violência

Dificuldades em atender a população: um panorama da saúde pública em Mariana

Obras na Nossa Senhora do Carmo: obstáculos e mobilidade urbana

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Maio de 2014 Arte: Rafael Melo

Editorial

Charge

Um olhar sobre a cidade A 14ª edição do LAMPIÃO tem como proposta levantar questões sobre infraestutura e mostrar também os dilemas e as peculiaridades da região. Durante o processo de produção, nos deparamos com desafios, memórias e afetos. Se, por um lado, a relação com o poder público – e sua burocracia - pôde ser encarada como um entrave na apuração das matérias; por outro, encontramos humanidade em todos os cantos e percebemos como a cidade consegue abrigar tantos personagens diferentes entre si. Mesclando as histórias e os problemas estão as matérias principais. Algumas perguntas foram feitas: como Mariana fornece saúde para seus cidadãos

e cidadãs? De quais maneiras o dinheiro recebido é investido no sistema de saúde pública? A partir de relatos, números e dados, tentamos estabelecer e apresentar o panorama da saúde em Mariana. Projetos educativos, narrativas singulares, insuficiências do serviço público, além de novos pontos de vista sobre as mulheres, o futebol e Santo Antônio do Leite. Tudo feito com muito empenho para os leitores e leitoras do LAMPIÃO. Por isso, queremos saber sua opinião do que foi escrito por nós! Fechando essa edição, apresentamos um ensaio para a reflexão. Para que não nos esqueçamos. E o mais importante: para que nunca mais aconteça.

jornalismo.ufop.br/lampiao Encontrou esse símbolo? Acesse os portais do LAMPIÃO e saiba ainda mais sobre os temas abordados.

Lampejos

“O aluno, geralmente, se apresenta procurando o olhar do pai na platéia.” Eduardo França, coordenador do projeto Circo Arte - Educação e Cidadania - Pág. 14

“Mariana precisa de um hospital público!” Zé Raimundo de Mendonça, morador de Mariana Pág. 6 e 7

“O fim pode ser apenas o começo.”

“O medo de prestar a queixa faz com que muitas mulheres permaneçam refém do agressor.” Pág. 5

Tico, músico e artesão - Pág. 11

Entre Olhares ARIADNE SELENE

“Podemos perdoar um homem que faça alguma coisa útil, contanto que não a admire. A única justificação para uma coisa inútil é que ela seja profundamente admirada. Toda a arte é completamente inútil”. (O Retrato de Dorian Gray - Oscar Wilde)

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Jornal Laboratório produzido pelos alunos do curso de Jornalismo – Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA)/ Universidade Federal de Ouro Preto – Reitor: Prof. Dr. Marcone Jamilson Freitas Souza. Diretor do ICSA: Prof. Dr. José Artur dos Santos Ferreira. Chefe de departamento: Prof. Dr. JB Donadon Leal. Presidente do Colegiado de Jornalismo: Profa. Dra. Denise Figueiredo Barros do Prado. – Professores responsáveis: Cláudio Coração (Reportagem), Ana Carolina Lima Santos (Fotografia) e Priscila Borges (Planejamento Visual) – Editora Chefe: Raquel Satto - Secretária de Redação: Ana Amélia Maciel - Editor de Arte: Edmar Borges - Editor de Fotografia: Bruno Arita - Editora Multimídia: Letícia Afonso - Reportagem: Ana Clara Oliveira, Alessandra Alves, Ana Cláudia Dias, Ana Luísa Reis, Anna Clara Antoun, Charles Santos, Danilo Moreira, Douglas Gomes, Francine Vilas Boas, Geovani Fernandes, Inaê Martins, Isânia Santos, Katiusca Demetino, Pamela Moraes - Fotografia: Amanda Sereno, Ariadne Selene, Emanuel Brandão, Iago Rezende, Laís Diniz, Lara Pechir, Pedro Ewers, Sarah Gonçalves - Diagramação: Aprígio Vilanova, Débora Simões, Flávia Gobato, Adriano Soares, Joice Mendes, Rafael Melo - Revisão: Marília Ferreira Monitoria: Pedro Carvalho e Túlio dos Anjos Colaboradora: Bruna Hayashi . Tiragem: 3.000 exemplares. Endereço: Rua do Catete, n° 166, Centro. Mariana - MG. CEP 35420-000


Maio de 2014 Arte: Rafael Melo

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educação

Há crianças, faltam creches Mesmo com duas novas unidades a serem entregues, o déficit de vagas e a precariedade das creches públicas persistem Emanuel Brandão

Isânia Silva Santos Um problema conhecido há tempos pela população marianense é a falta de vagas nas creches públicas da cidade. No início de 2013, a equipe do LAMPIÃO relatou de que forma essa carência afetava o cotidiano de algumas famílias que não haviam sido contempladas por essas vagas. Em dezembro, foi feito um cadastramento das crianças candidatas às vagas das creches municipais para o ano letivo de 2014. Esse cadastramento foi realizado pela Secretaria Municipal de Educação, que é responsável pela organização e administração dos cinco Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs). Segundo a Secretaria de Educação, a classificação das crianças é feita de acordo com o Decreto nº 6.748, de 18 de abril de 2013, que dispõe sobre os procedimentos para matrículas de crianças em creches subvencionadas pelo Poder Público Municipal. Nesse decreto fica estabelecida a realização de um cadastro único e de critérios de prioridades. Em geral, os critérios de matrícula combinam vários fatores como índice de vulnerabilidade social, faixa etária e local de moradia. No entanto, o Ministério da Educação determina que a educação infantil é um direito de todas as crianças, sem nenhum requisito de seleção. Em depoimento ao LAMPIÃO, S. de Souza contou ter enviado todos os dados necessários para conseguir uma vaga, e foi informada que seu padrão de rendimento não se enquadrava – mesmo sabendo que pessoas na mesma condição profissional que a dela estavam com seus filhos matriculados em creches. Por esses

motivos, ela não fez o último cadastramento, já que, desde 2011, passou o nome da criança para a diretora de uma creche, e até o momento não havia obtido retorno. De acordo com a Secretaria de Educação, 485 crianças são atendidas na rede. Porém, a oferta das creches não atende à necessidade da população. O número de vagas ainda é muito menor do que a demanda, e as famílias que não conseguem de imediato aguardam a convocação caso novas vagas surjam. Maria de Fátima do Carmo, que trabalha há três anos na Pastoral da Criança dos Bairros Cabanas e Vale Verde, confirma que a falta de vaga na creche que atende a esses bairros provoca muitos transtornos para as famílias. Ainda mencionou que cuida de uma criança de quatro anos, que foi afastada da mãe usuária de drogas e mora com a avó que está com a guarda e precisa sair para trabalhar. “Várias vezes fui à creche com a avó, e a diretora diz que não cabe mais criança. É muito difícil, acabei pegando para olhar”, finaliza Fatinha da Pastoral, como é conhecida. Implicações Em abril foi aprovada na Câmara Municipal de Mariana a liberação de aproximadamente R$ 3 milhões para construção de duas creches. Uma já está sendo construída no Bairro Vale Verde e outra será construída no Bairro São Cristóvão - já com ordem de serviço para início da obra. Esses bairros foram escolhidos por apresentar maior número de crianças na faixa etária de zero a cinco anos, que é o público alvo das creches. Com isso, abrirão 240 vagas

Construção de creche no Bairro Vale Verde, com conclusão prevista para outubro, ainda é insuficiente para demanda de Mariana

que ainda não serão suficientes. “A creche nova dá de frente para a casa da menina e nem pude colocar o nome dela na fila de espera. A diretora disse que já está cheia”, conta Fatinha da Pastoral. A condição de trabalho dos funcionários dos CMEIs é outro agravante. Segundo o Sindicato dos Servidores e Funcionários Público Municipais de Mariana (Sindserv), trata-se de funcionários públicos efetivos que prestaram concurso e foram nomeados, e funcionários contratados para trabalho temporário. Durante a paralisação que ocorreu em março, os monitores das creches denunciaram a superlotação e o número de funcionários não condizente com o de crianças. “Fomos procurados por assistentes que disseram trabalhar com dez crianças em turma de maternal. Recebemos denúncias de não cumprimento da rela-

ção funcionário e número de crianças”, expõe o vice-presidente do Sindserv, Darcy Pereira de Carvalho. O Ministério da Educação regulariza que o número de crianças por professor deve possibilitar atenção, responsabilidade e interação com os alunos e suas famílias. Levando em consideração as características do espaço físi-

co e das crianças, no caso de agrupamentos dentro de uma mesma faixa de idade, recomenda-se a proporção de seis a oito crianças por professor (no caso de crianças de zero a um ano), 15 crianças por professor (no caso de crianças de dois a três anos) e 20 crianças por professor (nos agrupamentos de crianças de quatro e cinco anos).

Contudo, para o presidente do Sindserv, Francisco de Assis de Souza, outros fatores acabam contribuindo para o mau funcionamento das creches na cidade. Em primeiro lugar está a falta de planejamento da infraestrutura, além de não haver integração com outros setores públicos, tais como saúde, assistência social e segurança.

Distribuição das crianças nos CMEIs Centros Municipais de Educação Infantil

Localização

Nº crianças

CMEI Espaço Cuidar e Educar

Centro

43 crianças

6 meses a 3 anos

CMEI Santo Antônio

Santo Antônio

84 crianças

6 meses a 5 anos

CMEI Santa Rita de Cássia

Santa Rita de Cássia

133 crianças

6 meses a 5 anos

CMEI Danielle Cristina Mendes

Passagem de Mariana

99 crianças

6 meses a 5 anos

CMEI Casinha de Nazaré

Rosário

126 crianças

6 meses a 5 anos

Faixa etária

Projeto discute consumo e sustentabilidade Pamela Moraes A procura por novos produtos e tendências aumenta, e, assim, muitos produtos tornam-se desatualizados. O crescente ritmo de produção, consumo irracional e degradação do meio ambiente motivam a pesquisadora e coordenadora do Setor Educativo do Museu da Inconfidência em Ouro Preto, Christine Azzi, a desenvolver, desde 2011, projetos educativos que visam contribuir para um desenvolvimento sustentável. Na Semana de Museus, realizada em maio de 2013, Christine elaborou duas oficinas sobre moda, consumo e sustentabilidade. Destinadas ao público infantojuvenil de escolas públicas, privadas e da Casa Lar, as oficinas beneficiaram 26 crianças. Christine conta que a intenção do projeto é trabalhar a mentalidade desses jovens para o futuro. Segundo ela, ao se tornarem críticos, eles dão mais importância à questão artesanal e manual. “Em um momento onde o consumismo é tão presente na sociedade, é preciso apresentar outra visão a eles, para que façam uma reflexão. Com isso, tendem a

consumir menos, tornandose seres completamente ativos nessa recepção de informações”, declara a pesquisadora. Uma calça que não utilizamos e que serviria como lixo, você pode cortar e fazer um short, é só ter imaginação. Do mesmo modo que fazemos um desenho, podemos criar algo a partir de materiais reciclados” Clarissa Lemos

As oficinas foram divididas em três etapas. A etapa teórica, onde Christine mostrou aos alunos que a moda pode fazer parte da vida de todos sem necessariamente estar relacionada à compra. Na parte prática foi estudado o conceito de customização, e realizados trabalhos manuais em que os participantes transformavam algo antigo em novo, uma forma de mostrar a eles que essa personalização reaproveita os materiais utilizados, diminuindo a quantidade de lixo. Para finalizar, foi realizada a doação de objetos. Cada criança, no ato de sua inscrição, trouxe um obje-

to pessoal que não era utilizado para trocar, com o objetivo de deixá-las mais preocupadas com o próximo e de acumular pertences. Clarissa Lemos, 12 anos, participou das oficinas e viu nelas uma maneira de pensar a moda como algo inspirador. “Uma simples camiseta velha pode virar uma blusa com nova estampa. Uma calça que não utilizamos e que serviria como lixo, você pode cortar e fazer um short, é só ter imaginação. Do mesmo modo que fazemos um desenho, podemos criar algo a partir de materiais reciclados”, ressaltou a estudante.

de 80% das compras da casa. Com o intuito de diminuir essa porcentagem, no dia 4 de abril, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) aprovou uma resolução que recomenda a proibição da propaganda infantil. A publicitária Bianca Brandão se mantém favorável a essa proibição, pois ela alega que até os 12 anos é direito e dever dos pais decidir o que deve ser consumido dentro de suas casas. Bianca acredita que a criança não tem o espírito crítico capaz de determinar o que de fato é melhor para si. “A publicidade,

Publicidade Infantil A sociedade contemporânea, caracterizada pela produção padronizada e em grande escala, sofre um consumo desenfreado de produtos que não tinham a necessidade real de serem adquiridos, por muitas vezes serem supérfluos e descartáveis. A publicidade e o marketing são fatores estimulantes nesse sistema, e segundo pesquisa feita em 2003 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as crianças participam do processo decisório

O governo deve se preocupar em oferecer educação e cultura às crianças (...) e não permitir que a publicidade leve ao consumismo descontrolado e antiético” Bianca Brandão

através do forte apelo visual, do uso do imperativo “compre” e “peça para seus pais”, das cores chamativas, de imagens animadas e fantásticas (nem sempre condizente com

o produto no ‘mundo’) e personagens famosos, cativam o público infantil para um consumismo irresponsável, sem levar em consideração a verdadeira necessidade e a qualidade daquele produto”, salienta. A publicitária argumenta que o governo deve se preocupar em oferecer educação e cultura às crianças, mesmo que pelas mídias, e não permitir que a publicidade leve ao consumismo descontrolado e antiético no país. A mudança nos hábitos de consumo não é de fácil resolução a um curto e médio prazo, o processo é gradual e os seus resultados serão sentidos ao longo do tempo. É necessário construir uma ética na maneira de consumir, com escolhas e comportamentos direcionados para a proteção do meio ambiente. Para isso, as propostas para um consumo sustentável implicam em ações individuais conscientes em conter o desperdício, diminuir os resíduos, reutilizar e reciclar. Dessa forma conseguiremos harmonizar as relações humanas com o planeta e não comprometer sua capacidade de atender às necessidades das futuras gerações.

Participe! O Setor Educativo do Museu da Inconfidência também realiza a oficina “Fábrica de ideias para pais e educadores: como criar um teatro de dedoches”. O projeto acontece na Casa do Pilar (Anexo III – Rua do Pilar, 76, Pilar) com o objetivo de resgatar a necessidade da participação da criança no processo de construção de brinquedos e de brincadeiras, retomando essa prática através da confecção de dedoches e de teatrinho para a brincadeira do faz de conta. Os encontros acontecem sob a coordenação de Christine Azzi, com duração de três horas pela manhã ou à tarde, e são agendados de acordo com as demandas em grupos de quatro a oito participantes. As inscrições são gratuitas pelo e-mail mdinc. educa@museus.gov.br ou telefone (31)3551-1378.


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Maio de 2014 Arte: Flávia Gobato

CIDADania

“Eu gosto de ficar quieto no meu canto” Como entender as histórias de pessoas que fazem da cidade de Mariana sua moradia, independentemente de onde seja

Amanda Sereno

Inaê Martins Olhar suspeito, e curioso. Falamos “Ei! Oi, tudo bem?” “Tudo bem...”. Silêncio incômodo. Quebro isso, disse quem éramos e o que queríamos entrando no espaço dos olhares, agora, firmes. Receptividade. Assim nos receberam e levamos um verdadeiro e leve papo. E na cordialidade do tchau, me disse “isso aqui ó, e a amizade, pra mim é tudo. Abre meu coração”. No último tchau, vi que abriu. Ganharam colchões, cobertas e sorrisos. Essas foram as primeiras impressões de uma conversa com Luís Carlos Domingos que, com boné da Azevedo, roupas cedidas e com desgaste do uso intenso, contou sobre sua trajetória até estar em situação de rua. Luís, 41 anos, nasceu em Diogo Vasconcelos, município próximo a Mariana e por

lá viveu com seus pais até os 12 anos, quando sua mãe morreu. Não gosta de pensar nem falar sobre a mãe. “Lembrança que eu tenho dela? O coração. A lembrança maior da minha vida é ela, ela tá aqui dentro [bate no peito], mas se ela tivesse comigo hoje eu num tava nessa vida igual eu tô”. Com determinação, Luís diz não gostar do pai, o considera um covarde. “Ele judiou de mim e nunca deixou eu entrar dentro de um grupo, pra eu fazer ao menos meu nome, nunca! Ele não me dava nada”. É o filho mais velho e tem quatro irmãos que moram em Mariana. Mantém uma boa relação, mas não costuma frequentar a casa deles. Luís saiu tão novo de casa que seus irmãos não têm muita noção do que ele passou. E a impressão que ficou foi de um distanciamento profundo nes-

sa relação, Luís deixando seu caminho livre de possíveis cobranças de sua família. “Saí pra minha vida, saí pro mundo”. Foi o que Luís contou sobre quando deixou a cidade onde nasceu até se estabelecer em Fonseca, distrito de Alvinópolis. Lá chegou porque estava “amigado”, conseguiu emprego -ainda menor de idade -, se casou e teve três filhos. Com 19 anos, já de carteira assinada, acreditou na “conversa fiada de um rapaz” dizendo que sua esposa o estava traindo, se separou e veio para Mariana. Foi nessa transição que seu filho mais velho morreu, por causa de uma insuficiência no tratamento de esquistossomose. Suas duas filhas moram com a mãe em Fonseca e Luís as vê apenas quando elas vêm visitá-lo em Mariana. Trabalhou na pedreira de Passagem, morando com a Amanda sereno

Luís Carlos e um visitante, oculto pelo cobertor , descansam em um colchão na instituição

Pertences de Luís Carlos e Arlindo ficam reunidos em parte do espaço ocupado no Caps

madrasta e os filhos dela, mas o convívio não deu certo. Já aqui, começou a trabalhar em uma serralheria na Cartuxa, mas “o negócio enfraqueceu”, ele não teve mais onde ficar e foi morar na rua. Há dois anos está nisso, e essa condição o deixou apenas com a possibilidade de pegar uns bicos de vez em quando. Mas a procura por emprego é empatada pelo uso constante do álcool. O canto A conversa que tivemos foi no canto quieto que Luís encontrou, na lateral do prédio do Centro de Atenção Psicossocial (Caps). Ele pediu pra ficar lá e cederam, condicionando apenas a limpeza do lugar. É cumprido. Luís divide o espaço com Arlindo Geraldo Mariano, e as várias visitas que recebem todos os dias. Luís fala de um jeito sério e preocupado sobre Arlindo. É uma amizade diferente, difícil de ser entendida, mas que

existe. E as visitas passam pra conversar, dormir, orar, ajudar, beber, desabafar e até namorar. Interação de vidas com histórias tão movimentadas quanto a descrita. Novelas na rua 26 pessoas em situação de rua, 26 histórias. Esse é o número mais recente levantado pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), de Mariana.O órgão atua contra a violação de direitos, o que inclui assistência às pessoas em situação de rua. Articulam documentação e atendimento médico/ psicológico - em parceria com o Caps. Além de, no próprio Creas, permitirem tomar banho, lavar roupas e guardar pertences e documentos. Vistos como imperfeição social, são alvos de uma existência quase anônima, consequente de discriminação nos olhares que criticam a aparência. Discussão apontada in-

clusive nas falas da psicóloga Ana Elisa Silame e da educadora social Márcia Mayrink Fernandes, que trabalham no Creas. Elas confessam que antes de estar nessa área, não pensavam nos percursos de vida, mas reproduziam imagem de prejulgamento de pessoas como Luís, Arlindo e suas visitas. São pessoas com trajetórias de conflitos familiares e sociais, condições de vício, consequências de violência física ou psicológica. As 26 causas para a rua ser a opção de moradia, o escape, a “liberdade”, a fuga dos vínculos que foram desfeitos. Parece até chamada de filme. Mas ilustram o clímax das novelas que passam nas ruas de Mariana. O roteiro é o passado dessas pessoas. Veja o ensaio fotográfico completo e comentado no site

Pesquisa do Ipea provoca discussões e motiva campanha feminista Katiusca Demetino No dia 27 de março, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou o estudo da pesquisa “Tolerância social à violência contra as mulheres” e os números foram preocupantes quanto à opressão contra a mulher no Brasil. A pesquisa indicava que a maioria das pessoas entrevistadas (65%) considerava que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Esse resultado provocou comoção e o protesto iniciado pela jornalista Nana Queiróz chamou mais aten-

ção para a pesquisa. A ação #nãomereçoserestuprada mobilizou as redes sociais trazendo à tona a atribuição de culpa à mulher pela agressão sofrida. Nana Queiróz recebeu muitas ameaças virtuais, mas também muito apoio e adesão ao movimento. Além da jornalista, outras mulheres publicaram fotos nuas da cintura para cima, tampando os seios com os cartazes que levavam os dizeres da causa. A página do movimento no Facebook já conta com mais de 40 mil seguidores. Alguns artistas também aderiram, como o apresentador

Serginho Groisman e alguns dos convidados do Programa Altas Horas. Outra celebridade que demonstrou apoio à luta foi a cantora de funk Valesca Popozuda.Três dias após a divulgação da pesquisa, ela publicou uma foto seminua no aplicativo Instagram com a frase: “De saia longa ou pelada #nãomereçoserestuprada”. Erro não desmotiva Após dias agitados causados em consequência da pesquisa, seguidos de reclamações e discussões, o Ipea lançou uma errata em sua página, lamentando-se pelo equívoco

de ter trocado os gráficos relativos à pergunta que mais levantou alvoroço referente ao estudo. No documento atualizado, o Instituto informou que 26% e não 65% concordavam com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”.O Instituto vem sofrendo desde então contestação da sua credibilidade, outrora respeitável. A mudança nesses números não inviabilizou o movimento organizado por Nana. Em entrevista, ela destaca que “poucas vezes o ditado popular ‘há males que vêm para o bem’ foi

tão bem aplicado. O erro do Ipea serviu para que milhares e milhares de mulheres brasileiras descobrissem que têm uma força de articulação muito maior do que imaginavam”. A jornalista segue a campanha com a proposta de um projeto de lei. A presidenta Dilma Rousseff prometeu averiguar o propósito de um plano federal de conscientização sobre o estupro elaborado por Nana e especialistas voluntárias. O intuito principal do programa é prevenir abusos, falando sobre o estupro principalmente nas escolas públicas, mas também nos

hospitais. “Para mim, o erro do Estado brasileiro está em focar na punição e afastamento de mulheres em situação de violência doméstica e não na prevenção. Por isso sugerimos para a presidenta um programa para combater a cultura do estupro já nas escolas, com crianças bem pequenas, quebrando o tabu e discutindo o tema durante as aulas”, cita a ativista. Esse plano de conscientização propiciaria, inclusive, um embasamento maior para quem atende esses casos e muitas vezes não tem o preparo para auxiliar essas mulheres. Lara Pechir

Ação feminista que demonstra a inquietude do público feminino com resultado de pesquisa ganhou projeção nas redes sociais. Diversas hashtags foram criadas para a campanha


Maio de 2014 Arte: Flávia Gobato

Segurança

Além da Maria da Penha Assédio e violência: mulheres buscam outras alternativas para suprir o atendimento precário

Lara Pechir

Feministas do Ninfeias se reúnem quinzenalmente para discutir meios de promover a igualdade de gêneros e fortalecer o lugar da mulher na sociedade

Katiusca Demetino Os Centros de Referência Especializada de Assistência Social (Creas) são o único amparo para as vítimas de violência doméstica na região dos Inconfidentes. Quando a agressão se enquadra dentro da Lei Maria da Penha, o procedimento sugerido pelos órgãos competentes é primeiro prestar uma queixa contra o agressor na polícia. Posteriormente, a vítima é encaminhada a algum posto do Creas, ou, em outros casos, para o Serviço Interprofissional de Atendimento à Mulher (Siame), em Ouro Preto. Nesses lugares ocorre um atendimento psicossocial, em algumas ocasiões, também ao suposto agressor. O processo, entretanto, não ocorre dessa forma. O medo de prestar a queixa faz com que muitas mulheres permaneçam refém do agressor. Quando decidem denunciar, o processo é lento e ineficaz. A Polícia Civil oferece um curto horário de atendimento ao público e não funciona nos finais de semana e feriados. Outro problema estrutural está nas centrais de acolhimento, localizadas apenas no centro,

Alternativas O sistema, que possui falhas para os atendimentos relacinados à Lei Maria da Penha, não tem estrutura para atender os outros casos de agressão à mulher. Atacadas, ameaçadas ou agredidas por estranhos só podem recorrer aos meios legais como medidas protetivas, mas não tem nenhum local referenciado para acolhimento, tratamento terapêutico ou social. Tampouco existem iniciativas públicas para cursos, palestras e orientações para mulheres, homens, crianças e adolescentes sobre o problema de gênero e às relações patriarcais que envolvem a cultura de coação à mulher. Mas existem sim, grupos feministas que acabam sendo a única maneira de suporte e força para essas mulheres. Vítimas não somente de agressões domésticas, mas que passam por situações cotidianas de opressão, assédio, violência verbal e psicológica. O Menos Pausa Coletivo é um grupo aberto que propõe estudos e debates sobre relações de gênero.

longe dos distritos. Também não foram implementandas as Delegacias da Mulher, que funcionam propriamente para atender esses casos. Após registrado o boletim de ocorrência, é aberto um processo na defensoria pública e então - caso julgue necessário - o órgão encaminha os casos aos centros de apoio. Em março, o Creas Ouro Preto recebeu 17 processos referentes à Lei Maria da Penha. Desses, a maioria originada dos distritos e dos bairros periféricos, sendo Antônio Pereira o distrito com maior índice de ocorrências. Já no Siame, são atendidas em média 40 mulheres por mês, também encaminhadas pelo judiciário. O número é alto, e ainda não condiz com a realidade, pois não há uma triagem específica por parte do município, tornando impossível mapear todos os casos. Procurada pela reportagem, a Polícia Civil de Ouro Preto não cooperou em apresentar os números dos casos de violência contra a mulher na região. O inspetor Geraldo Magela apenas informou, por telefone, que a polícia não tinha acesso à senha do sistema que registra esses dados oficiais.

Despreparo Em 22 de março de 2012, foi promulgada a Lei Nº. 761 na cidade de Ouro Preto, que tem como foco estabelecer diretrizes para a Política Municipal de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência, dentre outras providências. Em uma das normas presentes lê-se: “a disponibilização de uma central para prestar informações, por contato pessoal, telefônico ou eletrônico, ou para realizar denúncias sobre os atos de violência contra as mulheres.” A lei também prevê criação de centrais de atendimentos, divulgações constantes desses locais, capacitação para funcionários e suporte prioritário às vitimas. Porém, ainda não houve mobilização para a criação dessa política pública tão importante. O Siame, criado em 1996 pela iniciativa da juíza Lúcia de Fátima Magalhães Albuquerque Silva, propõe dar suporte à defensoria pública, e atender às mulheres em situação de violência. O espaço é cedido pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e o trabalho realizado por voluntárias. No local são prestadas oficinas à comunidade e às mu-

Ele realiza manifestações e intervenções urbanas sobre o tema, principalmente na cidade de Mariana. Outro grupo importante na região é o Núcleo de Investigações Feministas (Ninfeias). A rede colaborativa iniciou suas atividades por volta de outubro do ano passado, proporcionando intervenções, apresentações artísticas e jogos teatrais. As reuniões ocorrem às terças-feiras no Departamento de Artes Cênicas (Deart) no campus da Ufop Morro do Cruzeiro. Durante uma dessas reuniões, realizada em abril, elas discutiram projetos para dar continuidade ao trabalho que realizam, relataram histórias inspiradoras de outras mulheres e atenuaram a importância do coletivo nwwchismo. Um dos pontos marcantes foi a discussão sobre o medo e a insegurança que paira no dia a dia da mulher.

ao assédio, nove a cada dez não esboçam reação diante da cantada por medo de serem agredidas, coagidas, perseguidas, entre outras formas de desrespeito e humilhação. O questionário aplicado foi baseado no estudo “Chega de Fiu Fiu” efetuado pelo site thinkolga. Dentre os casos narrados, existe uma recorrência de relatos sobre estudantes universitários, ex- namorados e colegas. “Fui me aproximando da portaria do cursinho, quando um cara, por trás, enfiou a mão entre as minhas pernas e apertou bem forte, calou a minha boca com uma das mãos e disse no meu ouvido: ‘Vem cá, gostosa!’ Fiquei até sem força de tanto nojo que senti. Gritei e quando ele viu que pessoas estavam saindo do curso de inglês, se assustou e fugiu. Eu corri sem parar até a minha casa, ninguém conseguiu me parar”, conta uma mulher de 23 anos que reside em Ouro Preto. Depoimentos como esse mostram a fragilidade da mulher, não em seu físico ou intelecto, mas numa condição cultural machista e opressora.

Assédio e medo Em pesquisa realizada com 30 mulheres da região, todas afirmaram não gostar de receber cantadas e, ao serem questionadas se respondem

lheres acolhidas. Elas podem aprender diversas práticas, como corte e costura, manicure e artesanato. Mas a realidade da falta de capacitação e informação deixam a instituição fragilizada, podendo inclusive ter a sua competência questionada. Em entrevista, a psicóloga Maria Aparecida Alves - que presta atendimento no local - demonstrou não possuir uma reflexão mais apurada sobre a situação de violência contra a mulher. Ao comentar alguns casos que passaram pelo local, Maria utilizou frases como “tem mulheres que provocam” e chegou a dizer que a mulher é mais flexível que o homem por natureza e por tal motivo deve ser mais maleável e ceder mais que o companheiro, para evitar brigas, desavenças e separações. Esse caso revela que as profissionais estão dispostas a prestar atendimento, sem, no entanto, estarem habilitadas a prestar auxílio adequado às vitimas

Ouro Preto Polícia Civil Av. Juscelino Kubitschek, 63 – Bauxita - 3551-3222 ou 197 Seg à sex, exceto feriados De 9h às 11h e de 14h às 17h Creas Rua Orlando Ramos, 55 Vila São José - 3551-6101 Seg à sex, de 9h às 17h Siame Praça Cesário Alvim, 50 - Barra 3551-6245 Seg à sex, de 9h às 17h

Mariana Polícia Civil Rua Dezesseis de Julho,1- Centro 3557-2811 Seg à sex, exceto feriados De 9h às 11h e de 14h às 17h Creas Rua Angelin, 54 - Rosário 3557-4185 Seg à sex, de 9h às 17h Seg à sex, de 9h às 17h

Confira mais depoimentos e entrevistas sobre assédio e violência contra a mulher

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Análise

Queimem as vadias. A fogueira está acesa Edmar Borges As mulheres já foram apedrejadas por se prostituir e condenadas à morte por praticar bruxaria. Em ambos os casos, bastasse que elas fossem apenas suspeitas. Depois, foi negado a elas o direito de votar. Há um rumor, contudo, de que evoluímos, de que as minorias ganharam voz. O juiz dos nossos tempos discorda – sob o pseudônimo de Sociedade Patriarcal, ele agora persegue as mulheres que não respondem à expectativa tradicional de seu gênero. Depois de tanto tempo, elas ainda não são livres para escolher o tamanho das suas roupas, a hora de voltar para casa e com quem vão transar. Eu sou homem. Segundo nosso “juiz”, eu lidero e sou obedecido, pois tenho direito natural de governar o mundo por ser homem. Qualquer ameaça ao meu império deve ser vetada. As mulheres podem ocupar o lado direito do trono, é claro, pois eu preciso me divertir e procriar; mas elas ficam no banco menor, aguardando serem úteis. “Essa história não existe mais, estamos no século 21...”, dirão. Mas a pesquisa realizada pelo Ipea desmascara a hipocrisia e aponta as arbitrariedades no nosso país: enquanto houver alguém que concorde que uma mulher merece ser estuprada por causa do que aparenta, estaremos eternamente acorrentados a uma era de regresso e incentivo à violência. A era dos que não respeitam os limites do outro e seu direito à autenticidade e não-violação. É claro que “o outro” costuma ser “a outra”. Um homem não é julgado por andar sem camisa ou beber demais. Se eu passar dos limites numa festa e voltar para casa à noite, sozinho, não serei visto como alguém pedindo por sexo. Eu dificilmente serei estuprado. Nessa mesma circunstância, porém, uma garota pode se tornar um alvo em potencial. Qual a diferença entre mim e ela? Uma mulher bêbada, com roupas curtas ou desacompanhada está, na verdade, querendo sexo ou disponível para flertes? Não. Ela tem todo o direito de sentir calor e de se divertir. Isso nem deveria estar em discussão. É óbvio. Mas parece que não para o Brasil, embora a maioria dos brasileiros que incentivam a cultura da culpa não conheça o nome atribuído à sua corja: sociedade “Slut Shaming”. O termo ganhou popularidade nos últimos anos e sua prole condena a mulher que ultrapassa certos limites comportamentais. Então, sua identidade como mãe, irmã, filha, mulher, é substituída pela identidade de “puta”. Ela não devia ter saído de casa com esse decote. Diferente do homem, que beija e dança a noite toda e chega a ser digno de respeito por isso, a “oferecida” não pode olhar para alguém, sorrir ou ser atraente sem esperar que os outros a assediem. Pelo contrário – ela será julgada por suas atitudes e intitulada “vadia”. Como se isso fosse um transtorno. E, claro, vai arder na fogueira social da vergonha; o que, sim, talvez seja um pouco chato. Mas aqui vai a boa nova: contra a frigidez da sociedade, só resta o calor das chamas.


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Maio de 2014 Arte: Joyce Mendes

SAÚDE

Os altos e baixos da

O LAMPIÃO ouviu o que a população tem a Em 2013, a Secretaria de Saúde do município declarou, aproximadame

Mapa da Saúde Atenção Primária ESF - A porta de entrada

Consultas: preventivas, agendadas e atendimento espontâneo com médicos, enfermeiros, dentistas, fisioterapeutas e nutricionistas; Acompanhamento: referente à saúde mental em casos leves e moderados; vacinação; curativos; administração de medicamentos; controle de pressão arterial e glicemia; preventivo; pré-natal de risco habitual e planejamento familiar. Funcionamento: segunda À sexta, 7H às 16H,

Atenção Secundária Complexo de Saúde Policlínica:

Pronto Atendimento: Atendimento de urgência e emergência por médicos clínicos e pediatras, por equipe de enfermagem e pequena cirurgia. Laboratório de Análises Clínicas, serviço de radiologia. Serviço de Fisioterapia: Reabilitação física, fisioterapia ortopédica, traumatológica neurológica, reumatológica, respiratória, ginecológica e domiciliar. Serviço Odontológico: Atendimento clínico, odontopediatria, urgência odontológica, endodontia e periodontia. Atendimento de médicos especialistas: Ginecologia, obstetrícia, mastologia, pediatria, ortopedia, oftalmologia, gastroenterologia, proctologia, otorrinolaringologia, neurologia, endocrinologia, dermatologia, pneumologia adulto e infantil e controle de doença infecto-contagiosa. Exames de ultrassom, endoscopia e ecocardiograma. Atendimento: Segunda à sábado, 7H às 19H.

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

SAMU Atendimento móvel de urgência

Central de Vacinação

HIPERDIA Controle da pressão arterial e diabetes

CRESCER Saúde Mental da Criança

Previne Atendimento com médicos especialistas

Serviço de Vigilância em Saúde

Cardiologia: exames, Teste Ergométrico, ECC e ECG

TFD Tratamento Fora do Domicílio

Atenção terciária

Hospital Monsenhor Horta

Atendimentos: casos em que a atenção primária e secundária não consegue resolver. Em Mariana o Hospital Monsenhor Horta realiza o atendimento dos casos que precisam de tratamento com internação ou cirurgia. Se o hospital não tiver suporte para resolver, ele deve encaminhar o paciente aos centros de referência mais próximos. Serviços oferecidos: consultas, exames de laboratório, Raios -x, teste da orelhinha, internações clínicas, pediátricas, obstétricas e cirúrgicas de urgência e procedimentos cirúrgicos eletivos pactuados na PPI - Programação Pactuada Integrada e Hemodiálise.

Horário de atendimento pelo SUS no pronto atendimento (clínico e Pediatra): segunda a sábado de 19h às 7h e, aos domingos, 24horas.

Ana Clara Oliveira Atualmente, Mariana atende cerca de 70% da população pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Esse serviço é distribuído, pela cidade e distritos, em 40 estabelecimentos públicos de saúde. Os atendimentos são divididos em três instâncias: primário, secundário e terciário (como é possível entender no esquema ao lado). O atendimento de emergência é à parte e se divide em pronto atendimento e pequenas urgências. O pronto atendimento possui maior estrutura para atender os pacientes e funciona na Policlínica, no Hospital Monsenhor Horta e, três vezes por semana, no Estratégia de Saúde Familiar (ESF) do Bairro Cabanas. Os atendimentos urgentes mais simples, que não requerem tantos equipamentos, funcionam nas unidades de atenção primária (ESF), que são 13 no total, no Centro de Especialidades - Previne e nas unidades de apoio, localizadas nos subdistritos da cidade. Policlínica A Policlínica funciona como uma Unidade de Pronto Atendimento 12h. Segundo Rosana Morais, referência técnica em atenção à saúde de Mariana, o projeto de construção da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) 24h já está encaminhado. Por enquanto, o pronto atendimento na Policlínica é das 7 horas às 19 horas, com uma média de 40 pacientes por médico por dia. Além disso, segundo Rosana, há dois médicos que atendem, separadamente, os casos de maior gravidade. Na manhã do dia 9 de abril, a técnica na área de ginecologia pelo SUS, Maria Lúcia, estava aguardando uma consulta ortopédica. “Marquei minha consulta pelo ESF e foi rápido. Muitas pessoas não marcam por lá porque não conhecem, mas o agendamento é bem mais rápido.” afirmou ela. Suelen Kailyane Ferreira estava acompanhando o tio que havia sofrido um acidente de moto na noite anterior: “nós fomos ontem a noite com ele ao Hospital, ele tirou raio-X e o médico disse que o pé estava quebrado, mas que não dava para engessar lá, então nos encaminharam para a Policlínica.” Ela chegou com o tio na Policlínica por volta das 7 horas, com o exame em mãos, mas pediram para que ele tirasse novamente um raio-X. “A mulher daqui falou que acha que o pé dele não está quebrado e, depois que todo mundo passar, vão atender ele. Já estamos aqui há duas horas”. Hospital O Hospital Monsenhor Horta é privado, porém, possui um contrato com a Prefeitura de Mariana e atende a rede pública durante a semana das 19 horas às 7 horas e, aos domingos, o dia todo. Essa parceria existe para suprir, principalmente, o fato de a Policlínica não funcionar 24 horas. Segundo a assessora de imprensa do Hospital, o estabelecimento disponibiliza cerca de 85% do atendimento ao SUS. Isso inclui, além do pronto atendimento, os serviços de ortopedia, apoio ao diagnóstico e 56 leitos dos 67 existentes no Hospital. A parceria entre Hospital e Prefeitura não implica no gerenciamento do estabelecimento. Isso cabe apenas ao Hospital. As consultas de público e privado, no período da noite, são realizadas juntas e todos enfrentam uma mesma fila, o que é motivo de muitas reclamações para os pacientes.

Na noite do dia 11 de abril, Andressa Rocha estava na fila à espera de uma consulta para o filho. Ela e a família sempre tiveram plano de saúde: “é tudo a mesma coisa: ruim” afirma. Segundo Andressa, a demora e o atendimento são iguais e a única diferença é que, em caso de internação, quem tem plano fica em apartamento. “A população está crescendo muito e o Hospital não suporta mais a quantidade de pacientes, Mariana precisa de outro hospital”, afirma ela. Zé Raimundo de Mendonça também estava aguardando uma consulta. Ele não tem plano de saúde e não está satisfeito. Me chamou e pediu que eu anotasse uma observação. “Mariana precisa de um hospital público!”. Segundo ele, a Prefeitura deveria parar de investir em um hospital particular e construir um hospital público na cidade. “Eu moro aqui perto e tenho idoso em casa, se eu o trouxer morrendo aqui entre 7 horas da manhã e 19 horas eles não atendem. Mandam a gente lá para a Policlínica.”, conta Zé Raimundo. Previne No Previne, entre as 19 horas e meia-noite, funciona o atendimento às pequenas emergências, com clínico geral e pediatra. Segundo uma funcionária que não quis se identificar, o principal problema do lugar é a falta de acessibilidade. O prédio é mal estruturado e possui dois andares, o que dificulta a mobilidade. Grávidas, idosos e cadeirantes precisam enfrentar as escadas para serem consultados no segundo andar. Além disso, de acordo com essa mesma funcionária “é um absurdo o atendimento no horário da noite, não há estrutura nem equipamentos no Previne para casos de emergência”. Na noite do dia 14 de abril, encontrei Márcia Veisack, que estava só de acompanhante dessa vez, mas disse que também nunca teve problema. “Para mim, a saúde em Mariana sempre foi boa, sou diabética e nunca precisei comprar remédio, nunca faltou”. Além disso, ela disse que nunca teve dificuldade em agendar consultas, ao contrário da mãe e da irmã que, apesar de possuírem plano de saúde, nunca conseguem vagas para serem atendidas. E as autoridades? Durante a apuração, o LAMPIÃO enfrentou muitas dificuldades para obter informações oficiais da Secretaria de Saúde. O processo é muito burocrático e demorado. Desde o dia 5 de abril, quando houve o primeiro contato do jornal com a Secretaria, foram muitas as tentativas de se conseguir um contato direto com o secretário de saúde, Germano Zanforlim. O que até hoje não foi possível. Faltando apenas um dia para o fechamento desta edição do jornal, no dia 24 de abril, conseguimos uma entrevista com Rosana Morais, que administra as unidades de saúde pública em Mariana e pôde passar as informações que constam na reportagem.

Um problema atrás do outro Ana Clara Oliveira Thayanne Carvalho é estudante da Universidade Federal de Ouro Preto. No dia 13 de janeiro, decidiu procurar um médico, porque estava sentindo sua perna inchada. Foi direto à Santa Casa de Misericórdia, em Ouro Preto, pois pensou que em Mariana a espera por atendimento poderia ser demorada. Na Santa Casa, ela foi atendida rapidamente pelo plano do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg). Após 13 dias internada, Thayanne foi diagnosticada com trombose venosa profunda na perna. A partir daí, ela vem enfrentando diversos problemas com os serviços públicos de saúde. A mãe dela foi ao Previne para marcar uma consulta de urgência com um especialista e foi informada que o atendimento era realizado no dia 31. Quando chegaram ao Previne no dia determinado, descobriram que, além de agendamento, precisariam de um encaminhamento do clínico geral, mesmo que já estivessem com o atestado de internação e o diagnóstico por escrito em mãos. Quando precisou se consultar com nutricionista, ela teve que ir mais de uma vez para conseguir marcar a consulta, já que o agendamento é feito em um dia específico do mês. Quando por fim conseguiu marcar, só tinha vaga para um mês depois. Thayanne precisa de um acompanhamento semanal com um clínico geral, e em todas às vezes, espera duas horas para ser atendida no Previne. Além disso, tem que fazer um exame de sangue semanalmente. Para isso, ela optou pelo serviço particular e precisa pagar R$ 5 a cada exame.


Maio de 2014 Arte: Joyce Mendes

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a saúde em Mariana

dizer sobre o atendimento na cidade. ente, R$ 62 milhões em despesas para o Ministério da Saúde

Investimento na cidade cresceu mais de 97 vezes em 12 anos Ana Cláudia Dias De R$ 638 mil, em 2002, para R$ 62 milhões, em 2013, em despesas anuais com saúde. Esses foram os valores que Mariana registrou no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (Siops).

O Siops agrupa registros das cidades do Brasil e seus dados têm natureza declaratória. Sua finalidade é a fiscalização da aplicação mínima em ações e serviços públicos de saúde, com base na Emenda Constitucional nº 29, de 2000. No mesmo pe-

ríodo, o valor declarado por Ouro Preto cresceu 9,63 vezes e o de Itabirito 6,80 vezes: cidades que compõem a microrregião de Ouro Preto no Ministério da Saúde. De acordo com a Sala de Apoio de Gestão Estratégica (Sage), em

Crescimento dos gastos X Crescimento populacional

2013

quisa de satisfação política encomendada pela Câmara Municipal. A Saúde, assim como Educação e Obras, teve 26% de aprovação em estudo realizado pelo instituto de pesquisa Giga, com moradores entre os dias 14 e 16 de dezembro de 2013.

Evolução das despesas com assistência hospitalar e ambulatorial e dos gastos com atenção básica Fonte: SIOPS

2002

12 anos o número total de equipamentos médicos disponíveis na Rede Pública de Mariana passou de 26 para 153. E, hoje, o SUS oferece 1,05 leitos para cada mil habitantes. A qualidade da saúde pública em Mariana pode ser verificada na pes-

60 milhões

50 milhões

Assistência hospitalar e ambulatorial

40 milhões

Variação da população 2002/2013

sarah gonçalves

Em 2002, o Ministério da Saúde considerou que Mariana tinha 48.505 habitantes e a Secretaria de Saúde do município registrou um gasto de R$ 638.368,07 no Siops. Já no ano passado foram 57.639 moradores e a despesa informada é de R$ 62.075.074,30.

Fonte: SIOPS

Variação de investimento 2002/2013

30 milhões

20 milhões

10 milhões Atenção básica

2002

2003

2004

2005

2007

2006

2008

2009

2010

2011

2012

2013

Registro, no Siops, da distribuição de gastos no primeiro ano de cada governo 2002: Celso Cota

2005: Celso Cota

2009: Roque Camelo

2013: Celso Cota

R$ ?

R$ 640.652,00

R$ 8115,5 R$ 0,00

R$ 74.092,27

R$ 776.700,00

R$ 4.214.608,19

R$ 1.131.500,00

R$ 41.313,00

R$ 536.642,00

R$ 300.874,60

R$ 43.560,00

R$ 0,00 R$ 162.004,03

R$ 709.074,22

R$ 358.228,91

R$ 0,00

R$ 0,00

R$ 327.390,01

R$ 394.174,57 R$ 10.771.427,00

R$ 20.461.263,13

R$ 4.000,00

R$ 57.012.660

R$ 516.415,24

Gasto total R$ 12.391.822,91

Gasto total R$ 23.379.411,95

Atenção básica

Alimentação e nutrição

Assistência hospitalar e laboratorial

Vigilância sanitária

Vigilância epidemiológica

Administração geral

DSTs: dilemas no atendimento Douglas Gomes O setor de Vigilância Epidemiológica atua juntamente com o serviço de infectologia, responsável pela notificação, prevenção, acompanhamento, monitoramento e tratamento de doenças transmissíveis, dentre elas as Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs). A chefe do departamento de Vigilância Epidemiológica, Nathércia Angélica Barbo-

sa Pereira Nobre, informa que a equipe de atendimento conta com quatro médicos, uma enfermeira, três técnicos de enfermagem, duas agentes investigativas de endemia e uma técnica de informática, sediados no Centro de Especialidades – Previne. Não foi informada como é realizada a capacitação desses funcionários nem se existem cursos de reciclagem para eles.

Uma paciente de 23 anos, que prefere não ser identificada, conta que procurou o atendimento de um clínico geral do SUS quando ainda era moradora de Mariana. Ao ter notado um corrimento vaginal atípico após ter mantido relação sexual com seu parceiro, ainda que com o uso de preservativo, ela se preocupou que pudesse ser alguma DST e procurou ajuda. “Fui até ao médico e esperava ter alguma explicação. Ele nem me tocou. Não me perguntou se eu havia tido problemas assim, se eu já tinha alguma doença relacionada aos sintomas. Apenas me encaminhou para o ginecologista e dois anos depois, ainda não obtive qualquer tipo de retorno sobre o encaminhamento”, relata a paciente que conseguiu o atendimento em outra cidade por meio particular. “Se dependesse exclusivamente do SUS para resolver meu problema, estaria até hoje esperando”, pontua. Por isso, casos como o da paciente de 23 anos não chegariam até o setor de infectologia devido à falha do primeiro atendimento. Em 2013, foram notificados 267 casos de DSTs em Mariana. Entretanto, o número de pessoas tratadas é superior, pois os casos de DSTs não são passíveis de busca ativa e o

paciente só pode ser notificado no ato do atendimento. Independente de qual seja a DST ou a sua gravidade, e segundo a atual legislação, essa notificação só pode ser realizada em ambiente interno à consulta. Atendimento Segundo a coordenadora, o setor de infectologia promove ações de prevenção de diversas doenças durante todo o ano, porém, não informou em que locais e nem como são feitos os direcionamentos dessas orientações para cada público. Nathércia informa que o paciente portador de qualquer DST pode optar por ser atendido pelo ESF ou pode agendar uma consulta no serviço de ginecologia ou urologia do Previne. Nos casos de exposição ao vírus HIV, além dos passos anteriormente descritos, o paciente pode solicitar uma consulta médica no serviço de epidemiologia, sem precisar especificar o motivo de sua consulta, não sendo necessário nenhum tipo de encaminhamento. Após relato ao médico sobre o tipo de exposição sofrida do paciente, são solicitados exames necessários que são realizados ou autorizados pelo laboratório municipal. Se o resultado for negativo, o pacien-

Gasto total R$ 62.075.074,30

Saiba como acessar os dados sobre a saúde no país

Fonte: SIOPS

Gasto total R$ 638.386,07

te recebe orientação para prevenção de DST; se positivo, o controle pode ser realizado no serviço de epidemiologia que acompanhará o caso por tempo indeterminado. Quando o atendimento demanda uso de medicamentos específicos para os sintomas da AIDS, o paciente tem de ser encaminhado para o município de Ouro Preto, onde terá suporte de que conta com uma equipe especializada formada por assistente social, nutricionista e psicólogo. As medicações para esse tratamento, especificamente, são fornecidas gratuitamente pelo Estado, bastando apenas o preenchimento da solicitação da medicação indicada pelo médico e manutenção das consultas mensais. A permanência no tratamento é de opção do paciente e seu abandono ou retorno não sofrem nenhuma restrição. Para o tratamento das DSTs em geral, após o diagnóstico efetuado pelos médicos do setor de infectologia, há medicamentos fornecidos gratuitamente nas farmácias dos serviços de saúde municipal. A chefe do departamento ressalta que o sigilo absoluto da identidade do paciente é mantido em todas as circunstâncias, sendo um fator imprescindível a todos os atendimentos.


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Maio de 2014 Arte: Débora Simões

cidade

Quebra-molas causam transtornos Faixas elevadas na Avenida Nossa Senhora do Carmo incomodam motoristas e afetam acessibilidade de pedestres laís diniz

Anna Clara Antoun Desde 2012, uma série de reformas de requalificação urbana está sendo realizada na Avenida Nossa Senhora do Carmo. Atualmente, o trecho tem uma licitação em andamento, incluindo várias reformas que apresentam impacto no cotidiano de moradores e trabalhadores. Uma das obras está em fase de conclusão e já causa transtornos: a instalação de pisos direcionais elevados que, desde que foram inseridos, são responsáveis por vários acidentes em função da sua altura. A enfermeira Maria Alves se acidentou recentemente, devido a uma batida de ônibus em uma das lombadas e levou dez pontos na cabeça. Segundo ela, o perigo que a passagem representa é grande e é preciso que sejam feitas adaptações no local para que ninguém mais se machuque. Os maiores questionamentos dos motoristas são em relação ao formato da passagem, altura e proximidade de umas com as outras. Arquiteta da Prefeitura, Anne Akemi

Yanaga, diz que a obra concorda com as normas de acessibilidade e do Conselho Nacional de Trânsito. “A faixa elevada é para que o pedestre possa atravessar a avenida sem ter que descer no nível da rua e fazê-lo com mais conforto. O ideal é que o pedestre não tenha que andar mais de 200 metros para fazer a travessia. Por isso que em alguns pontos elas estão mais próximas”. Akemi explica ainda a altura da passagem. “Muita gente reclamou da altura da faixa, mas o indicado é 15% de declividade (que é o caso da obra referida). Tem que ficar na mesma altura do passeio”. Apesar de estar na mesma altura da calçada, a faixa elevada não favorece a acessibilidade, pois existe um vão entre as duas. A dificuldade de acesso traz desafios para quem já enfrentava os antigos problemas de infra estrutura. Vinicius Pereira, deficiente físico, alega ter muita dificuldade para atravessar a avenida. “No início, acreditei que a intenção da prefeitura era de tornar a ave-

nida mais acessível para os deficientes físicos e visuais. Da mesma forma que tinha problemas de locomoção antes, agora não consigo atravessar em cima desse quebra-molas com minha cadeira de rodas. A prefeitura não pensou nas nossas simples dificuldades”. De acordo com Akemi, a faixa elevada possui dupla função: ao mesmo tempo em que permite aos pedestres atravessarem a rua com conforto sem descer do nível do passeio, também obriga o motorista a reduzir a velocidade, aumentando a segurança. A requalificação urbana na Avenida Nossa Senhora do Carmo contempla ainda ações como a desobstrução dos passeios, instalação de pisos podotáteis (para deficientes visuais), padronização das calçadas e rampas de garagens, instalação de pontos de ônibus e serviços de arborização. Trabalhadores da Prefeitura que estão executando as obras explicam que serão pintadas faixas de pedestres em cima de cada elevação, o que

irá ajudar na sinalização. Outra reforma no trecho que teve início em 2011, na época da constante troca de prefeitos, e que precisa ser finalizada, é a obra de transposição do córrego do Catete. O morador Moacir Eleutério diz que já solicitou várias vezes à Prefeitura uma providência em relação ao fechamento de parte do córrego que existe atrás de sua casa. No local, não há água suficiente para carregar os detritos e os moradores são obrigados a conviver com a falta de saneamento. Com relação à Prefeitura, Moacir diz que o engenheiro responsável não voltou mais ao local após uma visita no início de 2013. A reportagem do LAMPIÃO entrou em contato com a Prefeitura para verificar o andamento desta solicitação, mas até o momento do fechamento da edição não obteve resposta. Saiba o que mudou na avenida nos últimos anos

laís diniz

Vão entre passeio e a faixa dificulta a travessia de pedestres

Mobilidade Urbana

Inclinação da faixa elevada, que pode causar danos ao veículo, obriga motorista a reduzir drasticamente a velocidade

O Plano de Mobilidade Urbana, que visa a melhoria da acessibilidade e mobilidade de pessoas e cargas no espaço urbano, está em fase de elaboração no município de Mariana. Após as manifestações de junho de 2013, a Prefeitura garantiu apresentá-lo até dezembro do mesmo ano. De acordo com o chefe do Departamento de Transporte e Trânsito (Demutran), Geraldo Augusto Simplício, foram feitos levantamentos de demandas, que partiram de re-

clamações da população com relação ao trânsito e à locomoção. Mas até o momento o projeto não foi redigido. Segundo a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU - Lei 12.587/2012), todos os municípios brasileiros com mais de 20 mil habitantes, devem elaborar um planejamento até abril de 2015. Caso não seja feito no prazo, os municípios deixarão de receber as verbas federais próprias para o incentivo a mobilidade.

Taxímetro: da obrigatoriedade e do uso Francine Vilas Boas O mesmo trajeto em duas corridas diferentes que tem como resultado valores, muitas vezes, divergentes. Baseado nisso, o debate acerca da obrigatoriedade do taxímetro acarreta polêmica entre usuários e taxistas. A profissão de taxista foi regulamentada em 2011, de acordo com a lei federal n° 12.468. O Art. 8° da lei determina que, em municípios com mais de 50 mil habitantes, o uso do taxímetro é obrigatório, obtido por meio do órgão competente. No entanto, em Mariana, com uma população de cerca de 55 mil habitantes, essa lei não é sancionada. O taxímetro é um aparelho eletrônico, acionado no momento em que o freguês entra no veículo. É responsável pela medição do tempo de uso e quilometragem percorrida pelo automóvel, gerando, assim, o preço da corrida a ser cobrado ao cliente. Mariana possui quatro frotas de táxis, localizadas no Terminal Rodoviário, Praça Presidente Tancredo Neves,

Praça Juscelino Kubitschek e Praça Cláudio Manoel. Dentre elas, apenas a do Terminal Rodoviário utiliza-se do taxímetro. As demais dispõem de uma tabela fixa, que determina o preço a ser cobrado dependendo do local de destino. “O Sindicato vai e faz, a Prefeitura e o Demutran (Departamento Municipal de Trânsito) vai, aprova, e passa pra gente”, diz Anísio Jefferson, 31 anos, taxista há seis. De acordo com Anísio, que trabalha como motorista contratado e recebe 30% de toda corrida que faz, o principal motivo para que não se empregue o taxímetro está no baixo lucro por determinadas corridas. Há também o medo constante de serem assaltados, sequestrados e mortos pela falta de segurança e policiamento nas redondezas onde trabalham, além de combustível com preços elevados, e a má estrutura nas ruas marianenses que resultam em uma manutenção frequente dos carros. “Como auxiliar eu vou te falar assim, num ponto é bom e no outro é ruim.

No taxímetro tem corrida que não vai valer a pena, e tem outras que vão valer a pena. Só que a gente sai perdendo, taxista aqui em Mariana sai perdendo”, conta o motorista. Segundo José Horta, 62 anos, dos 130 taxistas da cidade, apenas 14 empregam o medidor para a cobrança de seus clientes. Horta, que trabalha há 17 anos na cidade, optou por aplicar o aparelho considerando uma atitude mais íntegra com o cliente e com os colegas de profissão, que recebem um lucro igual pela corrida. “No taxímetro x é x, você está mostrando pra pessoa o quanto ela tá pagando o preço justo”, relata. Os turistas que visitam a cidade e têm por costume o uso do aparelho, percebem os preços tabelados abusivos levando em consideração o caminho percorrido. “Me senti lesada vendo que os preços são tabelados. Para uma cidade do tamanho de Mariana é caro se pagar R$ 20 para ir do centro a rodoviária”, alega Camila Figueiredo, 27 anos, moradora de Ubatuba - SP.

Entre os moradores, o assunto gera discussão. Existe uma relação de confiança entre clientes e taxistas. Por causa disso, muitos concordam com os preços cobrados, em vista das más condições de trânsito e da pouca segurança enfrentada por esses trabalhadores. Outros, porém, consi-

deram altos os preços tabelados e prefeririam usufruir do aparelho eletrônico. Todos os carros regulamentados possuem em seus interiores o aparelho, utilizado ou não. Cabe ao município o cumprimento da lei e, principalmente, a fiscalização desses veículos e seus respecti-

vos medidores. O usuário tem o direito de solicitar o uso do taxímetro. Para os clientes que se sentirem prejudicados em relação ao preço cobrado, ou a recusa do taxista em ligar o aparelho, o Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) é uma alternativa viável para reclamações. laís diniz

Em Mariana, apenas 14 dos 130 taxis regulamentados utilizam o medidor para cobrar as corridas


Maio de 2014 Arte: Débora Simões

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esporte Emanuel brandão

Paixão além das quatro linhas O tradicional amor ao Guarany Futebol Clube envolve memórias e esperanças de seus torcedores Danilo Moreira O futebol, muito mais que um esporte, é a união de paixões. Laços de amizade e de família se vinculam de acordo com as cores pintadas nas camisas e nos escudos de cada clube. A intensidade é variável, mas, em cidades do interior, a evidência dessa forte ligação sentimental está nas raízes históricas. Nas memórias do povo. Nas trajetórias de sobrenomes, de vidas.

Os moradores de Mariana, em Minas Gerais, sabem bem disso. Os torcedores do Guarany, mais ainda. O Guarany Futebol Clube é um dos principais times da Região dos Inconfidentes. Maior vencedor de títulos municipais, o alviverde tem relação próxima com muitas famílias tradicionais marianenses. De pai para filho, o amor ao clube segue se renovando. “Salve mil vezes o Guarany”, diz o hino.

Na Rua do Seminário, em frente a um grande portão verde, um amontoado de crianças está sempre reunido. É a espera por mais uma chance de jogar bola, treinar, fazer o que gosta. A empolgação fica evidente na conversa alta, no riso fácil e no olhar ansioso. A animada cena é recente, mas lembra muitos momentos do passado deste lugar. “Antigamente, era muito diferente. Existia o amor. Essa tradição Emanuel brandão

Dedicação ao Guarany une Moacir Eleutério, presidente do time, e Emilio Ibrahim, torcedor

de amor ao clube está acabando”, afirma o atual presidente do Guarany, Moacir Eleutério. Se o futebol não possui grande representatividade nos dias presentes de Mariana, sua influência nas últimas décadas é inquestionável. No Estádio Emílio Ibrahim, a memória não fica no banco de reservas. Graças, principalmente, àquele que hoje dá nome ao estádio do clube. A Rua Salomão Ibrahim cerceia o campo do Guarany. De origem siríaca, Salomão chegou a Mariana no início do século passado. Seu filho Emilio nasceu em 1925, mesmo ano de nascimento do Guarany. Não à toa, a história do filho de Salomão e a do próprio Guarany parecem se confundir. “O Emilio sempre foi uma figura importante dentro do time”, destaca Moacir. Atuando pelas equipes aspirante e titular, Emilio se destacou. Em 1944, mostrou-se fundamental. Na final da disputa municipal, o Guarany fez quatro gols contra apenas um do seu grande rival, o Marianense. Sagrou-se campeão e fez desta partida a mais simbólica de sua história. Na ocasião, Emilio Ibrahim era não só um dos mais importantes

jogadores do time, ao lado do talentoso Carlyle, como também o capitão da equipe. Consequência do sucesso no Guarany, Emilio foi contratado, em 1948, pelo Fluminense, tradicional clube carioca. No Rio de Janeiro, além do auge futebolístico, envolveu-se com a Engenharia Civil. Participou, por exemplo, do acabamento do Estádio Maracanã, no inicio da década de 1960. Hoje engenheiro aposentado, Emilio ainda está muito ligado ao time alviverde de Mariana. “Em nossas conversas, o assunto é sempre o Guarany. Ele nos incentiva muito”, afirma Moacir. Emilio Ibrahim é presidente de honra do clube e, até hoje, um grande patrocinador. Mais do que isso, um apaixonado torcedor. “Por toda a vida ele tem amado o Guarany”. Em seu site pessoal, Emilio conclui que viveu “intensamente e muito feliz” o seu tempo. Tradição Em Mariana, a história representa muito. Deixa marcas na memória popular. O futebol na cidade sempre esteve ligado a outros fatores, principalmente políticos. A paixão sempre ultrapassou as qua-

tro linhas. Tratava-se de questão familiar, uma questão de honra. Gerações jogaram, torceram e amaram seu clube. Orgulhoso, Moacir Eleutério reforça essa ideia. “Quem era Guarany, era. Quem não era, não era. O futebol parecia melhor”. Emilio Ibrahim, em seu site, concorda. “Futebol é uma das mais sadias formas de lazer humano”. Essa visão sobre a relevância do esporte é corroborada pelo que certa vez o escritor francês Albert Camus registrou. “O que sei com maior certeza sobre moral e deveres dos homens, devo ao futebol”. O Guarany tenta resgatar sua história. O foco está nas categorias de base, elemento que sempre foi forte no desenvolvimento do clube. Assim, além de alcançar uma espécie de independência financeira, o alviverde marianense preza pela formação social de seus possíveis futuros atletas. “Seria prazeroso demais voltar a ver o futebol com amor”, diz o emocionado presidente Moacir. A esperança de um retorno aos bons tempos é o fôlego que o Guarany precisa. E, quem sabe, até mesmo encontrar um novo apaixonado como Emilio Ibrahim.

Crônica

Racismo: ninguém é igual a ninguém Danilo Moreira O racismo existe. Existe no mundo inteiro. No Brasil. Na cidade em que moramos. É preciso estarmos conscientes de sua existência. E, assim, combatê-lo. Nas práticas esportivas, atos racistas têm ocorrido com frequência. O esporte, meio que tem como fator fundamental a integração entre as mais diversas pessoas, torna-se espaço de gestos discriminatórios. Manchetes em todo o mundo denunciam dirigentes, atletas e torcedores que, de uma maneira ou outra, são protagonistas de cenas relacionadas ao preconceito racial. Um olhar atencioso sobre os mais recentes fatos e suas repercussões revela como estes são importantes para compreender

realmente o que está acontecendo e sendo discutido. Em fevereiro de 2014, em uma partida realizada pela Copa Libertadores da América, no Peru, o jogador Paulo César Tinga sofreu agressões racistas. O Cruzeiro, time de Tinga, enfrentava o Real Garcilaso, quando parte da torcida adversária simulou sons e gestos característicos a macacos. Além da comoção do próprio atleta, que na ocasião afirmou que “trocaria todos os títulos pela igualdade”, houve uma forte reação no Brasil. Veículos da imprensa fomentaram um debate que culminou com o encontro de Tinga com a presidente da república, Dilma Rousseff. A Conmebol, instituição responsável pelo futebol na América do Sul,

aplicou multa de cerca de R$ 25 mil no clube peruano. Tal punição seria branda ou justa? A dúvida vai além. A simples aplicação de multas resolve o problema do preconceito? Nos Estados Unidos, um caso extremo ocorreu no basquete, em abril. O dono da equipe Los Angeles Clippers, Donald Sterling, foi banido pelo resto de sua vida da NBA, principal campeonato do esporte no país. Em uma conversa telefônica com a namorada, Sterling exprimiu comentários racistas. Além de excluído da liga de basquete, será obrigado a pagar multa de quase R$ 5 milhões, valor máximo permitido pela constituição da NBA. Essa seria uma punição severa? Aplicável em outros contextos?

Em situação mais recente, no fim de abril, o brasileiro Daniel Alves foi quem sofreu com manifestações racistas. Na Espanha, o Barcelona, time de Daniel, jogava contra o Villareal, quando um torcedor arremessou uma banana em direção ao atleta. Em uma reação inesperada, Daniel pegou a fruta e a comeu. A repercussão foi imediata. Tal atitude ganhou grande respaldo, principalmente na internet. Famosos e publicitários aproveitaram a situação para se promoverem, inclusive. O torcedor responsável por jogar a banana no jogador foi detido e há, ainda, a possibilidade de uma pena de três anos de prisão por sua atitude. O Villareal proibiu o indivíduo de frequentar o estádio.

A ocorrência de tantos atos de cunho preconceituoso torna urgente uma política de medidas que busque a extinção do racismo dentro do esporte. Às vésperas de um evento como a Copa do Mundo, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, afirmou que “precisamos nos unir e brigar contra a discriminação de todas as formas”. Mesmo que soe como mais um dos vazios discursos comuns aos dirigentes e políticos, a esperança é de que haja uma real intervenção da entidade máxima do futebol na questão do racismo. A rigorosa punição determinada no caso do basquete poderia ser uma indicação de qual caminho seguir. A conscientização apresenta-se como necessária

para a mudança deste cenário de segregações. A presidente Dilma Rousseff declarou que “nada nos difere, a não ser nossa tolerância com o outro”. O preconceito se faz presente todos os dias, em pequenos ou grandes atos. Enquanto instrumento fundamental na busca de mudanças significativas, o esporte tenta se proteger. Mas essa batalha não envolve apenas a discriminação de raça, mas também de religião, gênero e classe. Dessa forma, a luta torna-se mais complexa e exige mais de todos nós. Mas é preciso persistir. Afinal, precisamos entender que as diferenças existem. E não há problema alguma nisso. Pelo contrário. Ninguém é igual a ninguém. Somos todos diferentes.


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Maio de 2014 Arte: Adriano Soares

CULTURA pedro ewers

Crianças e adolescentes do projeto Circo Arte, Educação e Cidadania treinam as artes circenses: diversão, alegria e comprometimento se misturam e enchem de vida o ginásio do Ouro Preto Tênis Clube

Os bastidores do espetáculo Projeto ensina práticas circenses a jovens com menos oportunidades das comunidades de Ouro Preto Geovani Fernandes Há uma velha história de que quem larga a escola vai trabalhar no circo. Em Ouro Preto isso não é verdade. O Projeto Circo, Arte-Educação e Cidadania é uma referência na cidade para a valorização da cidadania dos mais jovens. Começou em 2006 como Circo da Estação por meio do Trem da Vale, um programa de Educação Patrimonial. O objetivo principal era oferecer oportunidades a crianças e adolescentes carentes, como a construção e a partilha de conhecimentos em um ambiente diferente e diversificado. Em 2008, as atividades foram interrompidas, mas a mobilização dos participantes e seus familiares não deixaram a iniciativa acabar. Assim, en-

tregaram um abaixo-assinado com 5 mil assinaturas à Câmara, que criou uma comissão de apoio e negociações junto ao Governo Municipal. Sensibilizados com o esforço dos participantes para a continuidade do programa, a Organização Cultural Ambiental (OCA), uma Organização Não Governamental (ONG), criou o projeto com o nome Circo, ArteEducação e Cidadania, com uma nova proposta pedagógica, que contribuiria para formação integral dos jovens e no auxilio do desenvolvimento das suas descobertas e potencialidades. Desde então, ele funciona no Ouro Preto Tênis Clube, localizado no Bairro Barra, ainda em condições razoáveis, devido à falta de recursos e espaço físico ideal.

Satisfação Como muitos projetos sociais, o Circo Arte-Educação e Cidadania precisa de verbas para sua existência e atualmente conta com apenas um patrocinador. Para o coordenador, Eduardo França, o ideal é ter mais de um auxílio, assim a continuidade do projeto fica mais sólida. A iniciativa já recebeu muitas premiações, entre elas o Prêmio Itaú/Unicef, referência na área da educação. Algumas delas ajudaram financeiramente o Circo, mas, para Eduardo, eles representam uma transformação na vida das crianças e da família. Anualmente, é realizada pelo projeto a montagem de um espetáculo diferente, intitulado Mostra Artística. Para Eduardo, esse é o momento

que os meninos se sentem felizes, pois estão demonstrando o que aprenderam: “O aluno geralmente se apresenta procurando o olhar do pai na plateia. É bem gratificante ver essa relação construída com a família”. A construção dos espetáculos são projetos dentro do projeto, já que procuram construir valores humanos a partir das apresentações. A iniciativa, que funciona como projeto de extensão do curso de Artes Cênicas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), ainda conta com a participação dos cursos de Educação Física e Serviço Social. Segundo a assistente social do projeto, Deborah Aguiar, o desenvolvimento das técnicas circenses ajuda na construção da educação e ci-

dadania dos jovens e tem um grande diferencial dentro das famílias dos participantes. O fotógrafo Gabriel Machado, que participou do projeto em 2009 dando aula de malabares, este ano fotografou o espetáculo Abracartabra, mostra artística do Circo. Ele diz que foi muito interessante voltar quatro anos depois e ver crianças diferentes sendo orientadas pelos seus ex-alunos, que hoje são professores. Rodrigo Ferreira, que participa desde 2006, foi aluno e hoje é professor. Para ele, além das técnicas circenses, o projeto ensina valores de respeito e amizade, além de ajudar na autoestima dos jovens participantes: “É incrível, um dia eu estive no lugar deles no projeto em que

eles estão hoje”. Stefany Maciel, que também é professora, participa desde abril e ensina técnicas tradicionais e atuais da arte circense para as crianças. Para ela, que nasceu e foi criada em circo, o prazer em dar aula é ver a alegria no rosto dos alunos. A satisfação de quem participa é facilmente percebida nas oficinas, realizada duas vezes na semana. Para Eduardo, o poder público deve ter maior participação junto ao projeto, pois, além das artes circenses, ele ajuda no desenvolvimento escolar e na construção dos valores que o nome carrega. Veja no site como funciona o projeto

Escola ensina a arte do teatro de bonecos Ariadne selene

O marionetista Catin Nardi realiza aulas em seu ateliê

Alessandra Alves Iniciaram-se em abril aulas da primeira Escola de Teatro de Bonecos em Mariana. Ela é um projeto da Cia Navegante Teatro de Marionetes e Associação dos Grupos Artísticos de Mariana (Agrupa). Os alunos fizeram inscrição gratuita através de edital que ficou disponível na internet e foram selecionados pelos membros organizadores da escola. Habilidades em manusear máquinas de lixar madeira e ferro, desenho, conhecimento em dramaturgia e interesse na área de pesquisa foram critérios utilizados para seleção dos alunos que fazem parte desse audacioso projeto. Dividida em núcleos de estudo e pesquisa, restauração e criação, a escola oferece aulas gratuitas até setembro. Sob supervisão e orientação de Catin Nardi, os alunos estudam desde projeto de construção de marionetes até elaboração de texto teatral e manipulação. Os bonecos construídos nesse processo farão parte da montagem de uma peça teatral que terá como tema principal os cenários das cidades históricas de Minas Gerais. O enredo será contado por per-

sonagens antigos e contemporâneos que são ícones de Mariana, Ouro Preto e região. A peça estreará na 8ª Mostra de Teatro de Bonecos da Cia Navegante, em outubro. O núcleo de estudo e pesquisa está empenhado na criação de um banco de dados no qual constarão informações sobre companhias, grupos teatrais, associações e eventos ligados ao mundo cênico para criar um vínculo entre os artistas renomados e iniciantes.. Todo o material de pesquisa estará disponível a todos interessados para consulta pública nas versões online e impressa no ateliê Catin Nardi. Mauro Carvalho é marianense e faz parte do grupo de alunos. Ele acredita que a escola possibilitará o aperfeiçoamento das técnicas que ele já conhece – já que está inserido no meio do teatro de bonecos há alguns anos – além de adquirir novos métodos para, assim, criar o seu próprio estilo na construção de marionetes e outros modelos de bonecos. Eduarda Ohe é de São Paulo e vem à cidade aos finais de semana em que acontecem as aulas para participar de todo o processo de aprendizagem.

Ela diz não ser comum a arte da marionete na capital paulista, por isso quis participar da escola para aprender a técnica de manipular bonecos de fios e diz ter Catin como sua grande referência. O grande interesse pela cultura de Minas Gerais foi também o motivo para que ela fizesse a inscrição para participar da escola. Para Catin Nardi, a escola é uma oportunidade de ar-

ticular a integração de novos integrantes à Cia Navegante. Além disso, o fato de possibilitar a disseminação da arte da marionete em outras cidades e estados faz com que todos estejam empenhados em executar esse projeto com uma enorme dedicação. A escola está situada na Rua do Seminário, 290, Centro. Informações: www.escoladeteatrodebonecos.com.br Ariadne selene

Alunos de várias cidades assistem à aula do mestre


Maio de 2014 Arte: Adriano Soares

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PERFIl

As faces de um músico mineiro Por meio de suas experiências artísticas, Tico encontrou múltiplos caminhos para a educação e a arte pedro ewers

Ana Luísa Reis Uma casa no estilo barroco, traçada nos moldes da cidade histórica de Mariana. A casa do personagem não destoa tanto das demais daquela rua. Porém, ao ser recepcionada, surpreendo-me com o local onde Thiago Ulisses Alcântara de Souza, 29 anos, exerce sua profissão. Filho de Eunice Brígida Alcântara de Souza e de Ulysses Lima de Souza, o percursionista transformou sua moradia em um estúdio personalizado. Se dependesse de influências familiares, Tico, como é conhecido na cidade, seria um fotógrafo, mas o percurso foi diferente, a paixão pela música fez com que ele se tornasse, além de percursionista, produtor de instrumentos e professor. Quando criança, Tico fugia dos padrões sociais, e contou que, por muitas vezes, foi tachado como estranho entre os amigos de escola, devido ao interesse em trabalhar apenas com arte. Entretanto, uma certeza ele tinha: queria ser músico, e passaria por cima dos obstáculos. No começo da carreira, gostava de interpretar músicas de bandas como Black Sabbath. Com o passar dos anos, percebeu que seu gosto musical estava além desse estilo; então, começou a tocar canções das bandas Nação Zumbi e Quinteto Violado, e de cantores como Mil-

ton Nascimento., de quem descobriu um novo timbre. Essa mistura e versatilidade fizeram com que Tico integrasse as bandas: Angu, Feijão e Couve, Corda de Tripa, Grupo Vira Saia, Banda Som de Luá (bandas autorais), além do Circovolante e a CIA Lunática (teatro e circo). A formação musical de Tico aconteceu na cidade de Barbacena, onde cursou Música, por dois anos, na Universidade de Música Popular (Bituca) - escola livre, gratuita, que tem o objetivo promover a formação com caráter profissionalizante. A Universidade foi apadrinhada pelo cantor Milton Nascimento, e conta com aulas de músicos brasileiros, como o baterista Lincoln Cheid (integrante da banda de Milton Nascimento) que pôde ensinar seus dons musicais ao percussionista. Um novo caminho O artista percebeu que trabalhando apenas como músico não conseguiria uma renda necessária para sobreviver: “O cenário daqui para trabalhar como músico é cruel e desgovernado. Quem ganha menos na música é o próprio músico”, ressaltou Tico. Para obter uma nova fonte de renda, o percussionista começou a ensinar musicalização infantil na rede municipal de Mariana, deu aulas de bateria e percussão

Em sua oficina, o percursionista Tico toca o disco soador, instrumento fabricado e comercializado por ele

no grupo Candonguêiros em Ouro Preto, e ministra oficinas de economia criativa, por meio da construção de tambores feitos com materiais recicláveis, encomendadas por empresas mineradoras da região para a comunidade carente. A escolha por fabricar instrumentos surgiu pelo interesse em se aprofundar na música de outras formas. Ele não tinha recursos financeiros para comprar todos os ins-

trumentos que queria, então, pela internet, descobriu como se construía. Foi assim que construiu seu primeiro tambor de couro de vaca e tronco de árvore. Atualmente, o mais vendido é o disco soador, instrumento que produz um som único e suave. As vendas dos produtos estão disponíveis na Internet. Após todos os problemas enfrentados em sua carreira, Tico descobriu que ela vai além do

que apenas tocar instrumentos. Percebeu que “diante das dificuldades”, é necessário sempre se reerguer e começar novamente, pois como ele mesmo diz: “OÇEMOC O ODNES ACIF MIF O OSSEVA OA RARIV ES” (leia ao contrário). QUER CONHECER O SOM DO DISCO SOADOR? CONFIRA NO SITE DO LAMPIÃO

distrito

Diversidade que representa e identifica Amanda sereno

Charles Santos Localizado a 25km de Ouro Preto, o Distrito Santo Antônio do Leite apresenta um artesanato que é referência na região. Parte de sua ocupação foi dada por pessoas de diferentes nacionalidades durante a década de 1980, como argentinos, chilenos, italianos e alemães. A maioria seguia uma ideologia de vida alternativa e, inspirados pelo movimento hippie, carregavam seus trabalhos nas costas. O principal objetivo era se sustentar com a atividade manual e viver em um ambiente

mais saudável com um ritmo tranquilo do interior. De acordo com os artistas locais, toda essa movimentação teve um ponto fundamental que foi a criação de trabalho. Com um pólo de artesanato implantado inicialmente por estrangeiros, a população nativa aprendeu as mais variadas formas de produzir arte. Nos tempos de alta produtividade da prata, matéria prima utilizada até hoje no artesanato, as oficinas ficavam cheias e a prataria do Leite era exportada para todo o mundo. Amanda sereno

foto: Amanda Sereno

Das oficinas dos artesãos do Leite saem as pratarias que dão fama ao distrito

O artesão Reinaldo da Conceição da Silva, com 38 anos e nascido no distrito, faz joias com ouro e prata. Há 22 anos neste ofício, nunca exerceu outra atividade e sobrevive somente com a renda do artesanato. Em seu atelier, a prata é fundida, laminada, polida e ganha forma nas mãos do artista, que realiza todo o processo sozinho no quintal de sua casa. O modo de produção é variável, o artesão faz peças sob encomenda de acordo com o pedido do cliente, e as peças mais detalhas demandam mais tempo de dedicação. Mesmo com uma grande quantidade de artesãos que trabalham com prata, Reinaldo afirma que tem espaço para todos, mas as pessoas que não se qualificaram tiveram que encontrar alternativas, pois um trabalho sem qualidade não vende. No início do distrito entramos em sua Chapada, e até chegar a Igreja de Santo Antônio, entre suas ruas pouco pavimentadas, é possível perceber que o número de artistas é expressivo. A cada esquina uma placa indica um atelier. No interior todos se conhecem e procurar um artesão se torna uma fácil missão. É só perguntar e, na calmaria do dia a dia do distrito, os moradores indicam com a maior facilidade: “procura a Cláudia, a Martinha, o Louro”. E terminam as instruções com o tradicional “eles moram logo ali, bem pertinho”. O artesanato produzido em madeira, cerâmica e a prataria, tornam Santo Antônio do Leite uma rota turística única. A pequena dimensão do distrito nos surpreende com a quantidade artística que abriga. Quem produz arte sobrevive com renda a partir do lucro de vendas das peças. O lucro com o artesanato pode alcançar o valor R$ 2 mil em determinados meses. Entretanto, o consumo de artesanato mudou ao longo dos anos e hoje a maior parte do que é produzido é vendido na Feira de Artesanato, que acontece todos os sábados.

Artista produz máscaras com traços de diversos países, como a do Brasil

Inspirações italianas Natural de Vincenza, na Itália, a artesã Patrizia Rampazzo, 52 anos, vive em Santo Antônio do Leite desde 1992. As máscaras inspiradas em personagens do teatro e no carnaval veneziano são marcas registradas da artista. São 20 anos de dedicação entre plumas, paetês e lantejoulas. Patrizia, que tem como o público alvo o brasileiro, adaptou sua arte. Segundo ela, cores fortes são uma preferência e a linha de máscaras feitas com sementes nativas representa características do Brasil. A artesã se diz “formada pela vida, pela prática e pelos anos de trabalho” e conta que aprendeu a criar máscaras com a ajuda de outro artista argentino. Inicialmente não era o foco de sua produção artística, mas

percebeu rapidamente a preferência do público. Assim aperfeiçoou sua técnica profissionalizando seu trabalho. Hoje em dia, para diversificar o seu trabalho, a artista ainda incluiu na sua produção relógios, castiçais, caixinhas e flores de pano. Em sua oficina a arte se materializa, as formas são preenchidas com a cerâmica, aquecidas no forno e o acabamento final fica por conta da pintura. No atelier Pacha - que foi criado para incentivar o turismo local - suas obras ficam expostas. Em seus projetos futuros, a artesã pretende abrir uma turma para ensinar e perpetuar sua arte. Apesar disso, a artesã enfatiza que os tempos mudaram e o artesanato está ficando um pouco decaído.


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Maio de 2014 Arte: Aprigio Vilanova

Ensaio

Habeas corpus Iago Rezende (texto e fotos) Em abril de 1964, senti o golpe. Roubaram meu corpo, calaram minha boca e me disseram que não seria mais capaz de sonhar. Por 21 anos, vivi o que me restou da vida, no que me restou do mundo. Disseram que deveriam me amar ou me deixar, então dei adeus para quem precisava de mim; e os que não concordavam, silenciavam. Vi a truculência da polícia, vi a tortura, o sufocamento e vi os mortos no fim da estrada. Hoje os fantasmas vagueiam e me lembram de todas as mães sem filhos. Me lembram também daqueles filhos da mãe.


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