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LEIA E REPASSE
Jornal-laboratório I Jornalismo UFOP I Ano 7- Edição Nº 28 - Setembro
TARIFAÇÃO DA ÁGUA GERA DÚVIDAS NA POPULAÇÃO MARIANENSE FOTOGRAFIA: ALINE VILELA
CIDADES ACESSIBILIDADE Ouro Preto enfrenta a falta de projetos para facilitar a mobilidade no Centro Histórico. Problemas como a falta de transportes adaptados para a geografia da cidade estão entre os maiores obstáculos, que impedem muitas pessoas de realizar suas atividades básicas. PÁGINA 4
COMPORTAMENTO DANÇA PELA LIBERDADE
O Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) pretende instalar hidrômetros em Mariana a partir de setembro de 2017 com o objetivo de tarifar o consumo de água na cidade. A autarquia garante que a cobrança é necessária tanto para melhorar os serviços que ela oferece quanto para controlar
o consumo elevado por parte da população. Entretanto, a medida não é conhecida por todos os moradores, que veem a mudança com desconfiança. A tarifação divide opiniões entre os marianenses, que questionam a possibilidade de melhorias efetivas no serviço, após a implementação. PÁGINAS 6 e 7
CIDADES
CULTURA FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
Viúvas com mais de 60 anos relatam suas histórias e contam sobre os processos de envelhecimento e emancipação enquanto frequentam o baile “Hora Dançante”, do Clube Guarany, em Mariana. Também revelam dificuldades de mobilidade e, sobretudo, a ausência de espaços que promovam divertimento e interação social. PÁGINA 10
FOTOGRAFIA: LAURA VIANA
PANELAS ALIAM CULTURA E ECONOMIA Cachoeira do Brumado preserva produção da panela de pedra-sabão. Com a modernização do processo, muitos fabricantes usam a eletricidade na elaboração, exceto Gegê Barbudo, que continua usando a força da água para confecção do material. PÁGINA 8
PARQUE ARQUEOLÓGICO DO GOGÔ SOFRE COM ABANDONO
ESPORTE
FOTOGRAFIA: MARIA SANTOS
Um dos maiores sítios arqueológicos do período colonial no Brasil enfrenta o descaso dos órgãos públicos de Mariana. Mesmo com o tombamento feito pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural em 2008, o território do parque ainda registra acidentes e invasões. Além disso, a Prefeitura de Mariana não cumpriu com a responsabilidade de reconstruir a capela histórica do século XVIII, quase uma década depois de recuperar suas peças originais. PÁGINA 3
ENTREVISTA Em 2000, Josinéia Godinho, professora de música e organista da Catedral da Sé e da Igreja Nossa Senhora do Carmo, mudou-se para Mariana. Ela contou ao LAMPIÃO sobre a relevância da música erudita na educação de crianças e adultos. PÁGINA 9
ENSAIO Tarde ensolarada, o vento corta o céu ao norte. Convite para alçar mais uma brincadeira na imensidão azul. Assim como as andorinhas, pipas planam no ar e fazem a alegria de todos, independente da idade. PÁGINA 12
BAIXOS INVESTIMENTOS PREJUDICAM DOWNHILL A geografia da região dos inconfidentes é favorável para a prática do esporte. No entanto, os atletas sofrem com baixos investimentos e falta de patrocínios dos setores público e privado. Mesmo com dificuldades, praticantes das cidades de Ouro Preto, Mariana e Itabirito se destacam em grandes competições pelo mundo. PÁGINA 11
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LAMPIÃO
OPINIÃO
ARTE: MARIANA MOSCHEM
SETEMBRO DE 2017
EDITORIAL
Vamos conversar sobre coletividade? Viver em comunidade é um grande desafio. O compartilhar dos dias, das horas e das experiências requer cuidado, atenção. Entender os mais diversos perfis, respeitar todas as nuances, diferenças e, ainda assim, conviver prezando pela qualidade nas relações não é tarefa fácil. Mergulhamos no desafio de compartilhar algo para além de nós mesmos, das nossas demandas, dos anseios e desejos pessoais. Compartilhamos rotinas, histórias, lugares, problemas e a realidade de pessoas que nem sempre conseguem oportunidades que as deem visibilidade. A responsabilidade é gigantesca. Nos debruçamos sobre uma rotina que nos colocou em comunhão contínua. Os problemas surgiram, os desentendimentos também e até mesmo a possibilidade de que esse Jornal não chegasse até você, mas aqui estamos. Ainda bem que estamos! O processo de aprendizagem pelo qual passamos vai além do pedagógico, do que nos prepara para o mercado e para a realidade da profissão desejada. Fomos continuamente formados para a humanização das nossas relações. O processo não foi facilitado, mas se tornou gratificante. Foi durante ele que entendemos a importância do respeito a cada palavra que nos foi falada, de cada pessoa que despendeu do seu tempo para nos ajudar e de cada história que passou a fazer parte do nosso imaginário e precisava ser contada. Assim nasce esta edição. Em um mundo onde a individualidade passa a ser palavra de ordem, a coletividade se estabelece como desafio, nossa coletividade é em prol do leitor, da notícia e de cada pessoa que passou por nós. Entregar um jornal que preze pela qualidade, entendendo todo o processo educativo que existe por trás dele, foi nosso maior desafio. Tentamos sanar os erros, ajustar as dificuldades e nos colocamos nas ruas para ouvir a comunidade. A escuta é o nosso bem mais precioso de trabalho. A palavra é o meio que utilizamos para transformar relato, ideia e problema em materialidade. Nosso desejo é que você possa se sentir representado, que as suas necessidades possam figurar em um veículo que conte a sua história e lide com ela com respeito e humanidade. Esperamos estar cumprindo com esse compromisso, para seguir estreitando nossas relações e para que a comunidade seja sempre fator principal dentro das páginas desta publicação.
CRÔNICA
CHARGE
É sobre ser jornalista VIVIANE NOVY
“Nossa, sua filha fala tanto! Ela também gosta de escrever. O que vai ser quando crescer?”. Eram incontáveis as vezes que meus pais escutavam isso dos professores da escola. Desde pequena, mantinha um caderno de anotações ao lado da cama. Acordava na madrugada e anotava os pensamentos. Disseram-me uma vez que a autora que escreveu Harry Potter lançou oito livros assim, com sonhos de um mundo fantástico. A sonhadora que sempre fui, com os pés (nunca) no chão, se permitia devanear. Cresci. Tornei-me uma adolescente que gostava de brigar com os outros quando acreditava estar certa. Puxei isso da família. “Será que ela também vai ser advogada? A irmã faz Direito, o pai advogado e a mãe professora. Deve seguir os passos”. Para a surpresa de todos, fui aprovada em Jornalismo na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). “Viviane, você precisa unir o útil ao agradável”. “Você? Acabou de fazer 18 anos! Não vai sair de casa!”. “Acha que é fácil? E se ficar doente? Como vai para a aula? Vai comer? Mas e...”. Eram
FALA COMUNIDADE O crescimento do bairro Cabanas ANA REIS E SANDRA ARAÚJO*
O que foi visto em primeira visão pelos moradores que chegaram aqui foram as florestas, um bairro plano, com poucas casas, que não tinham luz, água e nem rede de esgoto. Com o passar do tempo ele se tornou um bairro imenso, só que não podemos deixar de ressaltar que houve o desmatamento, que levou ao surgimento de muitas casas e moradores. Talvez você conheça, talvez não, mas o Bairro Cabanas está se desenvolvendo cada vez mais. Só que não é apenas em relação à arquitetura, ambiente ou qualidade de vida, mas também com moradores que amam o lugar em que moram e que não sairiam daqui por nada, como nós, por exemplo.
Sabemos que há um preconceito em relação ao nosso bairro, pensamentos que muitos constroem sem nem conhecê-lo. Mas não só eu como os moradores queremos mostrar que o nosso bairro está se tornando uma “cidade alta” cheia de novidades para você que não conhece e deseja conhecer. O que queremos passar para toda sociedade é que o Cabanas é um bair ro bom sim, porque quem faz o lugar são os moradores e, por isso, precisamos de mais colaboração e menos crítica. #CDA * Ana Reis, 18, Sandra Araújo, 19, estudantes do 2º ano da Escola Estadual de Ensino Médio Cabanas.
objeções intermináveis, mas com muito custo, saí de Nova Lima, abandonando as asas dos pais para cursar o que eu realmente queria. Dizem que uma pessoa saudável dorme oito horas por dia. Questiono se sou uma pessoa tão saudável. A conta de telefone me faz lembrar de cada pessoa que me disse “só um minuto, vou repassar para o responsável te responder”. Depois de alguns (muitos) minutos na espera, a ligação cai. Meu número era bloqueado quando falava o assunto para o qual precisava de informações. Órgãos públicos se mostravam bastante irritados quando solicitava dados. Eu estava incomodando por querer expor algumas verdades e eu adorava isso. Desde o começo, o jornalismo me intrigava. Era contar histórias? O percurso me mostrou que fazer notícia é mais complicado do que sentar na frente do computador e apertar as letras do teclado. É sentir, reviver e ouvir. Sempre gostei de café. Hoje, não fico sem. O ritmo é intenso, mas o orgulho e a alegria de ver o trabalho ser lido e repassado pelas ruas compensa. As palavras e o esforço têm efeito, já que quem não costuma ser ouvido, agora é.
ERRATA
LAMPEJOS “É muito fácil você tarifar tudo na vida. Mas o que de benefício, de fato, você está trazendo para a população?”, Marcos Vinícius de Paula, 27, morador do bairro Cabanas. “Pra nós, nossa riqueza é a panela. Sem ela, nós estamos tudo atrapalhado”, Geraldo José Teixeira, 66, morador de Cachoeira do Brumado. “Fiquei 41 anos casada. Esse tempo todo sem dançar”, Rita Dias, 64, moradora do bairro São José. “É cultura. O povo, em Mariana, nunca pagou pela água. Se você nunca pagasse água na sua vida, você não iria lavar o seu passeio?”, Alexandre Delduque, 44, morador do bairro Cabanas.
• Na 27ª edição do LAMPIÃO foram publicadas informações incorretas na matéria “Abandono de canis afeta saúde”. Nem Luana Neves, voluntária da Associação Ouropretana de Proteção aos Animais (AOPA), nem Luciana Salles, que trabalha no Instituto de Defesa dos Direitos dos Animais (IDDA), foram ouvidas pela reportagem. Também erramos quanto ao incidente envolvendo Alexandre Figueiredo. O entrevistado é, na verdade, estudante de Física, mora na Bauxita, e foi perseguido por um cão (não mordido), sem necessidade de atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA). • Na reportagem sobre “Mulheres na Economia de Mariana” consta o nome “Francismar Coelho”, que teria “51 anos”. Porém, houve um erro na escrita do nome e da idade da empreendedora Francimar Coelho, 47 anos. Pedimos desculpas às nossas fontes, aos leitores e agradecemos pela contribuição junto à nossa reportagem.
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Jornal Laboratório produzido pelos alunos do curso de Jornalismo – Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA)/ Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) - Reitora: Profª. Cláudia Aparecida Marliére de Lima Diretor do ICSA: Prof. Dr. José Benedito Donadon-Leal - Chefe de Departamento: Prof. Dr. André Quiroga - Presidente do Colegiado de Jornalismo: Profª Drª. Jan Alyne Barbosa Prado – Professores Responsáveis: Profª Ma. Tamires Coêlho (Reportagem e Multimídia), Prof. Me. Flávio Valle (Fotografia), Profª Drª. Michele Tavares (Planejamento Visual) – Editor Chefe: Marcos Fileto - Editora de Texto: Viviane Nový - Sub-editor de Texto: Matheus Iglesias - Editora de Arte: Giselle Carvalho - Editora de fotografia: Larissa Helena - Editora Multimídia: Taysa Bocard - Reportagem: André Ferrari, Daniel Borges, Gabriel Abreu, Isabely Pignonato, Lethícia Bueno, Lettícia Lages, Luiza Felipe, Matheus Effgen, Miriã Bonifácio, Pedro Freire, Raíssa Lessa e Thiago Dias - Fotografia: Aline Vilela, Débora Madeira, Eric Castro, Laura Viana, Maria Santos, Mayron Brito, Sandro Aurélio e Wandeir Campos - Diagramação: Daniela Ebner, Flávio Reis, Giselle Carvalho, Mariana Moschem e Thalia Gonçalves - Multimídia: Bruno Miné, Carolina Coelho, Luiza Boareto, Matheus Bragansa, Nayara Freitas, Octávio Abrão e Rhaquel Rocha - Repórter Audiovisual: Carolina Coelho e Nayara Freitas - Revisão: Paula Koch e Sandra Roza - Colaboradores: Ana Paula Bitencourt, Amanda Granado, Carolina Carli, Fernanda Covalski, Matheus Gramigna, Paula Locher, Pedro Nigro, Samara Araújo, Samuel Consentino, Santos Jo - Tiragem: 3.000 exemplares. Endereço: Rua do Catete, n° 166, Centro. Mariana - MG. CEP 35420-000
SETEMBRO DE 2017
LAMPIÃO
CIDADE
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ARTE: MARIANA MOSCHEM
Parque do Gogô é esquecido pela prefeitura Comunidade de Santana reclama do descaso com sítio arqueológico, sem plano de manejo e com potencial turístico desperdiçado ANDRÉ FERRARI
O Sítio Paisagístico e Arqueológico, Morro Santo Antônio e Morro Santana, localizado em Mariana, servia como ponto de extração de ouro entre os séculos XVIII e XIX, a princípio para portugueses e, mais tarde, para ingleses. O sítio, que também é conhecido como Parque do Gogô, tem como proprietária a Companhia Minas de Passagem e possui mais de 2,6 milhões de metros quadrados. De acordo com o dossiê realizado pela empresa Memória Arquitetura, o tombamento municipal da área e seu entorno foi feito por um decreto em 2008. Esse processo garante, judicialmente, a preservação do local, impedindo assim, qualquer modificação extrema do parque. Em março deste ano, o Instituto do Patrimônio Cultural e Artístico (Iphan) iniciou o processo de tombamento federal, que garante ainda mais respaldo e garantias sobre o parque. Apesar da sua importância histórica e do potencial de atrair estudos e turistas para região, Ricardo de Oliveira, que viveu todos os seus 46 anos no Morro Santana e é o vice presidente da associação de bairro, reclama da falta de preocupação do poder público com os desejos da comunidade. Dentre suas objeções estão a falta de aproveitamento do potencial turístico da região, a reconstrução da capela de Santana para as celebrações das missas e a manutenção nos arredores do parque. Oliveira relata que acontecem visitas informais, que são, muitas vezes, orientadas por ele e por outros moradores: “Os turistas vêm sem mais sem menos e entram. A gente fica preocupado (...). E se cair alguém lá? Tem que ter gente pra orientar”. Ele alega que a Prefeitura Municipal de Mariana (PMM) poderia aplicar melhor os recursos para a criação de um parque turístico completo, com portaria, sinalização e roteiros guiados para visitas. Os principais pontos de visita são as ruínas da capela, os cemitérios, os lagos e os buracos de sarilhos, aberturas em formato cilíndrico com profundidade entre 20 e 100 metros que permitem a entrada de oxigênio nas minas, dando condições para exploração. Após a ocorrência de alguns acidentes, a Secretaria de Defesa So-
FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
cial de Mariana colocou cercas neste ano. Desse modo, pela primeira vez, a procissão tradicional de Santana, que acontece anualmente no dia 26 de julho, não foi até as ruínas da capela. O vice - presidente da associação de bairro do Morro Santana alerta que, mesmo com a decisão de fechar o parque, moradores e turistas continuam tendo acesso. “As pessoas que se criaram aqui sabem de tudo, onde tem uma mina, onde pode pegar uma água. Um dos motivos disso é a falta de lazer no bairro: Se a prefeitura pensasse bem e investisse mais aqui, eu tenho certeza que seria bem melhor pra gente”, critica. No que se refere ao fechamento do parque, o subsecretário de Defesa Social, Alisson José dos Santos, diz que essa atitude foi necessária devido às invasões de terras para a construção informal de casas. Cercas também foram colocadas por questões de segurança, em razão dos buracos de sarilhos que podem chegar a 20 metros de profundidade. A decisão foi tomada após a queda de duas criancas nessas fissuras no ano passado. Uma delas, inclusive, faleceu. Os moradores ainda frequentam o parque, mesmo fechado, e não há controle de entrada e saída no território devido à falta de supervisão. Sobre a possibilidade de ter vigilantes que evitem essas ocorrências, Santos culpa a questão financeira e a falta de recursos do município. De acordo com o dossiê citado, estão conservados ao longo do parque vestígios antropológicos como utensílios domésticos históricos, ruínas de capelas, casas e estruturas de mineração a céu aberto quase intactas, que são de grande importância para futuros estudos e intervenções arqueológicas. Lélio Pedrosa Mendes, coordenador de patrimônio da Secretaria de Cultura, Turismo e Patrimônio de Mariana, ressalta a importância da criação de um plano de manejo que compreenda um conjunto de ações necessárias para a gestão, sustentabilidade e mapeamento do local, que adeque e facilite o gerenciamento do parque. Mesmo com o tombamento municipal, o grupo Minas da Passagem (proprietário do parque) ainda não entrou em consenso para
Perigo. Por todo o terreno do Morro do Gogô há buracos de sarilho expostos que oferecem riscos à população.
realização dessa gestão. Há uma decisão da juíza Vânila Cardoso André de Moraes de março de 2016, do Tribunal Regional Federal de Minas Gerais, que proibiu qualquer autorização de pesquisa minerária ou exploração de jazida no local até a conclusão final do Iphan sobre alguma viabilidade do empreendimento na área. Mendes afirma que o tombamento municipal não retira a propriedade privada do grupo. Dessa forma, qualquer ação deve ser feita em conjunto para preservação e possíveis intervenções no parque. Sem esse plano, ele não orienta e nem incentiva nenhum turista a frequentar o local, já que o mesmo é extremamente perigoso. Uma possibilidade é que após um consenso com o grupo proprietário, seja criado um roteiro de visitas guiadas. Uma das outras grandes questões do parque é a capela que existia no local desde o ano 1712. De acordo com um estudo feito por Leandro Henrique dos Santos, formado em Letras e História pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), por ser cada vez menos frequentada ao longo do tempo, a igreja foi doada em 1978 pelo bispo Dom Oscar de Oliveira para a empresa Mendes e Júnior, que a reconstruiu em sua sede no Bairro Es-
toril, em Belo Horizonte. Em seguida, ela foi cedida para a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). No início dos anos 2000, um grupo de representantes do bairro, junto a órgãos públicos, iniciaram uma busca para a recuperação da capela. Desde 2008, com a iniciativa do Ministério Público, PMM, Câmara Municipal, UFMG e Arquidiocese de Mariana, as peças originais da capela voltaram para a cidade e estão, atualmente, no Centro de Convenções Municipal. Apesar da PMM ter se comprometido com a reconstrução e feito contrato com a empresa Jô Vasconcellos Arquitetos para a elaboração de um projeto que custou aproximadamente R$ 10.000, ele acabou não indo pra frente. Eduardo Campos, 46 anos, pintor, escultor e restaurador formado em Belas Artes pela UFMG, mora há 14 anos na comunidade. O artista alega que a empresa não queria usar as peças originais, e sim apenas como referência, de forma que “a comunidade não aceitou o projeto. O Iphan, o Conselho de Patrimônio e outros órgãos entraram na discussão, mas ninguém moveu um dedo pras coisas acontecerem e as peças estão lá no Centro de Convenções. À medida que o tempo vai passando, elas vão se deteriorando e estamos
esperando. Acho um total descaso e desperdício muito grande a cidade receber um acervo desses e ficar por isso mesmo. Dez anos se passaram e nada”, reclama Campos. Ana Cristina de Souza Maia é presidente do Conselho de Patrimônio Cultural de Mariana (Compat), que tem como objetivo proteger e preservar o patrimônio histórico, artístico, estético, arquitetônico, arqueológico, documental e ambiental do município. Ela afirma que o conselho atua apenas em obras de emergência desde o rompimento da barragem de Fundão (da Mineradora Samarco) e, paralelamente, com atenção à deterioração de alguns monumentos históricos, dentre eles, a Igreja de Camargos e a Igreja de São Francisco, que custam em torno de R$ 400 mil. Segundo Maia, o conselho não tem condições financeiras de discutir algum plano de manejo. Não há também nenhuma previsão para a reconstrução da Capela de Santana, considerando o contexto e as demandas atuais do Compat, que conta com um orçamento anual de até R$ 1 milhão. “Desde 2015, o Parque do Gogô não é pauta de nenhuma reunião, mas eventualmente ele voltará a ser discutido”, ressalta Maia
FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
Ruínas. Ricardo de Oliveira, residente e Vice-presidente da Associação de Moradores, apresenta vestígios resistentes da Casa Paroquial construída no inicio do século XVII.
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LAMPIÃO
CIDADES
SETEMBRO DE 2017
ARTE: THALIA GONÇALVES
Acessibilidade ainda é um desafio Fornecimento Em Ouro Preto, projeto enfrenta barreiras impostas pelo IPHAN e a falta de mobilização social FOTOGRAFIA: MARIA SANTOS
de remédios pelo SUS sofre alterações
Gabriel Abreu e Lettícia Lages
Reclusão. Os vizinhos, Geraldo e Ezequiel, convivem diariamente com uma vida mais autônoma. Matheus Effgen
Os problemas de acessibilidade em Ouro Preto têm limitado o deslocamento de idosos e pessoas com deficiências. Os maiores obstáculos são as variações do relevo da cidade, a preservação do patrimônio e a falta de consciência social. Sônia Maria da Silva, 52 anos, moradora do Bairro Novo Horizonte, precisa de muletas para andar. Ela acredita que houveram algumas melhorias, principalmente nos ônibus da cidade, “As portas estão maiores e os degraus mais largos”. Silva observa que há muito o que se fazer e entende que essas mudanças precisam ser estudadas de uma maneira mais aprofundada. Já Gabriel Mapa, 30, não avalia bem o serviço de transporte público devido às dificuldades que encontra em sua utilização. Ele, que é cadeirante, relata que precisou contratar alguém que o levasse todos os dias até o seu trabalho, na Feira de Pedra Sabão. “Não tem como eu andar de ônibus”, conclui. Ele conta também que conhece muitas pessoas com deficiência que não saem de casa pelas dificuldades no centro da cidade, já que nos demais bairros a pavimentação das ruas permite uma maior facilidade em seu deslocamento. Segundo a empresa Turin Transportes, uma das responsáveis pelo transporte público em Ouro Preto, apenas três de seus 23 ônibus possuem as adaptações necessárias para o transporte de pessoas com mobilidade reduzida. Procurada, a Transcotta, que também é responsável pelo transporte na cidade, não informou o número de veículos adaptados. Além das dificuldades no transporte, essas pessoas ainda têm que enfrentar problemas que podem parecer simples ao restante da população, mas que fazem toda a diferença em sua rotina. São ruas muito in-
clinadas, calçadas muito estreitas, com postes no meio e excesso de degraus. Tudo isso causa o isolamento e a falta de atividades para um grande número de pessoas. De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 24% da população de Ouro Preto possui algum tipo de deficiência física permanente. O estudo também mostrou que existem na cidade, aproximadamente 8 mil pessoas acima dos 60 anos. Mesmo com esse número expressivo, as atividades para eles ainda são restritas. Geraldo Bento, 56, técnico administrativo aposentado da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) diz que após perder alguns de seus movimentos devido a uma doença degenerativa, viu suas atividades se tornarem limitadas. Como depende de outras pessoas para ajudá-lo, nem sempre consegue ir a lugares distantes ou mesmo resolver pendências sozinho. Ele alerta para o fato que as pessoas ainda não compreendem o problema quando não o vivenciam. “A acessibilidade é completa quando há pessoas que se preocupam de verdade”, conclui Bento. Maria Coelho Martins, 65, entende que essa falta de preparo também passa pelos órgãos públicos. Martins conta que desistiu de tentar instalar uma placa que proibisse o estacionamento na frente de sua casa, devido a grande burocracia que foi exigida. Ela cuida de seu marido, Ezequiel Martins, 55, que passou a utilizar cadeira de rodas há aproximadamente um ano, após complicações por sua diabetes. Martins avalia que essa, entre outras dificuldades, acaba fazendo com que seu marido tenha de permanecer muito tempo dentro de casa, quando poderia estar passeando pela cidade, como é sua vontade. Para os turistas a situação também é
complicada. Um exemplo disso é a dificuldade que os visitantes enfrentam para chegar aos diversos Museus da cidade. Gilson Antônio Nunes, professor do curso de Museologia da Ufop, entende que há muito para se avançar nesse quesito e que as atividades feitas até agora são poucas, mas pontuais. Sem soluções De acordo com a lei 12.587/2012, que institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana, todos os municípios com mais de 20 mil habitantes precisam desenvolver planos de mobilidade. O objetivo é pensar medidas que visam diminuir os obstáculos físicos na locomoção dos habitantes. Em Ouro Preto, o plano foi desenvolvido pelo Instituto da Mobilidade Sustentável “RuaViva” e entregue a prefeitura no ano passado. Entre as mudanças propostas, estavam a implantação de elevadores, teleféricos e a melhoria da acessibilidade nos ônibus da cidade. O projeto foi arquivado após a reprovação de algumas de suas partes. Em resposta ao requerimento do vereador Alysson “Gugu”, Zaqueu Astoni Moreira, secretário de Cultura e Patrimônio, informou que o plano não foi aceito devido a falta de um maior detalhamento técnico sobre sua execução. Segundo o secretário, há pontos, no plano, que foram reprovados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). André Macieira, diretor do escritório técnico do Iphan, em Ouro Preto, ressalta que as mudanças no centro histórico da cidades não são proibidas. Ele explica que os projetos devem ser mais detalhados, para que o Iphan tenha condições de avaliar sua viabilidade, mas reforça que as alterações devem ser feitas respeitando as características do patrimônio da cidade Impressões do Repórter
Fonte: IBGE 2010
6%
MOTORA
4%
AUDITIVA
13%
VISUAL
1%
24%
MENTAL
dos ouropretanos apresentam alguma deficiência permanente Segundo o IBGE, em 2010, Ouro Preto tinha 70.281 habitantes. Desses, 17.612 possuem algum tipo de deficiência permanente, o que corresponde a 24% da população.
O processo de apuração nos confronta de maneira dupla. Primeiro, quando temos que ir à campo, conversar com pessoas até então desconhecidas e praticar as tantas atividades inerentes ao exercício da profissão que almejamos. Mesmo quando o fazemos com prazer, é um desafio. Seguimos sendo retirados de nossa zona de conforto quando nos deparamos com situações que, mesmo que não tivéssemos notado, sempre estiveram ali. Com certeza, essa foi uma das etapas mais importantes da minha formação. Ainda que falar de acessibilidade não seja nenhuma novidade, é impressionante como conhecer realidades muito distintas da nossa é enriquecedor. Conversar com essas pessoas e poder escrever sobre elas é uma das formas de mostrar a negação de seus direitos mais básicos. Tudo isso fez com que eu tivesse o primeiro contato de fato com a prática do jornalismo. Isso só melhora quando essa prática pode, de alguma forma, contribuir para a mudança da realidade. E é esse o jornalismo em que quero acreditar.
Em maio de 2017, o prefeito Júlio Pimenta aprovou um decreto que regulariza a distribuição de medicamentos pelas farmácias das Unidades de Saúde de Ouro Preto. Devido à constante perda e falta de medicamentos para usuários dependentes da rede pública, os dirigentes perceberam que era necessário um maior controle e organização na distribuição dos medicamentos. “Com a restrição do orçamento e a arrecadação em baixa, o prefeito precisava organizar o sistema de distribuição para que não faltasse medicamentos para a população de Ouro Preto. Com isso, começou a pesquisa da melhor administração dos recursos”, acrescenta Paula Medeiros, farmacêutica responsável pelo novo almoxarifado de medicamentos. Anteriormente, qualquer cidadão tinha acesso aos remédios nas farmácias populares da cidade através de uma receita médica particular ou do SUS. Segundo Wandicléia Rodrigues Ferreira, farmacêutica responsável pela FARMÁCIA ESCOLA da Bauxita, a prática gerava deficiência na distribuição de remédios, uma vez que a verba recebida pelo município, para a saúde, é baseada no número de habitantes da cidade. A falta de informatização do sistema de saúde dificultava o controle: uma mesma receita médica, por exemplo, poderia ser utilizada para obter o medicamento em farmácias diferentes, agravando sua falta. Agora, para a retirada do medicamento, o paciente que não possui cadastro da rede municipal deverá registrar as suas informações pessoais e também do medicamento requisitado, como: nome, dosagem, tempo de tratamento, data de emissão e data de validade. Também serão necessários a assinatura e o carimbo da unidade de saúde. Para a retirada do medicamento gratuito, o paciente precisa, além de se cadastrar na Farmácia Central da UPA, apresentar um comprovante de residência, documento com foto e a receita proveniente do SUS. Não serão aceitas receitas deliberadas em atendimentos particulares ou em outras cidades. Será possível somente o atendimento de receitas do SUS independente que seja de Ouro Preto, podendo, por exemplo, vir de Mariana ou Itabirito, desde que seja do SUS e que a pessoa resida em Ouro Preto. A inserção do novo sistema gera maior burocracia para a retirada dos remédios, o que desagradou a população ouropretana, como afirma o vereador José Geraldo Muniz, conhecido como Zé do Binga. Ele afirma que esse desconforto foi causado porque a maioria é dependente do SUS. Como o novo cadastro demanda tempo para ser feito, a velocidade de atendimento pela UPA também foi afetado. A falta de medicação ainda é um problema no município. O governo acredita que, após o cadastramento de todos residentes da cidade, haverá mais controle na oferta dos remédios, facilitação do atendimento dos farmacêuticos e maior organização, impedindo fraudes e estabilizando a falta de medicamentos. A estudante do 7º período do curso de farmácia da Ufop, Ana Carla do Nascimento, 23, ressalta que “Antes, precisava apenas de uma receita para você conseguir pegar o medicamento. Hoje em dia, é necessário ter uma receita do SUS e, também, um comprovante de residência”. Os repasses para a saúde vêm de três órgãos: o governo federal; a secretaria do Estado e a secretaria do Município. O governo federal transfere o valor de R$5,58/habitante-ano; a secretaria do Estado, R$3,00/habitante-ano e, o municipal, menos que R$2,36/habitante-ano. A conta feita para saber qual é o valor investido na saúde deve somar os repassses federal, estadual e municipal, multiplicado pelo número de habitantes na cidade. O portal de transparência do Fundo Nacional de Saúde mostra dados dos repasses para Assistência Farmacêutica Municipal. Em 2013, foram transferidos cerca de R$ 477 mil e, em 2016, houve uma queda de cerca de R$ 25 mil
SETEMBRO DE 2017
LAMPIÃO
CIDADES
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ARTE: THALIA GONÇALVES
CIÊNCIA
Cortes prejudicam pesquisas Governo faz redução de verbas e prejudica avanços científicos nas universidades Thiago Dias
As universidades federais são compostas por três pilares: ensino, pesquisa e extensão. A legislação brasileira determina a “indissociabilidade” entre essas vias de ensino, ou seja, elas devem ser de igual importância e não podem se separar do processo de aprendizagem. Nas universidades, o ensino é a principal função das instituições. A extensão é uma atividade específica compartilhada entre alunos, professores e a comunidade. As atividades de pesquisa, por sua vez, têm uma função importante no desempenho do docente e na formação dos alunos, tentando reduzir a distância entre o que é ensinado e aprendido. Desse modo, ela é considerada uma atividade acadêmica essencial, de total importância no tripé que a legislação estabelece. Em 2010, 47% dos investimentos do Brasil em pesquisa eram de origem pública, conforme os indicadores no site do Senado Brasileiro. Apesar do financiamento misto, que inclui a captação de fundos arrecadados pelo governo e pelo sistema privado, as pesquisas são feitas em centros públicos de ensino. Os recursos destinados pelo Governo Federal a essas instituições são arrecadados através do pagamento de impostos. Com a atual crise financeira, o governo apresentou medidas que teriam o objetivo de equilibrar as contas do país. Dentre elas, o corte de verbas para desenvolvimento científico nas instituições de ensino superior. Em agosto de 2016, o Ministério da Educação (MEC) propôs que, no ano de 2017, as universidades federais passassem por um corte de 41% nos investimentos e de 18% no custeio de despesas básicas para manutenção, como luz e água. Essa proposta foi apresentada por meio do Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e
Controle (Simec) e não houve inforapenas um exemplo de como a pesmação prévia ou negociação com as quisa pode ser revertida diretameninstituições de ensino. te à comunidade. Como os projetos Em consequência desses cortes em andamento já estão financiados, gerais, muitos projetos de pesquisas “os danos causados à pesquisa levacientíficas também foram suprimirão de três a quatro anos para serem dos. Aos pesquisadores foi estabenotados”, completa Mosqueira. lecida a redução de 70% do orçamento para o Programa de Apoio O custo de um projeto de à Pós-Graduação (Proap). Houpesquisa ve também o corte de 20% de bolOs projetos de pesquisa são fisas de iniciação científica do Consenanciados tanto para a aquisição de lho Nacional de Desenvolvimento equipamentos quanto para a comCientífico e Tecnológico (CNPq). pra de material de consumo, serviPara a Universidade Federal de ços de terceiros, diárias e passagens. Ouro Preto (Ufop) isso significaA verba disponibilizada para execuria uma redução de R$ 17,6 milhões ção do projeto só pode ser utilizada na verba recebida. se a pesquisa for aprovada por uma Atualmente, a Ufop possui dois agência de fomento, que verifica o tipos de financiamento, o externo e valor e o impacto de seus resultados o interno. O primeiro é composto na ciência para financiá-lo. por recursos vindos das agências de Matheus de Souza Gomes, profomento à pesquisa, que regulamenfessor da Universidade Federal de tam o desenvolvimento de pesquisas Uberlândia (UFU) e coordenador no país. Já o segundo, é direcionado Laboratório de Bioinformática do aos pesquisadores que ainda não e Análises Moleculares, conduz um tiveram seus projetos aceitos pelas projeto que tem como objetivo estuagências. Para que eles consigam ter dar o genoma dos caracóis e entenseus projetos der melhor esses moluscos submetidos, a que carregam os vermes Os danos Ufop oferecausadores da esquistossocausados à pesquisa ce um auxílio mose, doença popularmenlevarão de três a através do fite conhecida como “barriga quatro anos para nanciamento d’água”. A esquistossomose interno de R$ é uma doença que afeta inserem notados 1 milhão, por divíduos de regiões pobres meio do Proem países subdesenvolviVANESSA MOSQUEIRA grama de Indos ou em desenvolvimencremento da to, causada pela infecção de Qualidade da Pesquisa e Pós-Gravermes do gênero Schistosoma de duação (PIQ). água doce. Vanessa Mosqueira, pró-reitora A pesquisa de Gomes é pioneira adjunta de Pesquisa e Pós-Graduae possibilitará a busca por alternatição da Ufop, explica que esses corvas terapêuticas e o possível controtes afetarão a pesquisa na instituição, le da doença, o que auxiliaria a poprincipalmente os projetos voltapulação em risco e poderia diminuir, dos para a comunidade. Um exemno futuro, os custos de tratamento plo, segundo ela, são os 117 projetos nos sistemas públicos de saúde. O nas mais diversas áreas destinados a projeto, que é financiado por dinheiminimizar os efeitos do rompimenro público, faz parte do edital Unito da Barragem de Fundão, da mineversal de 2013 do CNPq, e recebeu radora Samarco. Esses projetos são uma quantia de R$ 29.817,00
VALORES APROVADOS POR DOCENTES PESQUISADORES (EM MILHÕES DE REAIS)
Comunidade como extensão da universidade Daniel Borges e Matheus Effgen
A extensão universitária propõe uma relação entre o conhecimento acadêmico e a comunidade. A intenção é transformar a realidade social aproximando os universitários da cidade em que estudam. Em 2009, foi aprovada uma lei referente à concessão de bolsas para esses projetos. A lei nº 12.155 define
que as “atividades de extensão universitária [são] destinadas a ampliar e fortalecer a interação das instituições com a sociedade”. O pró-reitor de extensão, Marcos Knupp, ressalta a importância dos projetos de extensão. “O aluno que atuou em projeto de extensão só tem a ganhar, sai um profissional diferenciado, por já ter tido esse contato com a comunidade”. FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
Apoio. Aulas de reforço ajudam alunos em notas escolares.
Um desses programas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), o projeto Centro Cultural do Bairro Piedade, em Ouro Preto, passou por reformas e voltou às atividades no começo de agosto. Com aulas de reforço em Português e Matemática para mais de 90 jovens entre sete e 14 anos, o local também oferece aulas de inglês e de zumba para os adultos. Daiane de Oliveira, aluna do projeto, está ansiosa para começar as aulas de dança. “Fiquei sabendo que vai começar as aulas, e
já fiz minha inscrição para não perder isso”. Além disso, a biblioteca comunitária também está localizada na sede do Centro Cultural. Atualmente, o centro conta com três estudantes que recebem bolsa, além de outros três voluntários. Para o presidente da Associação de Moradores do Bairro Piedade, José Antonio Vivela, esse e outros projetos da universidade exercem o papel que a prefeitura deveria fazer. “Se ela não nos atende, a universidade nos acolhe e ajuda”. FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
Debate. Projeto promove discussões sobre arte e sociedade
O projeto Mineração do OuTro foi criado em 2014 pelo professor do curso de Serviço Social Marlon Garcia da Silva e busca utilizar a arte como ponto de partida para reflexão sobre a realidade social. As atividades são estruturadas em três frentes: o Curso Ontologia, estética, arte e sociedade; o Cine Faísca e o Projeto Lavras de Versos. Neste último, crianças e adolescentes do bairro Santo Antônio (Prainha), em Mariana,
participam de oficinas para criação de jograis e poesias, baseados em escritores e filósofos. Já o Cine Faísca consiste na exibição de filmes que posteriormente serão assunto em debates. Organizados pelos próprios alunos, a exibição é gratuita e aberta à comunidade. O Curso Ontologia, estética, arte e sociedade conta com debates e minicursos abertos à sociedade. Em sua quarta edição, realizada em outubro de 2016, teve como temas a arte, ontologia, estética e mineração. FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
FOTOGRAFIA: SANDRO AURÉLIO
Som. Além de crítica de mídia, oficina estimula interesse pela música.
Fonte: Dados cedidos pela Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação da Ufop
Outro projeto que também é realizado pela Ufop chama-se “Nos bastidores da Notícia: Mídia e Democracia”. Nele, são trabalhados temas relacionados às questões de crítica de mídia, democracia e produção de conteúdos informativos para crianças e adolescentes de bairros da periferia da cidade de Mariana. As atividades buscam capacitar seus participantes para que compreendam melhor como funciona o processo de construção das notícias,
criando assim uma identificação com o conteúdo que eles mesmos produzem durante as atividades. A ideia é que os integrantes possam refletir e questionar a forma como a notícia é construída pelos grandes veículos de comunicação e pelos da região. Além disso, o projeto realiza algumas oficinas para as escolas da comunidade. No mês de agosto, o DJ Túlio César Almeida ofereceu um pequeno curso aos alunos sobre seu instrumento de trabalho e sobre o estilo musical
LAMPIÃO
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ARTE: DANIELA EBNER
FOTOGRAFIA: WANDEIR CAMPOS
ÁGUA EM MARIANA:
PROBLEMAS VÃO ALÉM DA TARIFAÇÃO Para muitos moradores de Mariana, agosto, mês de estiagem, representa mais que a proximidade do fim do ano. O período é considerado por eles como um dos mais castigados pela falta d’água na cidade, tornandose sinônimo de escassez e mudanças radicais na rotina dos lares, comércios e indústrias. Mas o problema não fica restrito apenas a esse período e a preocupação com a água ocorre durante o ano todo. Agora, os marianenses poderão ter que pagar por ela. LETHÍCIA BUENO E RAÍSSA LESSA
Apesar da questão da falta d’água ser uma realidade que antecede a fundação do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae), as críticas à autarquia não cessaram desde que foi implantada, em 2005. Com a possibilidade de cobrança da água cada vez mais próxima, as pessoas não sabem se a tarifação trará melhorias efetivas nas atividades prestadas até então. O Saae diz fazer o possível para atender às demandas da população com os recursos de que dispõe. Além disso, vê a tarifação como a melhor opção para sanar o desperdício e investir na melhoria dos próprios serviços. Por outro lado, os moradores ouvidos pelo LAMPIÃO
reclamam da qualidade, da distribuição irregular e da constante falta d’água. A autarquia, que hoje atende cerca de 59.342 habitantes, contando com a sede e os distritos, pretende implantar um serviço de cobrança de água na cidade, que ainda está em estudo. O Saae propõe que sejam instalados hidrômetros nos prédios públicos, como na Prefeitura Municipal de Mariana (PMM), entre setembro e outubro deste ano. A hidrometração em empresas e domicílios tem previsão de início em 2018. A intenção é que a tarifação seja feita em etapas, como conta Alessandra Alves, assessora de comunicação do Saae. Segundo Alves, a aparelhagem e a instalação dos hidrômetros é cara e a autarquia só poderá dar
continuidade ao processo se tiver como custear esses gastos. Dessa forma, o dinheiro arrecadado com a tarifação de um bairro será revertido para hidrometrar outro, e assim sucessivamente. “Faremos assim até conseguir hidrometrar a cidade toda. Mas, antes, faremos o investimento na captação e distribuição da água”, explica. A assessora afirma que a tarifação não gerará lucro para o Saae, mas uma renda que será aplicada na melhoria dos serviços oferecidos pela empresa. No entanto, a tarifação de água em Mariana ainda é um mistério para muitos moradores da cidade. “É novo para mim que passaremos a ter uma conta a mais”, diz Marcos Vinícius de Paula, 27, morador do Bairro Cabanas e vice-presidente da Associação Comunitária de Morado-
res do Bairro Cabanas (ACMBC). Assim como ele, a maioria dos entrevistados possuíam pouca ou quase nenhuma informação sobre a cobrança e reprovaram a atitude do Saae em não divulgar a proposta à comunidade. Apesar do Saae garantir que está organizando uma audiência pública para debater a questão da tarifa com a população marianense e distrital, a reunião está prevista para acontecer somente depois da votação do Conselho de Controle Social de Saneamento Básico, comissão responsável pela aprovação ou não da tarifação. Para Marcos, a tarifação não solucionará os problemas referentes à água no município. “É muito fácil você tarifar tudo na vida. Mas o que de benefício, de fato, você está trazendo para a população?”.
lidade 24 horas, melhora a distribuição e depois me cobrem”, analisa Delduque. Todos os critérios que se referem à tarifação de água - o valor, a maneira como será cobrada, a ordem dos bairros que serão tarifados, entre outros - estão em fase de discussão e serão votados pelo Conselho de Controle Social e Saneamento Básico de Mariana, composto por membros da sociedade civil e de instâncias do governo. “Se tiver um voto contra, ou ele [projeto de tarifação] tem que ser apresentado e votado de novo até que isso chegue num consenso, ou a pauta cai”, explica Alessandra Alves. Segundo Alves, a ideia do prefeito Duarte Júnior é de que o formato de cobrança seja por excesso de consumo individual. A tarifação seguiria a meta estipulada como essencial pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que define o uso entre 100 e 120 litros de água por pessoa ao dia. Se ultrapassado o limite, o indivíduo pagaria pela quantidade de água consumida a mais no mês. O Saae declara que um marianense consome de 350 a 400 litros por dia. Mesmo com a possibilidade de uma taxa mais barata do que a cobrada pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), pagar pela água preocupa Tatiane Rodrigues, 23, moradora do bairro Rosário. Rodrigues vive com o marido, o irmão e o filho numa casa
que, segundo ela, falta água com frequência. Com dificuldades financeiras, ela é contra a tarifação por acreditar que a água é um direito humano básico que deve ser ofertado gratuitamente. “Nas condições em que o Brasil está, a gente já tem que pagar energia, e mais a água? E uma água que você não tem, que não vem diariamente? Que a qualidade também não é cem por cento?”, critica. Algumas hipóteses sobre uma tarifa branda para a população de baixa renda foram levantadas em reuniões do Conselho. Nada foi votado ainda. A proposta da autarquia é se reunir com a Secretaria de Desenvolvimento Social de Mariana e definir a forma mais justa de cobrar pela água. Para Alexandre, a tarifação pode se tornar mais um motivo de desigualdade social na cidade, pelo fato de criar uma despesa a mais para os marianenses. Entretanto, ele sugere “que a Prefeitura poderia, por exemplo, onerar um pouco mais daquele que pode pagar e criar uma tarifa social para quem comprovar uma renda.” Se aprovado pelo Conselho, o plano de tarifação será apresentado em audiência pública, que poderá apoiá-lo ou não. Só depois a Câmara de Vereadores de Mariana decidirá se o projeto entrará em vigor na cidade, sendo transformado em lei.
AFINAL, POR QUE TARIFAR? Por ser uma autarquia, o Saae recebe subsídios anuais da PMM para se manter. Em 2017, o orçamento total previsto no Plano Plurianual (PPA), que já chegou a cerca de R$ 30 milhões, foi de R$ 12 milhões e não é suficiente para novos investimentos, segundo Alves. O dinheiro é repassado mensalmente pela PMM, de acordo com as demandas fixas da autarquia, como a folha de pagamento, ou com os gastos ocasionais, quando uma obra apresenta defeito e precisa ser consertada, por exemplo. Atualmente, o Saae arrecada apenas com penas d’água, processo que custa R$ 270, mas aos moradores que solicitam o serviço são cobrados R$ 5,50. Um gasto que, para a autarquia, não apresenta retorno. Segundo a assessoria de comunicação do Saae, a proposta de tarifar é para que a autarquia possa gerar renda e não dependa exclusivamente da PMM. O objetivo é aplicar o dinheiro em manutenções de obras e equipamentos. “A intenção é que, com essa tarifação, a gente possa, pelo menos, bancar esses custos operacionais”, diz Alves. Ela também relata que, em algumas ocasiões, os funcionários da empresa já tiveram que comprar peças por conta própria para finalizar uma obra, devido à falta de ferramentas. A queda na Receita Municipal de Mariana, devido ao alto índice de desemprego e
da baixa na arrecadação de impostos, depois do rompimento da Barragem de Fundão, é apontada como uma das principais motivações para colocar a tarifação em prática. Além disso, o Saae alega não possuir estruturas suficientes para atender Mariana e seus distritos, que cresceram muito desde sua criação. No entanto, mesmo quando recebia mais subsídios, a autarquia não expandiu ou modernizou seus sistemas. Alexandre Delduque, 44, é topógrafo e mora no bairro Cabanas. Ele considera justa a tarifação, mas não se mostra contente com o tipo de serviço que o Saae oferece e teme pelo discurso do “não temos dinheiro” que o Saae utiliza. Segundo Delduque, que já trabalhou com obras e construções de grande e médio porte, a autarquia deveria ter se projetado para atender a cidade a longo prazo, calculando loteamentos, aumentando reservatórios e construindo um mapa de distribuição. Apesar de considerar a água da cidade como de boa qualidade, o topógrafo acredita que a cobrança deveria ser barata, justamente pelos problemas de investimento e de manobras do Saae. Como exemplo, ele relata a vez em que sua rua ficou sem água porque o manobrista contratado pela autarquia estava bêbado e não conseguiu ligar o sistema de distribuição. “Me dá água de qua-
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ARTE: DANIELA EBNER
ABASTECIMENTO E DESPERDÍCIO
Karina Soares e Ingrid Marques, estudantes da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e moradoras da República Relicário, localizada no bairro São Gonçalo, dizem não se sentir representadas pelo Saae. Como motivo, listam a má qualidade da água, a pouca informação sobre sua distribuição e a ineficiência da empresa para sanar problemas, como na ocasião em que ligaram solicitando um caminhão pipa que nunca chegou. Para as estudantes, a água que chega nas caixas d’água da república apenas no período da manhã é insuficiente para suprir as necessidades das oito moradoras. Quando falta, a solução é tomar banho na casa de amigos, namorados ou até mesmo nas instalações do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (Icsa). Soares, mesmo cética quanto às melhorias, é a favor da tarifação, desde que o tratamento da água seja feito adequadamente, como acontece em sua cidade, Ponte Nova. Ela conta que lá o serviço é cobrado e a qualidade, tanto da água quanto do atendimento, é garantida. Hoje, o Saae não possui um mapa de abastecimento atualizado. A rede utilizada como base, que é anterior à criação da autarquia e foi expandida a partir do centro da cidade, não leva em conta as áreas de ocupação. Angélica Fernandes, coordenadora da Divisão de Expansão do Saae, lista o
relevo, a escassez e, principalmente, o consumo exacerbado por parte da população como as principais razões para o abastecimento desigual no município. “O abastecimento é preferencial, primeiro as partes mais baixas. Enquanto as pessoas estão consumindo, a água não consegue subir’’, esclarece. Maria do Carmo Dumont, é moradora do bairro Rosário e desaprova a distribuição de água do Saae. Ela conta que nunca sabe a hora que a água chegará e que o tempo do rodízio da manobra não é suficiente. “Tem dias que eles soltam e ela fica aí no máximo duas horas. Às vezes, não dá nem pra encher a caixa d’água”. Além disso, ela sofre com uma manilha que entope com frequência o esgoto da rua, fazendo com que ele infiltre pelo muro de sua casa e fique por todo o quintal, causando mau cheiro e desconforto. Quanto à tarifação, Dumont enxerga a cobrança como uma solução para a falta d’água em Mariana. Ela reconhece que os marianenses gastam água em excesso. “Tudo que é de graça o pessoal gasta sem controle”, avalia. Assim como ela, Alexandre Delduque considera que o desperdício é uma questão de hábito. “É cultura. O povo, em Mariana, nunca pagou pela água. Se você nunca pagasse água na sua vida, você não iria lavar o seu passeio?”
FOTOGRAFIA: WANDEIR CAMPOS
Sistema. Captação Cristal, uma das ETA’s que recebe o tratamento de água.
FOTOGRAFIA: WANDEIR CAMPOS
Revezamento. Marianenses recebem abastecimento de água em dias alternados.
QUALIDADE E TARIFAÇÃO
O abastecimento de Mariana fica a cargo das quatro Estações de Tratamento de Água (ETAs). São elas, a ETA Mata do Seminário, a ETA Matadouro, a ETA Santa Rita de Cássia e a ETA Sul. No relatório final do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), consta que no período de estiagem a água passa por desinfecção simples, sendo tratada apenas com hipoclorito de cálcio, composto presente na água sanitária. Nos demais períodos, o tratamento é o chamado ‘convencional’, adicionando à água hipoclorito de cálcio, sulfato de alumínio e cal hidratada. O Saae afirma que a tarifação em Mariana é justa, em especial porque a água é bem tratada e passa por testes diários, a cada duas horas, nas ETAs. De acordo com Alessandra Alves, o produto final que chega à população é de boa qualidade, e isso, por si só, justificaria a cobrança. Daniel Rolim, engenheiro agrícola e ambiental, que realizou um estudo em 2012 sobre a disponibilidade hídrica em Mariana, diz o contrário. Durante sua pesquisa, Rolim visitou todas as captações de água do município e afirma que ela é excelente antes de ser captada, mas quando entra nas adutoras, perde a qualidade. Ele conta que a situação é ainda pior nos reservatórios, onde “a vedação é precária”, ou seja, eles não são propriamente tampados, e podem ser encontrados restos de animais nas proximidades. De acordo com o relatório do PMSB, Mariana possui 26 reservatórios de água. Apenas 20 funcionam. Destes, oito operam em más condições e os demais estão em estado regular. Segundo Rolim, a distribuição desigual do
FOTOGRAFIA: WANDEIR CAMPOS
GLOSSÁRIO Autarquia: entidade autônoma, auxiliar da administração pública. Hidrômetros: aparelho para medir a quantidade de água consumida nas residências. Hidrometração: instalação dos hidrômetros. Penas d’água: instalação do cano da água da rua até uma casa que está sendo construída e que faz a solicitação. Geralmente são casas que ainda não possuem água encanada. Manobra: operação manual que distribui a água para uma região de cada vez. Manilha: tubo de barro vidrado para canalização de água e esgoto. Adutoras: canal ou encanamento que conduz ao reservatório as águas de um manancial. Assoreada: rio, canal ou lago com volume de água reduzido devido ao acúmulo de sedimentos (terra, areia, detritos, lixo, etc) Vazão: escoamento; saída. Outorga: recurso legal que concede ao usuário o direito do uso da água.
Dúvida. Devido às incertezas sobre a qualidade da água, população questiona a tarifação.
recurso hídrico não é atribuída ao desperdício nem ao relevo. Ele afirma que há água em abundância e os problemas estão na ausência de um planejamento que atenda à cidade, nos poucos profissionais especializados e, principalmente, no desconhecimento sobre hidráulica do município. Em seu estudo, o engenheiro comprovou que as captações estão, em sua maioria, assoreadas e por essa razão têm sua capacidade reduzida, além de não possuírem barragens corretas para reter a água. Segundo Rolim, o sistema utilizado nas ETAs é ultrapassado e defeituoso, portanto, ineficiente. Para ele, a culpa se dá graças às más gestões anteriores da autarquia e a falta de modernização do sistema. “A água não é devidamente tratada. São sistemas antigos, cheios de defeitos, vazamentos. A perda de água no trajeto é enorme. Tem que ter um estudo de vazão”, comenta. Ele também defende que a outorga da água deveria ser feita em todas as microbacias de captação. A Saae mantém estratégias que visam melhorar o sistema vigente. Os planos são de curto, médio e longo prazo. O objetivo a curto prazo se resume a criar uma captação no Córrego Banca do Rego, em Passagem de Mariana, além de construir novos reservatórios. A longo prazo, pretende-se captar água no Rio Gualaxo do Sul, com o objetivo de sanar os problemas da falta d’água em Mariana. Para Rolim, essa estratégia é eficiente, caso seja realmente retirada do papel e contar com um projeto bem executado. Em sua avaliação, o Gualaxo do Sul é um curso d’água grande e tem uma vazão considerável, capaz de alimentar boa parte da cidade
Impressões das Repórteres Para escrever esta matéria, conversamos com pessoas de contextos bastante diferentes, mas que compartilhavam uma coisa em comum: todas queriam ter acesso constante a uma água de qualidade e bem tratada. Buscamos ouvir, no processo de apuração, a população, o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) e um especialista. Nosso maior desafio foi escrever um texto que contemplasse e respeitasse as opiniões de todas as fontes, para que, ao final, o leitor pudesse ter seu próprio ponto de vista a respeito da tarifação, do desperdício e dos demais temas que perpassam nossa matéria. Nosso papel como jornalistas em formação não consiste em falar sobre vilões e mocinhos, e sim em levar os fatos com a maior diversidade e clareza possíveis para os cidadãos. Sentimos que cumprimos nosso dever e, embora ser repórter não seja uma tarefa fácil, ver o trabalho finalizado é, com certeza, recompensador.
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CULTURA
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ARTE: FLÁVIO REIS
FOTOGRAFIAS: LAURA VIANA
PEDRO FREIRE E METHEUS BRAGANSA
Visitar um mineiro é ser recebido na mesa com quitutes: pão de queijo, biscoitos e um bolo de fubá assado na hora. O povo de Minas Gerais possui uma hospitalidade tão única e verdadeira, que é quase impossível não se sentir à vontade quando os visita. Suas cidades centenárias contêm registros importantes para o entendimento de manifestações artísticas da nossa história. Dentre essas diversas expressões culturais, a culinária se destaca. Na cozinha tradicional mineira, as panelas de pedra asseguram um visual único e seu material conserva o calor da comida por horas, fazendo as refeições renderem muita prosa. Também por isso, a produção da panela de pedra-sabão no distrito de Cachoeira do Brumado, se tornou um bem imaterial da cidade de Mariana, integrando o extenso patrimônio do estado. A condecoração do modo de fazer da panela de pedra-sabão reconhece a tradição do distrito como um patrimônio importante na cultura mineira. O título garante visibilidade em âmbito nacional e abre oportunidades para os artesãos de Brumado. Com isso, o distrito tem a possibilidade de explorar o potencial turístico do artesanato, além de ter acesso ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços do Patrimônio Cultural (ICMS Patrimônio Cultural), programa que distribui parcela da receita arrecadada pelo ICMS do produto para municípios que protegem seus bens culturais. O utensílio é uma das principais atividades econômicas de Cachoeira e uma tradição que perdura desde o período colonial. Há registros do uso da pedra-sabão em Minas Gerais que remete a mais de 300 anos, a pedra já foi usada por povos indígenas, e esteve presente no Barroco rococó. Seu nome original é "esteatita", o apelido "pedra-sabão" foi devido ao objeto ser escorregadio ao toque. Um dos seus principais compostos é o talco, o que faz que ela seja facilmente maleável, sendo muito eficiente para o artesanato. “Cachoeira do Brumado é a capital das panelas de pedra-sabão. Não tem outra” afirma Vicente Carvalho, diretor da Associação dos Artesãos
Engana-se quem acha que Minas Gerais tenha recebido influência apenas da África e da Europa. Embora os dois continentes tenham grande peso na construção cultural do estado que conhecemos hoje, a Ásia também teve participação em nossa história. O que aproximou dois países tão distantes foi um fator em comum: Macau, atualmente região administrativa especial da China, também era colônia portuguesa. Além de importar objetos como pratos de porcelana, por exemplo, a Europa passou a utilizar o estilo chinês de pintura em suas obras, que também acabaram chegando ao Brasil. José Roberto Teixeira Leite, historiador de arte e autor do livro “A China no Brasil”, afirma que “em nenhuma região brasileira, mais do que em Minas Gerais, foram tão numerosos exemplos de pintura decorativa com temática ou de inspiração chinesa”. Marcas dessa influência asiática podem ser vistas ainda hoje em Mariana e Ouro Preto. O órgão alemão da Catedral da Sé de Mariana, trazido já pronto de Portugal, foi pintado majoritariamente em vermelho e dourado, cores caracterís-
Produção artesanal da panela de pedra reforça economia local Distrito de Cachoeira de Brumado destaca-se como pólo produtor do patrimônio imaterial
e Produtores Caseiros de Cachoeira do Brumado, e um dos produtores no distrito. Ao passear em Brumado, é comum ver esculturas, vasos com flores e até porta-retratos da matéria prima. Apesar dos artesãos locais utilizarem as pedras para os mais diversos artesanatos, o que sustenta economicamente o distrito é a fabricação das panelas de pedra-sabão. Os produtores afirmam que nunca duas panelas serão iguais, cada uma tem sua particularidade, um detalhe que a deixa única. A maneira clássica de produção é por meio de um torno acoplado a um moinho, que gera energia através da água. Em aproximadamente meia hora, utilizando a talhadeira para modelar e dar acabamento, a pedra se transforma no utensílio. No distrito de Cachoeira, o único artesão que ainda produz dessa forma é Geraldo José Teixeira, conhecido como Gegê Barbudo. Ele aprendeu a operar o torno com o seu tio, aos sete anos e não parou mais. Desde então, Gegê acorda de madrugada e começa a esculpir, só terminando o trabalho ao anoitecer. Nesse ritmo, chega a várias peças ao dia, a quantidade varia em relação ao tamanho e a encomenda. Hoje, aos 66 anos, o artesão afirma ter criado sua família com o dinheiro que ganha da profissão. “O ganha pão da gente, é a panela". Para ele, é muito importante manter a tradição não só do ofício, mas também do torno movido pelo moinho d’água, como uma memória do passado. "Pra nós, nossa riqueza é a panela. Sem ela, nós estamos tudo atrapalhado” afirma Gegê, que espera sua neta ficar mais velha para lhe ensinar a tornear também. Com o passar do tempo, a profissão se consagrou em Cachoeira do Brumado. E diante disso, houve uma modernização no processo. Embora ainda seja um trabalho artesanal, o que afirma a exclusividade de cada peça, a energia gerada a partir da queda d’água foi substituída por eletricidade. Segundo Gegê, a única diferença entre os dois processos é a velocidade. A automatização possibilita grande rapidez na técnica de modelar a pedra para transformá-la em panela. É mais perigoso, mas a produção é em maior escala. A qualidade e os preços dos produtos permanecem os mesmos. Se há 10 anos os artesãos buscavam as pedras livremente pela cidade, hoje precisam comprá-las. Segundo Vicente, as empresas de mineração que agora tomam conta dos terrenos que possuem a matéria prima, vendem por cerca de três mil reais um caminhão com pedras brutas. “Eles não selecionam as pedras. Dessa vez, vieram três blocos de pedra e dois serão jogados fora pois são impossíveis de serem utilizados”, revela o diretor da Associação dos Artesãos. Apesar das dificuldades, a produção da panela de pedra-sabão ainda persiste. Além das memórias afetivas que os moradores possuem em relação aos utensílios, a procura é grande. “Vende tudo. Não sobra uma”, comenta Vicente
VEJA OUTRAS INFORMAÇÕES SOBRE OBRAS NA VERSÃO ONLINE: http://goo.gl/ cq5p7
Resistência Cultural. O clássico e moderno persistem na produção artesanal da panela de pedra-sabão e asseguram o título de bem imaterial.
As influências da China no barroco mineiro GIULIANA TERRANOVA
ticas de obras chinesas. Além disso, a caixa do instrumento foi decorada com inspiração nos tecidos, biombos, ornamentos e porcelanas, assim como nos pagodes (construções tipicamente orientais), árvores, pássaros e algumas pessoas com roupas tradicionais, bem diferentes das usadas no ocidente. Com o órgão já instalado, artistas locais decoraram o encosto da cadeira em que os músicos se sentavam. As pinturas desse encosto levam as mesmas cores que a decoração do órgão, mas as gravuras apresentam cavaleiros lutando contra animais e contruções mais "ocidentalizadas". Essa inspiração retirada da cultura chinesa foi nomeada de "chinoiserie", no francês, e traduzida como chinesice em textos portugueses e brasileiros. A chinesice virou moda na Europa e no Brasil por volta dos séculos XVII e XVIII, respectiva-
mente. Aquele era o modelo que a corte queria, como explica Cristiano Casimiro, professor, acrescentando que "chinoiserie é uma influência, não quer dizer que seja o original". As esculturas feitas na época também receberam tal influência. No Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, é possível encontrá-las. Algumas delas são assinadas por Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, que utilizava duas características em suas obras para identificá-las: olhos amendoados, popularmente chamados de "olhos puxados", e o bigode fino, características chinesas. Outras obras que não possuem identificação de sua autoria carregam alguns desses mesmos detalhes. "Como não existiam muitos materiais para servir como base, o artista anterior era a sua base. Você via e copiava. Isso era normal naquela época", esclarece Casimiro.
No Museu Arquidiocesano de Arte Sacra de Mariana está em exposição a imagem de Santa Cecília, a Patrona da Música. A santa, que tem pele em tons mais amarelados, está sentada em uma cadeira vermelha enquanto segura uma harpa. Sua vestimenta difere das outras obras ao seu redor, pois possui menos detalhes, menos panos cortados, como se sua roupa fosse apenas uma túnica. Um longo véu apoiado em seu ombro esquerdo passa ao redor de seu corpo até cair sobre o colo da imagem. Na época de sua fabricação, início do século XIX, os tons vermelhos eram bem vivos, mas apenas algumas partes da cor original continuam presentes. O detalhe que mais chama atenção é o cabelo escuro que está preso em um coque em cima da cabeça, penteado característico dos guerreiros orientais, que simbolizava sua honra e é encontra-
do em outras obras que estão expostas no Museu da Inconfidência. No Adro da Basílica do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, é possível encontrar os doze profetas feitos por Aleijadinho com traços que caracterizam suas obras. A reprodução em gesso do profeta Daniel pode ser vista no Museu da Arquidiocese, em Mariana, na mesma sala onde está uma urna usada em eleições, que é decorada com as chinesices, destacando as cores vermelha e dourada. A arquitetura de construções históricas também recebeu intervenções vindas da cultura chinesa. Casimiro conta que um estudo sobre a fachada do prédio da Câmara Municipal de Mariana está sendo realizado para descobrir se o mesmo foi construído conforme um pagode chinês. Os pagodes são construções geralmente utilizadas para fins religiosos, possuindo muitas beiradas nos telhados. Eles são muito comuns na China, Japão, Nepal e nas Coreias. No caso do prédio da Câmara, a construção se assemelharia a um pagode, caso tivesse mais um andar proporcionalmente menor em relação ao primeiro
SETEMBRO DE 2017
LAMPIÃO
CULTURA
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ARTE: FLÁVIO REIS
FOTOGRAFIA: ERIC CASTRO
CRÍTICA ENTREVISTA
O órgão, a música sacra e as novas gerações A organista Josinéia Godinho fala sobre a relação entre música, educação e juventude Música sacra. Josinéia Godinho, organista da Igreja do Carmo.
HÁ POUCOS ÓRGÃOS E SÃO ANTIGOS. COMO É MANTER OS QUE JÁ EXISTEM? QUAIS OS PROBLEMAS QUE ISSO IMPLICA? Órgãos são instrumentos complexos de cuidar, como proteger a parte de maQUAL É A SUA RELAÇÃO COM OS deira dos cupins. Hoje, aqui em MariaÓRGÃOS DA SÉ E DA IGREJA DO na, temos dois órgãos, mas nenhum orCARMO? ganeiro (profissional responsável pela A minha relação com o órgão da Sé manutenção do órgão) no estado de Mié bem antiga. Ele voltou ao Brasil após nas Gerais. Ainda assim, eles são bem sua primeira restauração, por volta de usados, em torno de duas a quatro ve1986. Na época, eu estava começando zes por semana, por causa de aulas, misminha faculdade de órgão em São Pausas e concertos. Dessa forma, não tem lo. Após essa restauração, foram promonecessidade de ter um técnico próximo, vidos cursos e foi aí que tive meu pripois a limpeza dos tubos e a movimenmeiro contato com ele. Já o órgão da tação das engrenagens são feitas. A meIgreja do Carmo, acompanhei desde a lhor maneira de cuidar do órgão é deisua montagem no muxar que seja tocado. Outra seu da música. Conforquestão é que o órgão, me ele era instalado, eu Há muitas e grandes como outros instrumentos ia tocando e afinando. orquestras com programas de igreja, requer uma pouA minha relação com pança. Quando precisa de educativos e esse é o futuro esses instrumentos é manutenção, isso viabiliza bastante próxima, tan- da música.” os gastos, pois as despesas to pessoal quanto de trabalho, já que dou aulas e faço concertos.
SOBRE UM INSTRUMENTO QUE AINDA É MUITO LIGADO À RELIGIÃO E A ORGANISTAS HOMENS, COMO É SER UMA MULHER NESSE MEIO? COMO É O PROCESSO DE RELAÇÃO ENTRE MÚSICA E RELIGIÃO NESSE CONTEXTO? É interessante ser mulher quando trabalha-se a liturgia (ritos religiosos). Aprendemos a lidar com certas situações como, por exemplo, o Mosteiro de São Bento, em São Paulo. Só pode tocar
Josinéia Godinho
são muito caras e quase ninguém tem tal dinheiro.
COMO INCENTIVAR A MÚSICA ERUDITA? E COMO DESMISTIFICAR ESSE TIPO DE MÚSICA JUNTO À JUVENTUDE? É uma vasta discussão entre os músicos no mundo todo, porque não é fácil manter a tradição. A primeira questão é a necessidade de uma educação musical. Creio que concertos e apresentações didáticas não são apenas para crianças, mas para qualquer pessoa de qualquer idade e que não possui contato com a música erudita. Se você disser à pessoa
QUAL A SUA EXPERIÊNCIA APRESENTANDO O INSTRUMENTO E A MÚSICA AOS JOVENS? Tivemos duas experiências, em 2004 e 2007, com concertos para escolas. Foi interessante, pois escolhemos músicas de dois minutos e explicamos os instrumentos musicais para as crianças, algo fascinante para eles. Produzimos uma cartilha educativa, um dos meus grandes orgulhos. Escrevi a história do menor tubo do órgão chamado Arpe e as ilustrações foram de Cristiano Casimiro, assessor da Câmara Municipal de Mariana. As crianças tiveram que fazer uma atividade escolar: podiam escrever, criar um mural ou desenhar e, nisso, desenharam a fachada da Sé. Algumas meninas do ensino fundamental até criaram um rap para o órgão. Todo concerto educativo, para adultos e crianças, explicado com clareza, faz com que entendam o que acontece por causa das ferramentas educacionais que receberam para ouvir. Assim, todos entram no espírito do instrumento
Historiador e Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Ouro Preto
Cinema brasileiro para quem? Comédias feitas a partir de produtos da televisão, alegorias com alto teor político, dramas existenciais, cinema queer (obras que vão na contramão da heteronormatividade), filmes de época, grandes documentários… diversidade é o que não falta no cinema brasileiro, principalmente no cenário contemporâneo. E ele é muito valioso! Porém, assim como um diamante, os cinemas brasileiros (sim, no plural) não são fáceis de ser encontrados. Há resistência de um público que insiste em dizer que o cinema brasileiro é ruim. Além disso, a dificuldade de inserção no mercado ainda é um problema que assombra a maioria dos filmes feitos no Brasil. Em um país de dimensões continentais, as diversas produções ainda encontram barreiras gigantes, desde o processo de captação de recursos para concepção dos filmes à luta por espaço no imaginário coletivo. É um longo caminho até chegar às mãos do consumidor. Para além de um debate sobre dificuldades de produção, atento para um fator decisivo ao que chega ou não ao público: a distribuição. As leis brasileiras de valorização ao cinema brasileiro obrigam os cinemas a reservarem um espaço (mínimo!) de sua programação para filmes nacionais. E mesmo assim, a grande diversidade é dispersa frente a uma tendência que domina as salas de cinema. A Globo Filmes (que trouxe ao público obras-primas, também) é uma das grandes responsáveis pelo pouco espaço dado aos produtores independentes. As agressivas campanhas de marketing, principalmente no canal aberto de maior audiência do país, fazem com que as grandes redes de cinemas optem por colocar em sua programação apenas uma parcela dessa ampla variedade, geralmente, comédias de qualidade duvidosa. Como nossa região não possui um cinema comercial, fica ainda mais difícil o acesso aos filmes variados. A programação da TV aberta, no pouco espaço que abre, reserva as madrugadas para a boa produção do cinema brasileiro. O home vídeo está falido. Nos últimos anos as locadoras têm fechado as portas. Comprar a mídia física ainda é uma opção cara, porque os filmes são comprados por distribuidoras nanicas (quando são comprados!) e que fazem cópias limitadíssimas. O streaming, plataformas como YouTube e Netflix, por exemplo, tem se tornado a opção mais barata para se assistir filmes. E nele, o problema ainda persiste: as abas de filmes brasileiros chegam a dar desespero. A gigante do ramo, Netflix, possui milhares de títulos, mas o cinema nacional ainda não passa de cem títulos. Sem opção legal e viável, o cinema brasileiro ainda é restrito a um público muito seleto que pode frequentar festivais e “cinemas de arte” de grandes cidades. Enquanto isso, a pirataria, único meio de acesso da maioria, segue crescendo.
AGENDA CULTURAL LANÇAMENTO DO LIVRO “O SORRISO DA CIGANA” DE LUCIANO GUIMARÃES PEREIRA E ILUSTRAÇÕES DE ARLINDO DIÓRIO
DIA 23 - OURO PRETO (CENTRO DE CONVENÇÕES DA UFOP) - 20H - R$20,00 * A ARRECADAÇÃO DAS VENDAS SERÁ REVERTIDA PARA UM PROJETO SOCIAL
FESTIVAL MIMO 2017
DE 29 A 30 - OURO PRETO - GRATUITO
CIRCO VOLANTE
14 E 15 - MARIANA (PRAÇAS GOMES FREIRE, SÉ E MG) - GRATUITO
OUTUBRO
O ÓRGÃO É O ÚNICO EXEMPLAR DA MARCA ALEMÃ NO BRASIL. COMO VOCÊ VÊ O INTERESSE PELO ÓRGÃO EM MINAS GERAIS E NO PAÍS? O Órgão, por causa da sua história e de ter mais de 300 anos, além de ser o único da marca Arp Schnitger no Brasil, tem um apelo turístico fortíssimo, e sempre vai atingir, por ser um instrumento musical erudito, um grupo de interesse mais restrito. Uma perspectiva de preservação é quando o instrumento é bem utilizado em aulas, missas e concertos, assim, cria-se uma relação com o público. Essa proximidade faz com que as pessoas valorizem a música e o instrumento, permanecendo na sua memória para as gerações futuras.
para ficar sentada por meia hora ou 45 minutos quieta, sem nem ao menos respirar, porque atrapalha o músico, ela não vai mais voltar. Agora, se você apresenta os instrumentos, mostra o som e explica a peça, como a filarmônica de Minas Gerais, a pessoa chega sabendo o que vai ouvir, de tal modo que consegue acompanhar o enredo. A música é educativa em inúmeras situações, como: quando toco um concerto explicando para alguém, estou instruindo também. Tenho amigos que desenvolvem a música como parte da educação informal. A música sempre foi um canal educativo, há séculos, e ela pode continuar sendo, desde que os músicos eruditos não reneguem. Há muitas e grandes orquestras com programas educativos e esse é o futuro da música.
SETEMBRO
Josinéia Godinho, 50 anos, professora de música e organista, fala sobre sua relação com os órgãos da Catedral da Sé e da Igreja Nossa Senhora do Carmo, seu estilo musical e sua atuação em Mariana. Natural de São Paulo, é formada em órgão pela Faculdade Santa Marcelina e em música sacra pela Escola Superior de Música e Teatro de Hamburgo, na Alemanha. Após receber um convite para tocar no órgão da Catedral da Sé de Mariana, decidiu se mudar para a cidade em 2000. Porém, devido à reforma temporária do local, a organista realiza concertos quinzenais na Igreja do Carmo com um instrumento novo, de apenas quatro anos. O órgão da Sé é antigo e o único da marca alemã Arp Schnitger no Brasil. Construído no século XVIII, é um grande atrativo turístico na região. Apesar do instrumento ter origem alemã, também traz influências do barroco e possui características chinesas em sua pintura. A professora conta sobre a importância da instrução musical para criar laços entre o instrumento, sua sonoridade e as novas gerações. A música é uma ferramenta de aprendizado, além de mostrar variedades e riquezas do estilo erudito (clássico).
o órgão deles se passar pela clausura dos monges e mulheres não passam. Assim, somente os homens tocam lá. Para mim, é normal que a questão do gênero apareça em profissões dominadas por homens. No entanto, não há muitos órgãos e nem organistas no Brasil, e menos ainda em Mariana. Sendo assim, a questão do gênero não tem tanta relevância.
NOVEMBRO
ISABELY PIGNONATO
FOTOGRAFIA: ALINE VILELA
FLÁVIO REIS
FÓRUM DAS LETRAS
DE 08 A 12 - OURO PRETO (CINE VILA RICA) - GRATUITO POR ALINE VILELA
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LAMPIÃO
COMPORTAMENTO
SETEMBRO DE 2017
ARTE: JOÃO DE BELLI
Corpos que dançam: mulheres em busca de independência e longevidade depois dos 60 anos Viúvas se reunem semanalmente em baile dançante à procura de divertimento e ampliação dos laços de afeto MIRIÃ BONIFÁCIO
“Mais de 100”, é o número que respondem quando perguntamos sobre a quantidade de público que frequenta o baile “Hora Dançante” do clube Guarany F. C, em Mariana. Difícil contar a quantidade exata de pernas que se movimentam no salão de quase 30 metros de comprimento, com tacos de madeira, pouco iluminado, número 32, que dá vista para a Praça Gomes Freire. Na contagem dos olhos, há mais homens que mulheres, e na intenção, elas aparentam menos idade do que eles. Um rodopio e a dinâmica da noite vai sendo revelada. Nas mesas, que ocupam a área das únicas três janelas que existem no local, sentam-se a maior parte dos casais e os grupos de mulheres que permanecem juntas na ideia de se divertirem. À frente, corpos em deslocamento. As mãos deles na cintura, as delas quase sempre em volta do pescoço. Na mistura da voz aguda do cantor e do eletroforró boleirado, os membros, sem necessariamente coordenação motora, se movem na passada do um, dois, três, encaixado. Na lateral, cadeiras de plástico enfileiradas. Rostos ansiosos estão sentados à espera do “vamos dançar?”. Rita Dias, 64 anos, moradora do Bairro São José, está em pé, os cabelos cuidadosamente presos para trás, a postura e mãos sobre o colo dizem que algo ali lembra uma bailarina clássica. Não é o caso. Trata-se de uma dona de casa, que já foi presidenta da associação de moradores do bairro e secretária da Federação das Associações de Moradores de Mariana (FEAMMA). Hoje, Rita é viúva e frequentadora dos domingos dançantes. Foi levada pelo filho, que descobriu sua paixão adolescente pela dança. “Fiquei 41 anos casada. Esse tempo todo sem dançar”, desabafa. Ela recebe pensão em razão do marido falecido e diz que vai ao baile mais pelos amigos e pelo forró do que qualquer outra coisa. Sente que o espaço é uma redescoberta de si mesma. Duas cadeiras atrás, Neuza Ferreira, também 64, semblante fechado, gingado tímido no assento. É habituada ao clube há quase dez anos. Na verdade, desde que se separou de corpo do marido, com o qual ficou casada por 39 anos. E também continuou lá, depois da morte dele há um ano e quatro meses. Ela se estressa um pouco ao falar sobre preconceito com os mais velhos. “Jovens, tem muitos que acham que você tá velho pra tudo. Essa roupa não é de velho. Esse lugar não é de velho. A maquiagem não é pra velho. É a melhor idade ou a pior idade?”, retruca. Entende que muitos de seus amigos não vão ao lugar por considerarem brega. E confirma a suspeita de que para as mulheres ativas com mais de 60 anos, a viuvez pode significar libertação. “A mulher quando não tem estudo, não tem no que se apegar, acha que desfazer um casamento é acabar com a vida. Para mim foi uma vitória”, sorri. Faça as contas, ela começou a namorá-lo aos 12, se casou aos 16 e engravidou aos 19. É mãe de quatro filhos, três de sangue e um de coração. Viveu, como ela diz, com “aquele” tipo de homem. “Ele bebia muito, era agressivo”. Sempre gostou de sair, “mas casada não dá, né?”, debocha. Diz que o marido ia ao baile com frequência mas não deixava que ela fosse. “Por isso não deu certo”, decreta. Contudo, nesse tempo em que está livre, Neuza não se relacionou com outra pessoa. Afirma que perdeu a confiança e teme viver de novo uma relação de dependência de qualquer tipo. Sente medo dos homens. Neuza conta que já sofreu demais, e para quem sofreu assim, divertimento é uma palavra muito cara. Assim, ela considera que as atividades voltadas para a sua idade, em Mariana, não atendem, pois além de serem poucas, não promovem divertimento. “Quero me divertir”, repete. Não tem problema com a idade, não se sente velha, apesar do conservadorismo antigo que parece acompanhá-la de outra geração. “Aqui, o ambiente é familiar, não entra gente de boné, bermuda. É lugar de gente civilizada”, pondera. Quem concorda com a sua fala é Neiva Oliveira da Silva, proprietária do empreendimento terceirizado que funciona dentro das acomodações do clube, que serve cerveja, ice, refrigerante diet, canjica, caldos, churrasco e cocada baiana aos dançantes. Neiva expõe que o consumo de álcool por eles é fraco e que gosta de trabalhar com esse público por serem tranquilos. “Não precisa nem de segurança aqui”, conforta-se. Com ânimo contrário ao de Neuza, Júlia das Graças, 62,
mesmo tendo receio do que pode acontecer, se diz “uma viúva à procura de viúvo”. A moradora do Bairro Barro Preto, avó de dez netos, está em busca de um amor desde que ficou sozinha, há dez anos. Não acha que a idade é desculpa para estar sem alguém. Uma mistura de vontade e solidão, contidos no rebolado e no sorriso que ela espalha por entre as paredes do Guarany. Mais animada que Júlia, só Maria das Graças, 69, e seus movimentos desacompanhados, com a mão no umbigo, que vão riscando o salão. Os braços, também uma marca, se agitam constantemente como se imitassem o gesto dos animadores de torcida. E a torcida de Maria é pelo que ela chama de “melhor idade”. Ela faz parte do Projeto Renascer - um clube particular de Ouro Preto, que desenvolve atividades como o teatro, o tai chi chuan e a yoga. Também acabou de voltar de uma viagem que fez pela Rússia e Suécia, junto a outros amigos, através desses tipos de “pacotão de agência”. A independência para a ex-funcionária pública vem também em relação ao tempo, que agora ela gasta em favor próprio e que, antes, não era possível. Solteira e “livre”, Maria, apesar de sofrer com o mal do século XXI - a depressão, ainda é adepta à filosofia Seicho-no-ie, ou o modo feliz de viver a vida. As sessões que ela frequenta na Associação Local de Ouro Preto, assim como a dança, a ajudam na recuperação de uma alegria que ela sabe que tem. Explica que só conseguiu ir ao baile duas vezes este ano, mas que sente: “agora voltei!”. Maria Irene de Almeida, 62, também conta que tem se sentido prostrada. Pela segunda vez no baile depois de um período de afastamento, por causa da cirurgia de redução nos seios e da necessidade de quietude dos braços, ela disse reconhecer o peso que lhe fez vítima dessa vida em que não se sai de casa. “Como não podia me mexer, eu ficava só deitada. Uma choradeira. Fiquei com depressão”, expõe. Não sabe dizer há quanto tempo voltou a frequentar a vida. Diz que tem mais de dois anos e que foi depois que o marido faleceu. “Eu morava na Vila Samarco. Mas além de ser longe de casa, eu não vinha [ao baile] por uma questão de respeito [a ele] também”, compreende. Agora, que vive no Bairro Centro, ela tem construído sua emancipação como uma forma de se tratar da doença. “O médico disse pra ir no jardim, fazer exercícios físicos e dançar”. Irene, e sua blusa bordada com fios dourados acendendo à noite, não se envolveu com mais ninguém depois da viuvez. Olhando de maneira afetuosa para o salão de dança, sentada em uma das cadeiras disponíveis ao redor da pista, ela declara “A depressão saiu de mim. Eu me curei, né?”. DIFICULDADES PARA UMA VIDA ATIVA Segundo o Atlas da Vulnerabilidade Social, em 2010, a população marianense teve uma taxa de envelhecimento de (0,874) anos. O índice de longevidade é o maior se comparado com o da vizinha Ouro Preto (0,834) ou ainda, com Belo Horizonte (0,856). Para além das médias, ainda podemos confirmar que as mulheres vivem mais do que os homens e, portanto, nesse contexto, são as mais vulneráveis a uma sociedade que não pensa no bem-estar das pessoas depois dos 60 anos. Dentre as entrevistadas, todas recebem algum tipo de pensão ou benefício previdenciário que lhe permitem estar presentes nesse ambiente - com entrada a R$ 10. Além disso, a mobilidade é uma questão. Muitas delas reclamam que precisam contar com a carona de amigos ou com a disposição das pernas naquele dia, para irem até o local. Nesse sentido, a distribuição de opções de divertimento pelas cidades em que vivem ainda são poucas, e, quando existem, necessitam de estratégias de acesso. Também, com exceção de Maria das Graças, todas elas com filhos, dizem sofrer algum tipo de recriminação - ou preocupação demasiada da parte deles, com suas saídas noturnas. Apesar de “permitirem”, há uma ideia velada de que as “mães”, “naquela idade”, não deveriam se arriscar em busca de prazer individual. Há, portanto, algo de desafiador no espírito delas para buscarem uma independência, após processos de matrimônios regrados, e recuperar práticas que gostariam de ter desenvolvido no passado. Além disso, o “Hora Dançante”, é para a maioria, um espaço estratégico de convivência - que não está ligado ao recomeço de relações amorosas, mas às possibilidades de divertimento e emoções
FOTOGRAFIA: MAYRON BRITO
Divertir. Pista de dança promove interação aos domingos.
FOTOGRAFIA: MAYRON BRITO
Recomeço. Irene volta a frequentar o baile.
FOTOGRAFIA: MAYRON BRITO
Disposição. Júlia investe na dança para espantar solidão.
Sobre envelhecimento e o espírito das pessoas que permanecem ativas após os 60 “No interior do movimento de redefinição das representações sobre a velhice, iniciado nos anos 1980, surgem os Programas para a Terceira Idade. Diversas pesquisas, dentre as realizadas por Lins de Barros (1998) e Debert (1999), têm indicado a importância desses espaços para a ruptura de estigmas ligados ao envelhecimento e para a criação de inúmeras possibilidades gratificantes de vivência desse processo. As perspectivas construídas por estes programas se pautam nessa etapa como uma possibilidade de realização de sonho e aprendizagem, calcada especialmente na ideia de envelhecimento sem velhice, que se propaga no ideal da eterna juventude, e que, por sua vez, fundamenta na contemporaneidade o “fenômeno cultural da juvenização” (SALGADO, 1992) - ou, mais precisamente, na “negação da velhice” como mais uma fase do ciclo da vida. A velhice, dessa forma, não é percebida como uma construção coletiva, mas como uma condição individual. Assim, é tomada como um “estado de espírito” (LINS DE BARROS,1987), fazendo recair sobre os idosos a responsabilidade pelo seu próprio envelhecimento.” Estela Saléh da Cunha - Professora do Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e autora da Dissertação de Mestrado “Velhices: múltiplas faces de um processo socialmente construído”
SETEMBRO DE 2017
LAMPIÃO
ESPORTE
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ARTE: JOÃO DE BELLI
Com condições geográficas favoráveis, o incentivo ao esporte de alto custo ainda é insuficiente
ISABELY PIGNONATO FOTOGRAFIA: ERIC CASTRO
Falta de financiamento ameaça Downhill na região dos Inconfidentes
COLUNA PASSE RÁPIDO
FOTOGRAFIA: MARIA SANTOS
É basquete que queremos!
Conquista. Rafaella Oliveira participa de campeonatos nacionais e coleciona prêmios, apesar da falta de incentivo e estrutura nessa modalidade. LUIZA FELIPE
Desafiar obstáculos e terrenos íngremes em alta velocidade: o Downhill é um esporte radical que ganha espaço na Região dos Inconfidentes. A geografia é propícia: oferece trilhas repletas de morros, locais preferidos pelos atletas para realizar as descidas em suas bicicletas. Mas, assim como muitas práticas esportivas, ele esbarra em uma questão comum no Brasil e em Minas Gerais: a falta de patrocínios e incentivos financeiros dos setores públicos e privados. Bernardo Cruz, ouro-pretano e morador do distrito de Cachoeira do Campo, desafia a velocidade e as circunstâncias para viver do esporte. Apesar do alto rendimento em provas mundo afora e de ser pentacampeão brasileiro na modalidade, Cruz conta, muitas vezes, apenas com o apoio do setor privado. O patrocínio recebido para dar início à sua carreira veio do pai que, na ocasião, realizou um empréstimo para comprar uma bicicleta adequada para que o filho pudesse competir. Ouro Preto tem se destacado por reunir jovens adeptos do Downhill. Entre os vários iniciantes na modalidade está o adolescente João Emanuel. Ele, que se diz “louco pelo esporte”, quer se profissionalizar e disputar campeonatos, mas, por enquanto, este sonho terá de esperar. Apesar do aumento do interesse dos jovens da região pelo Downhill, o poder público parece não incentivar financeiramente essa prática nem oferecer infraestrutura adequada. “Tem muito atleta em Ouro Preto. A prefeitura tinha que aproveitar isso fazendo trilhas, dando bolsas para atletas, ou interferindo de alguma forma para que meninos enxerguem que é possível viver do esporte. Não é fácil. Aqui no Brasil sou
um dos poucos, e se a família não tem condições financeiras fica mais difícil ”, afirma Cruz. João Emanuel, como muitos jovens da cidade, vê o seu talento esbarrar na falta de aporte financeiro. Além ser um esporte caro, as premiações dos campeonatos de Downhill que são realizados na região são pouco atraentes àqueles que pretendem viver do esporte. Muitas delas são apenas simbólicas, restringindo-se a medalhas e troféus. Os participantes ainda têm gastos com a inscrição e o transporte, além das exigências dos fiscais de prova em relação ao equipamento utilizado pelos ciclistas. “Preciso ficar mais velho, treinar bastante e me dedicar. Quero andar com os melhores pilotos do Brasil. Alguns colegas recebem auxílio da prefeitura para viajar para as disputas, ganham desconto nas inscrições para incentivar a prática. No meu caso, os meus apoiadores são meu pai, o mecânico que conserta a minha bicicleta e meu amigo que possui uma barbearia de frente pra minha casa”, explica João. Para que o atleta atinja um alto rendimento nas provas e esteja entre os melhores atletas da modalidade, segundo o ranking da Confederação Brasileira de Ciclismo, é necessário que a bicicleta usada seja própria para a modalidade, dificultando o acesso de muitos jovens ao esporte. No entanto, a falta de recursos e equipamento profissional não é empecilho para alguns. O casal Wellington “Zoi” e Rafaella Oliveira começou a competir sem contar com bicicletas ou acessórios adequados. Apesar do início difícil, hoje o casal compete na elite do esporte. Oliveira se destaca como a única representante feminina da região. Wellington pontua que o uso de equipamentos adequados contribui para um melhor desempenho e garante mais segurança ao atleta. FOTO: MARIA SANTOS
O Downhill é considerado um esporte de risco em função das frequentes quedas dos atletas. Acessórios como capacete, luvas, joelheiras e vestuário adequado, são aparatos que evitam lesões graves e que, em muitos casos, poderiam afastar os ciclistas das trilhas. Oliveira recentemente sofreu uma queda durante um campeonato em Santos, no litoral paulista, e só não sofreu graves lesões graças ao equipamento de proteção, geralmente fornecido por patrocinadores. “Nas competições, o uso dos equipamentos é obrigatório e, por isso, fiquei apenas desacordada e não sofri com sequelas, mas nos treinos muitas vezes, principalmente para quem está iniciando agora, é grande o risco de não os ter’’, alerta. Não obtivemos resposta da Prefeitura de Ouro Preto, até o fechamento desta edição, sobre detalhes quanto aos investimentos na modalidade. Em Mariana, o esporte parece tomar rumos diferentes em relação às cidades vizinhas. Os atletas contam, algumas vezes, com incentivos financeiros do poder público, embora esse repasse não consiga beneficiar todos os praticantes. Assim como nas cidades vizinhas, os ciclistas têm de se esforçar para treinar e conseguir apoio. Gustavo Izidoro e Yuri Oliveira são atletas marianenses de destaque e fazem parte da equipe Morfina, que auxilia jovens a praticar o esporte. Atualmente, a dupla compete em todo o Brasil. De acordo com Yuri Oliveira, o benefício do programa ‘Bolsa Atleta’, que é oferecido pela Prefeitura de Mariana, é uma forma de auxiliar os adeptos do Downhill. No entanto, o programa não atende quem está entrando no esporte, somente agrega aos competidores que já possuem resultados em competições estaduais ou nacionais
Quanto custa praticar Downhill ? Bicicleta - R$2.000 a R$35.000,00 Luvas - R$70,00 Vestuário - R$200,00 Óculos de proteção - R$40,00 Colete - R$500,00 Joelheira e Cotoveleira - R$150,00 Inscrição para competição - R$120,00 Manutenção - R$400,00 Custo mínimo com viagens - R$300,00 *Média calculada de acordo com valores informados pelas fontes e consultados através do site www. dcicles.com, que é um dos maiores fornecedores de materiais esportivos para downhill no Brasil.
Resistência. Há cinco anos, a atleta é a única profissional da região que pratica Downhill.
VEJA OUTRAS INFORMAÇÕES SOBRE A REPORTAGEM NA VERSÃO ONLINE: https:// goo.gl/fopmBr
Você já assistiu ao filme “Coach Carter - Treino para a vida”? Caso não, recomendo para um sábado à noite. Se já assistiu, então irá entender o que vou dizer sobre alguns jovens que fazem parte do projeto “Basquete Cabanas”, em Mariana. A Escola Estadual Ensino Médio Cabanas coloca em prática a ideia presente no filme. Eu os acompanhei em um dia de treino. Como eles, adorava jogar basquete. Cada bola na cesta era uma vitória. Acompanhá-los me fez lembrar da infância. Por alguns minutos, pude perceber que a paixão pelo esporte está presente nas pessoas, independente de gênero, idade ou altura. O sonho de muitos jovens é ser atleta. Conversando com os membros do “Basquete Cabanas”, jovens de 15 a 18 anos, percebi este grande desejo entre eles, ser jogador de basquete. Os treinadores André Luan Macedo e Bruce Portes, amigos e professores de História, são tão apaixonados por basquete quanto seus alunos. Ao ver os jovens jogando na quadra da escola com cestas feitas de aros de bicicleta e sem técnico ou qualquer auxílio, Bruce teve a ideia de criar o projeto com André. O “Basquete Cabanas” nasceu em fevereiro deste ano e, em pouco tempo, cresceu. Os 22 alunos e jovens moradores da cidade, antes, sem nada para fazer, ficavam em casa ou na rua. Hoje, são atletas e muitos com alto rendimento esportivo. Além disso, devido ao grande número de atletas no projeto, foram criados dois times: ESCOLA, só para alunos, e CABANAS, para jovens que frequentam ou não a escola. FOTOGRAFIA: MAYRON BRITO
Social. Projeto engaja alunos no esporte Agora vem a parte mais importante do projeto e algumas revelações sobre o filme. Na trama, o treinador Carter, para incentivar os rapazes a estudar, faz um contrato determinando que os jogadores frequentem todas as aulas, sentem na primeira fileira e tirem média 5,75. Como no filme, Bruce fez um contrato parecido com os garotos para mostrar que só o rendimento em quadra não é suficiente. Também é preciso desempenho em sala de aula para conseguir um futuro melhor quando saírem da escola. Por muito tempo, André colocou conteúdo de física nos treinos para mostrar a ligação do basquete com as matérias escolares. Os meninos respeitam muito seus técnicos. Há uma forte relação de admiração por eles. Os próprios alunos se cobram, quando necessário, para não decepcionar os treinadores. O diretor da escola, Wemerson Borges, e uma das professoras, Driely Oliveira, confirmam que houve a mudança que se esperava, não de notas melhores, mas de respeito e disciplina em sala de aula. Em poucos meses jogando, eles conseguiram melhorar sua postura em sala, um grande passo. Hoje, meses depois do início do projeto, o time tem uniformes e cestas de verdade, resultado do incentivo e da colaboração de suas famílias, além de muita união. Quando o técnico não está presente, eles treinam sozinhos. Estar na quadra e compartilhar esse momento com os alunos e professores me trouxe uma sensação de felicidade, em perceber que o basquete não só ensina, mas também os diverte. E com eles, foi possível entender que essa é a melhor maneira de crescer e aprender. O projeto “Basquete Cabanas acontece todas às quartas, às 18h, na Escola e, aos sábados, às 8h na Arena Mariana. Quem quiser participar, é sempre bem-vindo!
Calendário de eventos esportivos: 30/09 - 28º Jogos Escolares de Mariana (JEM) 12/10 a 15/10 - 5ª Copa Vôlei Líder 30/10 - Campeonato Mineiro de Jiu-Jitsu 11/11 e 12/11 - Copa Integração de Futsal
12 ENSAIO
LAMPIÃO
SETEMBRO DE 2017
ARTE: MARIANA MOSCHEM
FOTO E TEXTO: DÉBORA MADEIRA
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ANDORINHAS DE PAPEL Ao som da suave brisa, pontos equiláteros brincam no céu. Pelas ruas de pedras ouve-se o barulho das latas de linha, que ao conduzir a dança junto ao vento, passam como faca pelas pipas em seu caminho. Crianças e jovens no alto do morro ao sentir a direção do vento, param atenciosas, desembolam a rabiola, e alçam voo em mais uma brincadeira. Não importa se é pequeno ou gente grande, menino ou menina. Sobre telhados, pipas e casas todos querem ficar mais perto do céu.