Marco Zero 58

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JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINTER - ANO IX- NÚMERO 58 – CURITIBA, MAIO A JUL DE 2018

Foto: Ricardo Marajo/FAS

Foto: Antônio Cruz / Agência Brasil

pág. 3

Mais de 860 travestis e trasnsexuais foram assassinados nos últimos oito anos no Brasil

Foto: Leandro Taques / Jornalistas Livres

pág.4

Veja quais são os principais palcos de manifestações anuais na capital paranaense

Foto: Divulgação

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Um dos principais consoles de games do mundo completa 25 anos no Brasil em outubro

online Quer ver as edições online do Marco Zero? Use o Qr-Code ao lado e confira o seu jornal também na internet!

Aluguel Social: um direito “sem efeito” págs.6, 7 e 8


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Número 58 – Maio a Julho de 2018

OPINIÃO Foto: Google Earth

Ao Leitor Um jornal que se expande às próprias páginas. Este é o resumo desta edição do jornal Marco Zero, que abre um novo cenário de inovação para o periodismo impresso junto ao curso de Bacharelado em Jornalismo do Centro Uninter. Ao longo das doze folhas do jornal, você encontrará uma série de elementos que amplia o conteúdo do jornal, promovendo uma experiência interativa e tecnológica para cada leitor. Os Qr-codes espalhados pelas matérias são hiperlinks que abrem o mundo de possibilidades para outras matérias, aplicativos e vários outros conteúdos para além das páginas do Marco Zero.

Outro recurso que trouxemos nesta edição, e que veio para ficar, é o uso de Realidade Aumentada nas matérias, com conteúdos exclusivos para você. Diferente do Qr-Code, a Realidade Aumentada aqui no Marco Zero trará conteúdos no próprio jornal. Que tal ao ler a crítica sobre o clipe recém-lançado por um músico aproveitar para assistir o clipe na própria página do Marco Zero? Pois é, fique alerta! Sempre quer ver o selo da Realidade Aumentada nas matérias, saiba que alí tem conteúdo que saltará das páginas em seu celular.

Boa leitura! Equipe

Crônica: A praça

Marco Zero

Eliana Buratti

J

á pensou em assistir a uma entrevista nas páginas de um jornal impresso, em vídeo? Ou quem sabe conferir um mapa em terceira dimensão, ou ainda interagir com elementos gráficos que saem das páginas? O que há poucos anos seria um sonho, agora é possível e está nas suas mãos. Isso mesmo! Venha com o Marco Zero na

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onda da Realidade Aumentada, uma tecnologia que permite a interação entre elementos reais e virtuais. Para entrar nesta viagem, é fácil e rápico. Siga as instruções, e participe da experiência da notícia interativa. Nesta primeira versão, o recurso pelo aplicativo do Marco Zero está disponível apenas para aparelhos com sistema operacional Android.

Final de tarde, caminho pela Praça Tiradentes apressadamente. Os ponteiros no relógio correm para me pressionar ao horário da aula. Procuro algo rápido para comer. Sem me dar conta de onde estou, paro em frente à barraca do pastel “frito na hora”. - Um pastel e um café com leite, por favor-, é o que peço. Enquanto degusto o salgado, colocando de vez em quando uma pitada de pimenta, e esperando o café esfriar, observo o entorno. Ao longo da pequena rua na praça, as pessoas caminham a passos largos para alcançar o ônibus que já vai partir. Outros se apinham nos pequenos “tubos dos ligeirinhos”. A fila que não cabe denuncia a escassez de transporte no horário do “rush”. Algumas pessoas olham vitrines, outras conversam despreocupadamente em frente às lanchonetes da praça. Outras ainda parecem “negociar” algo enquanto falam alto e disfarçam para não chamar a

Na Praça Tiradentes, bem em frente à Catedral, está o Marco Zero de Curitiba, que oficialmente é tido como o local onde nasceu a cidade, além de ser o ponto de marcação de medidas de distâncias de Curitiba em relação a outros municípios.

Passo 2

Ao jornal Marco Zero foi concedido este nome por conter notícias e reportagens voltadas para o público da região central da capital paranaense.

Confira se o seu celular e a versão do seu Android são compatíveis. Depois, clique em instalar.

Prestes as completar uma década de atuação jornalística em Curitiba, o jornal Marco Zero segue sendo a voz da população da região central da cidade, abordando temas de relevância pública, de forma séria e primando pela ética e qualidade jornalística.

EXPEDIENTE

Com o APP aberto, aponte a câmera do seu celular para a página do MZ quando tiver a imagem ao lado

Sou despertada do transe, quando ouço um menino descalço na pedra gelada da rua, chamando-me de “tia” e implorando, com olhos apertados e a mão suja estendida. Compadeço-me e ofereço um pastel, que é devorado em segundos. Mais um?-, pergunto-lhe ao mesmo tempo que verifico se o dinheiro que me resta é suficiente. Enquanto atravesso novamente a praça em direção ao derradeiro destino, ouço sirenes e carros abarrotados de policiais que estacionam na calçada para mais uma inspeção de rotina. Uns com as mãos atrás do corpo, outros com a mão direita no coldre da arma. Imponentes, andam por entre a multidão apequenada pelo medo. Mesmo os que nada fazem de errado se encolhem para não serem vistos. O que me lembra minha mãe, dizendo para evitarmos problemas com a polícia - eles estarão sempre no comando da razão -, alertava-nos, temerosa. Mais alguns metros e já ouço a menina do “Pão de Queijo” aos berros - Seis salgados por cinco Reais!. Entro no edifício, subo as escadas e apesar de ter saído da praça, percebo a praça não saiu dos meus pensamentos.

O Marco Zero

Use o QR-Code ao lado para ser encaminhado à área do aplicativo no Google Play

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atenção. Observo alguns transeuntes com olhar vidrado, como se nada enxergassem em meio àquela multidão, com tantos desiguais. Andam atabalhoadas, em estado letárgico, o corpo esguio e esquelético. Quase como num susto ou num rompante, sorriem. O sorriso banguela e alucinado. Sorriem sem causa, sem motivo, sem rumo e sem direção. Ao lado, a imponente Catedral Basílica Menor Nossa Senhora da Luz, a eterna Catedral da Tiradentes, abriga sacerdotes, freiras e beatas, rezando, cantando e pregando a palavra de Deus, a moral, os bons costumes e o amor incondicional ao próximo. Mas a quem se referem? Quem é este próximo a quem se referem? Está tão longe que seus olhos não podem alcançar. Passada a missa das 18 horas. “Vão em paz e que o Senhor vos acompanhe”. Fecham-se as portas, em uma divisão insana de mundos vizinhos tão distintos. Do outro lado da rua, os “vagabundos” já deitam em seus colchões e apelam “uma moeda pelo amor de Deus”. A marquise do banco serve de abrigo, enquanto a barriga ronca de fome.

O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Internacional Uninter Coordenadora do Curso de Jornalismo: Guilherme Carvalho Professor responsável: Alexsandro Ribeiro

Diagramação: Alunos - Larissa Oliveira; Aliana Machado; Gabriel Mafra e Thays Polhmann Projeto Gráfico: Cíntia Silva e Letícia Ferreira

Uninter - Campus Tiradentes Rua Saldanha Marinho 131, CEP 80410-150 |Centro- Curitiba PR E-mail - alexsandro.r@uninter.com Telefones 2102-3377 e 2102-3380.


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SEGURANÇA Foto: Internet

Brasil é o país que mais mata LGBT no mundo Mais de 860 travestis e transexuais foram assassinados nos últimos oito anos no país, que é responsável por quase metade das mortes registradas no mundo

Só no primeiro trimestre de 2017 o Brasil registrou o assassinato de 117 pessoas lésbicas, bissexuais, transexuais e gays (LGBT)

Sérgio Aparecido

Não confunda preconceito com discriminação: o preconceito é juízo pré-concebido evidenciado em uma atitude perante pessoas, crenças, sentimentos e tendências de comportamento. Já a discriminação acontece quando há um comportamento adverso perante uma característica específica e diferente. É aqui que presenciamos atos como racismo, homofobia, xenofobia e outros. Prova de discriminação é o que ocorreu em novembro do ano passado com o estudante de enfermagem Alex Júnior, de 17 anos. Ao voltar para casa, no Jardim Social, em Curitiba, o garoto foi abordado por homens que queriam “curá-lo” ao desconfiarem que ele era gay. O jovem, brutalmente espancado, foi encontrado desacordado em uma situação lamentável, com a cabeça deformada. A cena, infelizmente se repete mais do que imaginamos. De acordo com levantamento da ONG internacional Transgender

Europe (TGEU), só no primeiro trimestre de 2017 o Brasil registrou o assassinato de 117 pessoas lésbicas, bissexuais, transexuais e gays (LGBT). Os dados foram divulgados no Dia Internacional contra a Homofobia revelam que uma pessoa é morta a cada 25 horas devido à sua orientação sexual. Responsável por quase metades das mortes registradas no mundo, o país é o que mais mata transexuais. De acordo com o mesmo levantamento, nos últimos oito anos foram registradas 868 mortes de travestis e transexuais no Brasil. O número é três vezes maior que o total de mortes registradas no México, segundo colocado na lista, com 256 assassinatos. Nem o ambiente de trabalho está livre de discriminação. Foi no emprego que a jovem Noemi, de 19 anos, sentiu o peso da violência simbólica. No banheiro da empresa em que trabalha, deparou-se com a frase escrita na porta: sapatão que nojo. “Fiquei muito ofendida e me sentindo mal”, afirma Noemi, que revela ainda que foi orientada pela sua supervisora e não levar o caso adiante. Meses depois, Noemi se deparou

De acordo com levantamento da Transgender Europe (TGEU), só no primeiro trimestre de 2017 o Brasil registrou o assassinato de 117 lésbicas, bissexuais, transexuais e gays

com situação semelhante. Desta vez, o nome de outra funcionária estava escrito junto à frase. “Minha supervisora não ligou muito. Achou normal e disse para voltarmos ao trabalho”.

Na contramão, justiça libera psicólogos para promover “curagay”

As garantias de igualdade de direitos e de proteção da lei, previstas na Declaração Universal dos Direitos Humanos, não são desrespeitadas apenas no ambiente de trabalho ou nas ruas, mas também no próprio meio jurídico. Em setembro de 2017, por exemplo, a Vara Federal do Distrito Federal concedeu liminar

tornando legal a realização de “pseudoterapias de reversão sexual”, a chamada “cura gay”. O protesto nas ruas foi imediato. Um dos principais palcos de manifestação e de liberdade de expressão do país, a Avenida Paulista, foi tomada por manifestantes em defesa da causa LGBT. “É um absurdo criminalizar a população LGBT, falar que nossa orientação sexual ou nossa identidade de gênero é uma doença. Porque não é. E é um absurdo ter que protestar por causa disso em pleno 2017”, diz Victória Gonçalves, estudante de História e Ciências Sociais de 19 anos para o EL PAÍS. Contrário à decisão da justiça, o Conselho Federal de Psicologia re-

correu da decisão da Vara Cível. Nos últimos cinco anos, o Conselho já havia recebido três queixas contra profissionais que ofertavam tratamento para homossexualidade. Segundo o presidente do órgão, Rogério Giannini, uma psicóloga chegou a ter seu registro cassado por causa da prática. Desde 1999 o Conselho proíbe qualquer tipo de tratamento contra homossexualidade. Para o coordenador da Associação Paranaense da Parada da Diversidade (APPAD), Márcio Marins, não há cura para o que não é doença. “O que deve ser curado é o preconceito que está dentro das pessoas que não conseguem respeitar a orientação sexual e a identidade de gênero de outras”.

Número de transgêneros assassinados no mundo entre 2008/17

Dados: ONG internacional Transgender Europe (TGEU) - 2017 / Mapa: Marco Zero


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CIDADANIA

Protestos aos quatro cantos de Curitiba A cidade pulsa em movimentos sociais, manifestações e atos públicos, eventos de cunhos políticos e passeatas em busca de direitos. Veja quais os principais locais de manifestação na capital paranaense Douglas Miranda

Todos os anos Curitiba é palco de pelo menos cinco grandes manifestações de rua. O calendário de protestos inclui a Marcha das Vadias, Parada da Diversidade LGBT, Marcha do Orgulho Crespo e os atos sindicais do Sindicato dos Servidores de Curitiba (SISMAC) e pelo Sindicato dos Professores (APP-Sindicato). No cenário nacional, Curitiba não fica de fora do calendário de atos públicos. Exemplo disso é que

a capital paranaense reuniu milhares de pessoas às ruas nas manifestações de junho de 2013. “Não é só por vinte centavos”, bradavam uníssonos os manifestantes insatisfeitos com o aumento da tarifa de transporte público e com a política nacional. E não é recente a fama curitibana de palco de grandes manifestações. Ao menos dois exemplos históricos e de impacto nacional estão nos registros dos protestos na capital, ambos vinculados ao processo de redemocratização no país. Um deles aponta Curitiba como o início do movimento Diretas Já!, com a realização do primeiro grande co-

mício em janeiro de 1984, que daria início ao movimento que pressionou pelo fim da Ditadura Militar e Civil e a retomada das eleições diretas. O outro foi três anos depois, em 1987, com o Circo da Constituinte, que promoveu debates sobre a reforma da Constituição Cidadã.

de 1988, em que cerca de 150 professores que buscavam audiência com o então governador do Paraná, Álvaro Dias, para tratar sobre reivindicações trabalhistas, foram “recepcionados” pela cavalaria da Polícia Militar com cães e bombas de efeito moral.

A “boca” que protesta

A praça da Mulher Nua

Mas não é qualquer lugar da cidade que as vozes em busca de direitos se manifesta. O reduto de protestos, de atos públicos e manifestações na capital é a Boca Maldita. O espaço corresponde ao entorno da Rua XV de Novembro com a Praça Osório, no centro da cidade. O lugar é conhecido como espaço de livre opinião desde 13 de dezembro de 1956, quando frequentadores dos cafés e restaurantes da região fundaram a confraria dos Cavaleiros da Boca Maldita de Curitiba, onde o lema era “nada vejo, nada ouço, nada falo”.

Praça da cultura e de movimentos

Apesar de ser o principal espaço de manifestações, a Boca Maldita não é o único palco de protestos. A Marcha do Orgulho Crespo, evento anualmente realizado em novembro no centro da cidade, por exemplo, tem como ponto de concentração a Praça Santos Andrade. O espaço, que abriga o prédio histórico da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e fica em frente ao Teatro Guaíra, já teve outros nomes, como Largo Lobo de Moura e Largo Duque de Caxias. Outro grande evento realizado anualmente no espaço é dos professores da rede estadual de ensino, encabeçado pela APP Sindicato. Os profissionais da educação rememoram no local o fatídico 30 de agosto

Após a concentração na Santos Andrade, os professores partem em marcha em direção ao Centro Cívico, para manifestações em frente ao Palácio do Iguaçu. Neste percurso, o ato passa em frente a outro reduto de protestos, a Praça 19 de Dezembro, data de comemoração da emancipação política do Paraná. O espaço também é conhecido como Praça do Homem Nu, em razão da estátua levantada em comemoração ao centenário da emancipação, em 1953. De autoria do artista Erbo Stenzel, a obra representa o Paraná emancipado, independente, caminhando com as próprias pernas e sem medo do futuro. Outra escultura da praça é a Mulher Nua, de autoria de Humberto Cozzo, que permaneceu nos fundos do Palácio Iguaçu até a década de 70, foi trazida para a praça a fim de complementar o conjunto e representar a Justiça. Local escolhido pelo movimento Marcha das Vadias, que surgiu no Canadá em 2011, em reação ao comentário de um policial que afirmou que “as mulheres não deveriam se vestir como vadias se

não quisessem ser estupradas”. A pauta principal do movimento, em todo o mundo, é o enfrentamento à violência de gênero e principalmente à culpabilização das vítimas. Em Curitiba, a marcha acontece desde 2011. Nos dois primeiros anos, o local de reunião da manifestação foi o Passeio Público. No entanto, o aumento do número de participantes e o movimento de veículos na região dificultava bastante a concentração. Ao adotar a praça como ponto de encontro, de manifestações e performances públicas, a Marcha das Vadias deu novo nome ao local, conhecido agora como Praça da Mulher Nua pelos movimentos sociais. Fora da área central, outro ponto de manifestação é a Praça Nossa Senhora da Salette, no Bairro Centro Cívico, espaço que reúne os prédios dos principais poderes estaduais, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. O nome atual do bairro surgiu durante os anos 1940, quando o urbanista francês Alfred Agache, dentro de suas propostas para o novo Plano Urbano de Curitiba, propôs a criação do bairro. O Plano Agache concebia a área como “uma praça de características especiais, de edifícios destinados aos altos órgãos da administração Estadual, que além da função de centro de comando, pudesse bem denominar-se como a “sala de visita da cidade”, apresentando um conjunto de arquitetura especial em harmonia com o tratamento paisagístico da ampla praça central”.

Ao menos dois exemplos históricos e de impacto nacional colocam Curitiba como arena de grandes manifestações: o início das Diretas Já! e o Circo da Constituinte

Fotos: Wilson Dias / Agência Brasil

Chafariz em frente ao Palácio Iguaçu, no Centro Cívico, manchado de vermelho em protesto às cenas de violência contra professores no fatídico 29 de abril de 2015


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COMPORTAMENTO Foto: Divulgação

Os gestos da comunicação Como surdos e ouvintes vencem as dificuldades do aprendizado de “novas línguas” e buscam a inclusão pela oralização e Libras Patrícia Zeni

Todo sábado pela manhã, Jane Scepanski sai de casa para fazer o curso de Libras oferecido pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Ela tem 44 anos, é surda, mas ainda não sabe se comunicar pela língua de sinais. Desde criança, quando perdeu parte da audição, é oralizada, ou seja, consegue falar e também entender o que as outras pessoas dizem. “Falo normalmente porque não perdi totalmente a audição. Contudo, muitas vezes faço confusão com o que escuto. Nestes casos, quando me perguntam alguma coisa, acontece de eu responder totalmente diferente”, conta. Jane e outros surdos conseguem falar devido a técnicas aplicadas por fonoaudiólogos, para estimular a audição que restou. A fonoaudióloga Kyrlian Bortolozzi explica que quando a perda auditiva é leve e moderada, o trabalho de oralização é mais fácil, principalmente com o avanço da tecnologia, que permite o uso de aparelhos de amplificação sonora. “São diversos os modos que podem ser realizados junto a uma criança ou até mesmo um adulto surdo, porém todas têm em comum o trabalho com a estimulação da audição

Além de forte instrumento em terapias, a música conforta a alma e conecta as pessoas

também é um processo de aprendizado. Para a fonoaudióloga Kyrlian, a interpretação se dá pela somatória das manifestações de comunicação, ou seja, pela leitura dos lábios, pela oralidade e também pelos sinais. “É preciso que se fale pausadamente, com palavras simples, de forma bem articulada, para que a pessoa possa fazer a leitura dos lábios”, explica.

que resta, também um trabalho com leitura labial, uso de aparelhos auditivos, sonorização especial de ambientes e legendas”, explica. Já quando o grau de perda é severa ou profunda, os resquícios não estão presentes, impossibilitando de ouvir a voz humana. “Isso dificulta grandemente o processo de oralização”, diz. Para Germano Spelling, usar Libras para se comunicar nem sempre foi usual. Quando criança, relata Spelling, a língua de sinais não era reconhecida e, portanto, não existia a obrigatoriedade de acompanhamento em sala de aula de intérpretes. Após a oficialização no Paraná, em 2002, o cenário mudou. “Como naquele tempo não conhecia a Libras, primeiro aprendi a oralizar e escrever, mas era difícil entender o português, e tinha que explicar aos professores que precisavam olhar para mim, para ler os lábios, então tinha bastante dificuldade em escrever e entender a interpretação dos textos das disciplinas”, conta. O primeiro contato com Libras foi na faculdade, com 19 anos, quando precisou fazer estágio e começou um curso em colégio para surdos. “Tive um pouco de dificuldade no começo, mas depois fui aprofundando cada vez mais”, lembra. Hoje, aos 37 anos, Spelling é professor de Libras. O entendimento por leitura labial

Ouvintes também contribuem

Foto: Patrícia Zeni

No mesmo curso de Libras que Jane participa, também estudam ouvintes que estão interessados em aprender mais sobre a cultura surda. Entre eles está Leandro Nunes, que chegou a frequentar um curso básico quando adolescente. Hoje, com 37 anos, quer se aprofundar para poder falar com o sobrinho, que nasceu surdo. “Meu objetivo é poder me comunicar melhor com ele”, conta. Além disso, ele diz que pode contribuir para a comunidade surda em geral, tanto conversando quanto traduzindo. “Já fiz isso, auxiliei alguns a se comunicar com ouvinte”, completa. Para a jovem estudante de filosofia, Eli Prado, o objetivo em aprender Libras está em aplicar na sala de aula, desenvolvendo atividades inclusivas com pessoas surdas. “No futuro penso em atuar voluntariamente na comunicação com surdos em alguns lugares, seja para auxiliar em cursos de formação, para atuar como intérprete ou tradutor”, conta.

Causas da perda de audição

Expressão facial é muito utilizada na comunicação em Libras

A fonoaudióloga Kyrlian Bortolozzi explica que existem duas formas de deficiência auditiva. A primeira é adquirida pelo bebê durante a gestação, pode se dar pelo uso de medicamentos pela gestante e também ser hereditária, por exposição a radiações, problemas no parto, nascimento prematura ou após o tempo, o uso de fórceps para a retirada da criança, falta de oxigenação e até mesmo doenças, como sífilis e toxo-

plasmose. “Se uma gestante for contaminada por uma dessas doenças, a sequela também pode ser passada para o bebê”, explica. A segunda é adquirida com o passar do tempo, também por algumas doenças, como rubéola, toxoplasmose, sarampo, sífilis, herpes, diabetes, pressão alta e meningite. “A surdez não acomete somente crianças, podem ser de forma súbita ou gradual, em adultos. Existem causas como cera no ouvido em grande quantidade, presença de secreções no ouvido médio, objetos estranhos dentro do ouvido que podem levar a maiores lesões”, explica. Outra causa também é a exposição a longo tempo a ruídos acima de 85 decibéis. “Excesso de música alta, armas, foguetes, maquinas industriais, efeitos de medicamentos, como antibióticos, quimioterapia”, diz. Alguns fatores como tumor no ouvido, cérebro e doenças que impedem o osso do ouvido vibrar, deixando de passar o som. “Alguns casos são reversíveis e outros não, a maioria não tem reversão com relação a questão auditiva”, completa.

De aluno à interprete

Everton Murilo, 33, é interprete e tradutor de Libras. Começou a

ter contato com a língua em 2002, quando foi visitar o Salão de Reino das Testemunhas de Jeová, onde havia grupo de surdos e ouvintes que usavam a Língua de Sinais. “Aprendi Libras no processo de imersão, no contato com a comunidade surda. No começo achei que não conseguiria, mas com muita paciência meus novos amigos surdos me ensinaram”, conta. Foi num convite para interpretar aulas numa escola onde haviam cinco alunos surdos que ele decidiu se tornar Tradutor Intérprete de Língua de Sinais e Português Tilsp. O objetivo de ajudar os alunos não deu certo, pois precisaria de certificado para comprovar proficiência e também participar do projeto “Amigo da Escola”. “A partir dali estava certo que seria intérprete de Libras, estudei, me dediquei, fiz muitos trabalhos voluntários e consegui passar na banca pró-Libras, certificação de proficiência de Libras pela Universidade Federal”, explica. Atualmente Everton trabalha no Serviço de Inclusão e Atendimento aos Alunos com Necessidades Educacionais (Sianee) do Grupo Uninter, que garante inclusão de alunos com necessidades específicas dentro de sala de aula.

Como se comunicar com uma pessoa surda? O livro Aprenda Libras com eficiência e rapidez, escrito em Curitiba pelos surdos Éden Veloso e Valdeci Maia Filho, traz algumas dicas para ouvintes se comunicar corretamente com surdos: • Falar de frente, claramente e pausadamente. Uma boa articulação dos lábios facilita a comunicação • Não olhar para o outro lado ao conversar. O contanto visual é importante na comunicação • Não gesticular muito nem ter qualquer objeto na frente dos lábios, isso dificulta a leitura labial

• Ambiente claro e boa visibilidade são importantes para um bom entendimento • Falar com o tom de voz normal, não é preciso gritar • O surdo não pode perceber mudanças de tons ou emoções através da voz • Ser expressivo para demonstrar sentimentos • Se não entender o que uma pessoa surda está falando, não tenha vergonha em perguntar novamente, e não perca a paciência, se for preciso peça para escrever • Falar diretamente com a pessoa, não ao lado ou atrás dela • Manter sempre contanto visual na comunicação


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ESPECIAL Fotos: Daniel Castellano/SMCS

Lei que garante amparo às famílias em situação de vulnerabilidade está sem “efeito”desde que foi sancionada, em julho de 2015

Aprovado há três anos, aluguel social segue sem regulamentação em Curitiba

Moradores que estão em áreas de risco e vulnerabilidade estão entre o que podem ser beneficiados com o Programa de Aluguel Social (PAS)

Gabriel Mafra

Larissa Oliveira

Casada com Emerson e mãe de Marcos Felipe, de 12 anos, Evelen tinha uma casa própria no bairro Fazendinha em Curitiba. Recebeu uma proposta para trocar o imóvel por um melhor na região metropolitana da capital. Um tempo depois da assinatura de escritura, descobriu que foi vítima de estelionato. Todos os documentos eram falsos. Um segundo golpe veio depois. Despejada, Evelin teve que recorrer a uma casa com cerca de 8 m², sem luz e sem água encanada, na ocupação 29 de Março, na Cidade Industrial. Aos poucos, Evelen foi reconstruindo a vida, comprando móveis e ampliando a casa. No entanto, mais uma vez provaria a dor do

lojadas aquelas que deixam suas residências, entretanto não necessitam ser deslocadas para abrigos públicos. Já os desabrigados, segundo a Defesa Civil, são aquelas pessoas que permanecem em abrigos públicos necessitando de ações do poder público para sua subsistência. É justamente em momentos de desastres e catástrofes que os cidadãos precisam do amparo do poder público, sobretudo em situações de vulnerabilidade que atinge toda a família com a perda de um lar ou na exposição a riscos em moradias em encostas ou em condições insalubres. Casos como este se repetem anualmente. Em 2017, segundo a Defesa Civil, ao menos treze desastres atingiram a capital paranaense. Em todo o estado, catástrofes como

Há três anos, famílias em situação de vulnerabilidade, desabrigados por motivos de catástrofes ou ainda com moradia em local de risco estão com direitos previstos na lei do Aluguel Social

vendavais, alagamentos e deslizamentos deixaram 442 desabrigados e 2,7 mil desalojados. O que poucos sabem, é que existe uma previsão legal que dá amparo às famílias nestas condições. No entanto, o direito não foi regulamentado ainda pela prefeitura. Trata-se do

Programa Aluguel Social (PAS), lei aprovada há três anos pela Câmara Municipal de Curitiba, motivada pelo projeto de lei do ex-vereador Jorge Bernardi (Rede), e sancionada pelo então prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT). A lei propõe beneficiar famíFotos: CAU-PR

Aliana Machado

desabrigo. Desta vez, vítima de uma catástrofe natural. Em um dia em que ninguém estava em casa, uma tempestade derrubou uma árvore que caiu na pequena casa, danificando o imóvel e estragando móveis e eletrodomésticos. A história da jovem batalhadora, que carente de uma moradia digna e de um auxílio em momentos de catástrofes se viu desamparada do poder público, foi registrada pela ONG Teto ao jornal Marco Zero. E não é única. Dois dias de chuva em março passado atingiram cerca de 1,5 mil pessoas na capital paranaense. De acordo com dados da Defesa Civil Municipal de Curitiba, foram 300 casas danificadas, deixando aproximadamente 200 pessoas desalojadas e quinze desabrigados. Consideram-se pessoas desa-

Benefício deve vir com amparo social, aponta a arquiteta Laura Bertol


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Fotos: Mobiliza Curitiba

Projeto deve integrar a política habitacional, aponta Alexandre Pedroso

mesmo tempo que auxilia a demanda por moradia popular em Curitiba. Tais preocupações estão estabelecidas na lei do aluguel social, sobretudo na medida em que propõe um limite para o benefício. Ou seja, com isso, fica claro que o benefício não é uma medida meramente assistencialista permanente. O Aluguel Social surgiu como uma maneira de auxiliar as pessoas até que estas conseguissem ter condições financeiras de não precisar fazer uso do benefício. Além disso, Bertol afirma que essa lei não concorria com o programa “Minha casa, minha vida” do governo federal, pois os objetivos dos projetos são diferentes. “Muitas vezes o ‘Minha casa, minha vida’ compromete a renda do beneficiário, não só com a parcela do financiamento, mas também com os custos da moradia, em alguns casos as pessoas perdem o emprego pois os conjuntos são distantes, e às vezes os patrões não querem mais pagar o vale transporte”. Para Alexandre Pedroso, urbanista da Frente Mobiliza Curitiba, o problema não é a falta da lei em si, e sim de “um programa organizado, porque o PAS tem que ser enxergado como parte de uma po-

O PAS tem que ser enxergado como parte de uma política organizacional. Está associado ao atendimento de famílias em situação de risco

Um benefício provisório com foco na moradia própria

Promover o amparo social, ao

lítica organizacional. O PAS está muito associado a atender famílias em situação de risco, você tira de alguma situação emergencial e leva para ter esse tempo de cuidado. Para ter a garantia de espaço digno para essas famílias”, aponta Pedroso. O que não acontece atualmente pois apesar de ser aprovada, a lei ainda não foi aplicada. Pedroso ainda afirma que “são 400 áreas na cidade que têm alguma precariedade, alguma necessidade habitacional, alguma urgência de habitação” e por não ter recursos próprios para este tipo de política, nos últimos anos, Curitiba, fica à mercê de transferências do governo federal para ter programas de impacto. “Você já tem normas federais que garantem que o recurso tenha que ser utilizado para a habitação, que é uma prioridade, é um direito social na constituição, mas hoje Curitiba gasta mais com propaganda do que com política habitacional”, afirma o urbanista. O urbanista diz que o PAS pode ser pensado não apenas como um programa que atende a vulnerabilidade social e risco físico. “Ele poderia ser parte de uma política para atender parte da população que não é atendida pelo mercado”, argumenta Pedroso. O principal fator para a não implantação da lei é a falta de recursos. “O que o munícipio alega, sobre a regulamentação dessa lei, e a possibilidade de utilização da bolsa aluguel é de que não existe dotação orçamentária para isso, eles não têm recurso, para implementar o programa”, assegura Laura Bertol. O município não informa a respeito do futuro da lei, tornando o destino da norma incerto. “Não informam se vão ou não regulamentar. Ora eles dizem que vão revogar a lei para fazer uma nova, ora falam que vão regulamentar por este decreto”, declara a arquiteta”, declara a arquiteta. Pedroso tem um juízo firme quanto a questão de regulamentação do PAS. “Nosso problema habitacional é pela falta de execução uma política pública organizada. Se hoje a gente não tem aluguel social é porque a prefeitura não quer que tenha, por algum motivo ela não está colocando” opina Pedroso.

nicípio de Curitiba e estabelece a concessão de benefício financeiro mensal para cobertura de despesas com moradia de famílias de baixa renda, na forma que especifica”. Contudo, faltou justamente especificar os valores e demais questões para a aplicabilidade da lei. Ou seja, faltou completar o que é determinado no artigo sétimo da mesma lei, de que o “Poder Executivo Municipal regulamentará a presente lei por decreto, fixando os critérios de concessão do benefício, seu valor e as condições de permanência do beneficiário no programa”. Com isso, passado três anos da sanção da lei, na prática, ninguém foi beneficiado por ela. De acordo com a prefeitura, tanto a Companhia de Habitação de Curitiba (Cohab) quanto a Fundação de Ação Social (Fas) são os órgãos que respondem por casos que possam ser amparados pela lei. Contudo, ainda estão sem base legal para atuar. Questionada sobre a aplicação da lei do aluguel social, a prefeitura, via Lei de Acesso à Informação (LAI), responde apenas que “se encontra

em estudo a regulamentação da lei em questão, e quando for publicada, será disponibilizada no sitio da Prefeitura Municipal de Curitiba”. Segundo o advogado Guilherme Bednarczuk, para que uma lei seja eficaz, deve haver a regulamentação dela, cuja indicação da necessidade geralmente é apontada em um item ou cláusula dentro da própria lei. “Via de regra, esta regulamentação é determinada por decreto. Neste caso, determinado pelo chefe do executivo municipal, ou seja, o prefeito. Na prática, o efeito dela é meramente a existência. Ou seja, não produz um outro efeito. É o que chamam de norma de eficácia limitada, uma vez que precisa de outro instrumento jurídico para a operacionalizar. A lei tem validade, existe, mas não é eficaz”. De acordo com Bednarczuk, a regulamentação da lei pode até ser invocada por um cidadão. Para isso, deve-se entrar na justiça com “mandado de injunção”, dispositivo previsto na Constituição Federal criado para atuar “sempre que a falta de nor-

“Você já tem normas federais que garantem que o recurso tenha que ser utilizado para a habitação, que é uma prioridade, é um direito social na constituição, mas hoje Curitiba gasta mais com propaganda do que com política habitacional”

Fotos: Alexsandro Ribeiro

lias que não possuem casa própria, ou estão em situação habitacional de emergência, além de pessoas vulneráveis. De acordo com o texto da lei, o auxílio é temporário, e tem valor mensal máximo de um salário mínimo regional, podendo ser concedido pelo prazo de até 24 meses. A lei estabelece que para ter acesso a esse benefício a família deve residir em Curitiba há pelo menos um ano. Segundo Laura Bertol, arquiteta e urbanista do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça (CAOP) e de Proteção ao Meio Ambiente e de Habitação e Urbanismo, um dos motivos que a levou trabalhar com o PAS, foi a quantidade de pessoas em condições precárias de moradia. A população alegava que não existia uma política pública voltada para indivíduos que moravam em áreas de risco. Buscando solucionar essa questão foi montado um grupo de trabalho para discutir a habitação principalmente para esse grupo, e após muitas discussões surgiu a ideia da locação social.

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Uma lei a espera de regulamentação

Ao ser publicada no Diário Oficial da cidade em 28 de julho de 2015, a lei do aluguel social determinou a autorização para que a prefeitura definisse critérios, “diretrizes e procedimentos para o programa de aluguel social no mu-

Lei sem regulamentação não é eficaz, afirma Guilherme Bednarczuk


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Fotos: Divulgação

O que determina a lei que implanta o Programa do Alguel Social (PAS)? LEI Nº 14.700, DE 28 DE JULHO DE 2015 A CÂMARA MUNICIPAL DE CURITIBA, CAPITAL DO ESTADO DO PARANÁ, aprovou e eu, Prefeito Municipal, sanciono a seguinte lei: Art. 1º Fica autorizado o Poder Executivo Municipal, a implantar o Programa Aluguel Social (PAS), destinado à concessão de benefício financeiro mensal para pagamento de aluguel de imóveis de terceiros, em favor de famílias na situação habitacional de emergência e de baixa renda, as quais residam há mais de 01(um) ano em Curitiba, e não possuam imóvel próprio, no Município, ou fora dele. Art. 2º Terão direito ao benefício do Programa descrito no caput, até o reassentamento definitivo, famílias de baixa renda, que se encontrem em situação de vulnerabilidade habitacional temporária, desde que estejam: I - morando em áreas destinadas a execução de obras de infraestrutura necessárias ao desenvolvimento municipal;

Lei tem efeito “autoaplicável”pela Prefeitura, defende Bernardi

ma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. Para o advogado, ao ingressar com o mandado deve-se indicar a lei, a data da sanção e apontar a necessidade desta regulamentação, pedindo para que o judiciário reconheça a aplicabilidade da lei. “Via de regra, situações como esta chegam ao Supremo Tribunal Federal (STF), pela característica da solicitação, como mandado de segurança, habeas corpus, dentre outros”. Bednarczuk alerta, porém, que não é tão simples o processo, uma vez que existe a separação dos poderes. “Existe um princípio no direito que se chama freio e contra-peso, que determina que não se pode obrigar um órgão que não tenha competência a interferir no outro, ou seja, isto é fundamental para que um dos poderes não tenha o poder absoluto e haja uma harmonia entre eles. Quando há o reconhecimento, por exemplo, pelo STF da regulamentação da lei, ele vai enviar esta sentença para o poder legislativo, informando sobre a regulamentação

da lei. Mas não tem um poder de determinar a regulamentação, mas sim de orientar apenas. Desta forma, o legislativo receberia esta orientação do STF e encaminharia para que o executivo, que é quem tem competência para regulamentar a lei, o chefe do poder executivo”. A medida resguarda não apenas a segurança dos poderes, mas também garante que um órgão não onere outro. O problema é que sem a regulamentação, a lei fica sem efeito prático, e não existe uma regra que force a prefeitura a realizar tal adequação em um determinado tempo. “A lei pode ficar anos sem regulamentação e não existe regras, ou seja, não existe um tempo para invalidar ou determinar a regulamentação dela. Acaba que ela existe, mas na prática não tem eficácia”, afirma Bednarczuk.

Mesmo sem a regulamentação, o direito é um avanço, aponta criador da lei

De acordo com o ex-vereador e autor da lei, Jorge Bernardi, a

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legislação proposta para a capital foi baseada na lei aplicada em outros estados. “A lei do Aluguel Social apresentei à Câmara Municipal aqui em Curitiba e tem a sua origem em outras cidades que já aplicam este instituto para famílias que sofrem de desastres naturais, que ficaram desabrigadas por conta de incêndio e demais famílias em situação de risco”. Primeira lei sobre o tema aprovada no estado, a lei que determina o Programa do Aluguel Social (PAS), segundo Bernardi, mesmo que ainda não tenha sido regulamentada, é “autoaplicável” no município. “Neste sentido, então, o município por meio da Cohab pode aplicar o benefício para famílias que sofrem tragédias, com moradias atingidas por deslizamentos ou ainda em casas em áreas de risco como junto aos rios ou ainda em casos de desmoronamento de prédios. Felizmente isto não ocorreu em Curitiba, mas a lei atende casos como o que ocorreu com prédio que pegou fogo e desmoronou no Largo do Paissandu, no Centro de São Paulo”, conclui o ex-vereador.

II - em situação de emergência decorrente de calamidade pública, com a moradia destruída ou interditada, consequência de deslizamento, inundação, incêndio, insalubridade habitacional ou outras condições que impeçam a utilização segura da habitação; III - vivendo em locais de risco, assim apontado pela Defesa Civil; IV - em situação de despejo; V - cadastradas, há mais de 01 (um) ano, em programas de reassentamento que habitam em situação precárias, em locais de alagamentos, deslizamentos e outras situações de risco. Art. 3º O aluguel social será concedido pelo prazo de até 24 (vinte e quatro) meses, para uma mesma família, sendo destinado a todos os trabalhadores, inclusive os de natureza informal. Parágrafo único. O prazo disposto no caput desse artigo poderá ser prorrogado nos casos estabelecidos em regulamento. Art. 4º O recebimento do

aluguel social não exclui o direito de recebimento de outros benefícios sociais oriundos de qualquer outra política pública assistencial desenvolvida nos demais níveis de poder. Art. 5º É vedada a concessão do aluguel social a mais de um membro da mesma família. Parágrafo único. A fraude no recebimento do aluguel social ensejará o cancelamento imediato do beneficio, sem prejuízo de outras ações cíveis e criminais cabíveis a espécie. Art. 6º As despesas decorrentes da implantação desta lei correrão por conta das despesas orçamentárias próprias, suplementadas se necessário. Art. 7º O Poder Executivo Municipal regulamentará a presente lei por decreto, fixando os critérios de concessão do benefício, seu valor e as condições de permanência do beneficiário no programa. Art. 8º Esta lei entrará em vigor 120 (cento e vinte) dias após a sua publicação. PALÁCIO 29 DE MARÇO


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CULTURA

O quanto cabe em um clipe? O rapper americano Ghildish Gambino mostra no single This Is América que em poucas cenas é possível reunir uma infinidade de referências históricas, apelos sociais, denúncias de racismo e críticas ao consumismo Neste momento do clipe ele faz referência a Tio Ruckus, um personagem de história em quadrinho que acredita ser branco, além disso, Ruckus possuía tendências racistas.

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A música começa com uma melodia leve, mas logo somos surpreendidos por um rap denso e sombrio. A pose peculiar que Glover assume para executar este homem negro é uma referência a Jim Crow, um personagem criado pelo ator branco Thomas Dartmouth, para espetáculos de blackface, onde Thomas interpretava um escravo negro, assim Thomas depreciava a cultura negra cantando e dançando com seu rosto pintado.

Por fim, percebe-se clara referência no clip a Richard Pryor, comediante que usou os textos humorísticos para combater o racismo, servindo de inspiração para diversas pessoas.

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Neste trecho há uma alusão ao Massacre de Charleston. Dyllan Roof, um jovem branco de 22 anos, assassinou nove negros em uma igreja. Ele não admitiu o motivo do crime, mas acredita-se que seja por racismo. O jovem o foi condenado a pena de morte.

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A arte no clip foi usada em forma de protesto. Childish Gambino é o alter ego de Donald Glover, um artista norte americano talentoso e ácido em suas produções. Porém, o foco da análise é a simbologia e as metáforas usadas por Glover em “This is America”.

Larissa Oliveira Foto: divulgação

Isso é só a AMÉRICA?

Se você não estava em uma bolha ou em outro planeta, certamente viu o clipe de “This is America” (Isso é a América). O vídeo traz algumas referências e nos faz interpretá-lo de diversas formas, mas você entende que tanto o clipe quanto a música são críticas a sociedade.


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COMPORTAMENTO Foto: Internet

25 anos de Super Nintendo no Brasil O Snes é um dos mais populares consoles de videogame e fez a cabeça de gerações de gamers no mundo todo

Jorge Júnior

SNES, Super Nintendo, Super NES, independente de como você se recorda ou como chamava (ou ainda chama), o console mais querido e conhecido da empresa nipônica de jogos e videogames, a Nintendo, faz bodas de prata no Brasil neste ano, marcando uma geração de gamers tanto no Brasil quanto no mundo todo. Antes de aterrissar aqui no país pelas mãos da Playtronic, empresa responsável pela distribuição dos produtos da Nintendo nas terras tupiniquins, o console já havia sido lançado primeiramente no Japão em 1990, e em 1991 nos Estados Unidos. O Snes foi a resposta da Nintendo para uma nova geração de consoles “16-bit”, na qual empresas concorrentes como a famosa Sega já havia dado sua cartada com o Mega Drive. A Nintendo não podia deixar a concorrência tomar conta e lançou em novembro de 1990 o então “Super Famicom”,com é conhecido o Sper Nintendo no Japão. No Brasil o console chega em outubro de 1993. Vendedor da extinta Disapel, loja varegista em Curitiba, Adelcio Cruz lembra que o Super Nintendo foi um fenômeno de vendas. “Estourou no comércio. Tinha outros videogames, mas a recepção no momento em que lançaram o Super Nintendo foi muito boa! As lojas as vezes tinham pilhas de consoles”. Foi graças a essa vendagem alta

que Adelcio ganhou seu primeiro SNES. “Fizeram uma promoção na loja, e vendia tanto que não foi difícil ganhar a promoção, eu vendi muito Super Nintendo e acabei ganhando um”. O console da empresa japonesa marcou a juventude de Adélcio, acompanhando-o até o início da vida adulta. “Eu jogava muito esse videogame em casa, mas foi na época que eu casei, e a mulher não gostava muito não, até porque eu ficava muitas vezes até de madrugada jogando” conta aos risos nostálgicos de quem viveu uma das épocas de ouro da Nintendo. Tamanho foi o sucesso que o console fez que antes de chegar no Brasil, inúmeros gamers ostentava o novo equipamento, importado de terras “gringas”, como do nosso país vizinho, o Paraguai. É o caso do Jefferson Voight, que ganhou de presente em 1992, um ano antes do lançamento no Brasil. “Foi o melhor presente de natal que já ganhei, o meu videogame favorito até hoje: Super Nintendo”. Jefferson foi iniciado no mundo dos games com o Atari, quando tinha quatro anos. Depois passou para o Nintendinho, versão antetior do Super. Contudo, afirma que nenhum outro console marcou tanto sua vida quanto o SNES. “Nessa época todos os meus amigos começaram a comprar o vídeogame, então toda festinha de aniversário era jogatina. Galera emprestava as fitas ou ia alugar e ficava o dia inteiro jogando”. ] Hoje Jefferson gosta de colecionar jogos, consoles e acessó-

rios, e não tem dúvidas que o Super Nintendo teve um papel muito importante em toda a indústria game. “O fato é que a Nintendo trouxe na década de 90, um videogame com uma biblioteca de jogos que revolucionou e influenciou muita coisa que veio depois e que ainda é feito hoje”, afirma. Mas e nos dias de hoje? Juan Marchiori, empresário no ramo de videogames antigos, afirma que chama a atenção, e muito. “Nos meus eventos, não falta SNES. Uma criança de nove anos pega o Super Nintendo, joga Mario e pensa que o jogo é atual”. Juan não entrou na onda do Super Nintendo só por trabalhar no ramo. Sua paixão vem desde 1995, quando conheceu o console na casa de um amigo. Depois da primeira experiência jogando Mortal Kombat 2, não parou mais de ir na casa desse amigo. Demorou alguns anos para ter seu próprio SNES. Hoje, tem oito aparelhos. “Tenho um apreço muito grande, sou apaixonado por ele”. Esses são relatos de três pessoas que viveram a época de lançamento do Super Nintendo, mas se dependesse da quantidade de consoles vendidos mundialmente, poderíamos ter mais de 40 milhões de relatos. Não é à toa que esse console é considerado um dos mais importantes na comunidade gamer, com uma biblioteca memorável de jogos com personagens como Mario, Link, Samus, Kirby e Fox. Tais personagens estão na memória até hoje da maioria dos gamers que puderam conhecer o console.

Cinco dos jogos mais vendidos do Snes A característica mais comum do Super Nintendo entre os gamers com certeza é a sua biblioteca de jogos, que conta com vários sucessos de peso, tanto em popularidade quanto em crítica, sendo considerada uma das melhores bibliotecas entre os videogames já existentes. Super Mario World – Um dos jogos de lançamento do SNES. Nessa aventura você pode voar graças ao poder da “peninha”, sair planando como um balão e montar no seu companheiro Yoshi, dinossaurinho que Mario encontra aprisionado e o liberta no começo do jogo. Street Fighter II:The World Warriors – Famoso jogo de luta da empresa Capcom, onde os lutadores devem derrotar o poderoso Mr. Bison. O jogo foi trazido dos fliperamas para o Super Nintendo, sendo esse uma das melhores conversões para consoles caseiros. Super Mario All-stars – Esta é uma coletânea de três jogos do encanador bigodudo, o Mário, lançados para Snes, mas com melhoria gráfica. A coletânea conta também com o jogo Super Mario Bros: The lost levels, versão do segundo jogo do Mario que foi lançado somente no Japão. Donkey Kong Country – Um dos aspectos mais chamativos no jogo foram os seus gráficos que se assemelhavam muito ao mundo real. O jogo contou com mais duas continuações, todas de grande sucesso, sempre apresentando novos personagens, inimigos e diferenças na jogabilidade. Super Mario Kart – A estreia do Mario e sua turma em um dos jogos mais competitivos e viciantes. O diferencial desse jogo de corrida é que você pode atrapalhar os adversários jogando itens que coleta no percurso, como cascas de banana e cascos de tartaruga.


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TECNOLOGIA

@TÁ NA WEB Aliana Machado

Especial

Tecnologia e jornalismo

texto o d m é l a a lísmo par

Um jorna

O Jornalismo Multimídia tem dentre suas características a multiplicidade de narrativas. A história é contada por meio de vários recursos digitais, que ampliam a dimensão da compreensão do leitor. Apesar de se assemelhar ao jornalismo digital, ele tem situações e conteúdos distintos. O multimídia vai dispor de várias plataformas dentro de um único conteúdo, pois além do texto, inclui áu-

dio, vídeo, fotos, mapas, etc. Uma das principais reportagens em formato multimídia surgiu em 2012 e foi realizada pela New York Times, com o título “Snow Fall: the avalanche at Tunnel Creek”, por John Branch. A matéria aborda catástrofes relacionadas as avalanches que aconteceram no Tunnel Creek, com personagens, suas histórias, dados do local, vídeos, fotos e mapas. Usando detalhes que prendem e fazem com que o internauta se sinta dentro da história

Use o QR-Code para conferir a reportagem

Um jornalismo m

ultimídia naciona

Use o QR-Code para conferir a reportagem

ícia t o n a d o r Você dent A realidade virtual (VR, em inglês) tem se tornado mais presente dentro do jornalismo. Por meio dela é possível passar por experiências que não são comuns de se acessar no cotidiano. A VR está se introduzindo cada vez mais no meio jornalístico pois ela incrementa de um jeito exclusivo e original a matéria.

The Guardian produziu sua primeira realidade virtual em 2016, com um tema perturbador: a experiência de estar numa cela de prisão em confinamento solitário nos EUA No Brasil, a Folha de S. Paulo publicou em 2017 um aplicativo que mostra, em 360º a Antártida. No final dessa matéria, a Folha ensina o internauta a visualizar os vídeos tanto com o celular, quanto com os óculos.

No Brasil, uma das principais matérias multimídia foi lançada em 2013 pela Folha de S. Paulo com o tema “A batalha de Belo Monte”. No decorrer dessa reportagem completa, foi possível observar todas as dificuldades durante a construção da hidrelétrica, os infortúnios relacionados aos rios do local, a preocupação com o meio ambiente e até mesmo o caos na infraestrutura nas pequenas cidades próximas da

The Guardian

Folha de S.paulo

Matérias em VR e 360º

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construção: lixo, inundação e esgoto e no dia de pagamento – a relação dos operários com os bares, brigas e prostituição. Por meio de infográficos, dados, slide show, vídeos, histórias, depoimentos de pessoas que trabalharam e moram no local é possível se envolver no drama e história daquele momento e daquela região


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ENSAIO FOTOGRÁFICO

Make yourself Fotos: Bruna Carolina

Construção e reconstrução da identidade. A projeção da imagem, a montagem das peças, a união das cores e das linhas que definem como nós nos vemos, como os outros podem nos ver. Confira no ensaio da aluna de Publicidade e Propaganda da Uninter, Bruna Carolina, o poema da “montagem” e a metamorfose Drag.

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