Sabrina Fernandes
1
ANO X- NÚMERO 65 – CURITIBA, DEZEMBRO DE 2019
LEIA NESTA EDIÇÃO João Inglês, o pirata que escondeu um tesouro e morou em Curitiba - Página 3 Série sobre a Ditadura: os 35 anos da campanha pela Diretas Já! - Página 8 Falta de saneamento aumenta mortes por infecção intestinal - Página 9
Com preconceito não tem jogo Aumento do número de casos de homofobia, racismo e machismo no futebol dentro e fora de campo acende um alerta sobre a intolerância e o preconceito no esporte
Conteúdo exclusivo
Jornal Laboratório - Curso de jornalismo do Centro Uninter
2
Opinião
MARCO
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019 Mariana Becker
Ao Leitor
Mariana
BECKER
Troquei pontos com o destino, e quando me dei conta mais uma vez estava nas quadras, porém agora como jornalista
S
empre fui muito competitiva quando criança. Sendo a do meio de três filhos, vivia ao redor das pernas de meu pai, e isso valeu a pena. O caminho foi ensinado cedo. Meu pai foi atleta de voleibol, e o amor pelo esporte passou de geração para geração. Quando adolescente, também competi. Até podia ter alçado voos maiores, mas os percalços da vida e as portas abertas para quem realmente treina em alto nível me jogaram para as boas risadas e as bolas cortadas erradas nas famosas reuniões de voleibol em família nos fins de semana. Troquei pontos com o destino, e quando me dei conta mais uma vez estava nas quadras, porém agora como jornalista. A sede por competição sempre me fez ouvir o trinar do apito de um árbitro e nunca deixei de sentir aquele gostinho de ‘quero mais’. Nesse ano tive a primeira oportunidade de cobrir um
evento de alto nível do esporte que joguei durante toda a minha vida. Acompanhar o Curitiba Vôlei foi o primeiro de muitos fundamentos que ainda preciso aperfeiçoar
Use o QR-Code ao lado para ser encaminhado à área do aplicativo no Google Play
J
Passo 2 da Realidade Aumentada, uma tecnologia que permite a interação entre elementos reais e virtuais. Para entrar nesta viagem, é fácil e rápido. Siga as instruções e participe da experiência da notícia interativa. Nesta primeira versão, o recurso pelo aplicativo do Marco Zero está disponível apenas para aparelhos com sistema operacional Android.
o gostinho de ‘quero mais’ ficou em cima de minha escrivaninha junto com as canetas o quase inseparável bloquinho de anotações. Final de ano tem mais. Obrigado, voleibol.
Por vezes quando dei por mim eu estava levantando, defendendo ou até gritando junto com a torcida
Passo 1
á pensou em assistir a uma entrevista nas páginas de um jornal impresso, em vídeo? Ou quem sabe conferir um mapa em terceira dimensão, ou ainda interagir com elementos gráficos que saem das páginas? O que há poucos anos seria um sonho, agora é possível e está nas suas mãos. Isso mesmo! Venha com o Marco Zero na onda
para desta vez chegar onde quero, mas valeu a pena, e muito...Por vezes quando dei por mim eu estava levantando, defendendo ou até gritando junto com a torcida. Desta vez
Confira se o seu celular e a versão do seu Android são compatíveis. Depois, clique em instalar.
Passo 3 Com o APP aberto, aponte a câmera do seu celular para a página do MZ quando tiver a imagem ao lado
EXPEDIENTE
Boa leitura!
Os tie-breaks da vida
Mariana Becker
A multidão de corações que o futebol, paixão nacional, afeta não tem tamanho. Desde a mais tenra idade o brasileiro aprende, quer seja no seio familiar, quer seja na mídia, a se familiarizar com o esporte. Mas e quando o espaço de diversão e socialização está dominado por uma cultura abusiva e preconceituosa? Nesta edição do Jornal Marco Zero vamos abordar um tema sensível, que é o preconceito dentro e fora de campo de um dos principais esportes nacionais: o futebol. Casos de racismo, machismo, homofobia e transfobia são dezenas e vem ampliando o número ao longo dos anos. Entidades de representação social, movimentos identitários, jogadores e jogadoras, juízes e torcedores se unem contra o abuso e o preconceito no esporte. Ainda nesta edição, publicamos a segunda matéria da série sobre repressão na época da ditadura. Desta vez, o tema é Diretas Já!, uma das maiores manifestações populares brasileira na busca pela retomada do voto direto e pela redemocratização no país. Na década de 1980, logo após a saída dos militares do poder, milhares de cidadãos foram às ruas clamando pela participação política e pelo direito de escolher o rumo do próprio país. Curitiba foi o berço do movimento, abrigando a primeira grande manifestação, reunindo milhares na Boca Maldita. Depois disso, o movimento ganhou as principais cidades do Brasil, pressionando pela participação da população no pleito eleitoral. Também nesta edição, veja o curioso caso do pirata Zulmiro, que deixou os mares para se esconder em terras curitibanas após um grande saque e esconder um milionário tesouro na Ilha da Trindade, no Espirito Santo.
O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Internacional Uninter
Coordenador do Curso: Guilherme Carvalho Professor responsável: Alexsandro Ribeiro Diagramação: Equipe Marco Zero Projeto Gráfico: Equipe Marco Zero Uninter - Campus Tiradentes Rua Saldanha Marinho 131, CEP 80410-150 |Centro- Curitiba PR E-mail - alexsandro.r@uninter.com Telefones 2102-3377 e 2102-3380.
N.º 65 – Dezembro de 2019
MARCO
Cultura
ZERO
3 Divulgação
João, o pirata de Curitiba
A documentada história de um pirata que pilhou um tesouro de valor inimaginável, escondeu em uma ilha no Brasil, e desembarcou em uma cidade a 110 quilômetros do mar
A Ilha da Trindade, na costa do estado de Espirito Santo, abrigaria um dos maiores tesouros piratas
U
m pirata, um tesouro e muita história na terra das araucárias. Esse é o enredo que gira entorno do ex-tenente da Marinha Britânica, Francis Hodder Cork, que trocou os navios da realeza para enfrentar os mares sob a alcunha de Pirata Zulmiro. Tudo o que envolve o pirata é misterioso, inclusive o fato de ter escolhido uma cidade a 110 quilômetros da mais próxima praia e a quase mil metros de altitude acima do nível do mar para viver alguns anos de sua aventureira vida. Mas há quem diga que sua história é a mais pura verdade. Um deles é o economista Marcos Juliano Ofenbock, que resolveu se aprofundar na pesquisa para conhecer a verdade sobre o tal pirata de Curitiba que ele havia ouvido falar. E, segundo ele, não é lenda. Mas Ofenbock não ficou apenas nas conversas e histórias orais, e pesquisou em documentos e reportagens em jornais toda pista que pudesse provar a existência do pirata. Uma
das principais evidências, segundo ele, foi encontrada no livro de registros do Cemitério Municipal São Francisco de Paula. Lá ele encontrou um sepultamento datado de 24 de julho de 1889 de um homem chamado João Francisco Inglez, nome esse que Zulmiro adotou em Curitiba. Natural de Cork, Irlanda, Zulmiro era de família rica e privilegiada. Estudou em um renomado colégio para garotos do Reino Unido, o Etton College, fundado por Henrique VI em 1440. Ofenbock conta que este também é um fato comprovado por meio de documentação conseguida, desta vez, através da escola inglesa. “O Francis Hodder quando estava em Curitiba, em 1879, estava com 81 anos. E aí fui atrás de arquivos para identificar isso. A Etton era um internato que se entrava aos 13 anos. Fazendo os cálculos da idade de Francis, ele teria nascido em 1798, e consequentemente entraria em 1811. E nos arquivos que consegui da escola, consta o nome dele, único aluno
vindo de Cork”, conta o economista. Após se formar, entrou para a Marinha Britânica e durante uma viagem matou um oficial e acabou fugindo para não ser condenado pela Corte Marcial à pena de morte.
Foram nove dias de caminhada do litoral até a capital paranaense. Em Curitiba, já com o nome trocado para João Francisco Inglez, Zulmiro se instalou no bairro Pilarzinho, em 1838
GUSTAVO
Conteúdo exclusivo
ria agora pode alcançar a tela da TV. Isso porque Ofenbock afirma que um canal de rede fechada está negociando os direitos de reprodução. “Estamos negociando. Um desses serviços de streaming estão interessados em querer comprar os direitos do livro que escrevi com a história do pirata para fazer um filme”. Confiante da existência do tesouro, Ofenbock quer partir para outra pesquisa agora, a exploratória. O objetivo é seguir em uma expedição para encontrar o tesouro deixado na Ilha de Trindade e, para isso, planeja fazer todo um projeto com a Marinha Brasileira e Britânica para chegar lá e realizar as escavações necessárias. Cido Marques
Hemeroteca BN
Recorte da edição do jornal A República, de 1913
A partir daí, tornou-se pirata e fez amizade com o russo Zarolho e o espanhol José Pancho. Em 1821, o trio roubou uma grande quantidade de joias, moedas de ouro e outros bens da Catedral de Lima, no Peru. Para não serem descobertos com os itens roubados, esconderam o tesouro na Ilha de Trindade, mais de 200 milhas da costa litorânea brasileira. Tempos depois disso, Zulmiro foi capturado por uma navegação britânica. Por sorte, o capitão da tripulação foi amigo dele quando integrava a Marinha, e simulou sua fuga no litoral brasileiro. O capitão deu a Zulmiro uma quantia em dinheiro e o fez jurar que largaria a pirataria ao entrar continente adentro. E assim ele fez. Foram nove dias de caminhada do litoral até a capital paranaense. Em Curitiba, já com o nome trocado para João Francisco Inglez, Zulmiro se instalou em um casebre na região do bairro Pilarzinho, em 1838. “A cidade tinha em torno de uns três mil habitantes. Ao chegar aqui ele aluga um casebre e fica escondido
no bairro”, afirma Ofenbock. Lá fez amizade com um jovem inglês recém-chegado ao Brasil chamado Edward Stammers. Para esse jovem, o ex-pirata contou tudo e passou para ele o mapa do tesouro. De início, Stammers achou que tudo não passava de conversa fiada e deixou quieto. Soma-se a isso o compromisso com o juramento feito a Zulmiro de que nada contaria enquanto o pirata estivesse vivo. Mas em um certo dia, após saber em noticiários que a marinha britânica tinha feito uma expedição em busca do tesouro escondido, percebeu que a história era de fato verdadeira. Neste mesmo momento, descobriu que Zulmiro havia morrido. Stammers então mandou cartas ao Jornal do Brasil contando a história do tesouro e o mapa. A incrível e misteriosa história do pirata Zulmiro ficou esquecida por um período até ser “ressuscitada” por Ofenbock quase dois séculos depois no livro “A verdadeira ilha do tesouro”. A histó-
Luis
Ofenbock, fantasiado de pirata no lançamento de seu livro
4
Tecnologia
MARCO
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019
Poliana Almeida
O Vale do Guadalupe
Curitiba vem se destacando como polo de financiamento e apoio às startups e empreendimentos digitais
Poliana
ALMEIDA
Curitibana, a fintech Ebanx é uma das principais startups financeiras do país
D
ez das cem startups mais atraentes do mercado nacional estão em Curitiba. É o que aponta o ranking que mede a capacidade inovadora e o potencial de atrair negócios em startups, promovido pelo Movimento 100 Open Startups. A curitibana GoEpik, que desenvolve uma plataforma de realidade aumentada voltada à resolução de problemas de manutenção de máquinas para fábricas, ficou em quarto lugar no ranking. O resultado do levantamento destaca a capital paranaense como um dos polos de promoção de novos negócios digitais. Quer seja pelos incentivos fiscais ou por projetos de incentivo da prefeitura, como o Vale do Pinhão, quer seja pelo clima tecnológico impulsionado pelas universidades e pelo ambiente de negócios, a capital paranaense vem se destacando como polo de inovação e de
Glossário da inovação >>Fintech são startups que
trabalham para inovar e otimizar os serviços do sistema financeiro. A Ebanx atua no mercado gerenciando contas e pagamentos de grandes empresas e apps, como o aplicativo de músicas e streaming em áudio, Spotify, e a empresa de facilitação de locação de imóveis, Airbnb.
>>Vale do Pinhão é
uma iniciativa da Prefeitura e do ecossistema de inovação de Curitiba. Trata-se de um movimento de atuação conjunta que envolve poder público, universidades, aceleradoras, incubadoras, fundos de investimento, centros de pesquisa e desenvolvimento, startups, movimentos culturais e criativos e a sociedade.
apoio às startups. Uma delas é a Ebanx, fintech genuinamente curitibana. Fundada em 2012, a empresa ganhou o status de “unicórnio brasileiro”, termo dado às startups revelações e com o maior potencial de investimento e retorno. A Ebanx nasceu a partir da mesma premissa que empreendimentos de sucessos partem: resolver um problema: como acessar o sistema financeiro sem ter uma conta no banco. O objetivo do trio fundador da empresa, Alphonse Voigt, João Del Valle e Wagner Ruiz, era proporcionar soluções para que sites de todo o mundo pudesse aceitar métodos de pagamentos locais, como o boleto, cartões de crédito, domésticos ou transferências bancárias. A recrutadora do EBANX, Débora Kretzer, afirma que a fintech emprega cerca de 600 profissionais em dez países pelo mundo. Ela ainda explica que em função de sua maturidade e alcance, já está em uma fase de escala. “Hoje, a empresa se consolidou como um grande player no mercado global de pagamentos, mas mantém a cultura empresarial de startup, incentivando a inovação diariamente”, acrescenta. Segundo Débora, a empresa ainda desempenha um outro papel importante, o de incentivar o mercado das startups na região. “Nós também ajudamos a impulsionar esse ecossistema de inovação. O Ebanx foi uma das primeiras startups a despontar na cidade, e se orgulha de fazer parte do que hoje é conhecido como Vale do Guadalupe – uma região do centro que reúne várias empresas de tecnologia com forte crescimento”. É neste cenário aquecido de inovação e preocupação com resolução de problemas que em 2015 foi criada a LeadLovers, startup especialista em criação de estraté-
gias e soluções de marketing digital. Segundo o cofundador da empresa, Fabio Leandro Verschoor, a escolha por este nicho veio pela necessidade de aprendizado em vendas dos projetos pela internet. “Vimos que muitas pessoas tinham a mesmo dor em vender online, e que não tinham a parte técnica que nós tínhamos”, ressalta.
Uma startup para cada tipo Small-Business >> o
empreendedor comanda a própria empresa e, na maior parte das vezes, trabalha para manter a si e a sua família, sem interesse em expandir o negócio.
Scalable Startups >> são as empresas escaláveis, criadas com objetivo de gerar um capital e, futuramente, conseguir ter ações na bolsa, ou ser comprada por um investidor. Lifestyle Startups >> se você trabalha fazendo o que ama sem ter o intuito de ser milionário, você pode ter uma lifestyle startup. Buyable Startups >>
normalmente quem tem uma buyable startup tem uma grande ideia, mas precisa de um financiamento para poder concretizá-la, e é aí que entram os investidores.
Social Startup >> você tem uma empresa com objetivo de mudar o mundo? Você não pensa em ser rico e famoso, mas sim em ajudar as outras pessoas? Então esta é a sua empresa.
Large-Company >> empresas grandes que estão no mercado há muito tempo e precisam inovar constantemente.
Atualidade, cultura geek e pop e muito debate sobre inclusão, gênero, LGBTQ+ e direitos é o que você vai ouvir no podcast Inclusão Pop, projeto dos alunos da Uninter. Confira no qr-code >>
Fique por dentro!
Gosta da sétima arte e de um bom bate-papo sem enrolação e com muita animação? Então a sua praia é o Programa Web Claquete, produzido nos estúdios da Uninter. Confira no qr-code >>
Cidades
N.º 65 – Dezembro de 2019
MARCO
Trabalho
ZERO
5 Exército
Força feminina em defesa do Brasil Ivone
SOUZA
Mulheres representam menos de 8% do total de militares no país. Número de participação feminina cresceu 28% em cinco anos
No exército, a representatividade é menor proporcionalmente entre as forças armadas. São seis mil mulheres militares, contra 180 mil homens.
A
Mulheres militares Use o Qr-code e confira dados sobre a participação das mulheres nas forças armadas.
liberali Rosso, 31 anos, é uma das mulheres que decidiu seguir carreira militar. Atual tenente da 5ª Divisão
O medo ou o estranhamento só são superados com conhecimento, e transmiti-lo é, sem dúvida, o papel fundamental da imprensa de Exército (DE), no bairro Pinheirinho em Curitiba, ela conta que não era um sonho entrar para o Exército, porém, prestou o edital e foi selecionada, então resolveu assumir para ver como seria. Agora diz que ama o que faz. “O Exército é algo que nos envolve, eu criei uma paixão pela força, especialmente pela organização a qual eu pertenço”, diz. Inicialmente Aline entrou como temporária para trabalhar na área de assessora de mídia, pelo desafio que é fazer parte da comunicação de uma instituição como o Exército. Ela conta orgulhosa do cargo que exerce. “Sou a assessora de mídia de um General que é como o governador dos assuntos militares no Paraná e Santa Catarina. Um cargo de suma importância”, argumenta. Segundo a tenente, na divisão em que trabalha homens e mulheres têm o mesmo Treinamento Físico Militar (TFM). No entanto, alguns exercícios são adaptados, como é o caso da flexão de braço, no qual, as mulheres fazem com os joelhos apoiados no chão. Além disso, todo o ano tem o Teste de Aptidão Física (TAF). Nele os militares têm os índices determinados pela idade e gênero.
Outra jornalista que se interessou pelo universo das forças armadas é a Daiane Andrade. Em 2014 soube de um curso do Exército voltado à jornalistas em Curitiba. Foi lá e fez. Com o treinamento, em 2017 foi para o Haiti cobrir o fim da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah). Andrade explica que como profissional da comunicação, todo esse contato com o Exército tem sido muito produtivo por oferecer conhecimento que serve também para inúmeras outras situações. “Saber como lidar, enquanto repórter, com um cenário hostil, é essencial e faz a diferença entre sair vivo ou não de uma pauta.” destaca. Para Daiane outro aspecto importante no contato com o Exército é a possibilidade de melhorar o acesso do público à essas Corporações e, com isso, gerar algum tipo de proximidade entre a população e as Forças Armadas e vice-versa. “O medo ou o estranhamento só são superados com conhecimento, e transmiti-lo é, sem dúvida, o papel fundamental da imprensa”, argumenta. Para a jornalista Aline Rosso a carreira militar exige muito, pois, não é uma profissão qualquer, no entanto, ela explica que para quem já leva uma vida regrada antes de entrar no Exército, se torna algo simples. “Eu sou militar 24 horas, o que significa que todas as minhas ações, dentro e fora do quartel, tem implicações, “afirma.
Divisão por gêneros - Instituto Igarapé
e Nova Zelândia possuem 15% do total do efetivo do sexo feminino. O líder desta lista é a África do Sul que possui 25% de mulheres nas suas
forças armadas. Em 2016, o país registrava cerca de 25 mil militares mulheres, das quais 70% em quadro temporário. Arquivo Pessoal
participação das mulheres no mercado de trabalho precisa ainda avançar em termos de representatividade e de direitos. Apesar de representar mais da metade da população brasileira, elas são minoria em postos de poder como cargos de diretoria, gerência e presidência de empresas. No meio militar, predominantemente masculino, a cena não é diferente das áreas privadas. Menos de 8% dos militares são mulheres. Nos cargos de liderança, esse percentual cai drasticamente. No exército, a representatividade é menor ainda. São seis mil mulheres militares, contra 180 mil homens. Na luta para conquistar um espaço, a persistência e a vontade de integrar o corpo das forças armadas é o que vem motivando mulheres para ampliar a participação no meio militar. Apesar de isentas do serviço militar, cada vez mais mulheres estão ingressando na carreira. Segundo dados do Instituto Igarapé, entre 2012 e 2017 houve um aumento de 28% no efetivo feminino. A maior participação foi nas forças aéreas, em que foram abertos dois mil cargos. A jornalista Aline Louise De-
Mulheres no Exército pelo mundo
Cerca de 20 países ao redor do mundo permitem mulheres em suas forças armadas. Segundo Instituto Igarapé o Brasil fica muito atrás em percentual de participação das mulheres nas forças armadas, com apenas 7,6% do seu efetivo, enquanto países como Canadá, Austrália
Rosso: o exército é algo que nos envolve
6
Especial
MARCO
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019 Sabrina Fernandes
Cartão vermelho para o preconceito Casos de homofobia, racismo e machismo invadem o futebol dentro FERNANDES e fora de campo, e vem preocupando entidades que lutam contra o preconceito
Sabrina
Casos de discriminação no futebol, dentro e fora de campo, cresceu 6,8% entre 2017 e 2018
A
de deficiência”. Em âmbito federal, os crimes de homofobia e transfobia começaram a se equivaler aos de
A CBF foi multada pela Conmebol em 2016 após a torcida brasileira ter atacado verbalmente o goleiro boliviano Carlos Lampe. Os gritos homofóbicos foram no jogo do Brasil e Bolívia. racismo, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). A possibilidade de os clubes serem punidos com perda de até três pontos, e pena prevista de um a três anos de cadeia, mudou a rotina do
campeonato. São diversos os casos de homofobia nos estádios brasileiros há décadas. Torna-se rotineiro ouvir gritos e injúrias homofóbicas quando o goleiro vai bater o tiro de meta, quando o juiz apita arbitra em uma situação polêmica, quando um jogador perde um gol. E isso independe se é jogo de campeonato de suburbana ou em torneios internacionais. Em outubro de 2016, durante uma partida entre Brasil e Bolívia, aos gritos homofóbicos, parte da torcida brasileira ofendeu ogoleiro boliviano Carlos Lampe. A Confederação Sul-Americana de Futebol) (Conmebol) multou a CBF. Outro caso, mas desta vez em campeonato nacional, durante a partida entre Cruzeiro e Vasco, no Mineirão, um casal de torcedores do Cruzeiro foram ameaçados por estarem abraçados e se beijando na arquibancada. Vídeos do casal
também foram feitos, e publicados em redes sociais, fazendo com que o casal se tornasse alvo de ataques homofóbicos fora do estádio também
Conteúdo exclusivo
Racismo também é problema dentro de campo
O preconceito nos jogos não são manifestados apenas a partir da homofobia, mas também pelo racismo. Nos campeonatos brasileiros já ocorreram vários casos de times que perderam pontos, foram multados ou eliminados por causa de crimes de racismo. As penalidades, contudo, não têm freado os casos em campo. Dados do Observatório da Discriminação Racial apontam um aumento de 6,8% nos casos de racismo no futebol brasileiro. Neste ano, foram 47 denúncias. Um ano antes, o número era de 44 ocorrências.
Uma das cenas de preconceito que mais chocou e ganhou repercussão nacional foi em agosto de 2014, durante uma partida entre Grêmio e Santos. O goleiro do Santos, Mário Lúcio Costa, mais conhecido como Aranha, sofreu injúrias de torcedores. “Naquele jogo do Grêmio me senti como todas as vezes que joguei lá, sempre com sentimento de ódio, raiva e indignação”, diz o goleiro. O clube, além de ter sido multado pelo STJD também foi eliminado da Copa do Brasil porque perdeu seis pontos. Um dos acusados de cometer Crédito: Reprodução/ TV Globo
partida da 16ª rodada do campeonato brasileiro estava em andamento. Era 25 de agosto, e em campo, jogadores do Vasco e São Paulo, em São Januário, seguiam o ritual básico, a luta pelos pontos no brasileirão. Aos 19 minutos do jogo, o árbitro Anderson Daronco paralisou a partida. O jogo foi paralisado. Não por causa de alguma infração em campo ou irregularidade, mas sim pelos gritos homofóbicos que invadiam o estádio vindo da torcida vascaína. O jogo foi parado pelo preconceito. O caso não é isolado. Em cinco anos, ao menos 19 casos de injúria racial e dois por discriminação de sexo foram relatados e julgados pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). O crime é previsto no artigo 243-G do regulamento do STJD, pelo qual, “praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora
Homofobia ou transfobia >>A homofobia pode ser entendida como uma repulsa, aversão, ódio ou medo patológico contra homossexuais, transexuais, lésbicas, bissexuais, travesti. Trata-se de um preconceito contra a diversidade sexual. Usa-se também o termo transfobia preconceito por identidade de gênero, e Lesbofobia para o preconceito dirigido especificamente a lésbicas. A homofobia pode se manifestar com assédio moral, injúrias, recusa à tratamento, atendimento ou ainda recusa de emprego, em violência física e em vários graus, até o assassinato. O
Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a criminalização da homofobia vinculada à lei sobre crimes de racismo. A medida, de junho passado, substitui provisoriamente o entendimento sobre os casos, até que o Congresso Federal edite uma lei específica. Até lá, pelo STF, deve-se enquadrar os crimes no previstos na Lei 7.716/2018. A interpretação do STF é que conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis.
Daronco paralisou o jogo devido às ofenças homofóbicas da torcida vascaína
N.º 65 – Dezembro de 2019
MARCO Divulgação
Aranha: o que aumentou foram as denúncias crime de racismo contra o goleiro, foi uma jovem de 23 anos, que foi filmada xingando o jogador. A imagem foi divulgada em vários programas nacionais época. Ela, junto com outros três gremistas, seriam condenados à penas entre 1 a 3 anos de prisão. No lugar da pena, aceitaram se apresentar a uma delegacia uma hora antes de cada jogo do Grêmio em Porto Alegre, durante seis meses. Ver casos de racismo noticiados não só no futebol, mas em diversos esportes, já se tornou frequente. “Não aumentaram os casos de racismo e injúrias, o que aumentou foram as denúncias. Os negros estão tomando coragem para não aceitarem mais serem desumanizados e humilhados. ” declara Aranha. A triste realidade não se restringe ao futebol brasileiro, mas também no mundial. Jogadores como Daniel Alves, Boateng, Arouca, Serginho, que chegou a abandonar
Denúncias de preconceito Use o Qr-code e veja os relatórios completos do observatório de 2014/18
uma partida na Bolívia, já sofreram com gritos racistas. O tcheco Theodor Gebre Selassie, primeiro negro a atuar pela seleção do seu país, relatou a jornalistas que notou gritos racistas e preconceituosos em uma partida contra a Rússia. Em novembro deste ano, os brasileiros Taison Barcellos e Bruno Ferreira, conhecido como Dentinho, que atuam pelo Shakhtar Donetsk, deixaram o campo chorando, durante um clássico contra o Dinamo de Kiev, pelo campeonato Ucraniano. Quando os jogadores tocavam na bola, torcedores do Dinamo, faziam sons imitando macaco.
O direito das mulheres ao futebol
Outro tipo de preconceito que invade o futebol é o machismo. E basta ir a um estádio para perceber que a massiva participação masculina no esporte cria um ambiente de risco para as mulheres. E isso não apenas nas arquibancadas, mas dentro de campo também, por jogadoras, árbitro ou ainda por jornalistas. É o caso da repórter Renata Medeiros, vítima de agressão. “Ser mulher no futebol é ter que provar que sabe, que conhece e que gosta do esporte a todo momento. As mulheres são colocadas à prova a todo momento. Quando erramos, ouvimos piadas sobre sermos mulheres, enquanto que os homens cometem erros que vêm de um engano ou de falta de informação mesmo. Nossa apuração também é muito mais contestada”. Em março de 2018, a jornalista esportiva da Rádio Gaúcha, ao cobrir o Gre-Nal, clássico disputado entre Grêmio e Internacional, foi hostili-
ZERO
“Naquele jogo do Grêmio me senti como todas as vezes que joguei lá, sempre com sentimento de ódio, raiva e indignação”, diz o goleiro Aranha, ao da partida entre o Grêmio e o Santos em agosto de 2014 zada e agredida fisicamente por um torcedor do Inter. A jornalista registrou toda a ação e divulgou nas redes sociais. O torcedor foi retirado da arquibancada por seguranças. “Senti, em um primeiro momento, que não pertencia àquele mundo, que era uma intrusa. Depois, transformei todos os insultos nas redes sociais e todo o trauma da situação em vontade de transformar o futebol num ambiente propício à presença de mulheres para que ninguém mais passe pelo que passei”, conta Renata. O caso de Renata não é isolado. As agressões físicas e o assédio sexual no esporte é o que motivo a campanha “Deixa Ela Trabalhar” em março de 2018, um manifesto de jornalistas esportivas contra o assédio e a diferenciação nos estádios, nas redações, nas redes sociais. Cerca de 50 jornalistas mulheres de todo o país participaram de um vídeo com relatos, comentários sobre casos violentos e ameaças de estupro que sofreram de torcedores, nos estádios e nas redes sociais. Passado mais de um ano da campanha, ainda resta muito a combater, destaca Renata. “Acredito que o machismo está mais reprimido nas pessoas. Externar discursos machistas está mais raro porque a pessoa pensa que pode ser repreendida, e não porque ela mudou de opinião. ”, explica sobre possíveis mudanças após a campanha.
Especial
7
Os números alarmantes da discriminação Dados do Observatório da Discriminacão Racial no Futebol chocam pelo aumento dos casos de preconceito e violência verbal nos estádios. Confira abaixo alguns dos números da análise sistêmica sobre os incidentes raciais no futebol brasileiro Casos de discriminacão registrados em 2018
Casos de discriminação em 2018 por estado
Casos de discriminação por tipo de injúria - 2018
Medalha Zumbi dos Palmares
O técnico Roger Machado, que comanda atualmente a equipe do Bahia, é um dos dois treinadores negros entre todos os vinte da série A de 2019. O treinador além de ser um dos destaques do time, é engajado em pautas e ações defendidas pelo clube. A atuação de resistência do treinador é prova de que em campo não deve ter lugar para racismo, homofobia, machismo e outros tipos de preconceitos. A luta do treinador foi reconhecida pela câmara dos vereadores de Salvador com a medalha Medalha Zumbi dos Palmares, homenagem é entregue para pessoas, grupos ou entidades que se destacam no combate ao racismo e intolerância religiosa.
Casos de racismo registrados entre 2014/18
Dados do Observatório da Discriminação no Futebol Brasileiro - Gráficos: Marco Zero
8
Movimentos
MARCO
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019 Comissão da Verdade
SÉRIE: Da repressão à democracia
35 anos do grito:
Diretas Já Patrícia
LOURENÇO
Capital paranaense foi o primeiro palco do comício que mobilizou milhões pela retomada do voto direto
“Subversão do meio universitário” marca a ficha do jovem Viotório Sorotiuk, uma das vítimas da ditadura no Brasil.
S
ão 35 anos de vivência e caminho percorrido. E há quem diga que com essa idade a maturidade está em seu auge. No entanto, a nossa democracia não é tão madura assim. Completamos três décadas e meia de uma das principais manifestações em favor da liberdade política, da participação do povo, do direito ao estado e ao futuro. Foi em 1983 que milhões de pessoas tomaram as ruas com cartazes, bandeiras, camisetas e com a garganta rasgando ao grito de “Diretas Já!”. Em 24 de janeiro de 1967, o regime militar criou uma constituição que, dentre outras determinações, retirava do povo o voto direto para preenchimento do cargo de presidente. Ou seja, a escolha do mais alto cargo do executivo brasileiro passou, à época, a ser definido por voto de um Colégio Eleitoral. Este era comporto por membros de assembleias legislativas dos estados, cujo número final era determinado pela proporcionalidade do número de eleitores inscritos em cada estado. Com o objetivo de retomar as eleições diretas à presidência, o movimento político foi de cunho po-
pular mobilizando a sociedade em comícios e passeatas. As Diretas Já tiveram início em maio de 1983 e foi até 1984. Mesmo com tamanho apelo popular e político, o processo de eleições diretas só ocorreu em 1989. Em 2 de março de 1983, o deputado matogrossense Dante de Oliveira chegou a apresentar ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que previa a volta das eleições diretas para a Presidência da República. No entanto, não surtiu efeito, e com a derrota, restava aos articuladores do movimento negociarem o final da ditadura militar. A eleição indireta de Tancredo Neves ocorreu em 1985, dando início ao final do período militar que durou 21 anos no país, desde abril de 1964. Adoecido às vésperas da posse, Tancredo não chega a assumir. Quem recebeu a faixa presidencial foi o vice, José Sarney. Apesar de ter sido o primeiro presidente civil desde o início da ditadura, não era consenso de que se tratava de uma total ruptura, já que o maranhense tinha sido senador na década de 1970 pelo Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido do governo.
O Pau de Arara era uma das torturas
De acordo com o pesquisador de História e Imagem da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Facundo Gabriel Giménez Castro, o movimenajuda a entender a democracia. “Independente das suas diversas leituras, se midiática, política, social, cultural, ou econômica, as Diretas Já é um referencial histórico para entender o Brasil e o mundo dos anos 1980, bem como entender a nossa democracia. Também serve para repensarmos as estruturas atuais que precisam ser mudadas em busca de uma sociedade mais justa e solidária”, comenta. Fruto daquela luta é a possibilidade de hoje vivermos em um ambiente democrático, termos a Constituição Cidadã, que nos dá permite a liberdade enquanto cidadãos, termos uma imprensa livre de censura como no período militar, além da garantia do direito à livre manifestação tanto nas ruas quanto nos meios digitais. Para chegarmos a isso, foi preciso que o movimento Diretas Já acontecesse. E é aí que chegamos em Curitiba, o berço do movimento e sede do primeiro comício oficial da campanha nacional que pedia eleições diretas no país. A mobilização nas ruas da capital paranaense foi em 12 de janeiro de 1984. Estava à frente da organização do comício em Curitiba o senador Álvaro Dias, que na época era presidente do PMDB estadual, e o então deputado Ulysses Guimarães, que presidia o PMDB e seria a figura central na constituinte. O comício reuniu cerca de 60 mil pessoas nas ruas e no já famoso ponto de grandes manifestações de Curitiba, a Boca Maldita, no final do calçadão da Rua XV de Novembro. A multidão clamava por algo em comum: a volta da democracia. O assessor da Câmara Municipal de Curitiba, Júlio Castro, relembra de quando, ainda jovem, vivenciou
o comício em Curitiba e se juntou a esse mar de pessoas, “as Diretas Já fizeram o Brasil respirar. Tive o prazer e honra de testemunhar e ver Curitiba parar. O país parou para ver os discursos que culminou em nosso país: a liberdade política e liberdade de expressão”, relembra. O movimento se espalhou pelo país, abrindo caminho para redemocratização. As Diretas Já reivindicavam o direito à liberdade de expressão, o direito a democracia e a participação social na política do Brasil. A pressão popular surtiu efeito e a redemocratização aconteceu no país. O comício paranaense foi o ponta-pé para outros que foram dando ao movimento uma escala crescente de participação. No Rio de Janeiro, na Candelária, a mobilização chegou a reunir um milhão. Logo depois, em São Paulo, 1,5 milhão foi o número de pessoas na manifestação na Praça da Sé.
Constituição Cidadã
Outro marco da redemocratização do pais foi a substituição da constituição militar pela instituída em 1988, que ficou conhecida como Constituição Cidadã, devido aos vários capítulos que prevê atenção aos direitos do indivíduo. A nova constituição representa um rompimento com o ranço autoritário da constituição de 1967 e restabeleceu o equilíbrio entre os poderes, executivo, legislativos e judiciário. De acordo com o professor da Unicentro e diretor do setor de Sociais Aplicadas, Edelcio José Stroparo, ela determinou eleições em todos os cargos. “A constituição de 1988 estabeleceu os direitos e garantias fundamentais do cidadão. Esse é o elemento que junto com a redemocratização do país, rompeu
Conteúdo exclusivo
definitivamente com o autoritarismo da constituição anterior e do regime militar”, afirma. A constituição de 1946 significou um rompimento com as constituições autoritárias de 1934 e 1937, por sua vez a constituição de 1988, estabelece um contraponto em relação à constituição anterior de 1967 que continha autoritarismo do período militar. O professor Stroparo comenta a respeito da relação da redemocratização e a constituição. “Ela é denominada constituição cidadã, pois ela democratizou o país, estabeleceu sistema eletivo para todos os governos e cargos diretivos do país, comprometeu-se com os direitos e garantias fundamentais. Isso que a faz, e ela ainda faz jus a denominação de constituição cidadã”, expõe.
SÉRIE: Da repressão à democracia Esta é a segunda reportagem de uma série que busca evidenciar a brutalidade da repressão nos anos de ditadura no país, bem como narrar os atos e movimentos de resistência que lutaram pela redemocratização a partir do Diretas Já!. Você encontra a primeira reportagem na edição anterior do Marco Zero.
N.º 65 – Dezembro de 2019
MARCO
Saúde
ZERO
9 Juliane LIma e Nayara Rosolen
Falta de saneamento aumenta mortes por infecção intestinal Juliane
LIMA
Nayara
ROSOLEN
Segundo dados do Governo Federal, cerca de 45% dos esgotos são tratados no país, e cem milhões de brasileiros vivem sem coleta de esgoto
Dados do SUS apontam maior incidência de casos e mortes em decorrência de infecção intestinal em regiões com menor tratamento de esgoto
O
saneamento básico no Brasil é um dos principais gargalos de saúde pública. Segundo o Governo Federal, ao menos 100 milhões de pessoas vivem no país sem tratamento de esgoto. A região nordeste está entre as com menor índice de coleta e tratamento. Na lista dos estados, o pior é o Piauí, com apenas 7% de residências com coleta de esgoto. Situação não muito diferente de mais outros 13 estados, com índice menor que 50%. Os problemas vão desde o agravamento de mortalidade infantil, até um aumento significativo nas internações por doenças de veiculações hídricas no país. Esses quadros estão relacionados com situações precárias de higiene pessoal, má manipulação dos alimentos e tratamento irregular da água. As doenças causadas pela
falta de saneamento básico, além de terem um alto risco de mortalidade, também geram um custo elevado para a saúde pública. Só para se ter
As doenças causadas pela falta de saneamento, além de terem alto risco de mortalidade, também geram um custo elevado para a saúde pública uma ideia, uma projeção feita pelo instituto Trata Brasil, especializada em saneamento básico, entre 2016
Mortes por infecção intestinal no Brasil - DataSus 2017
e 2036, considerando o avanço do saneamento no país, o SUS deverá economizar algo em torno de R$ 6 bilhões em gastos com saúde. A falta do acesso ao serviço é o agravante para diversos problemas sanitários. Como a água fica contaminada, doenças ligadas à infecções intestinais são as que ocorrem com mais frequência em regiões sem tratamento. Em épocas de chuva, a leptospirose se torna um risco maior, já que a população entra em contato com enchentes contaminadas com urina de roedores. A esquistossomose e a febre tifóide estão diretamente associadas com o contato com água infectada. A primeira ocorre em água doce contendo caramujos infectados por vermes que penetram a pele da vítima. O segundo caso vem da ingestão de água e alimentos impuros.
A última se dá pela bactéria salmonela. Todas têm sintomas semelhantes, como diarreia, desidratação e vômito. As contaminações, frequentemente relacionadas à falta de infraestrutura e limpeza necessária, são mais graves nas regiões nordeste e note. Essa diferença pode ser vista na comparação de casos entre as regiões. Nos dois casos apontados, o número de casos de doenças ligadas às infecções intestinais foram maiores. Forma de combater tais mortalidades, a universalização da implantação dos quatro serviços de saneamento básico no Brasil - água, esgotos, coleta de resíduos e drenagem-, é uma das metas da Agenda 2030. Para que isso ocorra, o país deve investir R$ 508 milhões em infraestrutura de saneamento, segundo estimativas do Ministério das Cidades e do Plano Nacional de Saneamento Básico. O problema é que tais projeções estão ficando apenas nas intenções. Ou seja, quando é para de fato colocar a conta do saneamento no orçamento, o compromisso acaba cedendo Desde 2016 estudos já mostram que será muito difícil que o Brasil consiga atingir este objetivo, pois o governo brasileiro investe atualmente apenas 0,2% do Produto Interno Bruto em obras de saneamento básico. Para alcançar a meta seria necessário pelo menos dobrar esse investimento.
Na contramão do país, Paraná é o 5 º com maior investimento em saneamento
Se em âmbito nacional os estados brasileiros andam de mal a pior quando o assunto é saneamento básico, o Paraná segue em direção oposta, e assume a quinta posição de estado com maior investimento no setor. Segundo a gerente de comu-
Conteúdo exclusivo
nicação e marketing da Sanepar, a empresa responsável pelo serviço de saneamento básico no estado do Paraná, Ana Cecília Pontes de Souza, só em 2018 a rede de coleta de esgoto no estado cresceu mais 2,8%. “A meta de universalização do saneamento direciona a Sanepar a concentrar seus esforços na ampliação das redes de coleta de esgoto, que hoje alcançam 72,5% da população urbana, mantendo o índice de 100% de tratamento para o esgoto coletado. Alguns municípios do Estado estão muito próximos de alcançar a meta universal, com índices acima de 90%, como Curitiba, Londrina, Maringá e Cascavel”, diz Ana.
Ranking de saneamento Use o Qr-code para ver no site da ong Trata Brasil o ranking de saneamento no país
10
EaD: um Marco Zero em cada canto
MARCO
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019 Silvano Damazo
Reportagem de Boa Esperança (MG)
Sem lugar para
estacionar Silvano
DAMAZO
À espera do plano de mobilidade urbana, moradores da cidade mineira de Boa Esperança sofrem com a falta de vagas
usando conceitos atuais de um desenvolvimento urbano orientado ao transporte público e o incentivo do uso de bicicletas, fazendo com que as pessoas se libertem da dependência ao automóvel. Levando-se em conta as condições financeiras atuais, o plano apresenta algumas importantes soluções de custo zero ou custo muito baixo e se Boa Esperança
atingir este objetivo, será pioneira no Brasil e servirá de modelo para outras cidades. De acordo com a gerente de projetos da administração 2017/2020, Sara Dalía, a Prefeitura aguarda a construção do Plano Diretor que direcionará as premissas deste projeto. “Acredito que será colocado em prática no ano de 2019, dentro das ações, foi ofertada no concurso público deste ano de 2018, uma vaga de analista de trânsito urbano, que será efetivado e este coordenará a execução” afirmou Sara.
eleitoral, então o vencedor — em represália — ao assumir a administração municipal desativava a banda, a qual era mantida com recursos financeiros da prefeitura. O primeiro coreto da praça foi desmanchado e um outro foi construído. Entretanto, antes da existência do primeiro coreto, a banda tocava sobre a laje da base da caixa d’água. Cordaro até se recorda dessa época, dizendo, de maneira bem humorada, que “era a única banda do mundo que tocava embaixo d’água.” Um outro morador de longa data — Antônio Vicente Morandin, 81 anos, aposentado — lembra-se de que muitos anos atrás, quando veio residir na cidade, “era uma praça alegre, coreto pequeno, e tinha uma banda muito boa, que alegrava a praça, as crianças brincando em volta”. Inclusive, Morandin foi o encarregado de uma das formações que a banda já teve. Na última grande reforma realizada na praça Dez de Março, ela foi praticamente reconstruída e re-
cebeu novos monumentos, e a caixa d’água foi revestida por painéis em homenagem ao trabalhador. Foi então que o prefeito lançou um desafio: se no Brasil existisse alguma praça mais bonita que a de Ituverava, ele rasparia os seus cabelo e bigode. Tal desafio foi até tema de reportagem feita por uma emissora de televisão da região. Mas de que adianta ter uma das praças mais bonitas, se a banda de música não está lá para alegrar os frequentadores? A cidade de Ituverava obteve o selo MIT (Município de Interesse Turístico), e passa a receber recursos financeiros governamentais para incentivar o turismo local. Eis aí um bom motivo para reativar a banda de música e suas apresentações dominicais. Consultada sobre a possibilidade de reativação da banda, a assessoria de imprensa da prefeitura municipal não retornou até a conclusão desta reportagem. E assim, a praça continua sem a sua mais saudosa atração. Cadê a banda?
As vagas disponíveis nas áreas centrais não dão conta do volume de carros da cidade, cuja média de veículos é de um a cada dois habitantes
A
cidade de pouco mais de 40.000 habitantes vem sofrendo com este problema, o centro não oferece muitas vagas de estacionamento. É neste local que ficam todas as agências bancárias, prédio da Prefeitura, Câmara Municipal de Vereadores e vários estabelecimentos comerciais. Só os funcionários usam cerca de 30% destas vagas existentes
e ficam estacionados durante todo horário comercial. A Câmara Municipal de vereadores, apresentou uma proposta de mobilidade urbana para ver se soluciona este problema, “Enviamos esta proposta para a prefeitura, para que seja estudada e apresentada em forma de projeto para nós aprovarmos” disse o vereador Delber Araújo que completou, “Vejo na implan-
Reportagem de Ituverava (SP)
E a praça ficou sem Música
Revitalizada, a praça VALIZI perdeu uma das mais tradicionais atrações
Auro
A tradicional banda se apresentava em baixo da caixa d’água
tação deste Plano de Mobilidade Urbana, uma solução, pois a gente percebe que os veículos das pessoas que trabalham no centro da cidade, ficam estacionado o dia todo”. O Objetivo deste Plano de Mobilidade Urbana é oferecer à cidade de Boa Esperança, além da possível implantação da área azul, adotar modelos de urbanismo aplicados nas cidades japonesas e europeias,
A
praça Dez de Março, principal logradouro de Ituverava-SP, outrora foi o principal local de passeio da população. Aos domingos à noite as famílias frequentavam-na em busca de lazer. As crianças brincavam, enquanto os jovens circulavam pelos passeios, em busca de um par romântico, e os adultos conversavam uns com os outros. Sem falar no pipoqueiro, no vendedor de algodão-doce, na sorveteria, no cinema e outros atrativos disponíveis na praça. Entretanto, a maior atração da praça era a banda de música. Um dos antigos moradores da cidade, o aposentado Geraldo de Souza, 87 anos, recorda-se que “todo domingo, quando chegava oito horas da noite, ia todo mundo para lá; enchia a praça pra ver [a banda]. Era muito bonito, muito gostoso.” Apesar da alegria e diversão que proporcionava à população, a banda sempre teve uma existência intermitente. Nelson Cordaro, 91 anos, aposentado e ex-integrante da banda, atuou nela durante muitos anos. Ele relata que um dos motivos pelos quais as atividades da banda foram diversas vezes descontinuadas foi a política. Segundo Cordaro, em época de eleições municipais, se o maestro e/ou os integrantes da banda demonstrassem apoio a um candidato à prefeito, e este perdia o pleito
Com pouco mais de 40 mil habitantes e um total de 20 mil veículos em circulação, a cidade mineira de Boa Esperança busca uma solução para abrigar todos os carros que buscam estacionamento nas áreas centrais do município
Praça Dez de Março Use o Qr-code para caminhar virtualmente pela praça Dez de Março e ver os monumentos e os espaços públicos da cidade de Ituverava
N.º 65 – Dezembro de 2019
MARCO
@TÁ NA WEB C
om a correria da rotina de produção jornalística, o que mais queremos é facilitar o nosso trabalho, não é? Tudo o que vier para deixar o dia-a-dia mais proveitoso será muito bem-vindo. Foi pensando nisso que a Press Manager lançou o primeiro App voltado para assessores de imprensa. Neea é possível o profissional interagir em tempo real com os principais meios e veículos do País. Os seus mais de dois mil clientes contam com uma base
Assessoria de imprensa
Tecnologia
ZERO
Poliana
ALMEIDA
Especial App para jornalistas
Confira o site do APP com o Qr-Code
de 55 mil jornalistas e blogueiros, que consegue interagir com as mais de 5 mil agências e redações. Pelo Press Voice, é possível consultar o banco de fontes, solicitar informações ou entrevistas. Para os jornalistas, o uso de tecnologias como essa somam ainda mais credibilidade a profissão.
Baixe o APP pelo Qr-Code
Ajuda na transcrição
D
urante uma entrevista, é comum todo jornalista anotar os itens mais importantes dito pelo entrevistado em um bloquinho. Entretanto, com a tecnologia cada vez mais presente no nosso cotidiano, quem sabe o famoso bloquinho seja finalmen-
V
ocê já deve ter ouvido a frase de que jornalista tem que saber de tudo um pouco. Mas como podemos tornar essa tarefa de consumir notícia, ao mesmo tempo que produzimos uma, mais simples? A plataforma Feedly foi criada pensando nisso. Dentro dela, as publicações do seu jornal preferido vai aparecer como notificação. Ou seja, você estará sempre por dentro das últimas do dia. Além disso, a plataforma também possibilita o alerta do google para palavras-chaves, a visualização de twittes
11
A imprensa no celular de influencers ou hashtags e a permissão de seguir qualquer outro usuário do Feedly. Ela funciona de forma bem intuitiva, possibilita a organização de documentos, a leitura é otimizada visando a produtividade, o compartilhamento ajuda na divulgação e a opção de ler mais tarde consegue se adequar a sua rotina.
Use o QR-Code para conferir o APP
te aposentado. O app Transcrição Instantânea é um que pode ajudar nessa missão. Apesar de em um primeiro momento ser desenvolvido para pessoas surdas e com perda auditiva, ele pode ser usado por todos. Através do reconhecimento automático de fala do Google, o app realiza a transcrição de voz e som em texto na tela. A transição permanece no seu dispositivo, porém, você tem um prazo máximo de três dias para salvá-la.
12
Ensaio fotográfico
MARCO
Cidade City Cité Poema de Augusto de Campos
Ensaio de
Maria Eduarda
BISCOTTO
atrocaducapacaustiduplielastifeliferofugahistoriloqualubri mendimultipliorganiperiodiplastipubliraparecipro rustisagasimplitenaveloveravivaunivora cidade city cité
ZERO
N.º 65 – Dezembro de 2019