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Editorial

Para que todos sejam um!

Poucas aspirações do coração humano estiveram mais universalmente presentes na história do que o desejo de união e o anseio por uma sociedade de pessoas que se enxergam como irmãos.

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Se pensarmos um pouco mais sobre esta ideia, no entanto, veremos que o conceito de fraternidade (do latim frater, “irmão”), por definição, pressupõe as noções de paternidade e de família. Por isso é que qualquer projeto de irmandade global que não reconheça a figura de um Pai comum está fadado ao fracasso – pelo contrário, nossa religião nos ensina que, quando criou o universo, Deus tinha em mente a união de todos os seus filhos, numa grande família espiritual (cf. Catecismo da Igreja Católica, CIC, 758-759).

Esta “família de Deus” (CIC, 759), que começou a ser preparada desde a vocação de Abraão a ser pai de “uma grande nação” (cf. Gn 12,3; 15,5-6) e a eleição de Israel como o povo de Deus (cf. Ex 19,5-6), foi depois constituída por Cristo por meio da redenção realizada na Cruz, e organizada hierarquicamente com pastores (os apóstolos e seus sucessores, os bispos) designados para cuidar do rebanho. Tal estrutura, no entanto, é temporária, e destinada a durar apenas durante a peregrinação desta vida terrena, pois, quando Cristo retornar, Ele reunirá os membros desta família no Céu.

É preciso reconhecer, no entanto, que, ao longo dos séculos, esta família passou por diversas fraturas em sua unidade – decorrências, muitas vezes, do pecado de homens de ambas as partes (cf. CIC, 817). A existência das igrejas e comunidades cristãs desvinculadas da unidade católica está hoje tão arraigada que não se pode imputar aos que nascem em tais comunidades o pecado de separação (cf. CIC, 818) – e é preciso reconhecer que o Espírito Santo pode, sim, se utilizar das comunidades cristãs separadas como meios de salvação (cf. CIC, 819).

Chamamos de ecumenismo os esforços no sentido de reencontrar a unidade dos cristãos. Segundo o Catecismo da Igreja Católica, essa unidade tão desejada deve ser buscada sobretudo por meio da caridade, já que ela é o vínculo da perfeição (cf. Cl 3,14). Mas a unidade da Igreja peregrina é assegurada, também, por laços visíveis de comunhão, a saber: “A profissão de uma só fé, recebida dos apóstolos; a celebração comum do culto divino, sobretudo dos sacramentos, e a sucessão apostólica pelo sacramento da Ordem, que mantém a concórdia fraterna da família de Deus” (CIC, 815).

Como caminhos de perseguição dessa unidade da família de Deus, o Catecismo da Igreja aponta as seguintes exigências: - uma renovação permanente da Igreja, numa maior fidelidade à sua vocação. Essa renovação é a força do movimento a favor da unidade; - a conversão do coração, com o fim de levar uma vida mais pura segundo o Evangelho, pois o que causa as divisões é a infidelidade dos membros ao dom de Cristo; - a oração em comum, porque a conversão do coração e a santidade de vida, unidas às orações, públicas e privadas, pela unidade dos cristãos, devem ser tidas como alma de todo o movimento ecumênico, e com razão podem chamar-se ecumenismo espiritual; - o mútuo conhecimento fraterno; -a formação ecumênica dos fiéis, e especialmente dos sacerdotes; - o diálogo entre os teólogos, e os encontros entre os cristãos das diferentes Igrejas e comunidades; - a colaboração entre cristãos nos diversos domínios do serviço dos homens (cf. CIC, 821).

Diz ainda:

“A preocupação em realizar a união diz respeito a toda a Igreja, fiéis e pastores. Mas, também, se deve ter consciência de que este projeto sagrado da reconciliação de todos os cristãos na unidade de uma só e única Igreja de Cristo ultrapassa as forças e as capacidades humanas. Por isso, pomos toda a nossa esperança na oração de Cristo pela Igreja, no amor do Pai para conosco e no poder do Espírito Santo” (cf. CIC, 822).

Rezemos, pois, por todos os nossos irmãos que creem no Cristo, para que a integridade da fé e os laços da caridade unam os que foram consagrados por um só batismo.

Fabricação de bebês

Opinião

EDUARDO R. CRUZ

Não muito tempo atrás, o ter uma criança era algo natural na sociedade. Apesar das preocupações e durezas de gestar e acompanhar uma criança, supunha-se que o ter filhos era um papel importante para a manutenção e o reavivamento da sociedade. Ademais, a criança vinha como uma graça, uma surpresa, em geral positiva. Aceitava-se a criança assim como a natureza a fornecia.

Mas uma rebelião silenciosa se instalou entre os adultos. Ter uma criança tornou-se uma questão de escolha, inclusive quanto ao genótipo do ser em questão. Duas notícias recentes reforçam esse viés narcisista de nossa geração. A primeira diz respeito a uma startup em Israel que desenvolveu uma tecnologia que torna a fertilização in vitro mais barata, segura e eficiente. Uma consequência dessa nova facilidade é que realizar uma fertilização deixa de ser a última opção de um casal que apresenta dificuldade de ter filhos, e passa a ser mais um procedimento rotineiro para quem quiser ter um bebê sob demanda, ajustado geneticamente de acordo com a preferência. Os outros embriões são

Arte: Sergio Ricciuto Conte

descartados por serem “menos viáveis”. É a reprodução por capricho, não somente para um casal que só admite ter filhos se puder controlar a “qualidade de fábrica” deles, mas, também, mais uma possibilidade para que mulheres deixem de se dar ao trabalho de se relacionar e amar um homem para ter seus próprios bebês. Além disso, como é quase senso comum hoje, ter um filho acaba se subordinando às demandas da carreira. Como diz a reportagem, como mais e mais mulheres atrasam o ter filhos devido ao estilo de vida e à busca de sucesso na carreira, a demanda pela In Vitro Fertilization (IVF) está aumentando e vai acelerar nos próximos anos.

A outra notícia diz respeito a um holandês que já doou sêmen para mais de 200 mulheres, uma prática que levantou preocupações com casamentos consanguíneos. Entretanto, talvez a preocupação seja outra. Pessoas normais se relacionam com pessoas similares, gerando bebês normais, mas isso dá lugar agora a mulheres que procuram doadores que apresentam características ideais em uma sociedade de consumo, desacoplando as relações sexuais da procriação (como no “Admirável mundo novo”, de Aldous Huxley). Tanto na primeira matéria quanto na segunda, a palavra “casal” não surge, reforçando-se, assim, a impressão de um capricho para combater a solidão, como se fosse o mesmo que adotar um pet.

Tanto no caso da IVF quanto no caso da doação, o que se tem efetivamente é uma forma de eugenia (ainda que todos digam que não), pura e simples.

É verdade que no passado já existiam situações diferenciadas daquilo que se considerava um padrão, mas hoje há uma recusa de qualquer padrão que seja. O bebê deixa de ser o fruto da relação de um casal e passa a ser uma entre outras comodities, passível de escolha como se faz, por exemplo, ao se mudar a decoração da casa. Não se “tem” mais crianças, agora elas são feitas. Há a urgência, portanto, de denunciar essa nova forma de eugenia, que infelizmente está se tornando o “novo normal”.

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