Noites de Baile

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UM CONTO DE JOSÉ BEZERRA

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UM CONTO DE JOSÉ BEZERRA

NOITES DE BAILE Junho de 1992

M

arcus olhava para o seu reflexo no espelho e aprovava o seu smoking. A gravata estava torta, mas ele achava que sua beleza ofuscaria a imperfeição. O baile era em poucas horas e apesar de não está indo com a pessoa que gostaria, Marcus divertia-se com os seus planos para essa noite de dança, alegria, beijos, bebidas e sexo sujo. Amanda era a parceira de Marcus, uma adolescente de beleza conservadora e que teve a sorte de ter sido convidada para o baile de formatura pelo cara mais famoso e bonito de sua sala. Ela estava sentada em sua cama pensando se devia mesmo ir a essa festa, quando, na verdade, não passava de uma cê-dê-efe se iludindo com a ideia de beijar seu parceiro. *** Pobre Amanda, ela não tinha ideia do que Marcus havia preparado para ela. E coitado do Marcus, ele nem sonhava como terminaria a sua noite. *** Marcus e Amanda saíram juntos da limusine alugada em frente ao colégio. Marcus estava impecavelmente belo em seu traje –5–


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e Amanda lindíssima em seu vestido de cetim e pedras, o qual Marcus não se deu ao trabalho de elogiar. O baile já estava em alta no ginásio. A música tocava no último volume, os alunos conversavam, riam, dançavam e bebiam sob o imenso globo de luz que estava a brilhar sobre as suas cabeças em coque e gel. Amanda estava feliz por estar no baile com Marcus, mas não se sentia confortável com o modo como ele e os seus amigos a olhavam, e como as patricinhas e ex-namoradas de seu parceiro a encaravam. Ela era a menina certa no lugar errado. Marcus curtia adoidado a noite, rindo com os seus amigos, e em nenhum momento chamou Amanda para dançar. Seus amigos “insistiam”, mas ele era duro na queda. Além disso, não era necessário deixá-la cansada com a dança, quando a veria respirar fundo e suar bastante com outra coisa. Ele e seus amigos passaram semanas planejando como levar Amanda a fazer sexo com Marcus, que desejava tirar a doce e adorável pureza da cê-dê-efe chatinha de sua sala. A ideia inicial era convidá-la para o baile e isso estava feito, o próximo passo era convencê-la a sair da festa com ele. Quando Amanda deixou o ginásio com Marcus meia hora depois, sob o pretexto dele que o local estava muito cheio e precisava de ar, ela pensou que logo iria beijá-lo. Indo para uma das salas de aula vazias na escola, naquele momento, deserta, Amanda logo soube o que Marcus pretendia. A boca dele encontrou a dela com um desejo voraz, e o seu hálito era de bebida. A mão dele foi para baixo do vestido dela, sob a calcinha, tentando tirá-la a qualquer custo. Ela tentava empurralo, mas ele era mais forte. –6–


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Amanda chorava e arqueava, mas não de prazer e, sim, pelo medo. Já Marcus ria de desejo enquanto tentava tirar a própria calça sem largá-la. Suas palavras não tinham nexo – mas é claro, ele estava bêbado. Antes que Marcus fizesse o que Amanda temia, os dois ouviram passos no corredor. Saltos quicavam no piso fora da sala. Amanda aproveitou o susto de Marcus e saiu correndo, sem se importar se estava ou não de calcinha. Suas lágrimas cobriam a sua visão, o que acabou ocasionando um esbarrão com outra garota, pálida e bonita. A jovem sorriu e ajudou Amanda a se levantar, a qual, sem agradecer, continuou sua corrida para fora da escola, para longe de Marcus Assone. Marcus saiu da sala depois de colocar a sua cueca e calça, e encontrou o corredor vazio. Amaldiçoou os seus planos que foram para o ralo e decidiu por voltar ao baile. Ele ficou com tesão e precisava de alguém para aliviar. De volta ao ginásio, Marcus estava assim como chegou, impecável, mas sem a sua companheira e com bafo de bebida. Enquanto caminhava pela pista de dança, ele reparou numa moça bonita e pálida sentada sozinha em uma mesa. Ele fez o seu caminho até ela. Com seu charme e lábia, logo Marcus conseguiu a confiança da jovem que não era de falar, mas sorria e acenava bastante. A Mudinha, como Marcus apelidou, aceitou dançar com ele e só parou quando a música foi cancelada para o anúncio do Rei e Rainha do Baile de Formatura da Turma de 1992. –– E o Rei e a Rainha do baile são... Todos ficaram em expectativa. –7–


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–– Marcus Assone e... Ah, desculpe, não sei quem é, mas a nossa Rainha é Alessandra Valesco. Marcus surpreendeu-se ao descobrir que a sua Mudinha era a Rainha da Noite, e a arrastou para o palco para serem coroados. De repente, o globo de luz despencou e quase caiu sobre a cabeça do Rei. Todos ficaram assustados com o ocorrido, mas o êxtase da festa era suficiente para dispensar isso rapidamente. Em cima do palco, Marcus e Alessandra (a Mudinha) receberam as suas coroas e, em seguida, fizeram a dança da coroação. Alessandra não disse uma palavra durante todas as honrarias e o seu sorriso era mortífero para Marcus, que o interpretou como desejo. Afastando-se dos colegas, Marcus arrastou Alessandra para uma porta lateral que ia dar no porão da escola, e ele ficou ainda mais feliz e excitado quando sua mudinha não resistiu. O membro na calça dele já latejava de desejo. *** Conhece aquela famosa fala de nossas mães de que não devemos falar e andar com pessoas estranhas? Pois bem, Marcus não levou isso muito a sério na sua infância e também não levou agora quando adulto. *** Já no porão de porta trancada, Marcus começou a beijar o pescoço de Alessandra, provando cada parte do seu corpo e descobrindo seu sabor, um sabor... estranho. Ele passou as suas mãos

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sobre as pernas dela levantando o vestido e quando atacou a sua boca foi para vomitar. Alessandra não tinha língua. Na verdade, ela não tinha mais uma pele pálida e bonita, mas seca, negra... Uma pele morta. Marcus tentou fugir, mas uma força maior parecia segurar o trinco da porta. Sem seu cinto, a sua calça ficava caindo, e o medo e a vergonha o imobilizaram. Alessandra aproximava-se lentamente como uma morta viva; seu sorriso não mais belo era horripilante na sua pele de cadáver. Ela se aproximou de Marcus, que estava encurralado na parede, e o beijou na boca. Os olhos dele arregalaram, suas mãos largaram a sua calça e seu corpo começou a tremer descontroladamente. O sangue começou a escorrer e não havia dúvidas que era de Marcus, deslizando pelo seu pescoço e manchando o branco impecável de sua roupa. Quando a criatura o largou, ele arquejou no chão, tossindo e vomitando o que restou de sua língua, de alguma forma, dilacerada pela criatura. A mesma língua que beijou tantas outras garotas; a mesma que forçou a boca de Amanda. Quando ele olhou para Alessandra novamente, ela se aproximava de novo. Ele se atirou contra a parede, arranhando e sufocando um grito que nunca sairia. Alessandra ajoelhou-se mortalmente na frente de Marcus e o seu olhar poderia ser de pena, mas ela só queria vingança. A boca cheia de dentes podres desceu por entre as penas dele, mordendo o seu membro. O grito de dor de Marcus nunca saiu, nem mesmo quando teve o seu precioso órgão arrancado a dentadas. Seus olhos arregalados demonstravam todas as sensações horrorosas que ele estava sentindo. E a última coisa que esses olhos viram foi o seu sangue na –9–


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boca da criatura, já bela e adorável novamente, e o cabo quebrado de uma vassoura sendo fincado em seu coração. O Baile de Formatura da Turma de 1992 chegou ao fim, assim como a vida do garoto popular, bonito, mimado e conquistador que era Marcus Assone. Seu corpo foi encontrado na manhã seguinte pelo zelador e sua assassina nunca descoberta. *** Alessandra um dia também foi uma dessas jovens estudantes, atenciosa e dedicada, até quando foi iludida pelas mentiras de um garoto e acabou sendo estuprada, a língua cortada e sendo morta na noite do baile da primavera de 1965. Diz à lenda que, durante noites de baile, o espirito de Alessandra vaga o terreno a procura de vingança. Segundo a história, esse espirito vingativo fareja o cheiro de mentiras e o desejo de garotos que só querem brincar com as meninas e ter uma noite de sexo selvagem. Ela os atrai com sua real beleza e depois os fazem provar de sua dor. Suas vítimas, exclusivamente masculinas, tem a língua destruída assim como a dela um dia foi cortada para abafar seus gritos de socorro; os órgãos genitais deles são arrancados para lhes proporcionar a dor que ela sentiu ao tê-lo sendo colocado a força dentro dela; e o coração de sua vítima é lacerado, assim como o dela um dia foi pelas mentiras e pela morte.

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