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A pecuária extensiva “está sob enorme pressão e a situação pode vir a agudizar-se”, diz presidente da APCA

Nuno Faustino, presidente da Associação de Criadores e Porco Alentejano

A pecuária extensiva “está sob enorme pressão e a situação pode vir a agudizar-se”

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Os efeitos da seca e o aumento dos fatores de produção são, nesta altura, situações que afligem os criadores de porco Alentejano. O presidente da Associação de Criadores e Porco Alentejano, sedeada em Ourique, em entrevista à Gazeta rural, traça um cenário difícil para o setor na região, considerando mesmo que a situação é “preocupante”. Nuno Faustino teme que os preços a praticar em 2023 não cubram os custos de produção dos criadores, levando a que muitos possam vir a encerrar a atividade. O dirigente diz que a pecuária extensiva “está sob enorme pressão, com a seca e a escalada de preços das matérias-primas, e a situação pode vir a agudizar ainda mais”.

Gazeta rural (Gr): Como está o setor de criação do Porco Alentejano?

Nuno Faustino (NF): O ponto de situação é preocupante. Relativamente à ‘montanheira’ que ocorreu em 2021 e 2022, 90% dos animais já foram abatidos. Essa ‘montanheira’ decorreu com deficiências, com problemas, desde logo com a seca que assolou o nosso território, pois não havia erva e água no campo, para além de temperaturas bastantes elevadas, - as chuvas que caíram são insuficientes, - o que faz com que os animais não consigam engordar convenientemente. Estamos a falar de peso, por animal, entre 15 e 20 quilos em média. Deste modo, toda a ‘montanheira’ se processa de uma forma difícil e lenta para os animais engordarem.

Relativamente ao futuro a situação preocupa, pois a erva é fundamental para os animais que estão em recria e que vão entrar em

‘montanheira’ em 2022/2023. As chuvas que caíram vieram minorar o problema, mas são insuficientes. Deste modo, os criadores terão que comprar rações para os animais, o que complica ainda mais a sua situação.

Sem erva nos campos, os animais alimentados com rações vão entrar em ‘montanheira’ com um preço de custo bastante mais eleva-

do, comparativamente ao ano anterior, o que traz preocupações acrescidas naquilo que pode vir a ser o mercado em 2023. Temos receio de que o preço final, ainda que mais alto, não cubra o aumento dos custos na produção. Aliás, a pecuária extensiva está sob enorme pressão, com a seca e principalmente com a escalada de preços das matérias-primas, situação que se pode vir a agudizar ainda mais. isso fosse algo de extraordinário. Obviamente que é melhor dar hoje, do quer amanhã, mas iam ser dadas na mesma, com seca ou sem seca. Isto é uma falsa questão.

O que fazia falta era um apoio à alimentação animal e isso era crucial que existisse. Não havendo temo que algumas explorações passem por momentos muito difíceis, que podem levar à falência.

“Os criadores estão totalmente expostos aos factores climatéricos e sem nenhuma rede de proteção”

Gr: Numa altura em que tanto se fala da importância do Alqueva, a água ainda não chega a zonas Gr: A chuva que caiu nas últimas semanas ajudou?

importante, como na área de criação do Porco Alen- NF: Resolveu parte do problema, mas muitas das culturas de setejano? queiro estão já perdidas. A parte dos fenos já está comprometida

NF: A água do Alqueva chega a uma pequena parte e muito dificilmente haverá uma produção cereais de jeito. do território. É ‘vendido’ pelo políticos que o Alentejo tem o problema da água resolvido com o Alqueva, o que Gr: relativamente à Feira do Porco, que expectativa tem? não é de todo verdade, pois irriga uma pequena parte NF: É um marco para a promoção e desenvolvimento da fileira do Alentejo. do Porco Alentejano. É sempre importante divulgar e dar visibi-

O grosso da área do Alentejo continua a ser sequeiro lidade aos produtos, à raça e ao seu potencial, e, dessa forma, e essa é a grande verdade. O Alqueva está muito longe alavancar toda a economia associada ao porco Alentejano, bem e não vai lá chegar, pois isso também não era possível. como dar a conhecer e captar novos investidores e novas indúsContudo, pensamos que era possível fazer mais alguma trias para o setor, para além da importância desta raça para a coisa com o Alqueva e julgo que isso está pensado. Agora, economia regional e nacional. o que faz falta são medidas estruturais, um plano a médio É a primeira feira a acontecer ainda em tempo de pandemia, e longo prazo para fazer face a estes problemas, como as agora agravada com a guerra no leste europeu, mas a expectasecas prolongadas, que são cada vez mais uma constante, tiva que temos é muito positiva. e para minimizar o seu impacto. Medidas como dotar as explorações com pequenos regadios, que pudessem fazer al- Gr: Fala-se muito na necessidade de renovação no setor guma forragem, e ter água para abeberamento animal eram primário. Há gente nova, novos investidores, a entrar nesimportantes. se setor?

Os criadores estão totalmente expostos aos factores clima- NF: Há alguma coisa, mas nada de significativo. Não tem téricos e sem nenhuma rede de proteção, o que é desanima- sido uma atividade muito atrativa para novos agricultores e dor e frustrante para quem tem a atividade de agropecuária novos investidores nesta área. O regadio e as grandes cultuextensiva e que tem que viver disto. É cada vez mais difícil e o ras, como o olival e o amendoal, atraem mais gente, porque Governo teima em medidas paliativas, muito apagadas e com a rentabilidade é diferente, que nada tem a ver com aquilo pouco impacto, como o adiantamento das ajudas, como se que a agricultura extensiva dá.

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