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Quintas de Tondela ou a resiliência de quem recusa “atirar a toalha ao chão”

Edição Especial

Com um rebanho de 400 cabras Serranas Jarmelistas

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Quintas de Tondela ou a resiliência de quem recusa “atirar a toalha ao chão”

‘Resistir e seguir em frente’ são as palavras de ordem de António Vicente Ferreira Alves, da esposa Madalena Fonseca e do filho Tomás. Na quinta de cerca de 70 hectares, encravada entre as freguesias de Ferreirós, Nagosela e Vila Nova da Rainha, no concelho de Tondela, pastoreiam cerca de 400 cabras Serranas Jarmelistas, o maior núcleo na região desta raça considerada em vias de extinção, e cerca de seis dezenas de ovelhas Bordaleira Serra da Estrela.

O grande incendio de 2017, que assolou a região, “levou tudo”, mas António Alves recusou “atirar a tolha ao chão”. Deitou mãos à obra, contruiu uma queijaria nova, licenciada em 2021, e hoje a Quintas de Tondela é a marca com que os seus queijos de cabra, produzidos com leite cru, cardo e sal, chegam ao mercado. Em entrevista à Gazeta Rural, diz que é altura de diversificar o projeto, para que se torne sustentável, como a vida que pretende levar.

Gazeta Rural (GR): Iniciou este projeto, disse, como uma brincadeira, que se tornou séria depois de 2008?

António Vicente Ferreira Alves (AVFA): Começou do bichinho que ganhei no sítio onde cresci. Nasci numa exploração agrícola que era do meu avô, em Mouraz, onde havia ovelhas, vacas, cabras e outros animais. Mais tarde decidimos, eu e a minha mulher, avançar com uma exploração de cabras. Como sou adepto de raças autóctones e daquilo que é nosso, enveredámos pelas cabras Serranas Jarmelistas, uma raça em vias de extinção, que nós contrariamos. Temos cerca de 400 cabras Serranas, o maior núcleo na região.

Começámos por produzir e vender leite, mas não era economicamente viável, pelo que começamos a pensar numa queijaria, cujo

ve emparcelamento, mas não há grandes incentivos, nem organização, tampouco facilidades nesse sentido. Deste modo, este é o nosso espaço, a nossa quinta. Tondela era uma zona de quintas, onde as pessoas sobreviveram ao longo de séculos. O nome “Quintas de Tondela” nasce à volta desta história.

GR: Estando inseridos na Região Demarcada de Queijo Serra da Estrela, alguma vez colocaram nos pratos da balança a opção entre a cabra Serrana ou a Ovelha Bordaleira ou Churra Mondegueira?

VF: Primeiro tivemos ovelhas, numa quinta que temos em

Tonda. A cabra Serrana é um pequeno ruminante que tem um comportamento completamente diferente das ovelhas, como o atrevimento e a traquinice, que nos cativou. Daí a nossa opção.

GR: É também chamada “cabra sapadora”?

VF: Não gosto do termo, pois prefiro chamar-lhe cabra jardineira, pois o que ela faz é espontar, atrasando o crescimento dos matos. Agora, o que é importante dizer, quando se usa o termo “sapadora”, é que terá de haver sempre mão humana, como maquinaria ou não, a fazer o complemento da limpeza dos matos.

processo de licenciamento começou em 2015, concluído, a muito custo, em meados de 2021. Entretanto, tivemos “uma ajuda grande”, com os incêndios de 2017… GR: Quantos litros de leite produzem por dia?

VF: Temos produções sazonais, embora tentemos ter leite todo o ano. Temos três cobrições e parições controladas, em períodos diferentes do ano, pelo que transformamos só o leite dos nossos animais. Estamos a falar em média cerca de 250 litros de leite por dia. Gastamos 12 litros de leite para produzirmos um quilo de queijo. Sabemos que é possível fazer mais, com outros modos de produção, com a utilização de algumas substâncias que são permitidas, e menos leite, mas nós é assim que queremos que o consumidor nos veja. Os nossos queijos são feitos com leite cru, cardo e sal.

GR: A produção de queijo é a única fonte de rendimento?

VF: É importante referir que nós somos produtores de leite. Neste momento temos que vender uma parte para outras queijarias, porque não temos ainda forma de escoar todo o queijo que podemos produzir com o leite das nossas cabras.

Temos outros produtos, como requeijão e o cabrito, que vamos tentar valorizar, para além da carne de cabra. Temos algumas ideias em mente para acrescentar valor a estes dois produtos, mas tem que ser uma coisa de cada vez.

GR: …Que vos destruiu tudo?

VF: Tudo. Não ficou um palmo por arder na quinta. Ficamos sem estabulo, equipamentos, entre outros materiais, mas conseguimos dar a volta.

GR: Depois de uma tragédia, de onde vem a força para recomeçar?

VF: Eu não estava cá na noite do incêndio, cheguei de madrugada, e a primeira coisa que me veio à cabeça é que não valia a pena continuar. Já, nessa altura, o nosso filho Tomás trabalhava connosco na quinta, nos tempos livres, e entendi que era um mau exemplo, à primeira dificuldade, atirar com a toalha ao chão. Já tínhamos feito um determinado investimento na quinta e não conseguíamos fazer mais nada que gostássemos com ele. Podíamos plantar eucaliptos, mas não era a nossa praia. Decidimos arregaçar as magas e reconstruir tudo outra vez.

O núcleo central da quinta tem 70 hectare, onde temos a queijaria, divido por três freguesias (Ferreirós, Nagosela e Vila Nova da Rainha) e temos outros terrenos arrendados onde semeamos as forragens para alimentar os animais durante o inverno.

GR: Isso quer dizer que o projeto ainda só vai a meio?

VF: Esperamos que sim. Tem de ser um projeto mais abrangente, até porque já nos apercebemos que, em termos de sobrevivência do mesmo, temos que diversificar as atividades, pois com o aumento dos custos de produção é difícil viver só do queijo.

GR: Entretanto lançaram a marca “Quintas de Tondela”?

VF: Há vários motivos e justificações para o nome. Como disse atrás, o núcleo central onde temos a queijaria é um conjunto de várias quintas. Vivemos numa região de minifúndio, que existe e tem as suas características. Este é o nosso espaço. Era bom que houGR: Têm também ovelhas?

VF: Temos cerca de 60 ovelhas bordaleiras. Fazemos alguns queijos, que ainda não são certificados.

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