Comentário: 2° Domingo do Tempo Comum - Ano B

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O CHAMADO QUE DEUS NOS FAZ BORTOLINE, José - Roteiros Homiléticos Anos A, B, C Festas e Solenidades - Paulos, 2007 * LIÇÃO DA SÉRIE: LECIONÁRIO DOMINICAL * ANO: B – TEMPO LITÚRGICO: 2° DOM. COMUM - COR: VERDE

I. INTRODUÇÃO GERAL

7. Estes versículos fazem parte de uma “semana teológica” no Evangelho de João (1,19-2,12). Ela inicia com o testemunho de João Batista, a partir do qual as pessoas vão aderindo a Jesus. A semana termina com o episódio do “Casamento em Caná”, onde “Jesus manifestou sua glória, e seus discípulos acreditaram nele” (2,11). O trecho que lemos na liturgia deste domingo resume o que acontece no 3º dia dessa “semana”.

1. “O que vocês estão procurando?” Esta pergunta, feita outrora a dois discípulos de João Batista, Jesus a faz a todos nós. Estamos procurando Jesus. Buscamos um sentido para nossa vida pessoal e comunitária. Hoje, nós também, queremos dizer ao Senhor: “Fala, que teu servo escuta”. Celebramos a Eucaristia, testemunho do Senhor que nos ama. E a celebramos porque outras pessoas, antes de nós, testemunharam que este é um momento privilegiado em nossa vida, a. A vocação nasce do testemunho (vv. 35-36) pois é a grande comunhão da humanidade com Deus. 8. A vocação dos dois primeiros discípulos (vv. 35-39) 2. Somos todos membros do corpo de Cristo. Na cele- nasce do testemunho de João Batista. A partir daí surge bração queremos sentir de novo que o corpo de Cristo e o uma conscientização vocacional que envolve outras pessoas corpo das pessoas são sagrados. E é a partir dos nossos a partir do testemunho de quem esteve com Jesus: André corpos que queremos glorificar o Deus vivo e verdadeiro. encontra seu irmão Simão Pedro e o apresenta a Jesus (vv. 40-42). Em seguida, é Filipe quem encontra Natanael e lhe II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS fala de Jesus (vv. 45-46). Assim, a partir do testemunho de 1ª leitura (1Sm 3,3b-10.19): Não é fácil reconhecer a voz outros, o grupo dos colaboradores de Jesus vai crescendo. de Deus 9. No Evangelho de João a vocação dos discípulos não se 3. O trecho mostra a vocação de Samuel, personagem dá da mesma forma que nos outros evangelhos. Nestes, importante na história do povo de Deus. Ele será, ao mes- Jesus chama pessoalmente e de forma direta. Em João, o mo tempo, sacerdote, profeta e juiz. Com ele inicia o profe- seguimento de Jesus se dá porque algumas pessoas sabem tismo propriamente dito. Ele se situa na passagem do regi- quem é Jesus e o comunicam a outros que, por sua vez, me igualitário das doze tribos para o regime tributário da passam a fazer a mesma experiência. monarquia. Samuel, contudo, será sempre crítico em relação ao novo regime que, aos poucos, vai se deteriorando. 10. O testemunho do Batista deve ter mudado completaPodemos afirmar que Samuel traçou, em Israel, a lucidez mente a vida dos dois discípulos. Vendo Jesus passar, ele profética que se oporá constantemente aos regimes de força diz: “Eis o Cordeiro de Deus”. João chama Jesus dessa que oprimem o povo. E nisso ele continua sendo ponto de forma porque descobriu nele o cordeiro pascal (Ex 12) e o servo sofredor (Is 53), síntese das expectativas de libertação referência para a vocação profética em nossos dias. do passado tornada presente na pessoa de Jesus que passa. 4. Naquele tempo, “a palavra de Javé se manifestava raramente e as visões não eram freqüentes” (3,1b), e o texto b. Exigências da vocação (vv. 37-39) dá a entender que Deus não se faz ver, simplesmente co- 11. Os dois primeiros discípulos devem tomar a iniciativa, munica sua voz, captada por aqueles que estão atentos e sem esperar que Jesus os chame. Para eles, bastou o testeprontos a ouvi-lo. munho de João Batista de que Jesus é o libertador. A partir 5. A vocação de Samuel ajuda a clarear as dificuldades desse momento, descobrem que em Jesus está a resposta a vocacionais de cada pessoa. Ele é ainda menino (v. 8), e o todos os seus anseios. O Batista, por causa do testemunho, Senhor se manifesta de noite. Esse detalhe é importante perde os discípulos. Estes, pela coragem da opção que fizeporque a noite é o momento em que os ruídos externos dão ram, dão pleno sentido a suas vidas e passam a ser testemulugar ao silêncio interior. Mas é também a hora do sono e, nhas para os outros.

para ouvir a voz do Deus que fala, é necessário acordar. De 12. No v. 38 encontramos as primeiras palavras de Jesus fato, Deus não chama o menino por meio de visões. Para no Evangelho de João: “O que vocês estão procurando?” responder, Samuel precisa despertar, levantar-se e cami- Do início ao fim de nossas vidas estamos à procura de algo nhar. ou de alguém. Como discípulos, procuramos saber quem é 6. O texto mostra que Samuel faz várias tentativas para Jesus. E ele testa nossa sede, perguntando-nos o que estareconhecer a voz do Senhor, que o chama seguidamente mos procurando. Esta pergunta, que aparece nos momentos (vv. 3-8). Por três vezes ele pensa ser Eli quem o está cha- cruciais do Evangelho de João, costuma se manifestar nas mando, e corre a ele. Uma noite de sono interrompido, no fases decisivas de nossa vida: “O que estamos procuraninício marcada por frustrações, acaba resultando na respos- do?” ta convincente àquele que chama: “Se o chamarem de novo, diga: Fala, Senhor, teu servo escuta” (v. 9). Isso demonstra que a vocação é um aprendizado constante, procurando discernir, nas “noites mal dormidas da vida”, o que Deus quer de cada um e de todos. Uma vez descoberta a voz do Senhor, é preciso estar atento e não deixar cair por terra nenhuma de suas palavras (v. 19).

13. A resposta dos discípulos é movida pelo desejo de comunhão: “Mestre, onde moras?” Os discípulos não estão interessados em teorias sobre Jesus. Querem, ao contrário, criar laços de intimidade com ele.

14. Para criar intimidade com Jesus é preciso partir, fazer experiência: “Venham ver!” (v. 39a). E o resultado da experiência já aparece: “Então eles foram, e viram onde Jesus Evangelho (Jo 1,35-42): “O que vocês estão procuran- morava. E permaneceram com ele naquele dia” (v. 39b). O verbo permanecer é muito importante no Evangelho de do?”


João. Por ora os discípulos permanecem com Jesus. Mais adiante, o Mestre dirá: “Permaneçam em mim” (cf. 15,5ss). Permanecer com Jesus e com as pessoas é fácil. O difícil é permanecer nele e nas pessoas. Só aí é que a comunhão será plena. 15. O evangelho afirma que a experiência com Jesus valeu a pena: “Eram mais ou menos quatro horas da tarde” (v. 39c). Quatro horas da tarde, em linguagem simbólica, é o momento gostoso para o encontro, ou a hora das opções acertadas. O passo dado por esses dois discípulos foi de ótima qualidade. Valeu a pena. Essa opção vai gerar frutos a seguir.

c. A força do testemunho (vv. 40-42) André era um dos discípulos que, diante do testemunho do Batista, seguiram a Jesus e fizeram a experiência das “quatro horas da tarde”. Só agora é que o evangelista revela o nome desse discípulo. O outro fica anônimo, podendo assumir o nome de cada um dos seguidores do Mestre. André significa homem (= ser humano). Será que o evangelista quer insinuar que as pessoas só se tornam verdadeiramente humanas depois que fazem a experiência do Mestre? Fato é que a experiência se converte em testemunho que arrasta: André leva Simão a Jesus. O evangelho mostra só um flash do testemunho de André. De fato, o v. 41 diz que “ele encontrou primeiro seu irmão…” Isso dá a entender que teria encontrado, em seguida, outras pessoas… André fala no plural: “Encontramos o Messias”. É uma experiência comunitária e progressiva de quem é Jesus. João o apontara como o Cordeiro de Deus; os primeiros discípulos o chamam de Mestre; Pedro já fica sabendo que se trata do Messias… 16.

17. Jesus pede que Simão Pedro encontre sua identidade: “Você é Simão, filho de João. Vai se chamar Cefas” (v. 42). Para o povo da Bíblia, o nome é a identidade da pessoa. Simão será, no Evangelho de João, símbolo de toda pessoa em busca de identidade. Ele dará muitas cabeçadas ao longo desse evangelho (cf., por exemplo, caps. 13 e 18), até se encontrar consigo próprio, com sua missão e com Jesus (cf. 21,15-19).

2ª leitura (1Cor 6,13c-15a.17-20): Nosso corpo é templo do Espírito Santo

relação com uma prostituta não atrapalhava o relacionamento com Deus. Levados por falsa compreensão da liberdade, afirmavam: “Posso fazer tudo o que quero”. A isso Paulo responde: “Mas nem tudo convém, e não deixarei que nada me escravize” (v. 12). Para eles, a prostituição era uma necessidade física, assim como o comer ou o beber: “Os alimentos são para o estômago, e o estômago para os alimentos” (v. 13a). Isso porque, segundo eles, só o espírito (alma) interessa ao Senhor. O corpo de nada serve. Para Paulo, a prostituição é idolatria, pois entrega um membro do corpo de Cristo a um senhor estranho que escraviza. Se freqüentar a prostituição fosse uma necessidade física, então o outro seria objeto, e não mais pessoa. 19. Paulo afirma, em primeiro lugar, que a imoralidade não é uma necessidade física como o comer. Isso porque, com a morte, o estômago e os alimentos serão destruídos por Deus, ao passo que o corpo será ressuscitado glorioso pelo poder de Deus (vv. 13b-14). Dessa forma, o corpo é destinado não à imoralidade, e sim ao Senhor. 20. Em segundo lugar, Paulo ajuda os coríntios a fazer a memória do que significa ser cristão (vv. 15-17). Com a morte de Jesus, Deus nos “comprou e pagou” (v. 20), de modo que pertencemos a ele, formando uma só coisa com Cristo. O corpo de cada pessoa é, portanto, parte do corpo de Cristo. Aqui Paulo se distancia do conceito de corpo enquanto unidade física; com isso o corpo de cada pessoa adquire uma dimensão social: “Vocês não sabem que seus corpos são membros de Cristo?” (v. 15a). Mais adiante expressa de modo melhor seu pensamento: “Vocês não sabem que o seu corpo é templo do Espírito Santo, que está em vocês, que de Deus receberam, e que vocês não pertencem mais a si mesmos?” (v. 19). 21. Os coríntios adeptos da prostituição imaginavam que, se um membro da comunidade viesse a praticar imoralidade, isso não afetaria a comunidade como um todo, nem quebraria a aliança com Deus. Para Paulo, a imoralidade atinge tanto o corpo físico (a pessoa) quanto o corpo social (a comunidade), de modo que, se um dos seus membros está sendo infiel, de certa forma toda a comunidade está se prostituindo e aderindo à idolatria.

22. Nos vv. 18-20 Paulo tira as conclusões dessa delicada questão: o cristão é membro do corpo de Cristo e templo do 18. Os versículos desta leitura giram em torno do tema da Espírito. Os que se unem ao Senhor formam com ele um só imoralidade. Tudo indica que se trata de prostituição sagra- espírito. E é por meio do corpo assim entendido e resgatado da. Alguns membros da comunidade de Corinto achavam que podemos glorificar a Deus. normal freqüentar os templos para se unir às prostitutas sagradas da deusa protetora da cidade. Para essas pessoas, a

III. PISTAS PARA REFLEXÃO 24. A 1ª leitura (1Sm 3,3b-10.19) e o evangelho (Jo 1,35-42) têm em comum o tema da vocação. A 1ª leitura enfatiza as dificuldades em reconhecer a voz do Deus que chama; o evangelho, por sua vez, mostra que a vocação nasce do testemunho das pessoas. Em geral, no início de nossa vida, e ao longo da caminhada na fé, há o testemunho de alguém que nos apontou a pessoa de Jesus. Seria interessante recuperar a memória dessas pessoas (pais, amigos, evangelistas, professores, mártires da caminhada e outros). A 2ª leitura (1Cor 6,13c-15a.17-20) resgata o valor do corpo como tal e o fato de sermos todos membros do corpo de Cristo. Não só a prostituição é imoralidade. É importante, também, denunciar tudo o que fere ou diminui o corpo humano em sua dignidade fundamental (pobreza, miséria, doença, fome, analfabetismo etc.).

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