Comentário: 5° domingo do Tempo Comum - Ano B

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JESUS E AS NOSSAS ENFERMIDADES BORTOLINE, José - Roteiros Homiléticos Anos A, B, C Festas e Solenidades - Paulos, 2007 * LIÇÃO DA SÉRIE: LECIONÁRIO DOMINICAL * ANO: B – TEMPO LITÚRGICO: 5° DOM. COMUM - COR: VERDE

I. INTRODUÇÃO GERAL Celebrar a Eucaristia a partir dos sofrimentos do nosso povo: este é o desafio que a liturgia deste domingo nos apresenta. Ao redor de nós, os olhos de milhões de brasileiros não vêem a felicidade, cabendo-lhes dias e noites, semanas, meses e anos de sofrimento e decepção (cf. 1ª leitura Jó 7,1-4.6-7). 1.

de noite, canso de agitar-me até o amanhecer!" (v. 4). Diante da vida que passa cheia de sofrimento, o que Jó pode desejar, senão um pouco de sossego antes de morrer? "Lembra-te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade!" (v. 7). Diante do sofrimento, ou descobrimos o rosto do Deus verdadeiro, ou fazemos dele um monstro que nos devora inexoravelmente. E a melhor maneira de descobri-lo é solidarizar-nos com os sofredores que vivem no meio de nós e ao nosso redor. É inútil afirmar depois que o sofredor morreu: "Coitado, descansou!", pois aí será a nossa vez de não descansar.

2. Jesus nos ensina a celebrar e a viver a partir das dores do povo (cf. Evangelho Mc 1,29-39). Tomando os doentes pela mão e ajudando-os a se levantar, estaremos libertando as pessoas e possibilitando-lhes servir, na liberdade, à causa do Reino. Evangelho (Mc 1,29-39): Jesus e as nossas enfermi3. Evangelizar é tarefa de todo cristão. Mas o anúncio dades

do Evangelho não confere títulos de glória nem privilégios (cf. 2ª leitura 1Cor 9,16-19.22-23). Os que se decidem pelo evangelho optam, ao mesmo tempo, pela gratuidade e serviço desinteressado, à semelhança de Jesus e de Paulo, que se fizeram servos de todos.

7. O evangelho de hoje é a continuação e conclusão de um "dia típico" da atividade libertadora de Jesus (Mc 1,21-34). O que encontramos lá e aqui é uma amostra daquilo que o Mestre faz constantemente. Com isso, Marcos vai mostrando quem é Jesus, pois essa é a preocupação fundamental do seu evangelho. Além disso, é II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS preciso ter presente que esse "dia típico" é um sábado, 1ª leitura (Jó 7,1-4.6-7): Deus se preocupa com nossos dia sagrado que se tornou estéril, porque incapaz de libertar e comunicar vida aos que sofrem. sofrimentos?

Jó é o tipo da pessoa que sofre. E sua dor nasce de várias situações. Em primeiro lugar, a desgraça que se abateu sobre sua vida e família. Em seguida, a falta de solidariedade da esposa e dos amigos, o que faz aumentar assustadoramente a solidão e o abandono: "A pessoa desesperada tem direito à solidariedade do amigo, mesmo que tivesse abandonado o temor do Todo-poderoso" (6,14). Em terceiro lugar, a impressão de que Deus está calado e ausente a tudo isso. E, se é possível detectar um traço da presença de Deus na dor, trata-se de uma presença que assusta e aterroriza: "Quando penso que o leito me aliviará e minha cama abrandará meus gemidos, então me espantas com sonhos e me aterrorizas com pesadelos" (7,13b-14). Dia e noite, o sofrimento não tem fim. E Deus, onde está? 4.

O Deus da teologia da retribuição, defendida pelos "amigos" de Jó, tornou-se tormento e terror para quem sofre. Que sentido tem a vida dos sofredores? Jó se faz porta-voz de todos eles e pinta um quadro dramático da situação. Para ele, a vida é um "trabalho pesado" (v. 1a), ou seja, uma espécie de serviço forçado no qual outros desfrutam seus resultados; é como o trabalho de um mercenário que põe em risco a própria vida para salvar a pele dos outros (v. 1b). Em síntese, meses de decepção e noites de sofrimento (v. 3). 5.

a. Da sinagoga à casa (vv. 29-31): Libertação e serviço 8. Jesus se desloca da sinagoga à casa de Simão e André (v. 29) com os quatro discípulos que escolhera (vv. 16-20). É a primeira vez, no evangelho de Marcos, que aparece a menção à casa. Aqui ela se opõe à sinagoga. Ao longo do evangelho, Jesus vai se sentir muito bem em casa, ao passo que a sinagoga irá suscitar conflitos, culminando na decretação da morte de Jesus por parte dos fariseus e alguns do partido de Herodes (3,6). 9. A sogra de Simão está de cama, com febre (v. 30a). O povo da Bíblia acreditava que a febre tinha origem demoníaca, algo que imobilizava as pessoas, deixandoas inativas. Marcos mostra Jesus pegando a mão da mulher, ajundando-a a se levantar (v. 31a). Com isso o evangelista nos estimula a progredir na compreensão de quem é Jesus: é aquele que ajuda as pessoas a caminhar com as próprias pernas e ser sujeitos do próprio agir. De fato, logo em seguida, "a febre desapareceu, e ela começou a servi-los" (v. 31b). Jesus liberta, e as pessoas, como resposta, se põem a serviço do libertador. O modo como Jesus age é simples e, ao mesmo tempo, profundo: ele liberta tocando, pegando pela mão, ajudando a pessoa a se libertar. Notemos mais um detalhe: se a primeira pessoa a ser beneficiada pela ação libertadora de Jesus é um homem, a segunda é uma mulher, sinal de que Jesus não discrimina.

6. Há perspectiva de futuro nessa situação? Como pôr fim ao sofrimento? Se não há esperança de felicidade (vv. 6b.7b), melhor é desejar a morte, visto que nem a 10. Jesus ajudou a sogra de Simão a se levantar. No noite oferece possibilidade de descanso: "Se me deito, texto grego, este verbo recorda o rito do batismo. Quem penso: ‘Quando poderei levantar-me?’ E quantas vezes, lê o evangelho com os olhos da fé descobre imediatamente o sentido do batismo em si e sua função na socie-


dade: é um levantar-se para pôr-se a serviço do projeto cos. Os discípulos sugerem que ele fique em Cafarnaum de Deus. usufruindo os dividendos que a fama de seus atos lhe proporcionaria. Aqui entendemos por que Marcos, ao b. Em frente da casa (vv. 32-34): Uma multidão de ne- falar que Satanás tentou Jesus (cf. 1,13), omitiu o contecessitados údo da tentação e o modo como Satanás se apresenta. Jesus vence a tentação da popularidade fácil porque o 11. Os vv. 32-34 são um sumário. Eles concluem o "dia caminho da libertação passa pela entrega total da vida na típico" da atividade libertadora de Jesus. Toda a cidade cruz. está reunida em frente da casa de Simão. No meio dessa multidão estão todos os doentes (dos quais a sogra de Simão é símbolo) e todos os possuídos pelo demônio (dos quais o possesso da sinagoga é símbolo). Ao dizer que "Jesus curou muitas pessoas de diversas doenças e expulsou muitos demônios" (v. 34a), Marcos está retomando um tema que apareceu no batismo de Jesus, o do servo sofredor que carrega as enfermidades da humanidade (cf. Is 53,4: "… eram as nossas doenças que ele carregava, eram as nossas dores que ele levava em suas costas").

2ª leitura (1Cor 9,16-19.22-23): Gratuidade e Evangelho

15. O capítulo 9 da primeira Carta aos coríntios ajuda a entender a questão da liberdade. Na comunidade de Corinto havia "fortes" e "fracos" na fé. Os "fortes" afirmavam que podiam comer as carnes sacrificadas aos ídolos sem incorrer na idolatria. Paulo concorda com eles, mas sua preocupação é com os "fracos" que, diante disso, poderiam perder a fé. Os "fortes" não perdem sua liberdade se, em vista dos "fracos", se abstêm de fazer o que 12. Reaparece também o tema do silêncio imposto aos prezam (cap. 8). demônios (cf. Mc 1,25). A descoberta de quem é Jesus é resultado de longo aprendizado na fé e na adesão à Boa 16. Os versículos de hoje ajudam a esclarecer essa Notícia por ele trazida, e isso só se concretiza depois que questão. Paulo, enquanto apóstolo de Cristo e fundador o discípulo acompanhou o Mestre até a cruz (cf. 15,39). da comunidade, podia fazer valer seus direitos e privilégios, mas não o fez, mostrando assim à comunidade que c. Da casa ao deserto e à Galiléia inteira (vv. 35-39): há outra forma de entender e viver a liberdade dos filhos Jesus vence a tentação de Deus. Para ele, pregar o Evangelho não é título de 13. Na manhã seguinte, Jesus se afasta da cidade para glória, mas uma obrigação que decorre de seu comproum lugar deserto a fim de orar (v. 35). A oração é im- misso com Cristo Jesus que, livre e gratuitamente, coloportante porque é a comunhão com o projeto do Pai. cou-se à disposição do projeto do Pai (vv. 16-18). ApeMarcos nada diz a respeito do conteúdo da oração de sar disso, sente-se inteiramente livre: "Embora eu seja Jesus, mas o contexto desses versículos nos dão algumas livre em relação a todos, tornei-me o servo de todos, indicações. A primeira é esta: a oração de Jesus situa-se para ganhar o maior número deles" (v. 19).

no início de novo dia de sua atividade libertadora. Além 17. A seguir, Paulo mostra sua trajetória de evangelizadisso, marca nova etapa: saindo de Cafarnaum, o Mestre dor. Sua vida se inspira em Jesus, que assumiu plenase dirige "a outros lugares, às aldeias das redondezas" mente a realidade humana (cf. Fl 2,6-11): "Tornei-me (v. 38), ou seja, "por toda a Galiléia" (v. 39). fraco com os fracos, para ganhar os fracos. Tornei-me 14. A segunda indicação diz respeito à tentação de Je- tudo para todos, a fim de salvar alguns a todo o custo" sus. Simão e seus companheiros foram atrás dele e, (v. 22). Para Paulo, Evangelho é a encarnação do Filho quando o encontraram, disseram: "Todos estão te procu- de Deus, que se esvaziou de prerrogativas e privilégios, rando" (vv. 36-37). São as primeiras palavras dos discí- assumindo nossa realidade e história. Os que desejam pulos neste evangelho, e elas vêm carregadas da "igno- seguir Jesus, anunciá-lo e tornar-se participantes do rância" que caracteriza os seguidores de Jesus em Mar- Evangelho, não têm outro caminho a não ser o caminho de Jesus.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO 18. Vivemos numa sociedade de sofredores. Milhões de brasileiros são pobres. A vida de muitos é marcada pela dor, solidão e desesperança. O que fazer diante desses milhões cujos olhos não vêem a felicidade? (cf. 1ª leitura Jó 7,1-4.6-7). 19. Jesus nos ensina como agir: tomar os doentes pela mão e ajudá-los a se levantar (cf. Evangelho Mc 1,29-39). Mas nos alerta também contra a popularidade fácil. 20. Paulo traça o perfil do agente de pastoral (cf. 2ª leitura 1Cor 9,1619.22-23). A busca de privilégios (posição social, enriquecimento etc.) contrasta com a atitude de Jesus e de Paulo, que se fizeram servos de todos e do Evangelho.


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