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Figura 1: Primeiro modelo do Game Boy
proporciona contextos de interação, que podem ser espaços, objetos e comportamentos que os jogadores exploram, manipulam e habitam. Os sistemas vêm a nós em muitas formas, de sistemas mecânicos e matemáticos a conceituais e culturais. Um dos desafios da nossa discussão atual é a de reconhecer as muitas maneiras que um jogo pode ser enquadrado como um sistema. Xadrez, por exemplo, poderia ser pensado como um sistema de estratégia matemática. Poderia também ser pensado como um sistema de interação social entre os dois jogadores, ou um sistema que simula abstratamente uma guerra. (SALEN & ZIMMERMAN, 2004, apud SANTOS, 2010, p. 29) Os autores pontuam o jogo como um sistema complexo, um conjunto de partes e elementos: jogadores ou participantes ativos do jogo, que interagem com o sistema do jogo; artificialidade, ou seja fronteira entre a ‘vida real’, no tempo e no espaço; conflito, pois todos os jogos compreendem uma competição; regras que possibilitam uma estrutura na qual o jogo existe que delimita o que o jogador pode ou não fazer; resultados quantificáveis, pois o jogo possui um objetivo ou resultado quantificável, um jogador perde, e outro vence, recebendo algum tipo de pontuação numérica, e talvez seja essa particularidade de resultado quantificável que difere os jogos de atividades menos formais como as brincadeiras. O objetivo aqui não é retratar uma gama incansável de autores e autoras que trabalharam para definir os conceitos de jogos, brincadeiras, games, videogames, e afins, mas sim, apresentar a discussão feita ao longo dos anos, e por se tratar de um assunto, não muito conversado na área de arquitetura, explicar o tema aos leitores mais leigos. Procuro neste capítulo conceituar os jogos eletrônicos, e mais especificamente os jogos de computador. Os jogos eletrônicos passaram por uma caracterização recente, Santaella (2014) sugere que o termo na língua portuguesa que mais se aproxima para se referir e designar genericamente os jogos que se desenvolvem seja via computador ou outras plataformas como consoles, dispositivos móveis, seria ‘jogos eletrônicos’. Porém o termo “jogos eletrônicos” podem se tornar amplo e genérico englobando qualquer jogo que se desenvolva por meio de uma máquina, por menor que seja, como um joystick, por exemplo, o Game Boy de 1989.
Figura 1: Primeiro modelo do Game Boy. Fonte: Wikipédia.
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O Game Boy lançado em 21 de abril de 1989 no Japão, foi criado por Gunpei Yokoi e pela Nintendo Research & Development. Trata-se de um console portátil que rodava vários tipos de jogos basta inserindo o cartucho correspondente. O termo videogame, seria o que mais se aproxima do termo que procuramos. Nesteriuk (2002), afirma que o termo videogame serve para se referir genericamente às plataformas diversas em que os jogos eletrônicos podem se desenvolver. Para ele, videogame não é o jogo em si, mas a plataforma, não só no quesito a função quanto a jogabilidade acontecer nesta plataforma, mas também no quesito produção dos jogos. Por exemplo, jogos de console como o jogo The Last of Us (2013) foram feitos para serem jogados em diversas plataformas, como o Playstation 3, o Xbox 360, mas ele foi produzido e programado em um PC (o computador de mesa), no qual também pode ser jogado. Frasca (2001) também utiliza essa generalização feita por Nesteriuk (2002), e neste trabalho usaremos o termo ‘jogos eletrônicos de computador’ para isso, se referir a jogos que acontecem dentro de uma plataforma, a mais utilizada sendo o PC, e que necessita de uma tela para sua visualização (SANTOS, 2010, p. 11). Chris Crawford (1982) classificou jogos de computador como jogos que dependem do auxílio de um computador para serem jogados. O autor destaca cinco plataformas diferentes: máquinas de fliperama (arcades), consoles, computadores pessoais, aparelhos portáteis e mainframes (servidores). Atualmente, poderíamos incluir nessa lista, os dispositivos móveis (celulares e tablets). Essas muitas plataformas, que não o computador, podem ser entendidas como computadores especializados, ou seja, consoles são um tipo de computador menos genérico, focado apenas no entretenimento, pois a lógica de funcionamento dos dois é indistinguível. Crawford afirma que “um jogo é um sistema formal fechado que subjetivamente representa um subconjunto da realidade” (CRAWFORD, 1982, apud AMORIM, 2018, p.28). Como foi visto anteriormente, o autor elenca que um jogo de computador apresenta representação, interação, conflito e segurança. Sua proposta, neste trabalho, foi colocada como definição de jogo no geral, e não como jogo de computador, embora esse fosse o foco de Crawford. Isso foi feito porque sua definição é abrangente e não exclui jogos tradicionais, por exemplo: o xadrez implica um perigo, pois representa uma batalha entre dois reinos, porém é assegurado, pois não há qualquer risco grave em uma partida de xadrez. Os autores Timo Kaukoranta, Jouni Smed e Harri Hakonen no livro de 2003, AI Game Programming Wisdom, no artigo Understanding Pattern Recognition Methods classificam jogos de computador como softwares:
[...] os jogos de computador são um subconjunto dos jogos, tudo o que podemos dizer sobre os jogos, em geral, também se aplica a eles. No entanto, os jogos de computador também são softwares, e, portanto, as lições aprendidas na construção de software podem ser aplicadas a eles. (HAKONEN; SMED, 2003, apud AMORIM, 2018, p. 30). Os autores afirmam que jogos de computador são integração de padrão de projeto de softwares, mais especificamente, possuem elementos que se relacionam entre si que são Modelo-Visu-
alização-Controle (Model-View-Controller). Onde Modelo representa a lógica de aplicação e coordena os processos de um jogo; Visualização é como tudo é apresentado ao jogador, a interface que ilustra a conjuntura do jogo; Controle é a forma como o usuário interage, participa e joga, propriamente dito.
Eles ainda propõem uma lista de características dos jogos como: seu universo, personagens/ jogadores sintéticos (NPCs), a inteligência artificial (IA), o estilo do jogo, etc. E sabendo que existem diversos estilos e categorias de jogo, os autores deixaram a lista em aberto para possíveis futuras alterações, acréscimos e melhorias. Como foi visto, na anteriormente, Costikyan, em seu artigo I have no words & I must desgin, mostra a abrangência dos jogos de computador e afirma que eles podem ser considerados arte:
A arte pode ser alcançada no entretenimento interativo, que tem sido e continuará acontecendo, e obras imponentes de criatividade imaginativa serão continuamente produzidas na área à medida que ele se desenvolve. Mas se você estiver procurando em outro lugar, que não nos jogos, você está procurando no lugar errado. O entretenimento interativo implica o jogo. (COSTIKYAN, 1994, p. 26, tradução nossa)3 Costikyan compara o designer de jogos com outros artistas como pintores, ilustradores, musicistas ou até mesmo escritores. É possível aceitar essa ideia de que o jogo é uma forma de arte, e consequentemente, seu autor ou projetista
3 Citação original: “Art can be achieved in interactive entertainment; it has been, and it will be, and towering works of imaginative creativity will inevitably be produced in the fi eld as it matures. But if you’re looking away from games, you’re looking in the wrong place. Interactive entertainment means games.” (COSTIKYAN, 1994, p. 26) um artista, pois jogos podem manifestar respostas emocionais, ideias, percepções em seus jogadores assim como a arte faz com quem a contempla. Essa ideia de que o jogo é uma forma de arte é ainda uma questão conturbada, cheia de discussões que não analisaremos aqui, mas, para entusiastas como Costikyan, pressupõe-se isto, uma pressuposição, ou seja, vem acompanhada de ‘pode ser’ e não como ‘é’. A questão se o jogo é ou não arte pode ser discutida, mas a questão sobre ser um entretenimento interativo raramente é questionada. Dungeons & Dragons (D&D), o mais famoso dentre os RPGs de mesa, em sua versão tradicional, jogada ao redor de uma mesa utilizando folhas de papel, lápis e dados de muitos lados (12 ou 20 lados) é um exemplo de jogo não eletrônico que tem a narratividade em seu cerne. Consiste em um jogo totalmente voltado para a imaginação dos jogadores, dando vida a personagens fictícios, encenando-os e vivendo aventuras surreais lutando contra dragões, monstros, etc. Ou seja, no jogo tradicional é possível a interatividade total entre os jogadores, os quais imaginam tudo: cenário, personagens, inimigos, etc. Eles são restritos apenas pela própria imaginação pois não estão inseridos dentro de um computador, um software ou um sistema binário que os limita. Salen e Zimmerman (2004) em seu livro Rules of Game, elegeram os quatro pontos que podem ser elencados em jogos de computador em relação aos jogos tradicionais. Levando em conta que a grande quantidade de jogos e estilos de jogos podem fazer com que esses pontos apareçam de formas diferentes nesses vários jogos. Os pontos são: interatividade imediata, porém restrita; manipulação de informações; uso de sistemas com-