ESPAÇOS RESIDUAIS URBANOS ÀS MARGENS DAS INFRAESTRUTURAS DE TRANSPORTE

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ESPAÇOS RESIDUAIS URBANOS às margens das infra-estruturas urbanas de transporte

FAU UFRJ TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO II 2017.1 Julio Lima

Orientadora: Andréa Borde



À mãe Célia que me acompanha todos os dias no meu interior Ao irmão Walter Junior pelas suas críticas construtivas e companheirismo Ao pai Walter pelo oportunidade de trabalho e pela dedicação à família À companheira Marion , pela sua sabedoria, paciência e amor



Agradecimentos Agradeço a todos que de alguma forma me ajudaram na elaboração deste trabalho final de graduação. Em especial a Andréa Borde, pela orientação e discussão sem as quais este trabalho não existiria; Michel Depeyre e Anne Sophie Granjon por terem participado do inicio deste processo, ainda embrionário, na França; Augusto Tumelero, parceiro de trabalho e de muitas idéias construtivas; Justine Rogues pelo apoio e correções na lingua francesa; Miguel Guerra e Yure Romão pelas experiências transdisciplinares; Jean Trindade e Bruno Guimarães pelas vivências na cidade e o grande o apoio nos momentos difíceis; Marion Daloux pelo doce companheirismo e perseverança do começo ao fim deste processo e com quem tenho o privilégio de conviver.


SUMÁRIO i.Introdução

ii. Justificativa iii. Objetivo

iv.Metodologia

15 Vazios Urbanos, Andréa Borde

v. Revisão Bibliográfica

19 Espaços Residuais Urbanos, Joana Pereira 22 Outros conceitos

06 10 11 15

Baixios de viadutos, 26 Daniela Coimbra A cidade de Saint Etienne

vi. Os estudo de casos

Saint Etienne e sua 33 infra estrutura urbana, o trem 38 Quantificação e qualificação : Critério Gerais e reflexão sobre os estacionamentos 40 Mapa de Quantificação e Qualificação

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41 O Percurso Os espaços e seus 42 agentes/usuários/ ocupantes vii. O Caso brasileiro: O BRT Transcarioca no Subúrbio da Cidade do Rio de Janeiro

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viii. O bairro de Madureira

As infraestruturas 54 urbanas do bairro de Madureira. Mapa de 59 Quantificação e Qualificação O Percurso 60 Os espaços e seus agentes/usuários/ 61 ocupantes

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viv. O bairro da Penha

As infraestruturas 67 urbanas do bairro da Penha Mapa de Quantificação e 71 Qualificação O Percurso 76

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Os espaços e seus agentes/usuários/ 72 ocupantes x.Comparação entre os casos

xi. Proposições para o bairro da Penha

89 Análise de uso e ocupação do solo

Diagrama de 114 combinações

Análise de 90 circulação de vias

Análise e Justificativa do 115 programa

91 Identificação das áreas 95 Estratégias urbanas 107 Estratégias arquitetônicas 113

143 146

Quadro tipológico d o s e s p a ç o s 81 residuais urbanos

Tabela de compatibilidade, tempo e custo

Legislação e 125 potenciais jurídicos Programa de uso 127 e ocupação Diretrizes de 129 projeto

xii. Conclusão

Bibliografia e referencias de internet


i- introdução Este trabalho final de graduação de viés teórico-prático tem como objeto de estudo os espaços ditos abandonados, subutilizados, vazios, vagos e residuais da cidade localizados, mais especificadamente, em áreas próximas às grandes vias de circulação. Este trabalho expressa, de forma sintética, uma graduação enriquecedora na qual pudemos desenvolver um pensamento crítico sobre as contradições sociais e as múltiplas possibilidades que o campo da arquitetura e do urbanismo proporciona para a formação de uma nova consciencia urbana. O intercambio em Saint-Etienne, na França, voltado para o Patrimônio e as paisagens culturais complementa esta graduação e integra os estudos de casos deste trabalho final de graduação. Na dinâmica do sistema capitalista que foi se estabelecendo ao longo da história humana os espaços da cidade se tornaram bens de consumo. A pratica consumista contemporânea gera, assim, não apenas resíduos materiais, mas também com o crescimento das cidades, resíduos espaciais, ou espaços residuais.. A partir da revolução industrial, a maneira do homem de se relacionar com a natureza, o

tempo e o espaço mudaram drasticamente. As novas demandas

industriais mudaram as maneiras de produção, de consumo, das artes, da arquitetura e do transporte; trouxeram uma maior concentração demográfica nas cidades; e ,aumentaram exponencialemnte a necessidade do homem, agora "moderno", de se relacionar com o mundo de maneira mais rápida e produtiva. A emergência da velocidade - de troca de informações, de bens, de riquezas, de produtos e de pessoas – leva o homem a traçar grandes vias de circulação destinadas aos meios de transporte que não cessam de se desenvolver. Em pouco tempo – se considerarmos que a primeira locomotiva a vapor foi construída pelo engenheiro inglês Geoge Stempheson em 1814 ( cerca de três décadas depois da revolução industrial inglesa) – as vias passam a se constituir em um sistema próprio, o das infraestruturas urbanas de transporte No século XX, o arquiteto Le Corbusier considera que "Habitar, Trabalhar, Cultivar o Corpo e o Espirito e Circular" são "funções da vida" na cidade, que correspnderiam às necessidades universais do homem. Seus métodos construtivos ligados à industrialização dos materiais geram uma maneira de projetar e construir ligadas à ordem dos quais percebemos até hoje em diversas intervenções urbanas pelas cidades. Ainda que as idéais de Le Coubusier mostrem diretrizes otimistas e progressitas para o bem estar das pessoas na cidade, os métodos modernistas de projeto e construção para as infra-estruturas urbanas de transporte sugere uma ordem, por vezes, impositiva e racionalizada em suas intervenções nos tecidos urbano. 6

1. BORGES, Barsanufo, Ferrovia e Modernidade, pág 2 2.BRITTO, Ana Lucia, A cidade Moderna. Texto in <http://www.ebah.com.br/c ontent/ABAAAeyM8AD/u rb-progressista>


iSobretudo, nos tecidos consolidados onde a inserção de infras-estruturas urbanas de transporte - linhas de trens, viadutos, vias expressas - geram cicatrizes no tecido urbano na medida em que ignoram critérios de contextualização do lugar. Muitas dessas cicatrizes constituem espaços residuais urbanos. Nos anos 1970, estes espaços remanescentes assim como aqueles relegados pelas mudanças operadas no modo de produção industrial passam a se constituir, inovadoramente, em alvo de projetos urbanísticos dos arquitetos e urbanistas europeus.. Embora essa sensibilização tenha grande relevância para a busca de novas soluções, o abandono dessas áreas se mantém como uma das consequências das constantes transformações urbanas. Expõem, assim, duas faces do fenômeno urbano relacionadas às infraestruturas urbanas de transporte: se, por um lado, geram quesitos positivos para a circulação de veículos, de informações, de produtos, de riqueza e dos fluxos; por outro, a sua inserção no tecido urbano desvaloriza e marginaliza lugares na cidade. Neste inicio do século XXI é possível observar uma mudança de consciência dos planejadores urbanos, das organizações sociais ligadas ao potencial de ocupação dos espaços residuais e da vontade de construção de uma nova narrativa para esses espaços "vazios". Este trabalho investigará, assim, esses espaços da cidade: em suas formas, sua origens, seus contextos, assim como exemplos de ocupações, de métodos interventivos e das possibilidades de ação no âmbito da arquitetura e urbanismo. Esta pesquisa busca, a partir de uma revisão conceitual sobre o tema e da compreensão da formação do arquiteto e urbanista como parte fundamental de construção da cidade, definir algumas diretrizes projetuais para intervenção nos espaços residuais às margens das infraestruturas de transporte. Este trabalho tem, assim, como objetivo buscar compreender como esses espaços urbanos podem ser estudados, categorizados e qualificados espaços de promessa, de reunião e de esperança, de tal maneira que sejam objeto de intervenções que não capazes desconsiderem suas identidades, mas que os considerem como expressões da liberdade, da autenticidade e da democracia.

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Casos pelo mundo Durante todo o processo de pesquisa sobre o tema, exemplos de casos pelo mundo serão incorporados como referências de situações diversas para a resolução ou identificação de possibilidades ligadas aos espaços residuais urbanos. Desta maneira, os «CASOS PELO MUNDO» complementam a narrativa deste trabalho dividindo os capítulos afim de melhor integrar o leitor sobre o tema abordado. Ao final deste trabalho incluem-se, como anexos, os textos referentes à cada aos «CASOS PELO MUNDO».

1. Academia de Boxe Cora Garrido, Viaduto do Café, São Paulo - Brasil

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Baixio do viaduto do café, São Paulo, Brasil. PERERIRA, Joana, Espaços Residuais Urbanos, 2011. p171

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ii - Justificativa do tema A inspiração para escolha do tema dessa pesquisa, além do fascínio pelas alternativas viáveis no campo da arquitetura e do urbanismo para a ocupação da rua e da cidade, está nas experiências e na vivência nestes espaços proporcionadas pela musica e arte de rua . Estes espaços fazem parte da nossa vivencia urbana cotidiana, mesmo que, conscientemente, não tenhamos esta percepção. O fato deste tema ainda ser pouco explorado no contexto acadêmico da FAU_UFRJ também atua como motivação complementar para este trabalho. Portanto, aliar as linguagens adquiridas pelas experiências na cidade e o aprendizado da formulação de um trabalho acadêmico se tornam indispensáveis para a conclusão de um processo de formação tão enriquecedor.

iii - Objetivo A intenção principal é desvendar as potencialidades dos lugares marginalizados, abandonados ou subutilizados próximos às grandes infraestruturas urbanas de transporte e mostrar algumas alternativas diferentes de ocupação. Como objetivos secundários, temos a intenção de valorizar a construção de uma paisagem urbana socialmente mais plena a partir dos métodos pesquisados no campo da arquitetura e do urbanismo; e de buscar estabelecer um elo entre as pessoas e os espaços da cidade que seja capaz de permitir a elaboração de dinamicas sociais novas no âmbito contemporâneo..

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iv - Metodologia Para alcançar os objetivos propostos este trabalho parte de uma leitura alternativa - a partir do uso de mapas, análises bibliográficas e ações para esses locais nos quesitos relacionados às ocupações espontâneas, coletivas, possíveis construções e intervenções artísticas – de acordo com uma estratégia de abordagem estruturada em quatro grandes esferas de atuação: (1)Revisão Bibliográfica sobre o tema fundamentando teórica e metodologicamente a abordagem crítica desses espaços urbanos tanto histórica e analítica quanto das assimilação de práticas metodológicas de pesquisa de campo ; (2) Estudos de Casos com análises e levantamento tipológicos dos espaços. Foram determinados três casos para a reflexão do tema proposto: a cidade de Saint Etienne, cidade da região Rhône-Alpes no Sudeste da França; A cidade do Rio de Janeiro em dois trechos urbanos distintos, o primeiro se encontra no bairro de Madureira, e o segundo se encontra no bairro da Penha, ambos na zona norte da cidade. A metodologia utilizada nesta etapa da pesquisa possibilita a descoberta - a partir de percursos estabelecidos às margens de uma infra-estrutura urbana de transporte, do caminhar, da vivência do lugar, da elaboração de mapas de quantificação, de qualificação e de registros fotográficos - dos espaços residuais que se encontram próximos ou muitos próximos às infra-estruturas de transporte urbano. Na cidade de Saint Etienne, França, a linha do trem da cidade e no Rio de Janeiro, o corredor de ônibus BRT Transcarioca. Os critérios de escolha aconteceram de maneira distinta em cada caso escolhido. No caso francês, o critério de escolha ocorreu pela vivência do lugar onde habitei durante um ano, além disso foi a cidade onde essa pesquisa começa com o foco metodológico baseado nos percursos, na quantificação e qualificação dos espaços residuais urbanos. A cidade tem uma relação muito forte com a questão industrial do séc XIX e sua infra-estrutura de transporte, o trem, é um símbolo para cidade, pois é o primeiro caminho de ferro da europa continental. No caso do bairro de Madureira, a escolha é, em parte, similar ao caso francês. A vivência no bairro durante período acadêmico foi muito importante para a escolha dessa região. Foram cerca de três semestres durante o processo de formação trabalhando em análises sobre bairro, projetando arquitetura, entre outros. Para o subúrbio carioca, é inegável que Madureira é o grande centro urbano. Historicamente intenso nas relações culturais do samba e da cultura negra, nas relações de comércio e serviços, e enfim, nas relações de transporte urbano. Além destes fatos, 10


Madureira foi a grande referência sobre os espaços residuais urbanos pela observação de como a dinâmica nos baixios dos viadutos Negrão de Lima e BRT são realmente potentes. No caso do bairro da Penha, a escolha ocorreu, principalmente, por três motivos. O primeiro, é o fato do bairro da Penha ter um caráter "metropolitano" no subúrbio - não como Madureira - mas certamente a intensidade urbana pertinente para se tornar um estudo de caso. O segundo, é a oportunidade de aliar o estudo de caso da Penha à questão do corredor viário BRT, gerando uma linha contínua de estudo na qual engloba os dois bairros, Madureira e Penha. E o terceiro motivo é descobrir cada vez mais as dinâmicas da cidade, ocupando-a, desbravando novos lugares, lançando-se em contextos urbanos diferentes para que o sentimento de viagem não se limite à um processo mercadológico de turismo, mas sim um processo continuo de construção do ser dentro da cidade. (3) a Identificação dos Agentes/Ocupantes/Usuários destes espaços enfatiza o teor social do «encontro» e da «observação» em níveis sociais aplicados. Nsta esfera de atuação a ênfase recai sobre a pesquisa de campo diferentemente das etapas anteriores que foram tratadas de forma gráfica, analítica ou teórica. (4) Proposições, Estratégias Urbanas eArquitetônicas, diretrizes de projeto e suas possíveis aplicações projetuais em um dos estudos de casos. A partir das três etapas a cima pretende-se expor proposições: análises de contexto de uso e ocupação de solo, estratégias urbanas e arquitetônicas, proposições de uso e ocupação de solo, diretrizes de projeto e ocupação para os espaços encontrados no contexto urbano do bairro da Penha.

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Casos pelo mundo 2.Vila Olimpica do Encantado, Encantado, Rio de Janeiro - Brasil

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Vila OlĂ­mpica do Encantado: Imagens capturadas pelo autor


v-Revisão Bibliográfica No intuito do aprimoramento sobre o conhecimento acadêmico em relação aos procedimentos de pesquisa e fundamentação, é necessário, primeiramente, buscar as referencias conceituais sobre o tema abordado. Embora expositiva, a base teórica aliada às vivências nesses espaços, em alguns contextos diferentes, tem como intenção mostrar caminhos metodológicos teórico-práticos, referenciais projetuais e possíveis soluções em nível teórico e projetual para as ações possíveis sobre os espaços urbanos aqui estudados. A primeira indagação que encontramos é: O que são os espaços residuais urbanos? Para tentar responder essa questão, a pesquisa sobre o tema abordará três trabalhos acadêmicos que formam um fio condutor para essa pesquisa. VAZIOS URBANOS A principal referencia bibliográfica relacionada ao conceito de vazios urbanos é a pesquisadora Andréa Borde (2003) que inicia seu trabalho afirmando que "a primeira impressão que os vazios urbanos da grande cidade nos causa, em nossos percursos cotidianos, é de um certo estranhamento".3 Esses percursos ocorreram no bairro onde a concentração de pessoas e os fluxos da cidade acontecem de maneira intensa e vezes caótica, a região central. Além disso, Borde caracteriza os vazios urbanos como os espaços que "(..) ora nos despertam sonhos de novas estruturas urbanas, ora a sensação de que devemos evitá-los em nossos trajetos."4 E que são por consequencia os "Produtos dos processos de urbanização, mas também da ausêcia de planejamento e de características específicas a cada um deles, (...)".5 Borde complementa assinalando que essas áreas obsoletas da cidade são "(...) destituídas de sua função original, do seu conteúdo social, as áreas (...) se transformam em vazios urbanos."6 O termo vazio urbano mostra uma grande abrangência dentro dos aspectos de observação e identificação destes fenômenos urbanos. Para Borde, "(...) a ampliação do debate passa, necessariamente, pela revisão conceitual, por definições mais precisas que articulem as características de cada situação de vazio urbano às diferentes dimensões do fenômenourbano. (...) pela abrangência conceitual do tema e a inexistênciade um corpo teórico sólido sobre vazios urbanos"7

3. BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p1 4. Idem 5. Idem 6. Idem 7. BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p1

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Sua leitura sobre os vazios urbanos acontece em quatro etapas principais. São elas: os fundamentos teórico-metodológicos no qual a revisão analítica percorre o levantamento bibliográfico, a realização da revisão conceitual e a observação empírica. A segunda etapa consiste na contextualização dos vazios da cidade do Rio de Janeiro configurada em uma análise preliminar em escala urbana com o objetivo de mapear as principais categorias dos vazios urbanos. A terceira é o aprofundamento histórico de formação e transformação dos vazios urbanos na área urbana central da cidade associadas às intervenções urbanas na região durante o século XX. A quarta, e última etapa, representa a análise da configuração atual da Avenida Presidente Vargas a partir da sua contrução em 1940 onde Borde constata a manifestação desses vazios urbanos como consequência do projeto de intervenção e as possibilidades de transformação e a elaboração de um inventário dessas circunstâncias de vazios urbanos a partir de plantas, mapas do contexto, análises de uso e ocupação, mapas de evolução urbana, cortes urbanos, maquetes eletônicas, entre outros. Sobre as origens desse fenômeno, Borde constata que: "O vazio torna-se uma categoria inquietante no contexto da vida urbana, a partir de meados do século XIX, quando passa a ser associado ao esvaziado.. Momento em que as condições urbanas das grandes cidades, como Londres e Paris, se agravam com o crescimento físico e 9

populacional, e atingem dimensões metropolitanas." O vazio urbano é, portanto, um fenômeno urbano expressivo na cidade contemporânea de origens modernas marcada pelas conseqüencias das mudanças operadas nas estruturas produtivas, nos fluxos de informações e de pessoas e da necessidade de implementação cada vez mais contundente de projetos de estruturas urbanas viárias de alta velocidade. Na análise da literatura produzida sobre o tema, Borde demonstra a existência de uma vasta nuance de conceitos ligados a este fenômeno na cidade: "Vazio, vacante, vago, baldio, abandonado desocupado e subutilizado qualificam a natureza e a qualidade de lugares - terrenos e edifícios - em situação de vazio urbano. (...) tierras vacantes, vacíos urbanos e terrenos baldíos, em espanhol; wastelands, derelict land, em inglês; e terrain 10

vague e frîches urbaines, em francês."

8.BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Vazios urbanos: Perspectivas contemporâneas, 2006. 9.BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Vazios urbanos: perspectivas contemporâneas, 2006, p 5 nota: Borde afirma que esse fenomeno, porém, começa a se transformar em algo significativo e despertar estudos no campo do urbanismo, a partir dos meados da década de 1970, onde ocorrera uma crise estrutural do sistema produtivo. 10.BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p4

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Neste sentido, ao passo que exite esta multiplicidade das terminologias que exploram a evidência desse fenômeno urbano, Borde pondera que "também contribuem para uma imprecisão que dificulta a sua própria compreensão. Essa diversidade pode ser atribuída não apenas ao campo de vazios urbanos que podem ser 11

encontradas nas distintas cidaades e pasises."

Portanto, os vazios urbanos assinalados por Borde podem ser caracterizados como a grande esfera deste fenomêno urbano. Espaços construídos ou não, abandonados, subutilizados, vagos, com nenhuma ou poucas funções sociais. Em suma, é todo espaço urbano na cidade que não cumpre suas capacidades ocupacionais, sociais, legais, etc. Borde enumera em quatro itens gerais como esses vazios urbanos estão inseridos na cidade. "a) o grau de consolidação da área onde está inserido - vazios urbanos localizados em áreas consolidada infra-estrutura x vazios urbanos localizados em áreas de expansão periférica b) os usos e atividades - espaços sem utilização x espaços ocupados por infra-estrutura obsoletas c) dimensão - rual de grandes dimensões x lotes de pequenoas dimensões inseridos na malha urbana d) processo de urbanização - vazios urbanos constituídos por áreas resultantes dos impactos de 12 grandes projetos x áreas que se mantém vazias em razão da sua própria história urbana " Tal enumeração se torna importante no sentido de promover uma clareza sobre os possíveis tipos encontrados nos percursos da cidade a partir da leitura do fenômeno sobre os seus aspectos em níveis históricos, dimensionais, ocupacionais e contextuais urbanos. Borde disserta que a abrangência do tema transcorre não apenas nos campos conceituais. Outras categorias deste fenômeno urbano podem ser identificadas a partir de outras abordagens de estudo e atuação. "Além dos estudos que tratam das questões conceituais, existem aqueles que enfocam o processo de formação dos vazios, o centro de interesse não é o debate sobre os vazios, mas as ações de 13

renovação urbana e seu impacto na forma urbana."

11. Idem 12.BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p14 13.BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p7

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imagem 1: vazios na Avenida Presidente Vargas. BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Vazios urbanos: perspectivas contemporâneas, 2006, p 28 Imagem 2: vazios na ilha universitária do Fundão. BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Vazios urbanos: perspectivas contemporâneas, 2006, p 31 Imagens 3 e 4: Sede do IBGE,em São Cristóvão e sede do Jornal do Brasil, no bairro do Caju BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Vazios urbanos: perspectivas contemporâneas, 2006, p 84

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"(...)Pensando nos significados urbanos, Ferrara trata não dos vazios urbanos, mas dos espaços residuais. Espaços que seriam conformados ao longo do permaente processo de construção e reconstrução da cidade e que se expressariam como cicratrizes do que foi destruído e não foi possível reconstruir totalmente. Espaços que surgem como "uma descontinuidade, um vazio a preencher de informação e de novos usos"(...)

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Esses espaços ditos residuais, para Borde, compõem uma escala de vazio urbano que está relacionada com a escala do habitante, diferentemente das grandes áreas urbanas abandonadas na cidade. Ou seja, os espaços residuais urbanos fazem parte de uma categoria dentro deste fenômeno chamado vazio urbano. ESPAÇOS RESIDUAIS URBANOS Joana Pereira (2011) enfoca em sua pesquisa os espaços residuais para os quais propõe soluções sobre os espaços residuais urbanos em quatro fases de estudo apos uma abordagem teórica inicial. A primeira baseia-se na leitura histórica da cidade em dois contextos distintos: Europa e América Latina e como occoreu o processo de desenvolvimento urbano nesses dois contextos culturais "distintos" a partir dos olhares e das mudanças trazidas pelo movimento moderno relacionando-os às questões de mobilidade e trasporte "(...) de modo a entender as mega-estruturas. Entender como a partir da época da apologia da mobilidade, e do automóvel como actor principal das cidades industriais, se desenvolveu uma visão de cidade homogénea e consequentemente se formaram estes espaços “esquecidos”, pois na realidade a cidade contemporânea é fragmentada."15 Na segunda fase, o objeto de estudo são "os espaços residuais urbanos" sobre os quais a pesquisa se debruça nos conceitos que possam ajudar a defir esse tipo de espaço urbano. De maneira expositiva e reflexiva, Pereira aborda conceitos anteriores ao trabalho elaborado tais como: 'thirdspace' de Edward Soja, 'terrain vague' de Solà-Morales, junkspaces de Rem Koolhas, assim como exemplos de outros trabalhos sobre o tema como Post-it City, Espaços Colaterais, PKMN Studio ou Recetas Urbanas.

14. BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa, Percorrendo os vazios urbanos, PROURB/FAU/UFRJ, X Congresso Nacinal do Anpur, 2003. p7 cita FERRARA DOS SANTOS, C. Nelson (1986). Preservar não é tombar, renovar não é por tudo a baixo. Revista Projeto S. Paulo: Projetos Editores, nº86, abril; 15. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .23 cita SOLÀ-MORALES, Ignasi, Territorios, 2002, p. 79

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Pereira cita para justificar a vontade da mundança de olhar e consciência sobre esses espaços. "Porque o urbano parece visualizar-se de maneira primordial neste tipo de paisagens? Porque há uma sensibilidade paisagística, (...), que faz esta natureza artificial repleta de surpresas, de limites imprecisos, carente de formas fortes que representam o poder?”16 "É através deste olhar que se pretende despertar uma consciência paisagística na observação dos espaços residuais, ao mesmo tempo que uma consciência sensibilizadora acerca do que é potencial, do que é prejudicial e de como podemos agir,"17 Na terceira fase, a pesquisa debruça-se sobre estudos de casos gerais e sobre "Os baixios de viadutos", mostrando alguns exemplos de intervenções pelo mundo analisando quesitos formais e informais dos espaços estudados. O desfecho desta fase é a análise de dois exemplos de intervenção nos baixios de viadutos. A primeira análise é feita sobre o projeto do NL Architects em Koog aan de Zaan, Zaanstad, Holanda e a segunda análise é feita sobre a Academia de box e biblioteca Cora Garrido, em São Paulo, Brasil. Em uma análise crítica sobre as infraestruturas urbanas de transporte como os viadutos, Pereira cita Boere: "Ostentosas e débeis ao mesmo tempo, estas infraestruturas convertem-se muitas vezes no síbolo de uma modernização incapaz de se adaptar às mutações em curso"18 Pereira constata que: «Quanto mais crescente a cidade se desenvolve maior é a utilização das grandesvias de infraestutura Urbana. Assim, a relação direta entre os espaços residuais e redes de comunicação»19 Para Pereira as possibilidades de intervenção nestes locais devem ter aspectos de caráter múltiplo e paradigmática. "Intervir nestes espaços, extremamente fragmentados e incoerentes, requer uma visão alargada e multidisciplinar, sobretudo desprendida dos cânones tradicionalistas, Assim, as intervensões passam normalmente por trazer atividades urbanas que contribuem para a vida na rua."20 É importante sublinhar que em seu discurso propositivo, Pereira utiliza os baixios de viadutos como o grande referencial do fenômeno chamado espaço resisual urbano, atrelando a este um caráter potencialmente de uso público. 16. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011.p19 cita SOLÀ-16. MORALES, Ignasi, Territorios, 2002, p. 79 17. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .25 18. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .147 cita BOERE, Stefano, Mutaciones, 2000 19. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .147 20.PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .149

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imagem 1: Planta de situação do trecho de intervenção na cidade de Coimbra, Portugal. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .188 imagem 2,3 e 4: simulações das intervenções nos baixios dos viadutos da região PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .218,p.219,p.221

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Na parte final de seu trabalho, Pereira demonstra um caráter prático e propositivo para os espaços encontrados nos baixios de viadutos das vias de acesso à Ponte Rainha Isabel às margens do rio Mondego em Coimbra, Portugal. Nesta etapa, assim como a pesquisa de Borde, Pereira utiliza alguns mapas de localização do terreno e análises programáticas das intervenções a partir dos fundamentos anteriormente estudados. Além disso, algumas simulações em fotomontagem são exploradas para elucidar suas idéias interventivas. Pereira explicita a identidade vacante e imprecisa como características dos espaços residuais urbanos "Nem sempre o que é estritamente necessário para um lugar é uma intervenção formalizada. O importante é trazer gente para a rua, através de pontos de encontro qualificados, longe dos inúmeros preconceitos, tendo em conta que a vigilância e segurança das ruas são mantidas pelo 21 olhar informal dos seus utentes." PARA ALÉM DOS VAZIOS URBANOS E ESPAÇOS RESIDUAIS Tanto nas análises teóricas de Borde quanto nos estudos conceituais de Pereira, é evidente a convergência entre algumas referências bibliográficas e conceitos sobre o tema, tais como o terrain vague de Solà Morales e o junkspace de Rem Koolhas, formando assim outras duas refêrencias para a leitura desses espaços. Além dos conceitos abordados pelas pesquisas de Borde e Pereira, este trabalho insere, de maneira expositiva um conceito cujo significado cria uma abertura para novas leituras e possibilidades para a compreensão dos espaços residuais urbanos. É o conceito de friches industriais estabelecido no contexto francês para designar espaços industriais abandonados. Os friches industriais surgiram a partir da analogia do conceito "friche sociale" estabelecido pelo 22 geógrafo Jean Labasse para compreender à descentralização industrial ocorrida na década de 1960. de sua época. Segundo o Serviço técnico de urbanismo francês o termo friche "é usado geralmente para designar «um espaço, construído ou não, desocupado ou muito sem utilização; antes ocupado por atividades industriais ou outras atividades ligadas à indústria. A reinserção deste espaço no mercado imobiliário, independente do seu uso, implicará num novo planejamento, salvo a utilização precária ou provisória."" Percorrendo sobre os conceitos, o termo Junkspace aparece na pesquisa de Borde como uma das dimensões políticas para o fenômeno do vazio urbano. Segundo Koolhas o Junkspace (ou espació basura) seria "A soma das decisões não tomadas, dos problemas não afrontados, das opções não elegidas, das prioridades deixadas sem definir, das contradições perpetuadas, dos 24 compromissos adotados, da corrupção tolerada" 21. PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços Residuais Urbanos, Coimbra, 2011 p .191 22.MENDONÇA, Adalton, Ensaio sobre friches urbaines Artigo retirado in <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/02.014/869> 23.SEPROREP/STU: L'Enjeu Friche Industrielle,1989, p.11. 24.BORDE, Percorrendo vazios urbanos, p4 cita KOOLHAS, Rem (2001). Espació basura: de la modernización y sus secuelas. Arquitectura viva 74. p.23

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Pereira completa citando-o: “Se o lixo espacial são os resíduos humanos que conspurcam o universo, o espaço-lixo é o resíduo que a Humanidade deixa sobre o planeta. O produto construído (...) da modernização (...) é (...) o espaço-lixo. (...) é o que resta depois da modernização seguir o seu curso, ou mais concretamente o que se coagula enquanto a modernização está em marcha, o seu resíduo”(...)25 “Nota para os arquitectos: pensávamos que podíamos ignorar o espaço-lixo, visitá-lo às escondidas, tratá-lo com desdém condescendente ou desfrutá-lo indirectamente... como não podíamos entendê-los, deixamos fora as chaves...”25 Para Borde, Solà Morales (1996,1998) e o Terrain Vague fazem parte dos grandes marcos teóricos sobre o tema "vazios urbanos". Esclarecendo suas leituras paradigmáticas dentro do seu tempo, ela ratifica suas leituras sobre essa categoria do fenômeno urbano junto à dualidade que esses espaços vagos carregam simbologicamente para cidade. "(...) Ao analisar os diferentes elementos da cidade contemporânea, observou que as recentes mudanças no sistema urbano teriam produzidos uma inflexão no processo de formação continuada de vazios urbanos, iniciado duas décadas antes, que se traduziria em uma transformação na significação simbólica: não mais vazio urbano, mas terrain vague, ausência e 27

oportunidade, memória e transformação."

Acrescentando que para Joan Busquets "a fotografia seria o melhor recurso para a compreensão dos atributos reais e potenciais dos terrenos vazios das áreas centrais pela capacidade que esta manifestação artística apresentaria de ressaltar, os contrastes e tensões latentes nos terrains vagues."28 Pereira, sobre o terrain vague, expressa essa perspectiva aberta e esperançosa que o conceito carrega afirmando: "Pode então dizer-se que, o terrain vague não só liberta a mente para as memórias do passado, como permite uma observação positiva e estimulante perante estas situações urbanísticas, geralmente tidas como negativas, problemáticas ou simplesmente desconhecidas. Neste sentido, espaços e situações que povoam a cidade e aos quais, genericamente, se denominam 29

terrainvague despertam um interesse crescente e até uma certa paixão."

"Os artistas, os vizinhos e os cidadãos desencantados da vida nervosa e imparável da grande cidade sentem-se profundamente contrariados. Aqueles terrain vague parecem ser os melhores lugares da sua identidade, do seu encontro entre presente e passado, ao mesmo tempo que se apresentam como o único reduto incontaminado para exercer a liberdade individual ou a de pequenos grupos”.30 25. PEREIRA, Espaços residuais urbanos, p. 109 cita KOOLHAAS, Rem, Três textos sobre a cidade, 2010, p.69 26. PEREIRA, Espaços residuais urbanos, p. 111 cita KOOLHAAS, Rem, Três textos sobre a cidade, 2010, p.69 27. BORDE, Vazios Urbanos, p.28 28. BORDE, Percorrendo vazios urbanos, p6 cita BUSQUETS, Joan (1996). Nuevos fenómenos urbanos y nuevo tipo de poyeto urbanístico. Barcelona : Confrés UIA 96. p 280 29. PEREIRA, Espaços residuais urbanos, p. 101 30. PEREIRA, Espaços residuais urbanos, p. 101 cita SOLÀ-MORALES, Ignasi, Territorios, 2002, p. 103

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imagem1: Mouvement. Du terrain vague au dance floor, 1984–89 imagem 2: Mouvement. Du terrain vague au dance floor, 1984–89 imagem 3 e 4: cenas da série Netflix « The Get Down»

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imagem 1: zona industrial da cidadede Lille no início do século XX Imagem 2: a mesma zona industrial da cidadede Lille atualmente imagens retiradas do programa «C’est déjà demain» in: <youtube.com>

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Nesse sentido, é importante sublinhar a importância de uma investigação sobre os agentes e ocupantes desses espaços da cidade. Um exemplo notável deste fenômeno explicitado por Solà Morales é o cenário da cidade de Nova Iorque no final da década de 198031, especificadamente no bairro do Bronx onde os terrenos vazios urbanos ou terrains vagues eram locais que incitavam o encontro da jovem cultura negra local, o que se tornaria anos depois o grande movimento cultural chamado de Hip Hop32. O Hip Hop ou a cultura de ruas é assemblagem de quatro pilares de expressão artística da cultura negra. O primeiro pilar, conduzido pela poesia, chamada de RAP ( Rithim and poetic), e comandado pelos mestres de cerimônia (MCs). Em seguida a música, orquestrada pelos DJs ( Disk jokers) com o papel de pesquisa e reafirmação, a partir de seus discos e da repetição das batidas, da identidade musical dessa conjuntura. O terceiro pilar é a expressão do corpo pela dança chamada de break dance. Os B-boys e B-girls usam a expressão para criar movimentos rítmicos versáteis e inovadores a partir de refêrencias diversas como a disco-music da época, dos movimentos das artes marciais chinesas como o kung-fu e das danças africanas herdadas de suas origens diaspóricas. Por fim, o último pilar, a expressão gráfica chamada de grafitti. Os grafittis são intervensões em muros, paredes, vagões de trem, ônibus ou carros com suas tipografias próprias buscando uma certa marcação de território pela cidade. Neste cenário tão fértil para a expressão artística em que os espaços vazios da cidade acabam tornado-se palco para a convergência e troca entre esses grupos, o HIP HOP é efim, concebido. O BAIXIO DE VIADUTO No contexto brasileiro, mais precisamente no contexto carioca, a pesquisa de Daniela Coimbra 33 (2013) busca de maneira investigativa e empírica a descoberta desses agentes culturais no contexto do bairro de Madureira, onde os espaços residuais no baixio do Viaduto Negrão de Lima se configuraram em um exemplo desse empoderamento da cultura de rua e da música negra com o Baile Charme e a CUFA. "Os viadutos são elementos da infraestrutura viária que na maioria das situações não estão associados com o tecido da cidade em que estão inseridos, funcionando como grandes desestruturadores da paisagem urbana. A partir dessas características esses elementos proporcionam o surgimento de áreas subutilizadas e marginais que atuam negativamente no cotidiano da cidade, são esses resíduos de espaços, esses espaços residuais, verdadeiras sobras do que foi planejado, e que atualmente não tem uma função específica."34 31. nota: Referencias iconográficas do livro Mouvement. Du terrain vague au dance floor, 1984-89 de Yoshi Omori, 2014 32. nota: Ver série documental original Netflix: "HIP HOP Revolution" 33. COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana, UFRJ / FAU, 2013. 34.COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana, UFRJ / FAU, 2013.p1

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Coimbra afirma a partir da Carta Basileira da Paisagem que: "a paisagem e o seu papel coletivo, as relações entre a paisagem e a população: paisagens culturais brasileiras. Todas as citações levantadas traduzem que construir cidades melhores significa transformação dos nossos espaços, a partir dessa interpretação entende-se atuação do profissional além do que se imagina ser a ótica ecológica. Resiliência urbana, transformação do espaço, repensar o lugar seriam para Coimbra estratégias para cultivar na cidade o espaço, por excelência, da garantia de direitos e inovações sociais. Essa premissa possibilita a criação de paisagens urbanas que interagem com as relações humanas e que são reflexo das ações sociais e culturais."35 Em sua pesquisa Coimbra utiliza métodos diferentes para a investigação como observadora destes espaços e seus ocupantes. Utilizando o termo "vivência do lugar", a autora usa Zeisel como referência metodológica para sua qualidade metodológicas: "A observação empática foi a qualidade metodológica presente neste trabalho, pois durante todo o processo de analise havia uma grande tendência a sentir o que sentiria caso estivesse na situação e circunstâncias experimentadas pelas outras pessoas observadas. Todo o processo de observação foi pautado em se colocar no lugar do outro, em pensar no outro." Na observação reconhecida o pesquisador é reconhecido como tal, e os outros membros da situação têm ciência de sua presença e atividade. Ser reconhecida como observadora, algumas vezes, fez com que os observados (as) não agissem de maneira natural, o modo como eles ou elas freqüentemente agem em determinadas situações e sim damaneira “politicamente correta” ou como eles desejam ser visto pelos outros. Por outro lado esse tipo de observação faz com que as pessoas se sintam à vontade para fazer alguma observação, reclamação, pedido ou comentários diversos que julgam importantes. Na participação marginal o pesquisador se coloca como simples participante de determinada situação agindo naturalmente, os outros participantes reais podem vê-lo, 36

mas acreditam ser apenas mais ummembro daquela situação cotidiana."

35. COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU, 2013.p8 cita ZEISEL, 1981, p.117, tradução pela autora 36. COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU, 2013.p13

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Coimbra desenvolve seu trabalho em quatro capítulos. De maneira mais objetiva que reflexiva, visto seu trabalho de ênfase prática, ela começa o estudo identificando o objeto aliando às dimensões jurídicas e possibilidades relacionadas aos conceitos de sustentabilidade social e cultural da paisagem. Após, o estudo desenvolve a metodologia para a investigação sobre o objeto escolhido (O viaduto Negrão de Lima em Madureira, Rio de Janeiro) a partir de uma revisão bibliográfica, a vivencia do lugar, entrevistas e referências projetuais. O terceiro capítulo se encarrega das análises do contexto urbano com o uso de mapas de localização, contexto, situação, assim como o histórico do bairro e, enfim, o trecho estudado, os baixios do viaduto Negrão de Lima. Na ultima parte de seu trabalho, Coimbra cria um projeto de requalificação para os espaços sob o viaduto com o uso de diagramas, diretrizes, plano geral de intervenção, cortes do local e plantas.

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p70

Imagem 1 : Planta baixa do projeto no baixio do viaduto Negrão de Lima. COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU, 2013.p70 Imagem 2 : Corte do projeto no baixio do viaduto Negrão de Lima. COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: espaços residuais da infraestrutura viária e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU, 2013.p76

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casos pelo mundo 3.O projeto A8erna, Koogaan de Zaan - Holanda :

Projeto A8erna, Holanda Imagens retiradas em : COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrรฃo de Lima: espaรงos residuais da infraestrutura viรกria e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU. p19


vi - Os estudos de casos O objetivo deste capítulo é construir, a partir de um percurso predeterminado, um levantamento geral, onde possamos quantificar e qualificar a presença dos espaços residuais que estão diretamente ligados, ou muito próximos, à linha do trem de Saint Etienne Chateaucreux - Bellevue e do corredor BRT Transcarioca nos trechos dos Bairros de Madureira e Penha, na cidade do Rio de Janeiro. "Registrar atividades sobre plantas, diagramas ou mapas é particularmente conveniente se pesquisadores querem observar e analisar várias pessoas em uma área em geral, ao mesmo tempo [...]. Olhar para o comportamento registrado em mapas pode proporcionar aos investigadores uma melhor noção de como um lugar inteiro é usado de uma só vez, do que olhar para tabelas estatísticas. Se os investigadores querem precisar a localização física dos dados, eles podem construir mapas base com informações correspondentes aos elementos regulares na configuração atual, como tipos de piso ou colunas"37 A importância da quantificação e da qualificação desses espaços é criar uma relação de investigação de campo na pesquisa, afim de misturar as bases teóricas e a leitura do cotidiano da cidade como uma prática de uso da cidade. Analisar e registrar o estudo de caso através de mapas é essencial para identificar trechos de áreas e suas atividades principais, uma vez que não havia mapas ou plantas específicas que mostrassem os espaços residuais e suas posições geográficas na cidade. Além dos estudos quantitativos, qualitativos e tipológicos, neste capítulo faremos um breve estudo histórico das regiões estudadas afim de compreender ou esclarecer algumas dúvidas sobre o processo de construção e crescimento urbano dos locais estudados. Desse modo, o capítulo transcorrerá em três etapas fundamentais. Serão Elas: A apresentação do contexto urbano estudado com seu breve histórico de desenvolvimento urbano a partir da infra-estrutura urbana de transporte, o percurso de quantificação e qualificação dos espaços às proximidades dessa infraestrutura, assim como a observação dos tipos de espaços e enfim os espaços e seus agentes, ocupantes e usuários. Este ultimo quesito tem como objetivo entender quais maneiras de organização social, de ocupação ou de projeto podem auxiliar na 37.COIMBRA, Danielle, Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: Espaços Residuais da Infraestrutura Viária e Paisagem Urbana, UFRJ, 2013.

compreensão e tratamento dos espaços residuais, pois, no fim, o arquiteto tem um grande valor político para a construção da cidade e precisa relacionar-se diretamente com ela e os agentes não formados no campo de domínio técnico construtivo. Assim, deve-se entender que a leitura social é muito importante para descobrir os caminhos possíveis de uma nova abordagem ou da reafirmação do

citação de ZEISEL, Inquiry by design, 1981, p.122, fazer arquitetura e urbanismo.

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A cidade de Saint Etienne, França Saint-Etienne é uma cidade localizada na região Rhône-Alpes, departamento 42, França na qual cerca de 174.566 habitantes (censo nacional de 2010) se distribuem por seus oitenta quilômetros . Por muito tempo conhecida como a cidade francesa "da arma, da bicicleta e da tira (tecido)" - atividades consagradas no Museu de Arte e Industria da cidade - foi também um centro importante de extração de carvão, representado pelo grande "Musée de la mine". A INFRAESTRUTURA URBANA DE TRANSPORTE, O TREM A cidade de Saint-Etienne se torna no começo do século XIX a mina de carvão mais importante de França. O engenheiro Beaunier propôs a construção de uma "via férrea" entre Saint-Etienne e Andrézieux, municipalidade pequena das extremidades da região Loire, para facilitar a evacuação do carvão até a região de Paris. No dia 5 de maio de 1821, o governo francês recebe um pedido de licença para a construção de uma linha ferroviária de Saint Etienne Andrezieux. Concluída em Julho de 1827, esta linha de vinte quilômetros permite o transporte de carvão das minas de St. Etienne, às margens do rio Loire, até Andrézieux onde é embarcado em grandes barcos de fundo chato, chamados de "rambertes." Saint Etienne Andrézieux é, assim, a primeira linha de via férrea da Europa continental. Em 1832, outro passo importante para o crescimento da cidade foi a construção da linha férrea Saint-Etiene/ Lyon. Marc Seguin foi o responsável pela construção desta linha férrea cuja rota de 57 km facilitou o transporte do carvão e dos produtos industriais desta área mineira importante. Antes da década de 1850, Saint-Etienne não tinha estação principal, mas várias estações menores pertencentes a diferentes empresas ferroviárias. Durante a fusão dessas empresas, foi prevista a construção de uma nova estação central. Devido à retificação das primeiras ferrovias da França e ao aumento do fervor do público foi construída a estação Châteaucreux combinando viajantes, produtos e máquinas de depósito. Em 1857, a estação foi colocada em serviço pela companhia "Grand-Central de France" e até hoje é a principal estação ferroviária da cidade, juntamente com as estações Carnot e Bellevue. No mesmo ano, foi construída outra importante estação para a cidade de Saint Etienne, a estação Bellevue. A estação tem uma relação mais doméstica com as dinâmicas sociais da cidade. Ela se encontra próximo à praça Bellevue, onde existe ligações com comércio local, edifícios (antigos e modernos) de habitação e transporte rodoviário, diferentemente da isolada estação Chateacreaux. 30


Não menos importante - embora mais recente - para os estudos dessa pesquisa, a estação Carnot se encontra entre as duas estações já mencionadas anteriormente. Inaugurada em 1980, a estação Carnot foi construída para amenizar o intenso tráfego da estação Châteaucreux. A sua localização no centro da cidade e seu fácil acesso ao transporte público lhe rendeu sucesso rápido. Comandado pelo arquiteto Mr. Beyet, a característica especial para sua construção foi sua realização em um viaduto. Todas essas estações estão sobre a linha férrea de " Saint-Georges-d'Aurac à SaintÉtienne-Châteaucreux", inaugurada em 1890. A linha de Saint-Georges-d'Aurac Saint-Étienne-Châteaucreux faz parte de uma "rota Bordeaux – Lyon” datada e concedida por decreto imperial em 1853. É evidente que a cidade de Saint-Etienne passou por um vasto programa de desenvolvimento e mudança durante sua história. A cidade passou também por uma renovação urbana para transitar da fase de cidade industrial, herdada do século XIX, para a fase de "capital do design" do século XXI. Saint Etienne tem grande importância histórica para o desenvolvimento econômico e produtivo da França no século XIX, ou seja, o processo de modernização do país passa por Saint- Etienne.

Imagem retirada do Google Earth. Localização da Cidade de Saint Etienne, Sudeste Francês

31


a cidade de Saint Etienne

CARNOT

CHATÊACREAUX

BELLEVUE 0km

1km

Imagem retirada do Google Earth. Cidade de Saint Etienne

32

2 km


A estação Chateaucreux é a estação principal da cidade. Ela se conecta a cidades como Lyon, Montbrison, Roanne, Le Puy, Paris, etc. A estação representa uma entrada e uma saída da cidade, criando em si um caráter metropolitano na região onde se encontra. No contexto observado, é visível um crescimento da cidade em termos de altura dos edifícios. É clara a presença de edifícios modernos e contemporâneos de alto gabarito, mas também alguns pequenos edifícios mais antigos, como ecléticos, artdéco, etc. A estação de Bellevue é outra referência para a cidade, pois assim como a estação Chateaucreux, exerce uma enorme concentração de funções para o transporte público da cidade. Na estação se concentra duas paradas de tram-way ou VLT. É também ponto final de diversas linhas de ônibus, contém muita concentração de pessoas em todos os horários do dia, além de ser um contexto urbano de muito comércio e serviços da cidade, como bancos, mercados, bares, tabacarias, etc. Entre as duas extremidades, Chateaucreux e Bellevue, encontra-se outra importante parada de trem, a estação Carnot. A estação Carnot tem muita importância urbana, pois está localizada numa região centralizada da cidade. A estação fica em cima das linhas de tram-way, pontos de ônibus, além de ter um certo caráter gravitacional urbano por causa dos fluxos, tanto de veículos, transporte público, quanto, obviamente, de pessoas. O lugar ganha também um grande potencial de encontro entre as pessoas em consequencia de sua enorme praça de mesmo nome, serviços urbanos importantes como a escola de designer e arte ( la Cité do design), uma igreja, bares, escolas primárias. Foram encontrados vinte e três espaços no trajeto de oito quilômetros entre a estação Châteaucreux e Bellevue. O raio de ação para o registro dos espaços residuais não se extendeu mais do que 100 metros da linha do trem. Foi observado que no meio urbano próximo à estação Carnot temos uma maior concentração de espaços residuais urbanos nas condições de aparente desuso ou abandono, entretanto existem também graves situações nas proximidades da estação Bellevue.

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Imagem 1 : Processo de crescimento das linhas férreas Francesas, de 1937 à 1956. imagem 2 (em cima à direita) : Estação de trem Bellevue em Saint Etienne. Data da foto desconhecida. Imagem 3 (embaixo à esquerda): Estação principal da cidade, Chateaucreux. Imagem 4 : Estação de trem Carnot, a mais recente entre as três estações principais da cidade.

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Quantificação e qualificação dos espaços residuais Critérios gerais da quantificação e qualificação e reflexão sobre os espaços ocupados por veículos (estacionamentos como espaços residuais da cidade): Neste tópico abordaremos os critérios gerais adotados para a quantificação e qualificação dos espaços residuais nos estudos de casos da cidade de Saint Etienne e nos bairros de Madureira e Penha, nos quais se ratifica a crítica à ocupação dos espaços vagos da cidade pelos automóveis. Tem-se como objetivo entrelaçar as características da manifestação desses espaços dados os contextos diferentes. «Nos tempos que correm vê-se, cada vez mais, a substituição da rua por estacionamentos e coberturas de edifícios enterrados (garagens, armazéns, galerias) ou linhas de metro, que deixam de permitir o uso daquele lugar como espaço público. Como este tem sido o caminho da evolução urbana, é relevante propiciar lugares de convívio e espaços públicos qualificados nas 38

áreas residuais e vagas que tanto pontuam as nossas cidades.»

«(...) grandes vazios urbanos utilizados como estacionamentos nas áreas centrais dos bairros que atuam, tal como nas demais áreas da cidade, como estoque de especulação imobiliária.(...)Outras situações de vazio urbano encontradas no Rio de Janeiro são aquelas prefiguradas por espaços residuais, intersticiais, como pequenos edifícios desocupados em graus diferenciados de deteriorização e terrenos baldios inseridos na trama das quadras; grandes lotes vazios utilizados como estacionamentos nas áreas centrais; edifícios públicos abandonados; grandes estruturas cujo processo de construção foi interrompido(...)»39 A segunda etapa constitui na elaboração do mapa geral de quantificação dos espaços residuais encontrados ao longo da linha da infraestrutura. Durante o processo foi percebido que existe uma nuance de tipos, uma tipologia no que pode ser considerado um espaço residual. Por exemplo, um estacionamento pode ser enquadrado como um resíduo da cidade? Ou é uma propriedade privada com uma função urbana social? Será um direito do cidadão ocupar o solo urbano com um veículo particular, ao mesmo tempo que a cidade sofre com problemas de individualização das relações sociais e sobretudo a falta de espaços de lazer e 38.PEREIRA,Joana, Espaços Residuais Urbanos, p.157

encontro? O fato é que a questão ideológica do carro na cidade está sendo abordada de maneira cada vez mais crítica pelos teóricos em Arquitetura e Urbanismo. Partindo do pressuposto de que existe uma contradição entre o que é público e o que é

39.BORDE, Andréa. P e r c o r r e n d o Va z i o s Urbanos. Rio de Janeiro, P R O U R B / FA U / U F R J , p.14

privado nessa dialética carro-rua/pedestre-usuário, percebe-se que em algumas situações os estacionamentos são criados justamente por uma falta de uso efetivo do território por parte dos pedestres, ou seja, em alguns casos podemos identificar a apropriação de um espaço residual para função de estacionamento. 35


Em outros casos, o estacionamento é contemplado por projeto como o estacionamento da praça Bellevue ou estacionamentos em frente de condomínios de habitação. Como os espaços residuais estão à disposição do acaso e do indefinido, muitas das vezes a cultura do transporte individual se apropria e ocupa esses espaços vazios e a cidade. Assim, esses espaços, tal como a rua, devem seguir para sua origem de utilização pública onde a política (polis) possa ser praticada em sua excelência. A terceira etapa, portanto, é baseada na qualificação dos espaços residuais a partir da fundamentação teórica e então foram categorizados três gêneros principais de espaços residuais urbanos. O primeiro gênero encontrado é caracterizado pela aparência de pleno abandono (cor vermelha). Esse tipo de espaço residual encontrado geralmente é deposito de dejetos como lixo, móveis, grama alta, ou até um edifício totalmente em desuso (um friche sem ocupação permanente). Embora esses espaços tenham uma aparência de abandono pleno, vê-se que existe uma relação pessoa-espaço em seu sentido de expressão artística de rua ou intervenções nos muros, como o graffiti, as colagens ou os pixos. O segundo gênero (cor azul) encontrado é caracterizado pelo aparente desuso, entretanto o espaço demonstra vitalidade pela presença de alguns mobiliários urbanos, certa pavimentação, algumas estruturas cobertas, pequenas construções ou até pequenos jardins. Esse tipo de espaço também se caracteriza pela presença da organização comunitária, pequenas empresas ou associações no gerenciamento e no tratamento cotidiano do lugar. É também perceptível outro nível de relação da sociedade com o espaço, onde ocorrem intervenções artisticas cotidianamente, como na praça Cartonerie, na 45 rue Etienne Boisson ou a assotiation Cinema Grand Lux que promove eventos de cinema e cultura a baixos preços, a CUFA em Madureira, a praça das mães no viaduto Negrão de Lima ou o Baile charme no mesmo local. O terceiro gênero (cor laranja) determinado é caracterizado pela a relação de ocupação de veículos nos espaços residuais. Estes espaços demonstram outra relação do cotidiano da cidade, são espaços que aparentam estar entre os quesitos descritos acima, com intervenções artísticas, mobiliários urbanos improvisados, lixo ou pequenas construções, mas além disso, é presente a função de estacionamentos de veículos, ocupando o vazio gerado pelas incertezas e oportunidades desses espaços.

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Mapa: quantificação e qualificação dos espaços

espaço ocupado por veículos espaço subutilizado ou em abandono pleno. Construídos ou não construidos

lugares com algum grau de ocupacao 0km

1km

2 km

Mapa de quantificação e qualificação dos espaços residuais às margens da linha de trem da cidade

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O percurso

espaço ocupado por veículos

espaço subutilizado ou em abandono pleno construidos ou nao constridos

lugares com algum grau de ocupação imagens dos espaços encontrados no percurso capturadas pelo autor

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Os espaços e seus agentes/usuários/ocupantes Association Carton Plein: A associação CARTON PLEIN foi constituída em 2010 a partir de uma grande intervenção temporária e experimental aos arredores do bairro Carnot - bairro que contêm uma grande praça residual de dois mil m2 nas proximidades da estação de trem. Formada por diversos profissionais de várias áreas de atuação como arquitetos, sociólogos, artistas, jardineiros, desenhadores, pintores, atores, a associação trabalha até hoje na manutenção desse espaço além de participar de outras intervenções na cidade de Saint Etienne. «Este lugar público atípico se tornou um lugar de experiência, um lugar vivo onde segue um ao outro seminário, jogos, difusões artísticas, residências, eventos diversos misturaram a vida do local e os usuários múltiplos(...)Passo a passo, o projeto agarrou-se às oportunidades da cidade, líderes de projeto motivados cuja a abordagem se junta às da Carton Plein. Estes são também os habitantes e os usuários do lugar que participam na reivenção. A associação implementa dispositivos (jardim compartilhado, canteiro criativo, eventos...) para incitar o cidadão a se mobilisar na fabricação de seus quadros de vida. É sobre um espaço em permanente construção que não congela nada e tenta abrir à cada passo novas perspectivas.»40 Após essa experiência, a praça se tornou um pátio de recreio de atores múltiplos (universitários, planejadores, vizinhos, os profissionais da concepção de lugar público, associações, companhias). Hoje percebe-se que ainda existe uma certa raiz de terreno vago, ou seja, não é um lugar de muito movimento de pessoas, ocupação plena ou contínua. Entretanto, é interessante perceber a qualidade das intervenções nos muros o que mostra que existem pessoas engajadas em manter o espaço expressivo. A paisagem formada pelas constantes intervenções - tanto da associação quanto dos agentes locais informais - se torna um ambiente atrativo durante o passeio. Durante as visitas não se viu todo o espaço ocupado em sua plenitude, mas havia sempre uma certa movimentação, seja de pessoas com seus cachorros, seja de crianças, jovens pessoas, casais, artistas de rua. Outros aspectos relevantes que tornam o lugar mais aprazível, além dos muros, são os mobiliários urbanos e a pavimentação, esses trazem uma certa noção de estabilidade ao local onde se percebe a atuação da associação e o gerenciamento do lugar. A metodologia de trabalho varia de acordo com o lugar, entretanto o modo pluridisciplinar, a vontade de abertura com a população local, a dinâmica 4 0 . Tr e c h o e x t r a í d o i n < h t t p : / / w w w. c a r t o n plein.org> (tradução livre pelo autor )

colaborativa, são fundamentais para o desenvolvimento dos projetos de intervenção nos bairros.

39


Atualmente, a associação busca participar e evoluir os métodos não só de concepção do espaço público, mas também de formas de intervenção temporária (ou não) de espaços privados abandonados, como lojas, boutiques ou bares. Em Saint Etienne, buscam gerar uma dinâmica com outras associações de ação direta na cidade, a criatividade ligada a riqueza histórica representada no passado industrial e nos fenômenos de migração que marcam o contexto dos tempos atuais da cidade. Em um dos encontros realizados, Fanny Herbert, cofundadora da associação, Socióloga com especialização em espaços públicos, vê que as intervenções podem ser de forma independente, buscando práticas que incentiva a ativação e presença do próprio cidadão, além de inovações no campo das políticas públicas para legitimar ações como essas. Exemplo disso está no bairro de Jacquar em Saint Etienne no qual após um evento de ocupação e intervenção da associação os prórprios habitantes do bairro gerem e organizam eventos independentemente das associações institucionalizadas, mostrando a atmosfera de que os espaços públicos residuais são um grande potencial de coletividade e parceria entre as pessoas. No bairro Jacquar, especificamente na praça Cartonnerie, jogar, experimentar, viajar, mudar os usos, acomodar-se, festejar, aproveitar o tempo e a ociosidade se torna, por vezes, uma possibilidade real e praticável na cidade. Propor a exploração sensível de lugares residuais, instalações artísticas, adaptação de espaços temporários públicos, de troca, de encontros públicos, como também um observatório de usos e um espaço de reflexão contínua e aberta tornam a associação CARTON PLEIN um exemplo de uma nova perspectiva de ação na cidade.

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Imagem 1:Cidade de Saint Etienne, bairro Jacquard, praça «Cartonnerie» em 2010. Imagem retirada do site da associação Imagem2: Praça Jacquar em fevereiro de 2016. Imagem retirada pelo autor Imagem3: Evento e ultima intervenção da associação, em outubro de 2016 Imagem4: Projeto para possiveis usos e ocupações para a praça Jacquard.

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Association Cinéma Granlux: Os efeitos decorrentes da degradação urbana ligados aos friches - efeitos visuais, espaciais, econômicos, sociais, culturais - contribuem, por vezes, negativamente para a paisagem urbana. Entretanto, meios de ocupação e de revitalização são cada vez mais recorrentes para a ativação desses lugares. Um exemplo de uma ocupação bem sucedida nesse cenário dos friches industriais é a associação Cinema Grand Lux de Saint Etienne. A associação se encontra em um antigo edifício que é uma antiga cervejaria do fim do século XIX. Em seu subsolo há cerca de 4000 m2 divididos em dois andares, lugar onde as cervejas fermentavam. Ao chegar no lugar, percebe-se aspectos e características já citadas que podem definir lugares em abandono. Aspectos como a pavimentação de terra ou de pedras, graffitis em algumas paredes, aparentes patologia estrutural do edifício, fachada suja e degradada sem nenhum aparente projeto de revitalização externa. Esse aparente abandono externo não traduz o que vemos no interior do prédio. A ambiência intimista com luzes neon compõe a primeira sala, onde existe um bar e acontece as sessões de cinema com musicas vintages. O grande salão de estar com mesas, sofás aconchegantes, luzes de baixa intensidade complementam a sensação de conforto ambiental. Não se sabe, antes de entrar, que o interior do edifício é tão oposto ao exterior. A preservação da fachada original no exterior cria uma dualidade interior/exterior de respeito ao contexto urbano de uma história industrial. A associação se adequa no lugar urbano e não o lugar urbano se adequa à estética da associação, o que se vê também é um certo "respeito", ou aceitação, à identidade marginalizada já instaurada ao longo dos anos de abandono. Nos espaços percorridos posteriormente, é visível as estruturas antigas, os pilares as vigas de ferro fundido, pé direito alto e também as paredes sem revestimento e assim se mostram mais adaptados ao contexto arquitetônico. Esses aspectos criam um ambiente diferente do primeiro espaço visitado, o que torna mais interessante e dinâmico o passeio pelo prédio. A variabilidade espacial criada no GrandLux potencialidade pela arquitetura rústica industrial - mostra como o espaço pode ser adequado a novas demandas sociais no qual existe um desprendimento de suas funções originais. A cidade constrói esses edifícios no período industrial, a cidade abandona esses edifícios no periodo de descapitalização e recessão economica, a população os ativa e os ocupa, os agentes transformam esses espaços segundo demandas contemporâneas. Isso mostra que embora a arquitetura industrial permaneça em sua forma, sua função no tempo é totalmente flexivel e está em constante mutação, assim como a consciência das pessoas que o utilizam. 42


No site da associação, o grupo introduz como a dinâmica espacial funciona na ocupação desse friche dizendo: «Um espaço modular para acolher todas as formas artísticas quando elas têm um elo com a cinematografia( cinema, experimental, espetáculo, expressão sonora, teatro diferente, artes plásticas). A diversidade dos diferentes espaços do Gran Lux nos oferece múltiplas possibilidades para acolher artistas e todos, especialmente cineastas em residência(...)Os espaços de trabalho são numerosos e modulares. No andar térreo, nós podemos abrigar as pessoas convidadas. Alternativas, cruzamentos, casamentos improváveis por uma cinéfila vivante em pesquisa perpétua.»41 Segundo a reportagem o jornal eletrônico "Le progrès" a diversidade dos diferentes espaços do Gran Lux nos oferece múltiplas possibilidades para acolher artistas e especialmente cineastas em formação. Por ser um antigo edifício industrial, a associação dispõe de vários espaços modulares de trabalhos. "A filosofia do Gran Lux é de criar uma alternativa às salas de cinema clássicas, com uma ambiência apropriada e uma programação diferente" diz o presidente da associação Oliver. Enquanto, por um lado, a associação Carton Plein propõe uma certa peregrinação na cidade com métodos de urbanismo participativo - usuários e moradores dos diversos contextos onde passam - por outro lado o tipo de ocupação da cidade proposto pelo o cinema Gran Lux se mostra mais estático no lugar de atividades. É importante perceber que, mesmo com certas diferenças no método de ocupação dos espaços residuais, as duas associações criam oportunidades de expressão da arte, do encontro entre pessoas e ação coletiva no saber fazer a cidade, reforçando essa cultura de ocupação dos espaços urbanos pelas pessoas.

41.Texto extraído do site da assotiação Cinéma Grand Lux. Tradução livre pelo autor.

43


imagens do Cinema Granlux em Saint Etienne. Imagens capturadas pelo autor, exceto a primeira.

44


Casos pelo mundo 4.Cidade de Lagos, NigĂŠria

Cidade de Lagos. imagens retiradas em: PEREIRA, Joana, Espaços Residuais Urbanos. P154


vii - O caso brasileiro O BRT transcarioca e os bairros de Madureira e Penha Neste capítulo, estudaremos o caso mais recente de uma infraestrutura de transporte de massa do Rio de Janeiro, o BRT. Embora não tenha alta capacidade, estes corredores foram implantados como alternativa a mobilidade urbana no Rio de Janeiro. Hoje, o BRT na cidade do Rio de Janeiro conta com três linhas operantes (Transcarioca, Transoeste, Transolímpica) e uma em construção (Transbrasil), finalizando quatro ao total. Este capítulo ensaiará reflexões baseadas em uma dessas vias, especificamente, o corredor Transcarioca. É fato que sua construção gerou grande debate sobre temas essenciais para o saber fazer urbanismo, o papel da urbanização e crescimento da cidade, a questão do direito à habitação, e enfim, o objeto de estudo, os espaços residuais ou vazios urbanos próximos ou proeminentes da construção dessas grandes estruturas urbanas como é o BRT. Segundo a empresa que administra a circulação dos BRT na cidade do Rio de Janeiro: «O BRT vem da sigla em inglês que significa Transporte Rápido por Ônibus. Na prática, representa um transporte articulado que trafega em corredor exclusivo e, por isso, é uma alternativa mais rápida de viagem para os passageiros.»

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O corredor Transcarioca foi inaugurado em 2014, às vésperas da Copa do Mundo do Brasil. O corredor expresso liga a Barra da Tijuca (zona oeste da cidade) ao Aeroporto Internacional Tom Jobim (zona norte), integrando-se ao terminal Alvorada, TransOlimpica, trens e a linha 2 do Metrô. Um trajeto que possui no total trinta e nove quilômetros de extensão, capacidade de quinhentos mil passageiros por dia, duzentos e cinqüenta automóveis articulados por dia, contendo trinta e nove estações com distância média entre elas de 800 metros. O custo desse empreendimento foi de R$ 1.833,60 bilhão, tendo como fonte o Programa de aceleração do crescimento (PAC) e as empreiteiras consorciadas Delta Construções e Andrade Gutierrez, recentemente investigadas por corrupção.43 O BRT, uma das mais novas intervenções de infraestrutura urbana na cidade do Rio de Janeiro (com uma estação especifica em Madureira, Penha e Olaria) promete trazer benefícios ao fluxo e circulação de passageiros mais rápido para cidade. O que foi constatado em sua construção foram as mesmas contradiões históricas - a exemplo do viaduto Negrão de Lima - que continuam sendo perpetuadas mesmo depois de 54 anos de evolução da cidade. Problemas como desapropriações de terras, 4 2 . Tr e c h o r e t i r a d o i n :

remoçôes compulsórias pelo Estado, altos custos na verba pública, corrupção. Além <http://www.brtrio.com/conh eca> disso, a criação de mais espaços residuais urbanos sob esse novo viaduto.

4 3 . F o n t e i n : <http://www.brtbrasil.org.br>

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No processo histórico do bairro de Madureira e Penha - tanto a construção da linha do trem como construção dos viadutos - as necessidades de uma maior velocidade de circulação de automóveis e pessoas foram e são evidentes. A problemática relacionada à implementação da Transcarioca e o pensamento monotemático dos políticos, urbanistas e detentores de poder e verba pública, face a complexidade da cidade na escala humana pode ser um gerador desses tipos de resíduos urbanos. Por exemplo, a construção de um grande equipamento urbano com apenas um propósito: a travessia de automóveis de um lado para o outro do bairro, sem pensar nas possíveis oportunidades de projeto e integração que estão sob eles mesmo. A Transcarioca, diferentemente da Linha Amarela (via expressa que contempla um trajeto semelhante), passa pelo interior dos bairros em ruas com importantes funções para a dinâmica da cidade, cortando bairros de maneira, vezes, impositiva. Para viabilizar o aumento de fluxo e alargamentos nestas vias, se fez necessária - muitas vezes - a ampliação de medidas de desapropriações dos lotes por meios de decretos municipais. Nesse sentido, outra grande problemática acerca dos espaços residuais urbanos pode ser notada. A questão da especulação imobiliária e as desapropiações de terras próximas ao corredo Transcarioca. A primeira questão é refletida por Andréa Borde em seu texto " Percorrendo Vazios Urbanos" como uma das origens e vertente de análise para esses tipos de espaços vazios e incertos. «A segunda vertente analítica considera os vazios urbanos como produtos do funcionamento do mercado de terras urbanas(...) se debruça sobre os aspectos relacionados à capacidade de negociação, e de flexibilidade na dinâmica futura, presentes nos objetivos políticos econômicos(...) Os vazios urbanos seriam áreas de negociação e de ajuste do mercado de terras urbanas. (...) os vazios urbanos se inserem no processo especulativo básico.»44 44.BORDE, Andréa. PERCORRENDO OS VAZIOS URBANOS. Rio de Janeiro, UFRJ. pág. 8

«(...) limitar a especulação imobiliária é assegurar a função social da propriedade (...) através de instrumentos de regulação como a tazação progressiva dos vazios urbanos, que recuperariam para a coletividade a valorização imobiliária

45.BORDE, Andréa. PERCORRENDO OS VAZIOS URBANOS. Rio de Janeiro, UFRJ. pág. 8 citação de FASE, Carta dos Direitos Humanos nas cidades. São Paulo: Congresso Nacional pelo Direito à Cidade, Outubro, item 4 do Capítolo " Direito à Moradia»

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decorrente de investimentos do poder público»

É evidente, portanto, que a participação do poder público é fundamental para as decisões no sentido distrital e municipal e que suas decisões estejam de acordo com o bem comum da população local. Entretanto, percebe-se que, as vezes, o Estado se submete à ordens que visam sobretudo a especulação imobiliária, gerando um grande desequilíbrio entre o que é interesse público e o que vem a ser os interesses privados dentro do setor público de gestão. 47


TRANSCARIOCA PENHA

MADUREIRA

TRANSCARIOCA

imagem: mapa da cidade do Rio de Janeiro e o trajeto do corredor de BRT Trascarioca retirada do google earth.

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imagem 1: construção do corredor Transcarioca em Madureira imagem 2: protestos da comunidade de Campinho contra as remoções para construção do corredor Transcarioca, em Madureira Foto: Eduardo Sá/Fazendo Media

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viii - O bairro de Madureira Madureira é um dos bairros culturalmente e economicamente mais importantes da cidade do Rio de Janeiro. Caracterizado como um bairro de ocupação mista (industrial, residencial e comercial) é também um lugar onde há a presença, majoritariamente, da classe média, média baixa e classe pobre da Zona Norte do município. Isto revela como o bairro tem um caráter potente no âmbito da diversidade. Outro aspecto relevante é o encontro de grandes estruturas urbanas, como o corredor do BRT, o Viaduto Negrão de Lima e linhas de trens que cortam o bairro. O bairro serve de passagem para diversos outros bairros das zonas Norte e Oeste e da Baixada Fluminense. Destaca-se pelo seu tamanho (quatro quilômetros quadrados). Sendo assim, Madureira é, além de uma referência comercial e cultural aos bairros adjacentes, imprescindível para os fluxos do sistema viário. Segundo dados de 2010 da prefeitura do Rio de Janeiro, Madureira ocupa uma extensão de 3.78 quilômetros quadrados, tendo uma altíssima taxa de urbanização (99,93%). Possui uma população de 371.958 habitantes, distribuídos em 124.000 domicílios (média de 2,99 habitantes por domicílio). Por ter características que demonstram sua importância nos fluxos urbanos - viadutos e linhas de trens que cortam o bairro, grande população habitante, grandes centros de comércio e industria, importância histórica na construção da cultura da cidade do Rio de Janeiro, e sobretudo no subúrbio carioca - o bairro de Madureira é um ótimo caso de referência e reflexão para as contradições encontradas sobre os espaços residuais remanescentes do crescimento urbano dos grandes centros metropolitanos, como o Rio de Janeiro. AS INFRASTRUTURAS URBANA DO BAIRRO DE MADUREIRA Além do atual corredor de BRT, Madureira tem uma história densa relacionada às vias de infraestrutura urbana como por exemplo a Linha de trem e o Viaduto Negrão de Lima. Nesse sentido, pretende-se entender quais variáveis históricas e quais dinâmicas já existiam - ou ainda existem - antes do processo de implementação do corredor Transcarioca. A LINHA DO TREM - RAMAL DEODÓRO - ESTAÇÃO DE MADUREIRA O transporte de passageiros nos subúrbios do Rio de Janeiro começou em março de 1858, após a criação do trecho inicial da Estrada de Ferro Central do Brasil, se estendendo do terminal Central do Brasil até a estação de Queimados. Naqueles tempos, as locomotivas à vapor puxavam carros de madeira no serviço de passageiros (uma ou duas vezes por dia) e vagões que escoavam as produções agrícolas das pequenas manufaturas. Mesmo assim o transporte de ferrovia foi primordial para o desenvolvimento econômico de diversos bairros da Zona Norte, Zona Oeste e das cidades da Baixada Fluminense, levando ao povoamento das cercanias ferroviárias. 50

4 6 . D a d o s i n < armazemdedados.rio.rj.gov. br>


aA Estação Madureira foi inaugurada em 15 de junho de 1890, dando o nome ao antigo proprietário da região, ajudando desta forma a consolidar o nome do novo bairro. Hoje, a estação caracteriza-se por um intenso fluxo de pessoas durante toda a jornada. Para isso, três ramais fazem conexão entre a estação e o centro da cidade (Estação Cental do Brasil). Nas décadas de 1960 e 1970, com a chegada de Juscelino Kubitscheck à presidência da República, começaria o declínio do transporte ferroviário do país. Seu governo adotou o compromisso de rápida industrialização do país, atraindo montadoras automobilísticas estrangeiras para a extensão de seus negócios no país e levando aos poucos o país a mudar a vocação do transporte nacional, passando do sistema ferroviário para o sistema de rodovias. Nos anos 60, teríamos a primeira leva de trens parcialmente fabricados no Brasil, num consórcio envolvendo fabricantes de equipamentos ferroviários dos Estados Unidos e da Hungria. O VIADUTO NEGRÃO DE LIMA Com o crescimento da cidade e a abertura de novas e importantes vias como a Av. Brasil e a Av. das Bandeiras, houve a necessidade da conexão dessas com o tecido urbano existente. Nessa ótica, os viadutos nas zonas suburbanas foram de vital importância para o fluxo rápido dos automóveis, assim como a valorização do consumo desse novo paradigma de transporte, o carro. Além disso, o viaduto foi na sua época a maior estrutura de concreto protendido da América do Sul, tendo mais de 500 metros de extenção, com um longo trecho (215m) em curva. Em 1958 o viaduto foi inaugurado, ligando as áreas do bairro separadas pelos ramais da linha férrea. É importante ressaltar que dentro desse mesmo contexto histórico, o Brasil vivia uma verdadeira expansão industrial herdada pelo governo do então presidente Juscelino Kubitscheck, presidente criador da cidade de Brasília nos anos de 1950 e 1960 - conjuntura que empenhou-se à valorização da industria automobilística como catalisador de crescimento da economia nacional. Para a construção do viaduto, todo o tecido urbano existente desapareceu. Os valores de verba pública, imóveis demolidos e as desapropriações de terra foram as maiores dificuldades encontradas durante as obras. A elevação do viaduto, assim como a construção da linha do trem, mostra a grande mudança da história e das dinâmicas alí já existentes. Entretanto, no caso da elevação do viaduto, percebe-se que este objeto gerou uma configuração mais impositiva para 51


a dinâmica local do que a linha do trem. Afinal, o trem circula em nível 0 e sua construção se dá em uma época onde a densidade urbana da região não se comparava à densidade urbana adquirida ao longo de quase oitenta anos. Avançando três décadas, no ano de 1994, o governo federal começava um processo de privatização de diversas empresas estatais, período conhecido como a inserção do modelo político econômico Neoliberal. Em 1998 o governo estadual decidiu repassar à iniciativa privada a operação dos trens, sendo apenas o responsável pelos investimentos de ordem maior na ferrovia (aquisição de trens, modernização e expansão da malha ferroviária, eram alguns dos encargos do Estado). Começava, então, a era dos trens privatizados, sendo a SuperVia - empresa que hoje enfrenta graves acusações e investigações de corrupção - a concessionária responsável pela operação dos trens. Isso demonstra como as implementações de infra estruturas urbanas são uma grande mudança, não só para a paisagem ou para a dinâmica dos fluxos da cidade, mas também demonstra pontos de descaso ou desconhecimento para com as pequenas escalas de projeto, afetando diretamente na escala do homem em sua condição de pedestre ou de morador. Em um primeiro momento histórico, a linha do trem divide o bairro, cria uma barreira. Em um segundo momento, o viaduto é criado gerando uma espécie de "teto" urbano sob o qual diversos espaços vazios, sem função definida por projeto, foram gerados. Apenas a Praça das Mães - praça embaixo do viaduto Negrão de Lima - fez parte do projeto de implementação do viaduto.

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imagem 1 (esquerda) : estação de Madureira, primeira década do século XX imagem 2 (direita) : estação de Madureira, década de 40 do século XX imagem 3 (esquerda): estação de Madureira, década de 70 Imagem 4 : estação de Madureira, 2007 imagem 5: O cruzamento entre o Viaduto Negrão de Lima e a linha do trem. Imagem 6: Rua João Vicente. A estação BRT ao lado da estação de Madureira. Ao fundo da imagem os viadutos do BRT e Negrão de Lima. imagem 7: aerofoto da construção do viaduto do BRT em Madureira ao lado do viaduto Negrão de Lima imagem 8 (última à direita): Consolidação da obra do BRT

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O bairro de Madureira, Rio de Janeiro

ESTAÇÃO MADUREIRA ESTAÇÃO MADUREIRA ESTAÇÃO BRT

Ne de grão Lim a

ESTAÇÃO BRT

TR

TRA

NSC ARI O

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0

O bairro de Madureira, Rio de Janeiro. Imagem capturada pelo Google Eath

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200m

400m


Mapa: Quantificação e Qualificação

espaços ocupador por veículos espaço subutilizado ou em abandono pleno. construídos ou não construídos lugares com algum grau de ocupação Mapa de quantificação e qualificação dos espaços às margens do corredor de ônibus BRT Transcarica

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O percurso

espaços ocupador por veículos

espaço subutilizado ou em abandono pleno. construídos ou não construídos

lugares com algum grau de ocupação imagens dos espaços encontrados no percurso capturadas pelo autor

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Os espaços e seus agentes/usuários/ocupantes No decorrer dos anos, os espaços vazios começaram a desfrutar de alguma função. Sejam elas sociais ou econômicas, formais ou informais, espontâneas ou intencionais. Como já dito, o único espaço que realmente faz parte do projeto do viaduto "Negrão de Lima" é a "Praça das Mães", onde acontece feiras informais. A praça tem um caráter verdadeiramente público, entretanto sofre com as mazelas do projeto pragmatizado moderno, causando momentos de baixa ou nenhuma ocupação do lugar. Embora tenha cotidianamente uma feira ao ar livre, o espaço é vazio, com alguns mobiliários urbanos. A ocupação fica por conta de mercadores ambulantes (camelôs), skatista, moradores de rua, grafiteiros e pedestres. Hoje, a função em uma grande parte do espaço embaixo dos viadutos é destinada a uma estação do BRT. Tal estação é gradeada, os fluxos de pessoas não valorizam a pausa, ou até mesmo o encontro. É como se o espaço, todo gradeado e seguimentado, condicionassem as pessoas a atingir um só objetivo, chegar ao ônibus, é a vida direta, sem pausas, sem percepção do espaço. Por isso, o espaço se caracteriza pela monofunção, mesmo dentro de um programa de parceria público e privado, no qual se espera um equilíbrio entre as demandas dos usos públicos com os usos privados da cidade, o movimento dos corpos é predominantemente privado. Hoje poderia afirmar que este lugar sofre com problemas de identidade, é um lugar neutro, inerte, apesar de haver corpos em movimento. A construção do espaço cria essa inércia de consciência, como um curral de gado esperando a sua vez de partir. A função da cidade neste espaço residual ocupado destina-se ao acesso de usuários do transporte público, não de pessoas circulantes, ocupantes, moradores e atuantes do bairro, assim banalizando o espaço residual como um catalisador do encontro local, embora seja necessário para as demandas de circulação da cidade. Do outro lado da linha do trem se apresenta outro tipo de ocupação embaixo do viaduto, a CUFA. CUFA é uma sigla para dizer "Central Única das Favelas". A instituição está instalada embaixo do "viaduto Negrão de Lima" e promove eventos culturais diversos voltados a valaroziação da cultura de rua, a cultura da favela, o rap, o skate, o basketbal, a música, as artes marciais. Seus elos estão mais voltados para o domínio público. Embora existam diversos programas dentro do espaço da CUFA, a construção arquitetônica se relaciona de maneira introspectiva com a cidade, visto que ela também está cercada de muros que a autosegregam das pessoas que passam e circulam pelo espaço de baixo do viaduto. 57


Assim como a CUFA, existe outro espaço de expressão da cultura negra no mesmo viaduto chamado de O Baile Charme de Madureira. A festa se baseia na ocupação desse espaço residual para a celebração de músicas como Funk, Hip Hop, R&B e etc. O Hip Hop é um grande agente para a dinâmica do lugar, e principalmente na ocupação de espaços vazios nas regiões periféricas. O hip hop ou a cultura de rua apareceu no Brasil no final da década de 70 e tem um papel fundamental nas relações identitárias de lugar, raça e política, pois deu voz à população até então marginalizada pela sociedade. O hip hop tem como caráter principal a crítica às contradições da sociedade, como a criminalidade, o abismo social, o racismo e, principalmente, faz parte da expressão artística e da festa na rua como um instrumento de ação direta e afirmação de uma contracultura hegemônica. Em Madureira, a Cultura de rua (Hip Hop) é agente importante para a ocupação dos espaços residuais da cidade, como por exemplo a sede da CUFA, associação criada pelos rappers Negga Giza e MV Bill. Este setor do bairro de Madureira conta com uma há um grande população que utiliza os espaços alí configurados e que estão cada vez mais fortes e formalizados, uma vez que o poder publico tem oferecido apenas medidas simplistas para o bom gerenciamento da vida cotidiana. De um lado existe uma forte imposição de uma monofunção, a circulação do transporte. Do outro lado, uma instituição que segue um programa social relevante para a disseminação das culturas marginalizadas, um espaço de festa e dança que fica fechado durante a semana, mas tem um grande potencial de afirmação cultural no bairro e por fim, uma praça que fez parte do projeto do viaduto, mas que não sofreu nenhuma requalificação dos usos espaciais, tendo apenas como forte potencial as atuações informais, o que é positivo. Embora tenha diversos personagens, funções instauradas nesse grande espaço sob os viadutos e a margem da linha do trem, os programas não se relacionam entre si, criando um caráter segregatório entre os espaços residuais ocupados, e que renega a diluição, a comunicação e o encontro dos temas urbanos dentro de um mesmo contexto urbano tão vital que é esse trecho da cidade.

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Imagem esquerda em cima: Atividade esportiva ( Basquete) no interior da associação CUFA Imagem embaixo esquerda: «Calçadão cultural» em frente à entrada da associação. Batalhas de RAP, concertos de cultura popular como rodas de samba são comuns no local. Imagem em cima à direita e centro à direita: Baile Charme de Madureira. Imagem à direita embaixo : Feira no baixio do viaduto Negrão de Lima

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Casos pelo mundo 5.O antigo edifício de Belas Artes, Saint Etienne, França

imagem 1: Antiga sede da escola de Belas Artes início do século XX. imagem 2: Antiga sede da escola de Belas Artes no ano de 2015


ix - O bairro da Penha Lar de uns dos grandes cartões postais da cidade, a Igreja da Penha, o bairro da Penha é sem dúvida um dos mais importantes bairros da zona norte carioca e da cultura do subúrbio do Rio de Janeiro. Residência de 314 mil pessoas no ano de 2016, este bairro da Zona Norte - assim como Madureira -, é caracterizado pela grande diversidade de situações sociais e culturais. Complexos de favelas - como o Complexo da Penha - se encontram no mesmo perímetro distrital que condomínios de classe médias dos tipos "entre muros", mercados e mercadores informais se relacionam com o comércio formal e informal. No total, o bairro ganha ao longo do processo de urbanização um status de referência para quem busca produtos e serviços diversos - hoje ratificada pela presença de uma importante estação de BRT. Segundo dados fornecidos pela prefeitura do Rio de Janeiro, no ano de 2016, o bairro da Penha tem área de 5,8 quilômetros quadrados, com uma população residente de 314.000 pessoas distribuídas em pouco mais de 58.500 residências registradas (taxa 47

de 5,40 habitantes por domicílio).

O início da história do bairro da Penha permeia o início do século XX quando o bairro foi emancipado da freguesia de Irajá. Na mesma época, entre as prefeituras de Paulo de Frontin e Antonio da Silva Prado Junior, aplicaram-se grandes investimentos no setor industrial e de construção civil aumentando o índice de empregos e crescimento demográfico da região. Exemplos desses investimentos são: a construção do hospital Getúlio Vargas, a construção da Avenida Brasil, a grande indústria têxtil Cortume Carioca, e enfim a estação de trem do bairro. Com o aumento demográfico, era de se prever que haveria outros grandes investimentos para a infraestrutura para o jovem bairro. Entretanto, analisando o contexto geral do subúrbio carioca em relação ao grande centro da cidade e a zona sul carioca, a urbanização do bairro se deu de maneira orgânica e pouco planejada, criando favelas, habitações irregulares e em risco de assentamento, insalubridade e falta de saneamento básico. Mesmo com tantas contradições histórico sociais, o bairro - especialmente a área estudada - apresenta um caráter metropolitano, turístico e cosmopolita em potencial. A monumentalidade da Igreja da Penha, onde fiéis da cidade se convergem pela fé, a Avenida Brás de Pina e a Rua dos Romeiros e sua grande oferta de lojas, supermercados e consumo. Na mesma avenida, encontram-se algumas associações de moradores e amigos do bairro, um posto do DETRAN, um cartório e uma agência 4 7 . D a d o s i n < armazemdedados.rio.rj.gov. br>

dos correios. Nesse mesmo perímetro urbano, encontramos um hospital municipal do tipo "clínica da familía" chamado hospital Dr. Felipe Cardoso. 61


Ratificando a característica multidiversa da região, encontra-se um dos parques de diversão mais tradicionais da cidade, o Parque Xangai. Portanto, é evidente que o bairro da Penha concentra uma grade influência no sistema de fluxos, de permanência, de ofertas e demandas urbanas, passando por variáveis culturais, religiosas, comerciais, de saúde, e enfim, do transporte público. AS INFRASTRUTURAS URBANA DO BAIRRO DA PENHA O TREM - RAMAL SARACURUNA- ESTAÇÃO DA PENHA A estação de trem do bairro da Penha faz parte do trajeto do «Ramal Saracuruna». Esta linha passa por toda a parte da Zona Norte do Rio de Janeiro conhecida como «Zona da Leopoldina», com bairros de Bonsucesso, Ramos e Olaria, Penha. Mais além, a linha ainda passa pela cidade de Duque de Caxias. Apesar dessa grande extensão, as condições infraestruturais desta linha são claramente inferiores ao seu potencial de uso. Há, sobretudo, ausência de intermodalidade entre as estações, o BRT e os pontos de ônibus. Além disso, é perceptível que as condições dos veículos que circulam são de igual inferioridade ao que se espera de um transporte de massa tão importante para os fluxos urbanos da cidade, no qual cerca de 2.000.000 de 48

passageiros circulam por ano.

A origem do traçado da linha férrea unia o centro do Rio de Janeiro à Petrópolis e Três Rios. Uma parte dessa linha é datada de 1854, construída pelo Barão de Mauá na qual unia-se o porto de Mauá à estação de Raiz da Serra. Mais tarde, entre os anos 1883 e 1886, essas estações foram incorporadas pela Empresa Férrea Príncipe do Grão Pará que enfim construiu o prolongamento até a cidade de Petrópolis. Em 1900, finalmente, a estação Três Rios foi incorporada ao traçado. O final de todo o traçado dessa linha de trem é datado de 1964, ligando os trechos entre Vila Inhomerim, Três Rios e o Centro do Rio (Central do Brasil). Em 1886 é inaugurada a estação da Penha que opera, atualmente, como estação de trens metropolitanos da empresa de transporte público SuperVia. Analisando o histórico do bairro com a inauguração da estação percebe-se que, de fato, o desenvolvimento industrial de uma época - chamado de surto industrial, conduzido pelo Barão de Mauá - no final do século XIX e início do séc XX foi uma variável de grande importância para o crescimento da Região da Penha. Dessa maneira, a fundação do bairro Penha, assim como sua formação urbana, o "bum" demográfico e as contradições entorno da urbanização do bairro são uma consequência do próprio processo de modernização e crescimento urbano da cidade do Rio de Janeiro. 62

4 8 . D a d o s i n < armazemdedados.rio.rj.gov. br>


OS VIADUTOS: SÃO COSME E SÃO DAMIÃO Mesmo não fazendo parte da região administrativa da Penha, os dois viadutos de grande imponência fazem parte da paisagem urbana desta região. Inaugurados em 1969 na região administrativa de Ramos, os viadutos elevam-se sobre a linha do trem conectando a rua Uranos à rua Leopodina Rego. Além de ser um importante acesso de veículos, os viadutos em sua forma curvilínea exibem uma espacialidade peculiar em seus baixios nos quais a iluminação do dia se insere no espaço. A angulação de subida em curva gera variações de forma interessantes. O BRT TRANSCARIOCA Hoje o bairro é cortado por grandes vias de circulação de veículos, O BRT Transcarioca - cuja estação do bairro foi inaugurada em 13/09/2014 - segue a linha do trem do ramal de Saracuruna aumentando a escala de fronteira entre dois lados distintos desse perímetro urbano. De um lado, identifica-se uma região mais "nobre" com características morfológicas de construções austeras e fechadas em si, do outro, um bairro de visível crescimento «orgânico» sem planejamento, formado por favelas e guetos, a sobreposição da tipologia «casa» em relação à tipologia «prédio habitacional». Se a linha de trem de Saint Etienne foi a primeira linha férrea da França e, portanto, o primeiro registro da intervenção do homem nesse aspecto da infra-estrutura de transporte urbano, o BRT transcarioca - que no caso da Penha acompanha a linha do trem - pode ser observado como um dos últimos, se não o último, exemplo dessa história que percorre cerca de 180 anos. Contudo, é possível perceber e analisar que as formas e usos dos espaços residuais urbanos - mesmo que tão distantes em tempo e espaço - têm suas similaridades. Portanto, a intervenção do poder público para esses casos foi e está sendo perpetuado ao longo da história. Se ontem era a linha do trem, hoje é o corredor de ônibus.

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SARACURURA

PENHA CENTRAL

Imagem esquerda em cima: Trajeto da linha de Trem - Ramal Saracurura Imagem embaixo esquerda: Desastre junto à estação da Penha nos anos 1950 (Jornal Última Hora, RJ, acervo Arquivo Público de São Paulo). Imagem em cima à direita: Antiga estação do bairro da Penha. Imagem direita ao centro: embaixo : Atual estação da Penha. Imagem direita embaixo: Viaduto São Cosme e São Damião, 1969

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O bairro da Penha, Rio de Janeiro

VADUTO SÃO COSME E SÃO DAMIÃO

TRANSCARIOCA

TREM

BRT OLARIA

IGREJA DA PENHA

BRT - PENHA 1 PARQUE XANGAI

BRT - PENHA 1 ESTAÇÃO TREM

0

200m

400m

800m

O bairro da Penha. Imagem capturada no Google Eath.

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Mapa: Quantificação e Qualificação

0

200m

Mapa de quantificação e qualificação dos espaços às margens do corredor de ônibus BRT Transcarioca

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400m

800m


Os espaços e seus agentes/usuários/ocupantes Em seu artigo publicado pelo site vitruvius, Pessoa explicita a importância do reconhecimento dos usuários e freqüentadores afim de um projeto de qualidade: «Muitos projetos urbanos fracassam por não levar em conta os usuários do local antes da intervenção. Ainda que a requalificação de uma área urbana busque atrair novos usuários, é fundamental que se conheçam seus frequentadores no momento do projeto. Áreas que necessitam de melhorias não são necessariamente áreas abandonadas e em geral têm moradores e comércio ativo. É fundamental que se conheçam esses atores, pois essas são as pessoas que devem ser beneficiadas com a requalificação. É preciso ter clareza de quais são os novos usuários que o projeto busca atrair. Uma falha nessa interpretação pode acarretar no fracasso do projeto. É comum, e quase inevitável, em revitalizações urbanas, ocorrer algum grau de gentrificação. O planejador deve ter consciência desse fato e procurar minimizá-lo 49

oferecendo possibilidades de permanência da população original.»

O percurso revela uma diversidade pertinente sobre os agentes e usuários desses lugares. É evidente que a informalidade e a apropriação dita orgânica se faz presente nos resíduos visitados no trecho percorrido. Os tipos de usuários são múltiplos, assim como em Madureira. Entretanto, a mobilidade e efemeridade dos usos é mais evidente. Sobre espaços adjacentes à estação do BRT Penha (I e II), percebe-se um grande aglomerado de mercadores ambulantes vendendo produtos variados, entre feirantes, vendedores de pacotes de cigarro, comidas caseiras, doces e bebidas Esses vendedores se apropriam das saídas das estações para se estabelecerem como uma possibilidade de consumo rápido e integrado com o fluxo de pessoas. Outro aspecto importante dessa dinâmica, é o usuário do transporte. Como a Estação da Penha tem uma característica, já dita antes, de escala metropolitana, os usuários do transporte se diluem entre moradores e usuários dos serviços do bairro. Assim como analisado no caso de Madureira, os usuários não estabelecem uma relação profunda com o lugar por onde passam. O movimento entre as pessoas é cada vez mais objetivado entre o sair e entrar, ou seja, lugares de permanência e encontro não são presentes nas imediações da estação. Novamente, a idéia de uma pragmatização das infraestruturas de transporte, onde a ordem maior é a velocidade do "partir"/"chegar". Além disso, em horários de grande fluxo, os usuários se espremem 19. PESSOA, Denise Falcão Desafios do desenho urbano p a r a a c i d a d e contemporânea; trecho retirado in: <vitruvius.com.br>

dentro da estação, procurando o melhor lugar para esperar o ônibus BRT - na esperança de irem sentados no carro - e o que se percebe é uma grande insatisfação e impaciência entre os usuários dos quais o espaço de conforto e circulação são privados pelos vidros e limites da estação. 67


Outro elemento que, por vezes, pode contribuir negativamente na percepção geral do lugar é o abandono de outras infra-estruturas urbanas - como já explicado no caso dos «friches» e da «associação cinema Granlux». Nesse sentido, apresentamos um exemplo que se encontra justamente ao lado da estação analisada. Um antigo posto de gasolina se encontra em abandono pleno. O espaço ocupado pelo antigo posto de gasolina é dividido entre dois tipos de ocupação: no edifício onde havia a loja de conveniência, famílias de moradores de ruas o ocupam com seus pertences - algumas máquinas como de lavar roupas e televisões antigas - o outro lado onde havias as bombas de gasolinas, sob a estrutura treliçada, é ocupada por veículos, formando um estacionamento informal. No caso das famílias de moradores sem domicílio fixo, é evidente a precariedade das condições de vidas dessas pessoas. Com isso, a relação de marginalização do espaço residual é mais evidente nessa circunstância. Continuando o percurso ao longo do trecho urbano cortado pela Transcarioca e pela linha do trem, depara-se com o baixio dos viadutos "São Cosme e Damião", onde um grande grupo de moradores sem domicílio fixo ocupam o espaço de maneira precária e insalubre. Nesse caso, algumas fogueiras podem ser identificadas, evidenciando a falta de quaisquer estrutura básica para a segurança desse tipo de usuário ou ocupante. Como o baixio desse viaduto é, de algum modo, distante dos grandes fluxos de pessoas do bairro, o uso de drogas se faz presente para a ratificação desses usuários no âmbito da marginalidade espacial e social. Não menos importante, a associação CEDAPS (Centro de promoção e saúde) amigos e moradores da Penha - atua na região desde 1993. Com programas comunitários e locais para o desenvolvimento vinculada à saúde, a associação se tornou ao decorrer dos anos um modelo para o desenvolvimento do Programa de Saúde da Família obtendo financiamento do governo. O objetivo da associação é trazer a promoção da saúde em comunidades populares e a rede de construção compartilhada. A associação, além de promover programas nas demandas da saúde pública, também promove programas no âmbito da construção civil, o que gera uma multidisciplinaridade interessante nos quesitos de intervenção urbana, programa de desenvolvimento social e coletivo do bairro. Entretanto, o Centro associativo não se encontra instalado nas redondezas do bairro no qual age com esses programas de desenvolvimento social. Não distante do nosso percurso, exatamente no conjunto de favelas "complexos do alemão", o projeto «Praça pr'Alemão ter» foi o resultado dos esforços de estudantes, 68


professores e agentes universitário da disciplina Projetos de Urbanização Alternativa e o escritório modelo e projeto de extensão Abricó da FAU_UFRJ . O objeto de projeto e intervenção é um espaço residual da Avenida Central apartir das obras do PAC (programa de aceleração do crescimento) na reagião e o fio condutor transcorrese na vontade de integração entre a instituição acadêmica e a comunidade. "Mutirões de construção foram realizados junto com os moradores, estudantes e apoiadores da iniciativa durante três meses. Hoje, a Praça já se encontra consolidada, porém em constante processo de transformação, sendo esta ocupada com eventos do Instituto Raízes em Movimento, shows, rodas de conversa, exposição de trabalhos, e a intervenção do artista Miss Tobi, além do uso cotidiano por parte dos moradores(...) Em novembro de 2015 a Praça recebeu Menção Honrosa no 13º Congresso de Extensão da UFRJ, e no dia 13 de maio de 2016 o Prêmio de Melhor Trabalho na categoria “Projetos e obras destinadas a urbanização de favelas e intervenção urbana em bairros populares” da Exposição da Produção Universitária em Habitação de Interesse Social 2016, no Instituto 50 de Arquitetos do Brasil/IAB-RJ» Com o uso de materiais renováveis e ressignificados com uso de técnicas alternativas de construção tais como o uso de pneus que se transformam em poltronas confortáveis, «palets» que viram locais de estar, além de algumas técnicas mais vernaculares como a montagem de uma cobertura e estruturas em madeiras e restos de construção, o trabalho mostra o esforço perante as grandes dificuldades de estabelecer diálogos entre as instâncias sociais, institucionais e coletivas das quais as forças de ações, se bem conjugadas, transformam não só o espaço público em sua estética, mas a relação entre as pessoas a partir do senso participativo, local, coletivo e comunitário.

50.texto sobre a intervenção in: <https://www.facebook.com/p g/pracapralemaoter/about/?ref =page_internal>

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Imagem esquerda em cima: Baixio do Viaduto São Cosme e São Damião com roupas estendidas Imagem embaixo esquerda: Projeto da associação CEDAPS Jovens construtores Imagem em cima à direita: Projeto da associação CEDAPS Jovens construtores Imagem embaixo à direita: Projeto no Complexo do Alemão: «praça pra alemão ter»

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O percurso

espaços ocupador por veículos

espaço subutilizado ou em abandono pleno. construídos ou não construídos

lugares com algum grau de ocupação

imagens dos espaços encontrados no percurso capturadas pelo autor

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Casos pelo mundo 6.Viaduc Des Art Paris et La Coulée Verte, Paris, França

Imagem esquerda em cima: La coulée verte; caminho sobre a antiga linha de trem. Imagem embaixo esquerda: baixio do viaduto; cada pórtico forma um ateliê ou loja. Imagem em cima à direita: interior dos ateliês ou lojas Imagem embaixo à direita: Calçada da rua do Viaduc des arts


x - Comparação entre os casos

É incontestável que cada contexto urbano têm sua história, suas especificidades arquitetônicas e urbanísticas, assim como suas contradições cotidianas específicas ligadas à ocupação espacial.. Neste capítulo ensaiará descobrir os pontos em comum ou as disparidades entre os casos estudados, mais especificamente na cidade de Saint Etienne, o Bairro de Madureira e o bairro da Penha. A primeira diferença encontrada entre as situações está na proporção habitante por quilometro quadrado. Esse dado é importante para adquirimos uma visão geral do contexto urbano em que cada caso está inserido. Enquanto a densidade populacional de Saint Etienne é de 2.250 pessoas por quilômetro quadrado, Madureira tem uma taxa de 98.000 pessoas por quilômetro quadrado e a Penha de 54.000 pessoas por quilômetro quadrado. Embora Madureira e Penha conjuguem um quarto do tamanho de Saint Etienne, sua população é quase dois terços da população da cidade francesa. Esse dado mostra que a relação urbana e a aglomeraçãoé mais intensa no contexto brasileiro. Ou seja, o espaço em Saint Etienne é mais amplo para população, enquanto nos bairros cariocas a população vive mais aglomerada. A diferença de tamanho e densidade, evidentemente, interfere na dinâmica social de um espaço, entretanto ficou evidente que a problemática dos espaços residuais urbanos é enfrentada tanto no contexto populacional de grande densidade, quanto no contexto urbano menos denso. Outra notável diferença são os usos das terminologias para os usuários agentes - ou movimentos sociais - atrelados à valorização dos espaços estudados nessa pesquisa. No contexto francês a terminologia «associação» é muito empregada para definir um grupo social organizado, qualificado pelo estado que promovem ações de políticas locais - muitas das vezes de interesse cultural. Percebe-se que no contexto francês as associações e grupos sociais detém subsídios urbanos fornecidos pelo Estado como o direito à ocupação de friches, recursos públicos, além de recursos de iniciativa privada. Já no contexto brasileiro essa terminologia para caracteziar grupos sociais ativos na cidade, encontra-se num âmbito mais limitado do termo na qual as «associações» limitam-se, por vezes, à organizações sociais promovidas por moradores do bairro e coletivos, além de não serem tão assistidas pelo poder público. Esses dependem, muitas das vezes de patrocínio de órgãos privados e rendimentos colaborativos dos próprios integrantes da associação. Outro termo recente empregado no contexto da cidade do Rio de Janeiroe é a O.S - organizações sociais, ONGS e empresas de capital privado atuantes nos espaços residuais.

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A CUFA e o Baile charme são as organizações sociais que criam elos de similaridade com as ações promovidas pelas associações encontradas em Saint Etienne. Equivalente ao que cinema Granlux coloca em prática com as noites de cinema ou eventos abertos no seu edifício, a CUFA e o Baile Charme exercem um papel de valorização das culturas locais de favela, sobretudo o hip hop e os esportes. A arte, nos dois casos, tem um papel central. A livre expressão, o encontro entorno de um interesse comum e a expressão artística se encontram tanto na grande cidade como na média. Esse tipo de ocupação, embora tenha um caráter mais «privado» do que «público», gera vitalidade ao espaço que outrora estava em desuso, além de gerar uma característica de atração de usuários na qual os indivíduos atingidos pelas proposições devem vir até o lugar, já construído e com um evento predeterminado. Diferentemente dos exemplos acima, a associação Carton Plein gere suas intervenções de maneira mais aberta à diversidade da cidade. O próprio grupo de associados busca os locais de intervenção na cidade, embora tenham seu próprio espaço de projeto e discussão. O que se vê na maneira de agir dessa associação é uma forma mais direta aos habitantes e também uma espécie de projetos itinerantes na cidade. Parte do processo de criação de eventos é justamente a participação dos indivíduos que habitam no bairro ou quem tiver interesse nas proposições. O movimento não é mais do cidadão que busca o evento, mas sim o evento que propõe a participação do cidadão do bairro no seu próprio bairro, assim como o grupo universitário e os moradores locais no caso do «Projeto Praça Pr'Alemão ter». Enquanto o Cinema Granlux se estabelece em um edifício antigo e abandonado, ou seja, um friche restaurado no seu interior, a CUFA e o Baile Charme do viaduto Negrão de Lima se fixam no território a partir da construção de um edifício a fim de afirmar seus lugares na cidade. No caso brasileiro, os espaços eram um certo «resto da cidade» sem projeto, sem edifício, e ainda hoje, muitos edifícios abandonados que são ocupados sofrem repressão da polícia (o Estado) para desapropiação desses lugares. No caso do bairro da Penha o que se percebe a respeito dos usos dos espaços residuais é uma ocupação mais orgânica que institucional. Embora haja associações de moradores e amigos do bairro, não há uma atuação visível de intervenção e ocupação desses tipos de espaços nesse contexto urbano, ou seja, no percurso escolhido. Felizmente, exemplos de organizações sociais - Carton Plein, Baile Charme, CUFA e CinemaGranlux, ABRICÓ, CEDAPS - vêem valor nesses espaços para as dinamicas da cidade e compreendem a importancia de usá-los em favor da arte, do lazer, dos esportes e da cultura. 74


Quadro tipológicos dos espaços residuais urbanos França Saint Etienne

Esquina

Espaço de esquina vazio ou sem uso ou com mobiliário precário. Nesse caso no contexto brasileiro, quando há mobiliário, pequenas barracas de comércio improvisados são instalados de forma «provisória» ou efêmera. Intervenções como grafite são presentes nas empenas adjacentes. Duas esquinas

Esse tipo de espaço se assemelha ao anterior, contudo, duas esquinas fazem parte da disposição desse tipo. Nesse caso, percebe-se caracteristicas similares ao tipo acima, já citado, embora sua potencialidade, dado seu tamanho, esteja no fato de ser um grande espaço de transição entre edifícios, calçada, esquina e rua. Descontinuidade de quadra

Esse tipo caracteriza-se pela interrupção da continuidade da quadra. Seja um espaço vazio, um edifício abandonado ou uma ruína, entre outros edifícios em uso.

Meia quadra

Espaço residual sem ocupação ou mobiliário (mesmo que precário). Nesse tipo prevalece a divisão da quadra (ou do terreno) com as empenas cegas de demais edificações. São espaços extensos e lineares com limites tangentes à via de automóveis. Nesse caso o espaço vira uma extensão da rua.

Triangular

Espaço residual de esquina triangular. Os encontros de duas ruas oblíquoas geram espaços com esse tipo de configuraçãoQuando não em pleno abandono, o aproveitamento há determinados equipamentos de lazer e estar oupequenas barracas de venda.

Edifício

Edifícios de baixo gabarito (até 4 andares) ou casas antigas totalmente em desuso, vezes com risco que desmoronamento ou patologia estrutural. Não apresentam nenhuma ocupação fixa, embora seja alvo de intervenções artísticas temporária.

Galpão ou grande edifício industrial

Edifícios, geralmente industrials (grandes galpões ou antigas usina, postos de gasolina) abandonados, subutilizados ou com grande potencial de abandono. A presença de ocupantes é variável, desde grafiteiros até moradores fixos «sem teto».

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Rio de Janeiro Madureira

Rio de Janeiro Penha


França Saint Etienne

Baixio de viaduto - Arcos

Baixio de viaduto sob arcos. Espaço livre sob viaduto «fragmentado» em parcelas nos pórticos formados pelos arcos do viaduto. No caso françês de Saint Etienne, a linha do trem gera um grande vazio das intermediações do viaduto. Exemplo: praça Jaqcard, bairro Carnot Baixio de viaduto - Pilares

Baixio de viaduto. Esse tipo de espaço residual é caracterizado, geralmente pela formação de um extenso«teto»,gerando um grande espaço livre coberto. No caso Brasileir, encontramos esse tipo nos viadutos Negrão de Lima, em Madureira e no corredor BRT Trasncarica, também em Madureira e no bairro da Penha e Olaria. Estacionamento

Grande vazio urbano sem nenhuma ocupação ou construção. A unica manifestação de ocupação é a de carros. Nesses espaços, o terreno se torna um grande estacionamento de automóveis. Sua pavimentação em terra ou grama demonstra o abandono e a falta de planejamento para esses espaços. Podem ser locais alvo de especulação imobiliária. Estacionamento - Duas esquinas

Espaços residuais de esquinas ocupados por veículo. Espaços vazios sendo utilizados como estacionamento. Em alguns casos, algumas grades são colocadas para privar mais o espaço

Estacionamento - Baixio de viaduto - Arcos

Baixio de viaduto ocupado por veículos

Estacionamento - Baixio de viaduto - Pilares

Baixio de viaduto ocupado por veículos

Estacionamento - Meia Quadra

A grande calçada como extensão da rua, pode, às vezes se tornar um grande estacionamento de automóveis.

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Rio de Janeiro Madureira

Rio de Janeiro Penha


Casos pelo mundo 7.La Petite Ceinture - "Qu'est-ce qu'on peut faire?" ( O que a gente pode fazer?)

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Imagens da intervenção móvel sobre os trilhos da «Petite Ceinture». Espaço de encontro, workshops, pequenas seções de cinema. Imagens retiradas do site da associação: www.yaplusk.org


xi. Proposições e ensaios para o bairro da Penha A tentativa de resolução, assim como as proposições urbanas e arquitetônicas para os espaços descobertos à margem das infra-estruturas de transporte com qualquer ocupação dado suas formas e seus contextos, dentro de uma categoria programática de uso e ocupação, é o ponto essencial no qual se centra este capítulo. Tendo como base o discurso, os exemplos citados nos capítulos anteriores, assim como a pesquisa dos agentes e usuários da cidade, propõe-se agora uma análise projetual para o último estudo de caso dessa pesquisa, no bairro da Penha ao longo do corredor BRT Transcarioca. Ao longo do processo metodológico de percorrer seus quase quatro quilômetros de extensão, a fim de perceber os resíduos urbanos e suas formas de manifestação na cidade, foram descobertos 19 espaços dentro das três categorias gerais especificadas nos capítulos anteriores. Isso mostra como as cicatrizes do processo de modernização da cidade ainda são latentes para a discussão do fazer arquitetura e urbanismo no contexto contemporâneo. Através da intenção de projeto no bairro da Penha na região norte da cidade do Rio de Janeiro, levantam-se algumas questões na tentativa de romper o isolamento social e urbanístico destas áreas obsoletas e degradadas, potencializando suas diferenças formais e sociais, reafirmando seus valores de identidade, e portanto, respeitando seus usuários, ampliando a capacidade de interação entre as diferentes culturas dentro da complexidade urbana da região, de modo a torná-las atrativas à criatividade, à mobilidade das pessoas, à saúde, à educação e à mobilização da população local como grande agente urbano de ocupação contínua. Pragmaticamente, a metodologia deste trabalho leva a prática do caminhar como o fio condutor para as percepções e análises urbanas. Foi a partir da prática do caminhar que a leitura e o encontro com os usuários e agentes dos espaços foram possíveis. Portanto, o partido das propostas de ação ou as propostas interventivas se fundamentaram não só na busca das referências projetuais mostradas ao longo deste processo, mas também sobre a percepção urbana no ritmo do pedestre, assim como a sua valorização enquanto uma força da cidade. Os usuários ou agentes do espaço são da mesma forma importantes para as propostas de ação ou intervenção aqui ensaiadas, pois compreender quem visita ou se firma nesses lugares revela que o arquiteto e urbanista deve compreender as demandas sem autoritarismo ou segregação. O ato de caminhar para o reconhecimento dos espaços, assim como a leitura dos conceitos ligados aos espaços residuais urbanos são, enfim, postos de maneira prática e propositiva para o desdobramento das potencialidades desses lugares - hoje, estranhos, incertos e, por vezes, inseguros, muita das vezes dominado pelo estacionamento de veículos. 78


A associação YA+K, em seu ateliê urbano chamado TRANS305, nos mostra algumas medidas para a participação civil em um terreno vazio com a implementação de idéias experimentais ligada às artes, arquitetura modular de baixo custo e discurso de coletividade. «O ateliê TRANS305 acompanhou o canteiro de obras da fase 1 do projeto ZAC (zonas de desenvolvimento de cooperação) do bairro Plateau, entre o verão de 2010 e o inverno de 2011; O TRANS 305(...) se implanta no coração do canteiro da fase 2 do projeto ZAC. (...) examinando as mutações da cidade em curso. Esse mirante sobre a cidade, de arquitetura modular e genérica, permite um novo sopro às demandas do projeto explorando em um novo contexto, as condições urbanas e humanas necessárias para o fazer e para a integração da arte no espaço público(...) O ateliê abre um novo capitulo de projetos pluridisciplinares no bairro. Ele se insere, se impõe, como um território de liberdade criativa em um ambiente de estresse e de permanentes mutações»51 Isto exposto, o projeto para a zona da Penha encara os vazios urbanos como potencialidades de criação participativa, aproveitando as associações presentes como potencial de ação coletiva para as intervenções e compreendendo que o arquiteto e urbanista em si é um desses agente geradores de vitalidade e não o detentor da última decisão sob a linguagem de projeto. Além de compreender em que a arquitetura modular tem em seu fundamento a fácil alocação, produção e flexibilidade, a utilização de materiais recicláveis como «pallets», pneus, containers reutilizados, excedentes de construção, entre outros são importantes para a exploração do uso coletivo para alguns tipos de espaço. Segundo Nuno Portas, em entrevista, mesmo não concordando com a etimologia da palavra variada do inglês, afirma que a base da sustentabilidade da cidade é a idéia de que as decisões tomadas hoje devem considerar as repercussões para as gerações futuras. Para Portas o modernismo falha ao, arrogantemente, idealizar o futuro como algo que possa ser palpável ao domínio da linguagem arquitetônica e urbana. « Como vivemos numa época de grandes incertezas, nossas decisões devem ser, de alguma forma, flexíveis, passíveis de aperfeiçoamentos. Não devemos tomar atitudes últimas em todos os campos.(...) É cada vez maior o número de automóveis nos centros das grandes cidades. Sob o argumento de que não há transporte coletivo bom, os motoristas aumentam o problema da poluição ambiental; e, como faltam estacionamentos, deixam os veículos 52 em cima das calçadas» 51.Trecho retirado in : < w w w. y a p l u s k . o r g > tradução livre pelo autor 5 2 . Tr e c h o r e t i r a d o d e entrevista de Nuno Portas: <www.arcoweb.com.br>

Pretende-se, portanto, buscar maneiras da cidade viver de forma mais harmoniosa e coerente dentro das demandas de democracia e direito à cidade com os seus vazios marginalizados, aproveitando e reconhecendo seus potenciais e suas estruturas já existentes - como edifícios abandonados, baixios de viadutos e equipamentos subutilizados - ajustando-os às práticas reais e necessidades socioculturais do trecho estudado. 79


200m

0

O bairro da Penha. Em destaque o trajeto do corredor de Ă´nibus BRT Transcarioca

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400m

800m


Mapa de usos do solo O desenvolvimento das competências de análise, além da vivência do lugar, é de grande eficácia para o entendimento do contexto urbano. O Mapa de uso dos solos agrega à pesquisa um entendimento de quais dinâmicas sociais estão

viaduto Cosme e Damião

ligadas direta ou indiretamente aos espaços residuais urbanos. Constata-se que na região estudada, o uso predominante do solo é de caráter residencial, demonstrada por toda a área na qual está contemplada pelas cores cinzas. O mapa de uso de solos é importante para a reafirmação das características encontradas na vivência dos espaços, nas visitas à região e nos caminhos percorridos. Exemplo disto é o o grande aglomerado da função de comércio na região da estação do Trem da Penha englobando até a estação do BRT Transcarioca da Penha. Outra informação relevante levantada pelo mapa de usos do solo é a mesma manifestação de comércio nas proximidades dos baixios dos viadutos São Cosme e São damião, onde se encontra um grande vazio urbano e entre esses dois grandes polos há uma carência desse uso. Cobertura arbórea e arbustiva Cobertura gramíneo lenhosa Favela Áreas de transporte Áreas institucionais e de infraestrutura pública Áreas não edificadas Áreas de comércio e serviços Áreas de educação e saúde Áreas de lazer

Mapa de uso e ocupação do solo no bairro da Penha Dados: www.armazemdedados.rio.rj.gov.br

Estação BRT 81


Mapa de vias de circulação Como o trabalho - tanto no campo teórico quanto no campo propositivo de ações e intervenções tem uma relação estreita com as grandes rotas de infra-estrutura urbana de transporte urbano, é imprescindível antes de qualquer proposição mais profunda o esclarecimento dos trajetos de

viaduto Cosme e Damião

veículos e suas capacidades. Com o crescimento da cidade e seu desenvolvimento e o uso do automóvel cada vez mais imposto, criam-se avenidas nas adjacências desse rastro deixado pela linha do trem. Em uma linha cronológica vemos, primeiramente a linha do trem como primeira grande via cortando o bairro, em seguida as ruas Ibiapina, rua Uranos, e por último, a Transcarioca. É legível a relação entre a construção do BRT Transcarioca e os espaços residuais urbanos, pois onde os espaços estão manifestados é justamente onde o novo traçado urbano se desenvolve. Espaços triangulares às adjacências da grande

Bifurcação ruaUranos e rua Ibiapina

via são visíveis, assim como as possíveis desapropriações ou edifícios abandonados. Um potencial criado pela construção da Transcarioca foi a bifurcação da rua Ibiapina e Uranos, gerando uma grande rua de baixo fluxo próximo à dois grandes vazios urbanos, um construído e outro um espaço triangular cuja função se dá somente pela utilização de quadras esportivas.

Vias Arteriais

Estação BRT

Vias de Pedestres Vias Locais Vias Especias Linha Férrea Vias Coletoras

Mapa de vias de circulação elaborado pelo autor

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Identificação das áreas Espaço público Tipo: Baixio de Viaduto Usuários: moradores sem tetp Àrea: 2000m²

Espaço público Tipo: meia quadra Usuários: veículos Àrea: 1000m²

Espaço público Tipo:trecho de quadra Usuários: pedestres Àrea: 700m²

Tipo: Edifício Abandonado e espaço triangular Usuários: moradores sem teto/veículos Àrea: 3000m²

Espaço público Tipo: espaço triangular Usuários: transporte público e ambulantes Àrea: 4000m² Mapa de identificação das áreas no bairro da Penha Imagens capturadas pelo autor

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Identificação das áreas

Espaço público Tipo: Baixio de Viaduto Usuários: Carros e guardadores Área: 3000m²

Espaço público Tipo: meia quadra Usuários: Feirantes, moradores e usuários do BRT.

Espaço privado Tipo: Edifício Abandonado Usuários: Àrea: 2000m²

Espaço público Tipo: área triangular Usuários: moradores Àrea: 4000m²

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Espaço privado Tipo: terreno vazio Usuários: Àrea: 400m²

Mapa de identificação das áreas no bairro da Penha Imagens capturadas pelo autor

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Identificação das áreas Para que os espaços residuais deixem de ser lugares isolados deverão ser configuradas unidades geradoras de relação para um raio de ação envolvente no qual a criação de novos programas

8000m²

gere espacialidades atrativas a fim de nutrir as especificidades atuais e, além disso, captar novas possíveis ocupações. Deste modo, os objetivos primordiais concentram-se nas dinâmicas encontradas nos três lugares principais do percurso. O primeiro, local onde se encontra a estação do BRT, configura-se como o lugar onde há a maior concentração de espaços residuais com uma área total em torno de 9.000m². O segundo, se encontra no ponto médio do percurso, onde a rua Ibiapina cria uma bifurcação, dando início às ruas Uranos e Etelvina. Neste local dois resíduos

6000m²

são evidentes. O primeiro, um grande espaço triangular - formado pela divisão das ruas - e um prédio de características industriais abandonado, formando uma área total, entre construído e não construído, de em torno de 6.000m². O terceiro grande local é composto por dois baixios de viadutos - viaduto São Cosme e Damião e o recente viaduto do BRT Transcarioca formando uma área residual em torno de 8000m². Neste local a característica de confluência das vias é expressiva, assim como o caráter comercial da área. Além disso, o baixio do Viaduto São Cosme e Damião é totalmente segregado da malha urbana, tendo seu acesso restrito pelo baixio do viaduto do BRT. Com isso, os objetivos gerais focam-se não só nas necessidades imediatas das zonas, mas também na

9000m²

prática de uma modalidade de participação que gere uma rede de atores locais a trabalhar com o objetivo concreto de potencializar esses lugares sem que retire a sua identidade. 85



EstratĂŠgias Urbanas

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Estratégias Urbanas

Jardim Espaço planejado com plantas, flores e árvores para contemplação e encontros. Os jardins tem a capacidade de criar um «respiro» para ambientes urbanos muito densos. Ele permite o caminhar, o estar e o uso associativo, local e permanente são fundamentais para sua manutenção

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200

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Estratégias Urbanas

Food Truck ou Sacolão Móvel Iniciativa para a ocupação de território sem usos definidos. Consiste na utilização de caminhões ou ônibus para a venda de produtos, geralmente comidas de preparo rápido, frutas, hortaliças e legumes. Para sua implementação deve-se estabelecer junto ao poder público rotas itinerante.

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800m


Estratégias Urbanas

Pocket Park Pequeno parque acessível ao público. Fornece sombra e lugar de descanso ao ar livre. Os materiais usado podem ser recicláveis, tais como pallets, pneus, restos de construção e canteiros sustentáveis

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Estratégias Urbanas

Esporte e Lazer ligados à cultura de rua Equipamentos de uso esportivo como skate park, quadras poliesportivas, tablados de dança e musica. A transdisciplinaridade da cultura de rua ( ou Hiphop) se apropria inteiramente desses programas, gerando ocupação pelo esporte, pela musica, pela dança e pela arte gráfica.

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Estratégias Urbanas

Parklet Conversão de uma vaga para veículos em um «mini-parque» ou um ambiente de estar. cria limites entre a opressão dos veículos estacionados sobre as calçadas, torna a rua mais atrativa e ativa o comércio local.

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Estratégias Urbanas

Horta Urbana Possibilita o convívio social, promove um ambiente saudável, ocupando e transformando espaços ociosos. A produção de alimentos é voltada para o consumo local, descomprimindo gastos com esses produtos, além de ativar as práticas de consciência coletiva.

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Estratégias Urbanas

Pop Up Estratégias rápidas de fácil montagem e temporárias para ativar uma área determinada. Eventos como rodas de samba, feiras orgânicas ou eventos festivos são umas das características possíveis para esse tipo de estratégia.

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Estratégias Urbanas

Reabilitação Iniciativas que podem ser de cunho associativo ou politico institucional para a reparação de danos e patologias construtivas em determinados edifícios abandonados ou em mal estado de conservação

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Estratégias Urbanas

Traffic Calm Técnicas para reduzir o efeito negativo do trânsito, criando um ambiente mais agradável para os pedestres.

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Estratégias Urbanas

Ciclovia e ciclo-faixa Estratégia que tem como objetivo diversificar a mobilidade urbana de transporte. Com o uso de bicicleta pode-se atingir curtas, médias e até longas distancias. Chama-se ciclovia, exclusiva para bicicletas, onde não há nenhuma partilha com a via de automóveis. A ciclo-faixa é a via destinadas aos ciclista cujo trajeto é compartilhado com a via de automóveis

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400

800m


Complementando as informações dispostas nas análises sobre o contexto urbano da Penha, é importante perceber as carências da região. Como as funções predominantes da região são de caráter habitacional, de comércio e transporte, é primordial salientar as carências das funções do setor cultural, educacional, de esporte e lazer, além de vias especiais, como ciclovias, ciclofaixas e vias de pedestres. É sobre essas carências que as proposições vão se debruçar, juntamente com o esforço e os instrumentos da arquitetura e do urbanismo para a melhor adequação e integração entre ofertas e demandas das relações espaciais com o prepósito da criação de qualidade e conforto do ambiente urbano. Um espaço residual nunca deixará de ser um espaço residual, sua forma, sua identidade, sua origem está fundada na abstenção de escolhas do traçado urbano em projeto, do crescimento sem controle da cidade, da especulação do território ou da descapitalização deste. Eles devem reafirmar a vacância, a liberdade e a flexibilidade que o vazio possibilita como afirma Solà Morales. Entretanto, o que se propõe são ações que ressaltem estes aspectos, entrelaçados com as potencialidades existentes, isso estimula a densidade do território e a permanência dos usuários. As estratégias urbanas devem valorizar a mistura de funções, diferentemente da setorizarão do pensamento modernista. Essas estratégias se tornam importantes para a vitalidade do conjunto urbano, afinal o sistema complexo cidade é essa aglomeração múltipla de diferentes camadas e funções. Portanto, quanto mais múltiplo, quanto mais funções se interpenetram, quanto mais interdisciplinar o fazer arquitetônico se desenvolve, mais democrática e humana a cidade se torna. O resultado dessas estratégias torna as relações espaciais mais flexíveis e mais coerente com o cotidiano diverso que nossa sociedade encara dentro do direito no qual a rua é o lugar de troca política e de encontro. Contudo, em algumas das estratégias urbanas propostas neste capítulo, a manutenção dos equipamentos é tão primordial quanto sua inserção. Pode parecer que a necessidade de manutenção gere encargos ou custos. Mas é aqui que o papel de medidas associativas, coletivas e da democracia atinge sua relevância, onde as ações contínuas são parte integrante do projeto de cidade, da cultura local e da sociedade à exemplo das Associação Carton Plein, a CUFA, a FAU-UFRJ, etc. Deste modo, procura-se - além do entendimento de que a participação para estratégias urbanas permeiam os campos multidisciplinares como o da sociologia, da geografia, da política publica, da engenharia - a participação cívica como fator preponderante para os desdobramentos, a manutenção e inserção das intervenções e de novas demandas. 98


Estratégias Arquitetônicas

99


Estratégias Arquitetônicas A justificativa para a apropriação do módulo container é seu enorme potencial de flexibilidade programática, o valor de compra desses equipamentos, a oportunidade de re-utilização e a possível doação dos excedentes de industrias ou obras públicas. Esses módulos podem permitir uma grande gradação de experiências em diversas circunstâncias coletivas, sobretudo urbanas, de longa ou curta duração, mais ou menos coordenadas. Dessa forma, esses containers podem aumentar as expectativas de respostas à participação civil e integração urbana na construção cultural e social do espaço. Neste trabalho ensaiaremos com um módulo específico R$ 3.000,00

de dimensões demonstradas nos desenhos ao lado, visando uma simplificação dessa simulação, pois existem variações de tamanho e categorias de 20 pés. Este conta com o menor valor de mercado e as menores dimensões. Segundo o site de compra e vendas

2,591m

containers. O container escolhido é o mais simples, o de

mercadolivre é possível adquirir uma estrutura dessa por cerca de três mil reais na região do Rio de Janeiro.

58m

6,0 2,43

8m

Além dos preços acessíveis por um "mobiliário" habitável, abrigável e flexível, é possível que estes módulos possam ser adquiridos pelo Estado de maneira pública visando a ressignificação do container como uma estratégia arquitetônica para espaços ociosos da cidade com o propósito de reativar, reocupar ou catalisar a vitalidade do espaço público. Ampliando a forma de conceber o módulo, podemos utilizar somente sua estrutura e trabalhar painéis modulares para o fechamento, criando assim mais possibilidades de forma e combinações para este que já exibe proporções flexíveis ao uso na cidade. Ora podemos utilizar ele «original», ora podemos elaborar complexos jogos de cheios e vazios. 100


Estratégias Arquitetônicas Visando a instalação dos protótipo modulares em função das demandas do contexto urbano analisado, cria-se três categorias gerais - podendo ser variáveis em circunstancias diferentes - para a inserção nos espaços residuais. São eles: o módulo de pernoite, para usuários que necessitem de um abrigo temporário, viajantes em busca do repouso ou trabalhadores sem teto. Neste módulo, há uma necessidade de mobiliários como cama, Módulo de pernoite

um chuveiro, um armário e um banheiro. O módulo de comércio que visa dar suporte aos feirantes e comerciantes informais da região, necessitando apenas de uma bancada de exposição. E enfim, o módulo livre ou lúdico, cujo mobiliário pode ser desde «pallets», mesas, cadeiras, painéis de exposição ou outros equipamentos dadas as demandas dos agentes usuários locais. Ao contrário das tradicionais estratégias de negação que ensaiam mascarar os espaços residuais, o que se busca

Módulo de comércio

nessa experimentação é a reanimação dessa identidade residual a partir da noção de uma democratização do espaço. Ou seja, o uso de instrumentos, equipamentos, métodos, e mobiliários que se adequam à potencialidade de um espaço originário de uma construção de infraestrutura, que gere produtividade, encontro e ocupação do solo. A proposta visa ao longo deste capítulo a busca da máxima capacidade de ampliação e conhecimento das diferentes estratégias urbanas e arquitetônicas, que ao contrário do que genericamente se imagina, podem ser

Módulo livre ou lúdico

versáteis ao ponto de englobar diversas formas de ocupação, gerando densidade de forma positiva para a cidade e, portanto, sem a obrigatoriedade da modificação de seu tecido, de suas quadras e de sua configuração original.

101


Estratégias Arquitetônicas

Uso aéreo - Inserção de novos programas Essa estratégia identifica o problema dos espaços residuais como locais de estacionamento e ensaia a adaptação de novos usos a partir da elevação dos módulos, gerando uma colaboração entre espaços de estacionamento e a diversidade programática.

0

200

400

800m

102


Estratégias Arquitetônicas

Acréscimo de área Estratégia para edifícios à serem requalificados. Os anexos podem diversificar e aumentar os usos do prédio, além de dinamizar a forma original do edifício.

0

200

103

400

800m


Estratégias Arquitetônicas

Módulos nos baixio de viadutos Os módulos podem formar estruturas arquitetônicas conjugadas de maneira variada sob o viaduto. Sejam eles módulos de pernoite, módulos livres ou de comércio.

0

200

400

800m

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Tabela de combinação, compatibilidade tempo e custo

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recomendável

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pouco recomendável 105

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não recomendável


Diagrama de combinaçþes

106


Análise e Justificativa do Programa Edifícios vazios Sobre edifícios vazios que tenham o caráter de propriedade privada, afirma: «No brasil, o direito a propriedade privada não é absoluto. A constituição diz sim que todos têm direito à propriedade, mas coloca que essa propriedade deve cumprir uma função social. Uma propriedade que está em situação ociosa, vazia jogada está em uma situação ilegal. Ela não está 53 cumprindo uma função social.» No caso dos edifícios em estado de abandono, a prefeitura por meios de 54

decreto pode restabelecer o uso social de edifícios neste tipo de estado. Nesse sentido, cabe ao poder executivo, em sua parcela política, determinar a requalificação desses espaços. Entretanto o que se percebe em torno da política urbana é a submissão do poder público dentro de uma ótica especulatória dos espaços construídos em desuso. Foram identificados três edifícios ao longo do trecho percorrido em estado de abandono. O primeiro se encontra ao lado da estação do BRT Penha, R. Monsenhor Alves Rocha, 100-112. O segundo se encontra à 50 metros da estação, R. Monsenhor Alves Rocha, 63. E o terceiro mais adiante, na Rua Uranos 1461. A exemplo dos squats na França, o poder público, juntamente com as instâncias locais, poderia acordar e dinamizar esses edifícios para o benefício local da população, seja para uso habitacional, institucional ou associativo. Com isso, para os edifícios encontrados ao longo do percurso BRT Penha, dedicamos o uso associativo para o edifício ao lado da estação da Penha, (R. Monsenhor Alves Rocha, 100-112 e 63). Neste espaço podemos conjugar o programa de um centro associativo com biblioteca e espaços de leituras, atrelando novos módulos de containers. A dinâmica densa de passageiros e moradores do local tem uma relevância interessante para o trabalho e os programas associativos ligado à cultura e educação, aproveitando o ambiente decomércio formal e informal, lazer - instituído pelo parque shangai - e a presença institucional da "igreja Nossa Senhora 53.Guilherme Boulos in:<www.facebook.com/Mi diaNINJA>

Desatadora dos Nós". O aspecto cultural é considerado como um forte gerador e uns dos principais instrumentos de inclusão social, pois estimula a ação coletiva e o sentimento

54. nota: decreto

municipal 35.648/12

de identidade mesmo dos indivíduos das comunidades mais excluídas. 107


Deste modo, no endereço, R. Monsenhor Alves Rocha, 63, o edifício tipo "galpão" se encontra interditado e sem algum uso visível. Neste local propõe-se usos que possam se atrelar à dinâmica associativa comunitária como hortas urbanas, cinema popular, exibições teatrais e espaços de livre transito e ocupação, como pop-ups, eventos culturais, eventos ligados à cultura do samba, do hip hop, moda da periferia, assim como eventos beneficentes ligado à diversidade religiosa, feiras orgânicas e de produtos locais. Os mercados têm uma característica marcante no sentido da atração de pessoas para a ocupação dos espaços. Além de fazerem parte fundamental da cultura de nossa sociedade, os mercados promovem trocas legítimas de produtos, informações e ativa lugares de maneira diversa. Por isso propõese para o terceiro edifício, localizado na Rua Uranos 1461, que se impõe na paisagem, um programa diverso nesse sentido do mercado e dos serviços em seu térreo com pequenos mercados de frutas, hortaliças ou especiarias, passando por pequenos restaurantes ou bares. É uma construção de características verdadeiramente industriais, o que pode valorizar o imaginário da história industrial do bairro visto sua requalificação. Sua fachada, voltada para rua Uranos, é formada por diversos pórticos. Nesse edifício, dada a sua grandeza em área, é possível a diversificação entre espaços de cowork, salas de escritórios e biblioteca para as escolas da região Outros espaços residuais à margem do BRT Transcarioca Iluminando os demais tipos de espaços encontrados, percebemos uma variação grande na forma e nas áreas desses espaços residuais. Diferentemente dos edifícios em estado de abandono, esses espaços detém uma estrita relação com o traçado do corredor BRT Transcarioca - espaços de esquina, descontinuidade de quadra, meia quadra, triangular e estacionamentos irregulares fazem parte dessa categoria. Esses espaços se encontram: na Av. Brás de Pina 13; R. Monsenhor Alves Rocha, 100-112; R. Vassalo Caruso 553, R. Leopoldina Rego 887; R. Uranos 1496; Esquina R. Alfredo Barcelos/Corredor BRT Transcarioca; Esquina R. Fauto Amaral/ Corredor BRT Transcarioca. Como vivemos em uma cidade onde os acontecimentos muitas vezes são inesperados, é interessante perceber nesses espaços vagos a possibilidade de 108


Imagem esquerda em cima: Monsenhor Alves Rocha, 100112 Imagem embaixo esquerda: Rua Uranos 1461 Imagem em cima Ă direita: Monsenhor Alves Rocha, 100112 Imagem embaixo Ă direita: R. Monsenhor Alves Rocha, 63

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de dinamizar a fluidez de usos e ocupações. Isto exposto, determina-se um programa alusivo e diversificado em cada contexto, utilisando as estratégias urbanas e arquitetônicas demonstradas nas páginas anteriores. O único espaço dentro desta esfera que apresenta mobiliários, equipamentos e uma função social estabelecida em sua composição espacial se encontra na rua Uranos 1496, ao lado do edifício abandonado na mesma quadra. Esse espaço conta com quadras polidesportivas e alguns bancos. Entretanto, a função monotemática deste espaço o deixa ocioso em diversos momentos do dia, isso é agravado pelo fato de estar localizado entre duas grandes vias de circulação de alta intensidade e a falta de iluminação adequada. Nesse sentido, a proposta se apropria da identidade esportiva do local adicionando alguns novos equipamentos de esporte e lazer, módulos de comércio e módulos de livre utilização. Também é interessante - dado o tamanho de sua área - que se desenvolva algumas práticas que colaborem com o uso cotidiano coletivo, como hortas urbanas ou pequenos jardins associados ao mercado do edifício ao lado. Baixio do viaduto São Cosme e São Damião e Baixo do viaduto BRT «Tamanho o desinteresse e incapacidade do poder público manejar essas áreas, é comum “envelopar” esses espaços, completando a parte interna com material compacto e revestindo com alvenaria ou semelhante, transformando-os em apêndices grosseiros e rudimentares. Em contrapartida e até em contradição com o acontecimento do aparecimento de espaços residuais, está a super valorização do metro quadrado nas grandes metrópoles e a carência de áreas públicas de atividades coletivas ou recreação nos grandes centros urbanos.»55 Pelas características anunciadas por Coimbra, assim como suas origens, os baixios de viadutos podem ser considerados o símbolo assonante dos espaços residuais urbanos proeminentes das infra-estruturas de transporte urbano. Estes mostram, na maneira de ocupar a cidade contemporânea, um novo olhar sobre as grandes possibilidades de desenvolvimento social ativo. A exemplo das referências mostradas ao longo desta pesquisa: Viaduto do café, em São Paulo; O viaduto do encantado, no Rio de Janeiro; as intervenções da associação Carton Plein, na França; o baile charme e a CUFA, no Rio de Janeiro; percebe-se que nesses tipos de espaços há uma nuance de alternativas e programas a se seguir. Algo fundamental para a intervenção nesses espaços são as representações e símbolos que devem ser respeitados e que demarcam uma identidade sobre a qual habitualmente a rua é palco legítimo dessas manifestações. 110

55.COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva, Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: Espaços Residuais da Infraestrutura Viária e Paisagem Urbana, UFRJ, 2013, pag 6


Imagem esquerda em cima: Rua Uranos, 1088 - Viaduto do BRT Imagem embaixo esquerda: Viaduto São Cosme e São Damião Imagem em cima à direita: Rua Uranos, 1088 - Viaduto do BRT Imagem embaixo à direita: Viaduto São Cosme e São Damião

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Infelizmente, vemos um movimento contrário no qual a cidade tem se desenvolvido para seus usos cada vez mais individualizadores. Os cinemas de rua viraram salas em shopping center, espaços de convivência e lazer entre as grades e muros dos condomínios, espaços públicos ociosos viram estacionamento de veículos. Nesse sentido, propõe-se os usos sobretudo públicos para esses espaços de baixio de viaduto, mas sem deixar de observar os usuários e indivíduos permanentes desses lugares. Porque não disponibilizar também estruturas para o desenvolvimento social de quem vive na rua? Ou até alguém que precise pernoitar para trabalhar no dia seguinte, ou mesmo um viajante que não encontrou algum lugar para se abrigar? Desta maneira, encontra-se no baixio do viaduto a possibilidade de conjugar a flexibilização dos containers em módulos de pernoite com a questão da moradia na sociedade contemporânea. Os conteiners podem servir de maneira pública ou associativa institucional, e também adquirir outras funções durante o dia. O módulo possibilita também algumas variações formais, se abrindo em partes aéreas, varandas, terraços, pequenos jardins ou hortas. Embora isso não resolva o macro-problema habitacional das grandes metrópoles, com essa pequena ação pode-se buscar um equilíbrio entre aqueles que não se adaptam à cidade formal com as dinâmicas sociais, esportivas e culturais, visando um processo de adaptabilidade entre os usuários permanentes, pendulares e moradores. Em suma, a busca de uma vida democraticamente viável por intermédio do espaço urbano. Além das proposições referentes ao quesito "habitar", propõe-se - a partir de todas as referências encontradas - a busca de uma relação com o hip hop e a Cultura de Rua nesses espaços como uma força até hoje marginalizada, valorizando o skate com um skate-park, algumas áreas de tablado e quadras poli-esportivas. Os tablados podem ser usados para pequenos concertos ou rodas culturais, dança e práticas teatrais, além de poderem ser modificados como os usuários pretendam.

112


Imagem esquerda em cima: Rua Vassalo Caruso, altura da estação de Olaria Imagem embaixo esquerda: Estacionamento improvisado ao lado da estação da Penha, R. Monsenhor Alves Rocha, 100112 Imagem em cima à direita: Rua Vassao Caruso na altura do acesso ao Viaduto São Cosme e São Damião imagem embaixo à direita:Rua Uranos , s/ número - bifurcação da rua Ibiapina

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Intervenções em determinadas ruas Visto que o trajeto entre todos os espaços descobertos tem uma distância de entorno de dois quilômetros, e que além desta ocorrência, o caminhar e a locomoção local de ciclistas é feita de maneira perigosa, dedicamos uma parte pospositiva identificando a necessidade deste transito e fluxo também mais democrático. Primeiramente, partindo da estação BRT Penha, uma ciclofaixa compartilhada com a rua Monsenhor Alves Rosa. Na mesma estação há a possibilidade de se implementar equipamentos de mobiliário como bicicletários. A ciclofaixa percorreria a rua Ibiapina até a bifurcação, onde ela se torna então a rua Uranos e Etelvina. Nesta mesma bifurcação é onde se encontra o espaço triangular rua Uranos 1496 - entre as ruas Uranos e a Etelvina. Nesse trecho, a ciclofaixa se tornaria ciclovia com acesso apenas de pedestres ou uma rua de traffic calm. Ou seja, no trecho entre a bifurcação até a rua Leonídia, a rua Etelvina se torna de uso exclusivo de pedestres e de bicicletas. Após esse trecho até o viaduto do BRT a via se torna compartilhada novamente com os carros. Além disso, outras ruas, principalmente as vias de circulação local, podem ser convertidas em ruas compartilhadas com pedestres sob a estratégia de parklets e traffic calm. Nessas situações algumas ruas que dão acesso direto às estações do BRT Penha e BRT Olaria. Isso conformaria uma relação no caminhar mais seguro e menos opressivo da relação carro, pedestre e cidade. Em suma, o papel do arquiteto urbanista para esses gêneros espaços é pequeno em comparação às medidas e a mudança cultural de uma sociedade inteira. Seu papel fundamental, na verdade, é o de instrumentalizar e utilizar a linguagem do projeto e do desenho para desenvolver metodologias de ação cotidiana. Assim como existe o tratamento médico cotidiano pelo programa «médico da família», o arquiteto e urbanista deve ter papel cotidiano de relação com esses grandes pacientes: a cidade contemporânea e seus habitantes.

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Imagem esquerda em cima: Rua Leopodina Rego, 887 Imagem embaixo esquerda: Rua Vassalo Caruso, 553 Imagem em cima Ă direita: Rua Leopodina Rego, 887 Imagem embaixo Ă direita Rua Vassalo Caruso, 553

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Legislação e potenciais jurídicos Neste tópico, o estudo visa imergir as possibilidades e potenciais de ação para as proposições dos espaços residuais nos méritos jurídicos e legais dentro das esferas nacionais, regionais e municipais afim de embasar as competências pluridisciplinares relativas ao papel do arquiteto e urbanista na dinâmica da construção do espaço urbano. As leis, de uma maneira concreta, agem sob a ótica da legitimidade de determinadas ações e políticas do Estado para manter o equilíbrio entre as camadas de interesse público e privado. Deste modo, as leis têm extrema importância no agir da cidade, onde cada vez mais se identifica a sobreposição dos interesses privados - ou a capitalização do espaço - sobre os interesses públicos. Dentre as leis analisadas, algumas podem ser recorridas como instrumentos para a inserção do projeto em locais residuais ou vazios urbanos da cidade. Dentro da esfera nacional podemos evocar as leis Rouanet - lei de incentivo à cultura (Lei nº 8.313/1991), lei de incentivo ao esporte (Lei nº 11.438/2006), lei do ICMS (Lei nº 87/1996), lei do ISS (nº 116/2003). Com esses princípios legais podemos desfrutar de iniciativas por parte do Estado para criar incentivos fiscais e financeiros aos espaços dados seus programas de ocupação. Em relação aos espaços cujo a gestão tem como objetivo à valorização da cultura e de práticas como feiras, cinemas populares e eventos festivos de ordem cultural como as rodas culturais promovidos em Madureira ou o baile charme no mesmo bairro, pode-se aplicar os investimentos públicos aplicados pela lei Rouanet. Essa medida ampliaria os recursos para os agentes presentes no local, mas a participação popular para a manutenção de recursos é fundamental para esse quesito. Para os locais onde o programa está voltado para o quesito do esporte, pode-se desenvolver, a partir da lei de incentivo ao esporte a construção de quadras, skate-park e outras pequenas construções que possam aumentar a ocupação desses locais vazios. A isenção fiscal é um instrumento muito utilizado para regiões ou empresas que darão algum benefício à um local ou região. Entretanto, percebe-se que essas isenções podem passar por uma má gestão, novamente, entre o equilíbrio do público e privado e medidas arbitrárias são tomadas por essa relação de submissão das instâncias públicas sobre os interesses mercadológicos do espaço urbano. A lei do ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias e serviços) é uma lei de competência do Estado do Rio de Janeiro e constitui-se na tributação de impostos sobre mercadorias e serviços entre os Estados da federação brasileira. 116


Assim como a lei do ICMS, a lei do ISS é um tributo voltado para a prestação de serviços - estes de qualquer natureza. Contudo, a lei do ISS é de competência Municipal e Federal, atingindo assim, outras esferas de competência políticoinstitucional. A criação de subsídios ou incentivos como a isenção fiscal deste imposto traz o interesse de investimentos do setor privado para a colaboração para com os espaços residuais. Espaços de restaurantes e bares, locais onde há a necessidade de implantação de containers ou a compra dos mesmos, poderiam usufruir desse tipo de isenção fiscal. Outras medidas legais Outros instrumentos legais já praticados na valorização de determinados espaços urbanos serão pertinentes para a inserção das intervenções aqui propostas. Deste modo, as medidas como a isenção do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) cobrado anualmente pela Prefeitura - dos friches encontrados ao longo do percurso (R. Monsenhor Alves Rocha, 100-112; R. Monsenhor Alves Rocha, 63; na Rua Uranos 1461) poderão ter uma gestão mais flexível dada à isenção fiscal. Dentro deste quesito, outras medidas que podem ser aplicáveis no âmbito municipal de gestão do espaço urbano é a isenção da TLE (taxas de licença de estabelecimento) e da TEO (taxas de execução de obra). A TLE, ou simplesmente alvará é uma licença concedida pela Coordenação de Licenciamento e Fiscalização permitindo a localização e o funcionamento de estabelecimentos comerciais, industriais, agrícolas, prestadores de serviços, bem como de sociedades, instituições, e associações de qualquer natureza, vinculadas a pessoas físicas ou jurídicas.56 Portanto, a isenção dessa taxa busca novas demandas de interesse para os espaços onde há módulos de comércio, restaurantes, pequenas lojas ou as associações do bairro. A TEO tem como fato gerador o poder de polícia regularmente exercido pela administração pública sobre a execução de qualquer obra de construção, demolição, 56.Referencia in: <http://www.cdaservicos.sr v.br/artigos/detalhes-doartigo/42/taxa+de+licenca+ para+estabelecimento+++al vara+no+municipio+do+rio +de+janeiro>

reforma ou parcelamento de área, no âmbito do Distrito Federal, verificando a adequação delas à legislação vigente.

57.Refencia in: <https://www.jusbrasil.com .br/jurisprudencia/busca?q= C A RTA + D E + H A B I T E SE+REGULARMENTE+E XPEDIDA>

117

57


INVESTIDORES E AGENTES dividendos compra/venda

Lançamento do programa «Espaços Residuais Urbanas, Resíduos de esperança humana» com incentivos, diretrizes, editais e concursos

ESPAÇOS RESIDUAIS

associações e coletivos

URBANOS

associações e coletivos

USUÁRIOS

Lei Rouanet Lei de incentivo ao Esporte Lei do ICMS Lei do ISS Decreto 35.648/12

estudantes

jovens Isenção do IPTU Isenção da Taxa de Licença para estabelecimento Isenção das Taxas de Licença para execução de Obras

turistas

moradores sem teto

hip hop artistas

profissionais da ind. cultural

Diagrama das ações possíveis no âmbito legal associados aos agentes locais e usuários

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Ciclofaixa

Programa de uso e ocupação

Baixios de viaduto Área livre, Jardins Módulos livres Módulos de comércio Esporte Espaço de Lazer Módulos de pernoite Horta urbana/Jardim

Ciclovia - via exclusiva para pedestres

Módulos livres Áreas livres e jardins Trasnporte - BRT Área Livre - Jardim Módulos de comércio Requalificação de edifício: Bares Restaurantes Espaço para feiras Coowork Biblioteca escolar Esporte Módulos livres Módulos de comércio Horta Urbana/Jardins

escolas

Ciclofaixa

Módulos de pernoite Módulos livres Transporte - BRT Módulos de comércio Área livre e jardins Horta urbana Requalificação de edifícios: Centro associativo Espaço de leitura Sebo e Biblioteca Espaço de cinema popular Espaço de Feira e comércio informal via de pedestre ou traffic calm 119

0

200

400

800m


Programa de uso e ocupação

A C C

B

A B Ciclofaixa

Ciclovia - via exclusiva para pedestres

BC

B A

Ciclofaixa

C

A

Estação BRT Penha Transporte- Estação BRT Penha / Módulos de comércio- Área livreHorta urbana

Estação BRT Olaria Trasnporte - BRT Olaria- Área Livre e Jardim- Comércio informalMódulos de comércio- Módulos livres

Rua Ibiapina Módulos de pernoite Módulos livres

Viaduto BRT Rua Uranos Área livre- Módulos livresRequalificação de edifício: Bares Esporte - Horta urbana/JardimRestaurantes Espaço para feiras Espaço de Lazer - Hip Hop Coowork - Biblioteca escolar

Viaduto São Cosme e Damião Módulos de comércio Módulos de pernoite- Jardim Horta urbana

Rua Monsenhor Alves Rocha Requalificação de edifícios: Esporte- Módulos livres- Módulos de Centro associativo- Espaço de comércio- Horta Urbana- Jardins leitura- Sebo e Biblioteca - Espaço de cinema popular- Espaço de Feiras e comércio informal

0

120

400

800m


Diretrizes de projeto

Estação BRT Penha - Rua Monsenhor Alves Rocha

Estação BRT Penha - Rua Monsenhor Alves Rocha. Imagem capturada pelo autor Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Aproveitamento e reforma da cobertura existem. Uso livres: feiras, apresentações, eventos comunitários. Módulos livres ou módulos de comércio complementares

Reabilitação e requalificação do edifício: conversão do edifício em Centro associativo com espaço de leitura, biblioteca e projetos das associações

Limpeza do terreno; retirada de dejetos e possível demolição de meios fios irregulares. Retirada dos veículos. Utilização de áreas de transição com canteiros sustentáveis, uso de pneus, pallets ou outros materiais reutilizaveis

Uso da empenha para intervenções, artes de rua ligadas à educação e cidadania; cinema ao ar livre, projeções ou muros verdes.

Rua Monsenhor Alves Rocha: Via especial de ciclistas (ciclofaixa)

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Diretrizes de projeto

Rua Uranos , s/ número - bifurcação da rua Ibiapina

Rua Uranos , s/ número - bifurcação da rua Ibiapina Imagem capturada pelo Google streetview Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Rua Etelvina: Via especial de pedestres e ciclistas; inserção da ciclovia e pavimentação para pedestres e traffic calm

Uso da empenha para intervenções, artes de rua ligadas à educação e cidadania; cinema ao ar livre, projeções, muros verdes

Iluminação nas áreas de permanência; coberturas ve rd e s o u p e rg u l a d o s ; canteiros e arborização

Aproveitamento dos equipamentos de esportes; iluminação pública adequada para prática noturna

inserção de módulos livres e/ou módulos de comércio; inserção de novos equipamentos de esporte

Aproveitamento de canteiros obsoletos convertendo-os em jardins ou hortas urbanas; parceria com a escola local

Fechamento do retorno para veículos e ampliação da área de pedestres; inserção de módulos livres e/ou de comércio; pop ups; parada de sacolão móvel ou food truck

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Diretrizes de projeto

Rua Etelvina, s/número- bifurcação da rua Ibiapina

Rua Etelvina, s/número- bifurcação da rua Ibiapina Imagem capturada pelo Google streetview Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Uso da barreira do corredor BRT Transcarioca como um muro verde ou hortas verticais associados às práticas das escolas do local.

Rua Etelvina: Via especial de pedestres e ciclistas; inserção da ciclovia e pavimentação para pedestres e traffic calm

Aproveitamento dos equipamentos de esportes; iluminação pública adequada para prática noturna

Aproveitamento de canteiros obsoletos convertendo-os em jardins ou hortas urbanas; parceria com a escola local

Iluminação nas áreas de permanência; coberturas ve rd e s o u p e rg u l a d o s ; canteiros e arborização Fechamento do retorno para veículos e ampliação da área de pedestres; inserção de módulos livres e/ou de comércio; pop ups; parada de sacolão móvel ou food truck

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Diretrizes de projeto

Travessa Etelvina nº20 Rua Uranos nº 1488

Edifício Travessa Etelvina nº20 / Rua Uranos nº 1488 Imagem capturada pelo Google streetview Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Segundo Pavimento: implementação de programas como salas de escritórios e cowork , ateliers ligado às escolas do local, biblioteca. Reabilitação e requalificação do edifício: restauração da fachada; resgate da memória do bairro a partir de novas dinâmicas sociais; restauração da fachada

Rua Etelvina: Via especial de pedestres e ciclistas; inserção da ciclovia e pavimentação para pedestres e traffic calm

Nivelar rua e calçada com pavimentação adequada para a passagem de veículos em baixa velocidade e pessoas. Possibilitar a criação de locais de permanência: bancos, iluminação pública, locais sombreados.

Interdição para estacionamento na travessa Etelvina; realocação do estacionamento; possibilidade de parada de automóveis.

Nível térreo: implementação de programas ligados ao comércio e serviços: bares, restaurantes, lojas; ser viços: «poupa tempo», correios, lotéricas ou agencias de bancos.

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Diretrizes de projeto

Rua Vassalo Caruso s/ número

Rua Vassalo Caruso s/ número Imagem capturada pelo autor Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Uso da barreira do corredor BRT Transcarioca como um muro verde ou hortas verticais associados às práticas das escolas do local ou moradores

U s o d a e m p e n h a pa r a intervenções, artes como o graffiti. Iluminação para pedestres nas áreas de permanência; cober turas verdes ou pergulados; canteiros e arborização

pavimentação para a área de pedestres; inserção de módulos livres e/ou de comércio; pop ups; parada de sacolão móvel ou food truck , jardins e áreas de permanência

Rua Etelvina: Via especial de pedestres e ciclistas; inserção da ciclovia e pavimentação para pedestres ou/e traffic calm

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Diretrizes de projeto

Viadutos São Cosme e São Damião

Viadutos São Cosme e São Damião Imagem capturada pelo autor Mapa de localização do terreno no bairro

131


Diretrizes de projeto

Iluminação pública sob os viadutos Aproveitamento das áreas abertas obsoletas convertendo-as em jardins ou hortas urbanas em parceria com os usuários locais.

Uso do muro da linha do trem nas áreas cobertas do viaduto para intervenções artísticas em geral, aliada à iluminação pública

Uso dos baixios dos viadutos São Cosme e São Damião destinados aos módulos de pernoite. Podem ser conjugados de formas diversas respeitando os limites das vias adjacentes.

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Diretrizes de projeto

Viaduto do BRT Transcarioca - Rua Vassalo Caruso 55 Encontro entre as ruas Vassalo Caruso e Uranos

Viaduto do BRT Transcarioca - Rua Vassalo Caruso 55 Imagem capturada pelo autor Mapa de localização do terreno no bairro

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Diretrizes de projeto

Uso do muro da linha do trem nas áreas cobertas do viaduto para intervenções artísticas em geral. Espaços destinados à apresentações, rodas culturais, pequenos concertos ou workshops

Iluminação pública sob os viadutos

Interdição para estacionamento nas áreas do baixio; realocação do estacionamento; possibilidade de parada de automóveis.

calçadão: para implementação de pavimentação adequada e acessível, marcos de entrada e promoção dos eventos sob o viaduto ou do bairro, módulos livres ou de comércio, locais de permanência, sombra e iluminação pública.

Área sob o viaduto BRT: inserção de equipamentos ligados ao esporte e lazer; skate park quadras poliesportivas

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xii - conclusão A importância da leitura e dos estudos de casos de maneira prática mostraram como espaços são lugares de humanismo e de coletividade. Foi possível entender que a maneira mais direta e empírica cria uma possibilidade de conexão com as dinâmicas do cotidiano urbano, assim como a oportunidade de troca com indivíduos para a construção do conhecimento. Além disso, o processo de escrita, a expansão dos conhecimentos técnicos gráficos, a busca por proposições e a assimilação da lingua estrangeira, o francês, foram uma verdadeira conquista e um extraordinário processo de abertura dos campos da consciência acadêmica, mesmo que um processo muito árduo. A pesquisa mostrou, pelas bibliografias, uma linha de pensamento mais voltada às teorias elaboradas em um contexto histórico contemporâneo cuja a crítica aos procedimentos modernos é, por vezes, incisivo. Por isso, o tom crítico ao sistema modernista pode ser notório durante o texto elaborado. Isso acontece, pois o conhecimento brando sobre a complexidade modernista e a pesquisa mais aprofundada sobre as críticas conduz este trabalho à revelar o mesmo tom aos processos de modernização da cidade. Positivamente, podemos notar a abertura para um aprofundamento nas teorias modernistas, a

melhor compreensão de sua

estrutura e complexidade a fim de entender as origens e possibilidades sobre os espaços residuais urbanos. No estudo sobre as refêrencias bibliográficas consta-se que Borde amplia a leitura sobre os chamados "vazios urbanos" cuja categorização não está apenas baseada na consequencia da inserção das grandes vias de transporte embora essa seja uma das causas para o fenômeno urbano discutido por ela. Os vazios urbanos, portanto, são compostos por uma diversidade além dos espaços residuais urbanos. Entretanto, essa pesquisa mostra que os espaços residuais urbanos, a partir do estudo tipológico, podem ser manifestações mais amplas que apenas os baixios de viadutos -maneira pela qual é exposto nas pesquisas de Coimbra e Pereira. Exemplos desse fenômeno são os espaços triangulares e espaços de esquina, encontrados em todos os estudos de caso. Na verdade a pesquisa permitiu a mescla entre a leitura de Borde sobre os vazios e a leitura de Coimbra e Pereira, permitindo uma maior variabilidade entre os tipos de espaços residuais às margens das infraestruturas de transporte urbano. A exemplo desta circunstancia, foi possível incorporar edifícios em estado de obsolescência e grandes terrenos utilizados como estacionamento para a quantificação e qualificação dos espaços residuais às margens das grandes vias de transporte. 135


As três pesquisas estudadas mostram uma abordagem similar no que diz respeito à estruturação da narrativa. Todas começam por quesitos de ordem geral como a assimilação conceitual ou histórica sobre o tema e a partir dessa aboragem geral, as pesquisas tomam rumos específicos. No caso de Borde, uma análise crítica propositiva sobre a situação dos "vazios urbanos" na zona central do Rio de Janeiro. No caso de Pereira, um projeto para uma área específica com zonas ociosas nos baixios de viadutos da cidade de Coimbra, em Portugal. No trabalho de Danielle Coimbra, as proposições tem uma escala mais local que as anteriores no qual o projeto baseia-se na intervenção no baixio do viaduto Negrão de Lima, no bairro de Madureira. Isso mostra que a abordagem do tema pode transitar tanto em níveis conceituais como em níveis propositivos o que gera possibilidades no campo dos estudos acadêmico e no campo profissional prático. Este trabalho encontra aberturas para novas descobertas conceituais sobre o tema. Tanto Borde quanto Pereira citam conceitos importantes para a constatação do fenomêno urbano estudado. Se essa pesquisa pudesse ser desenvolvida em outras esferas acadêmicas, os conceitos de Terrain Vague, Junkspace e Friche poderiam ser grandes elos para a maior compreensão sobre as origens e possibilidades no que concerne os espaços residuais urbanos. Embora crítica, expositiva e propositiva, a pesquisa não tem caráter projetual para uma solução universal dos problemas que a cidade encontra nesses tipos de espaço. Assim, a pesquisa foi chave fundamental para entender algumas das possibilidades e referências de ocupação de pessoas da cidade. O espaço da cidade, que cada vez mostra a individualização e impessoalidade globalizada, pode também mostrar novas oportunidades e proporcionar relações alternativas entre espaço público e privado, onde um recinto cinema pode ser um local de bazar ou um baile de musica funk. Um lugar mutável, baseado nas necessidades realizadas pela comunidade. Na Europa, mas essencialmente no Brasil, há que compreender que as intervenções de grande escala foram muitas vezes responsáveis por grandes fracassos urbanos. Por isso, este trabalho tenta mostrar escalas de intervenção diversas, para que, gradualmente, possamos compreender todos os espaços da cidade. No mesmo caminho, a lei brasileira se porta favorável ao movimento de mudança para percepção dos espaços da cidade, entretanto as práticas exercidas na cidade ainda se inclinam para o conservadorismo histórico. 136


«II- gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;[...] V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;»

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Expostos à crítica e à criatividade, os espaços residuais pedem o estímulo para suas capacidades. Entretanto, antes de tudo, é necessário revelar à quem serve e à quem poderá servir esse processo de desenvolvimento. A pesquisa, a partir dos encontros e da pesquisa sobre os agentes, usuários e ocupantes esclarece como e quem são as pessoas que utilizam e qual será seu possível desenvolvimento futuro. Por isso, mas também por esta formação acadêmica fazer parte e revelar as dimensões do valor público (embora haja a dimensão do valor dos espaços privados) para o processo democrático da vida humana, esse trabalho buscou ser aprofundado numa atenção particular sobre o papel dos espaços residuais em suas condições públicas como geradores de encontro e de relações sociais construtivas ao progresso, capazes de redefinir esses possíveis "não-lugares" em "lugares qualificados".

58. Estatuto da cidade, Brasília, 2009, p.10. Lei federal brasileira nº 10.257, de 10 de julho de 2001

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LISTA DE REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BELLO, José Luiz de Paiva, Evolução histórica da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, Clube de Autores, São Paulo, 2010 BORDE, Andréa de Lacerda Pessôa.Vazios urbanos : perspectivas contemporâneas, UFRJ, 2006 BORGES, Barsanufo, Ferrovia e Modernidade, Revista UFG, ano XIII, nº11, 2011 BRAGA, Milton, Infra-estrutura e Projeto Urbano, 2006 COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva, Baixio do Viaduto Prefeito Negrão de Lima: Espaços Residuais da Infraestrutura Viária e Paisagem Urbana, UFRJ, 2013 CANTON, Katia, Temas da arte conteporânea: Espaço e Lugar, São Paulo, 2009 ESTATUTO DA CIDADE, Brasília, 2009, Lei federal brasileira nº 10.257, de 10 de julho de 2001 FAULHABER, Lucas e NACIF, Cristina Lontra; Rio maravilha: desapropriações, remoções e reforço do padrão de organização espacial centroperiferia; XV ENANPUR, 2013 HOBSBAWN, Eric J, A Era da Revoluções, 2001. KOOLHAAS, Rem, Junkspace, 2011 PEREIRA, Joana Isabel da Cruz, Espaços residuais urbanos,Universidade de Coimbra, 2011 SOLÀ-MORALES, Ignasi, Territórios, 2002 SEPROREP/STU: DELUC, Isabelle, L'Enjeu Friche Industrielle, Paris, STU, 1984,

LISTA DE REFERENCIAS DE SITE DE INTERNET ARCHIDAILY:<http://www.archdaily.com.br/br/01-35561/terrain-vague-ignasi-de-sola-morales> ARCOWEB:<https://arcoweb.com.br/noticias/entrevista/nuno-portas-01-04-2001> ARCGIS:<http://pcrj.maps.arcgis.com/apps/webappviewer/index.html?id=5529d644fef f4d92a30bd38 565f6c460> ARQUIVOS DE SAINT ETIENNE:<https://archives.saint etienne.fr/article.php?laref=255&titre=garede-carnot> ARQUIVOS DE SAINT ETIENNE:<https://archives.saint-etienne.fr/article.php?laref=254&titre=garede-bellevue> ARMAZÉM DE DADOS:<http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br> BRT BRASIL:<http://www.brtbrasil.org.br> BRT RIO:<http://www.brtrio.com> 138


CIDADE OLIMPICA:<http://www.cidadeolimpica.com.br> CARTON PLEIN:<http://www.carton-plein.org> CEDAPS:<http://cedaps.org.br/projetos/jovens-construtores/> CONEXÃO PARIS:<http://www.conexaoparis.com.br/2007/09/12/viaduto-das-artes-em-paris-umpasseio-pelo-artesanato-frances> DECRETRO 35.648/12 : <http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-09-07/cinco-mil-imoveisestao-abandonados-no-rio-300-deles-somente-no-centro.html> ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS:<http://www.estacoesferroviarias.com.br > FRICHE INDUSTRIAL: <http://www.actuenvironnement.com/ae/dictionnaire_environnement/definition/friche.php4> ISSU:<https://issuu.com/julianagotilla/docs/3_tfgmais> JORNAL O DIA:<http://odia.ig.com.br/noticia/observatorio/2014-08-14/penha-e-a-proxima-paradado-brt-transcarioca.html> JORNAL LE STEPHANOIS:<http://lestephanois.canalblog.com/archives/2010/03/30/17414937.html> LEI DE INCENTIVO AO ESPORTE: <http://www.esporte.gov.br/index.php/institucional/secretariaexecutiva/lei-de-incentivo-ao-esporte> LEI DE INCENTIVO À CULTURA: <http://www.cultura.gov.br/apoio-a-projetos> LEI DO ISS : <http://www.portaltributario.com.br/legislacao/lc116.htm> LEI DO ICMS: <http://www.portaltributario.com.br/tributos/icms.html> MIDIA NINJA: <www.facebook.com/MidiaNINJA> MIDIATECA FAU: <http://www.midiateca.fau.ufrj.br/projetos.php?id=1322&busca=&flt_orientador=15&flt_resumo=V azi o&pg=1> PINTEREST:<https://br.pinterest.com/pin/380483868500298871> RIO QUE PASSOU:<http://www.rioquepassou.com.br/?s=Negr%C3%A3o+de+Lima> SUPERVIA: <http://www.supervia.com.br> SNCF:<http://www.sncf.com/fr/portrait-du-groupe/histoire-sncf> SAINT ETIENNE:<http://vieux.saint.etienne.perso.sfr.fr/chemindefer/expo2004.htm> SUPERVIA:<http://www.supervia.com.br>

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TAXA DE LICENÇA PARA ESTABELECIMENTO: <http://www.cdaservicos.srv.br/artigos/detalhesdo-artigo/42/taxa+de+licenca+para+estabelecimento+++alvara+no+municipio+do+rio+de+janeiro> TAXA DE LICENÇA PARA EXECUÇÃO DE OBRA : <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=CAR TA+DE+HABITESE+REGULARMENTE+EXPEDIDA> TRENS FLUMINENSES:<https://trensfluminenses.wordpress.com> VITRUVIUS:<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/16.189/5980> VITRUVIUS:<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/02.014/869> VI ERRADO:<http://videerrado.blogspot.com.br/2014_06_01_archive.html> WIKIPEDIA:<https://fr.wikipedia.org/> WIKIMAPIA:<http://wikimapia.org/> YOUTUBE:<https://www.youtube.com/watch?v=YJqq30ocQyY> YOUTUBE:<https://www.youtube.com/watch?v=VGMyvAtRQVA> YA+k: <http://www.yaplusk.org>

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ÍNDICE

Casos pelo mundo

1. Academia de box Cora Guarrido, Brasil

2. Vila Olímpica do Encantado, Brasil

3.O projeto A8erna, Holanda

5. O

antigo edifício de Belas Artes, França

6. Viaduc Des Art Paris et La Coulée Verte, França

4. Cidade de Lagos, Nigéria

7. La Petite Ceinture, França


Casos pelo mundo 1. Academia de Boxe Cora Garrido, Viaduto do Café, São Paulo - Brasil Hoje a cidade de São Paulo constitui-se como o principal centro econômico da américa latina. Tem um perfil urbano muito denso com um processo de crescimento muito acelerado e violento. Espelho da história do país, a cidade carrega muitas contradições sociais e históricas. O "Viaduto do Café" é um grande exemplo de como o crescimento rápido das metrópoles pode gerar grandes transtornos à população da cidade. Os planos da cidade foram, em grande maioria, voltados para soluções de rápida execução, pensadas apenas para resultados de curto prazo. Esse tipo de atmosfera está presente até os dias atuais no cenário da política institucional brasileira onde os representantes públicos visam grandes obras para se promover durante seus mandatos. O Viaduto do café está localizado na Avenida Paulista, principal avenida da cidade, e foi construído na gestão do prefeito João Paulino Vieira Filho. Após sua construção, muitos problemas foram identificados, como os espaços embaixo da via, espaços sem utilização, sem projeto, sem vida urbana. Nesse contexto, surge o ex-lutador de Boxe, Nilson Garrido, que criou, juntamente com sua esposa Cora Batista, a iniciativa de construção de uma academia de Boxe e biblioteca sob o Viaduto do Café. Esta iniciativa tem destaque não só pela utilização dos espaços residuais provenientes da elevação do viaduto, mas sobretudo promovendo ações de reintegração social por meio do esporte e da educação. Ou seja, essa situação mostra uma dimensão das possibilidades e de disseminação construtiva nesse espaço residual urbano por uma mudança baseada no trabalho comunitário.

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Baixio do viaduto do café, São Paulo, Brasil. PERERIRA, Joana, Espaços Residuais Urbanos, 2011. p171


Casos pelo mundo 2.Vila Olimpica do Encantado, Encantado, Rio de Janeiro - Brasil Desde o anunciamento da cidade do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016, a prefeitura da cidade (aliada ao setor privado) investiu em alguns tipos de programas sociais ligados ao esporte. Uma dessas iniciativas se encontra no bairro do Encantado, embaixo do viaduto na zona norte e subúrbio da cidade. A Vila Olímpica do Encantado foi inaugurada em 2013 e teve como base de sua administração uma política de parceria entre o poder público (prefeitura da cidade) e setor privado (O.S - organizações sociais). A Parceria Público Privado (PPP) tem como base o repasse de verba pública para órgãos privados para a manutenção e administração dos espaços públicos da cidade, como por exemplo as vilas olímpicas. Dentre as atividades estão: Basquete, Futebol, Futsal, Skate, Tai-chi-chuan, Karatê, Caminhada orientada, dança de salão, oficina de grafitti, oficina de violão, academia para a terceira idade, ballet clássico, jazz, luta olímpica, etc. Durante dois anos a parceria funcionou positivamente para a população local, utilizando os espaços construídos de maneira cotidiana. Entretanto, em 2015 houve um problema nessa parceria - Prefeitura e O.S Atlas. De um lado o discurso de falta de repasse de verba, do outro o discurso de que não houve prestação de contas. Consequentemente a vila Olímpica se encontrou interditada, ferindo os principais agentes do local, os usuários. Após manifestações dos moradores do bairro, em 2016, a prefeitura (em parceria com a marca de artigos esportivos Nike) reinaugurou a Vila Olímpica do Encantado. A nova Vila Olímpica foi revitalizada e entre as principais atrações estão uma quadra de vôlei de praia e um estúdio de dança, que também pode ser usado como auditório.


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Vila OlĂ­mpica do Encantado: Imagens capturadas pelo autor


casos pelo mundo 3.O projeto A8erna, Koogaan de Zaan - Holanda : A cidade de Koogaan de Zaan, Zaanstad, Holanda virou referência para projetos arquitetônicos que ensaiam valorizar e requalificar os espaços residuais urbanos. Para contextualizar, Koogaan é uma pequena cidade próxima de Amsterdam, nas margens do rio Zaan, um dos milhares que compõem a geografia dos Países Baixos. No início dos anos 70, começou-se a construir esta autoestrada elevada sobre pilotis para atravessar o rio que foi traçada no meio da cidade, gerando um corte radical no tecido urbano, e, portanto, espaços residuais urbanos. Mas como revitalizar a área residual? Quais são os mecanismos e instrumentos da arquitetura contemporânea para reviver espaços obsoletos segregados da cidade? "Em suma, mesmo quando problemáticas na sua inserção, estar vias, devido ao seu caráter extraordinário configuram referencias importantes na paisagem urbana(...) na evidencia do confronto e agressividade da infraestrutura urbana, que passa a constituir um verdadeiro patrimonio da cidade. Em vez do equipamento se modificar, de forma forçada, na tentativa de uma melhor adequação à cidade, é precisamente esta e os modos de circulação dos seus utentes que se moldam ao elemento intra-estrutura agressivo, que se constitui como marca identitária da cidade." (Joana Pereira, Espaços Residuais Urbanos, p.167) O projeto A8erna é uma série de intervenções de programas e equipamentos públicos que aproveitam os espaços remanescentes da construção do viaduto. A elevação gerou um grande teto sobre o solo da cidade formando uma área de 22.500m². Esta série de intervenções é composta por uma pista de skate, uma galeria de graffiti, uma quadra poliesportiva, um supermercado, uma floricultura, uma peixaria, estacionamentos para 120 automóveis, uma pequena marina, uma parada de ônibus, praças e o redesenho total da orla do rio, que não havia sido planejada no projeto da rodovia. O projeto elaborado pelo escritório de arquitetura NL contou com uma grande colaboração dos habitantes da cidade e foi formulado o documento "cidadão A8ema" no qual os cidadãos puderam opinar sobre quais eram seus desejos para o espaço que seria modificado. Esse tipo de processo mostra a importância da relação cotidiana do arquiteto e urbanista na vida comum dos habitantes, assim como um estreitamento da discussão sobre cidade entre os orgãos públicos e a população.


Projeto A8erna, Holanda Imagens retiradas em : COIMBRA, Danielle Pinto Inocencio da Silva. Baixio do Viaduto Prefeito Negrรฃo de Lima: espaรงos residuais da infraestrutura viรกria e paisagem urbana / Danielle Pinto Inocencio da Silva Coimbra. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU. p19


Casos pelo mundo 4.Cidade de Lagos, Nigéria «Muitas das grandes metrópoles, possuem inúmeras áreas ociosas sujeitas a ocupações por parte da população de baixa renda. Essas zonas são normalmente invadidas devido à falta de controlo das entidades públicas ou à conivência dos governos para com certos usos ilegais, aliadas à impossibilidade de planejar por completo uma cidade que cada vez mais é alvo de crescimento informal e espontâneo.» Joana Pereira, Espaços Residuais Urbanos, p.152 No caso da Nigéria, especificamente a cidade de Lagos, os terrenos sob viadutos - apropriados de maneira espontânea pelos indivíduos - pertencem geralmente ao Governo e o tipo de ocupação gerada pelos " não proprietários" apresenta um aspecto temporário do uso do solo, mas sobretudo legal. Deste modo, o mercado, as estruturas, a organização gerada se mostra adaptável à auto-estrada e flexível às demandas temporais, associadas ao máximo proveito espacial. Entretanto, as atividades que se passam no local se mostram estritamente ligadas ao grave parâmetro econômico social. O que se identifica é uma grande quantidade de jovens em situação de trabalho precário (fazendo lanternas, panelas e diversos objetos metálicos, ou a separação de lixo por categorias depois de revirados pelas grandes «caçambas» lixo da cidade). Lagos é um importante caso para a leitura de como as apropriações da cidade (sobretudo terceiro mundistas) podem se dar de maneira mutável na qual os agentes urbanos ou usuários ocupam os espaços vazios do Estado de maneira desestabilizada, privada, mas necessária. De um lado o Governo legitima as condições precárias de trabalho onde não há um controle legal das dinâmicas estabelecidas, do outro, o trabalhador jovem informal sem condições de trabalho faz o que pode para gerar fonte de renda mínima para se sustentar na cidade. No meio de toda essa relação conflituosa e contraditória, os trabalhadores informais encontram nos espaços residuais provenientes da infra-estrutura urbana um lugar de oportunidade embrionária de uma vida útil, em certa medida produtiva embora precária.

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Cidade de Lagos. imagens retiradas em: PEREIRA, Joana, Espaรงos Residuais Urbanos. P154


Casos pelo mundo 5.O antigo edifício de Belas Artes, Saint Etienne, França Em 1859, esse edifício foi construído para acolher estudantes e professores da Escola de Belas Artes de Saint Etienne. O prédio destaca-se pelos seus ornamentos, sua materialidade e sua posição privilegiada no alto de uma colina. No ano de 2007, o edifício perdeu sua função original de sede da Escola de Belas Artes, sendo deslocada para outra parte da cidade, especificamente na atual "cité du design", e durante três anos de abandono o edifício se tornou verdadeiro friche. Publicado em 2010, o artigo do webjornal "Lestephenois" identifica as problemáticas relacionadas ao friche. "A antiga escola de belas artes virou uma lixeira (...) Na espera de um novo projeto, o lugar perdeu sua soberba e, o estado de insalubridade e de sujeira fez um de nossos leitores reagir nos enviando alguns cliques do local (...) Esse abandono suscitou uma certa emoção em nosso leitor que não esqueceu de, ironicamente, "parabenizar as pessoas da prefeitura"responsáveis no comando desse registro (...) Geneviève Albouy, encarregado de setor de sustentabilidade, prometeu fazer o necessário para entregar o lugar limpo."(tradução livre) Hoje, a grande característica desse lugar está na aparência de sua fachada. Embora seja um edifício do século XIX e tenha seus aspectos ornamentais muito presentes, as intervenções feitas em sua fachada dão uma nova face à relação antigo e novo. Seu aspecto austero é descontruído pela irreverência e liberdade nos desenhos marginais que tomam suas fachadas, os graffitis. Os espaços exteriores (públicos) como os jardins ou o estacionamento são cotidianamente frequentados por jovens, estudantes, artistas de rua, punks, skinheads, e ainda membros das associações que trabalham no interior do prédio, entre outros. Além dos usuários cotidianos, os jardins são utilizados para eventos públicos como festas de estudantes universitários, festivais de música e dança, etc.


imagem 1: Antiga sede da escola de Belas Artes inĂ­cio do sĂŠculo XX. imagem 2: Antiga sede da escola de Belas Artes no ano de 2015


Casos pelo mundo 6.Viaduc Des Art Paris et La Coulée Verte, Paris, França O viaduto das artes está estabelecido no 12º arrondissement na cidade de Paris. Conhecido como a vitrine do artesanato francês, o Viaduto das Artes de Paris conta com diversos ateliers, no total são 51 artistas de áreas diversas como restauração de obras antigas, fabricantes de móveis em madeira, de violão e violino, de maçanetas em bronze, estilistas de costumes de espetáculos, joalheiros, escultores, fabricantes de bonecas e marionetes, algumas galerias de arte, chapeleiros, molduras de arte, fabricantes de lustres e luminárias. A linha do trem foi construída na década de 60 do século XIX com o intuito de criar uma estação próximo à Ópera Bastille. A estação foi destruida, mas o viaduto ficou como lembrança desta época. A linha foi fechada em 1969 e até os anos 80 permaneceu no abandono. No ano de 1986 se deu inicio ao projeto de reabilitação do viaduto, tanto na sua parte alta quanto na sua parte baixa. O projeto foi liderado pelo arquiteto Patrick Berger e a sua reabilitação se deu entre os anos de 1989 e 1993. O projeto consistiu na criação de um longo jardim na parte de cima, no lugar dos trilhos, jardim este que se chama La Coulée Verte e na construção de lojas na parte de baixo, aproveitando os antigos arcos. Marion Daloux, moradora de Paris, afirma que: «o lugar tem um potencial bem positivo para cidade e para saúde cotidiana das pessoas, principalmente para os praticantes de esporte, no meu caso, corrida. Eu corria lá cotidianamente e me encontrava com os meus amigos também. Lá no Viaduto das artes tem também uma pequena praça ao final do percurso, onde associações de jovens artistas promovem encontros para aproveitar o espaço como oportunidade de criação.» A imagem que se criou ao longo do tempo foi de uma enorme estrutura "morta". Dentro dessa perspectiva o conceito friche industrial se encaixa no que se diz respeito à compreensão das possibilidades e qualidades espaciais do abandono. Nesse sentido, o resíduo está presente em sua identidade formal histórica. O friche representa, portanto, um resíduo histórico no qual a memória se mostra estagnada comprovada no abandono e na falta de vitalidade do local até as ações tomadas pelos projetistas, arquitetos, artistas, associações para mudarem esse panorama.


Imagem esquerda em cima: La coulée verte; caminho sobre a antiga linha de trem. Imagem embaixo esquerda: baixio do viaduto; cada pórtico forma um ateliê ou loja. Imagem em cima à direita: interior dos ateliês ou lojas Imagem embaixo à direita: Calçada da rua do Viaduc des arts


Casos pelo mundo 7.La Petite Ceinture - "Qu'est-ce qu'on peut faire?" ( O que a gente pode fazer?) A linha férrea chamada "Petite Ceinture" é um antigo caminho de ferro da cidade de Paris. Com cerca de 32 quilômetros, a linha de trem contorna grande parte da cidade de Paris, por sua borda periférica. Inaugurada entre 1852 e 1869, a linha de trem exibia grande importância, primeiramente, no transporte de mercadorias e depois no tráfego de passageiros. Abandonada pelos passageiros por conta da implementação crescente do sistema metroviário, em 1934, o tráfego de passageiros foi fechado. Mais tarde, entre a década de 1980 e 1990, o tráfego de mercadorias também seria fechado. Atualmente, a linha encontra-se abandonada. Entretanto, associações, artistas de rua, moradores dos bairros adjacentes à linha se esforçam para preservar a memória, instaurar novos usos e ocupações, procurar soluções alternativas para a linha férrea "Petite Ceinture". O projeto interventivo sobre a antiga linha do trem tem como finalidade a abertura progressiva de alguns trechos ferroviários ao público. Além disso, o objetivo da intervenção é criar recursos viáveis com o foco em gestão associativa ligada à manutenção dos espaços verdes adjacentes à linha férrea. O projeto "Qu'est-ce qu'on peut faire" interroga os programas e os usos desse friche. Encontros entre associações de moradores, associações de artistas e arquitetos e representantes da politica institucional da cidade são ocorridos todo sábado na estação do parque "Montsouris" no "13º arrondissement". "Estre atelier de concepção do espaço público, workshop de construção com os residentes, conferências e debates em torno das questões da natureza na cidade e organização de eventos culturais e festivos, nós temos a intenção de questionar e valorizar o caráter desse lugar, na sua escala local e também, mais amplamente, metropolitana." (tradução livre pelo autor do trecho extraído do site yaplusk.org) A formação de duas frentes de ação para a reapropriação do lugar foi necessária: A primeira, conduzida pelas associações de arquitetos com o objetivo de identificar os pontos de potencial fragilidade dos trechos férreos na qual múltiplas caminhadas sobre a linha do trem e seus arredores se fizeram necessárias. A segunda é a construção de uma plataforma móvel e polivalente sobre os trilhos, afim de acolher os eventos, pessoas e novas intervenções.


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Imagens da intervenção móvel sobre os trilhos da «Petite Ceinture». Espaço de encontro, workshops, pequenas seções de cinema. Imagens retiradas do site da associação: www.yaplusk.org


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