Newsletter Setembro 2015

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Conselho Editorial Anabela Lemos, Daniel Ribeiro, Janice Lemos, Ruben Manna, Samuel Mondlane e Vanessa Cabanelas Boletim informativo com a autorização Nr. 17/GABINFO-DEC/2007


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Mais Uma voz Se Calou! Sim, mais uma voz calada neste Moçambique que se tornou num país de referência pelas razões mais injustas e erradas… Pela falta de respeito, pela imoralidade, pela falta de direito de expressão, governado pela lei das armas onde simplesmente abatem e matam se não concordas, onde matam quem diz a verdade, onde matam só porque incomodas o “poder”. A força de uma arma é mais eficaz que um diálogo, porque a voz se cala e o corpo inerte numa poça de sangue tornou-se numa imagem comum do nosso dia a dia... Já deixaram de ameaçar ou de intimidar agora simplesmente abatem... E nós, todos os outros que só queremos que este Moçambique seja um país livre e em paz, onde os nossos filhos possam viver em harmonia, onde este mosaico de raças e culturas conviva pacificamente respeitando as crenças e ideais de cada um... Sem armas apontadas à cabeça, sem ameaças, sem violência, sem intimidações... Simplesmente em paz e sempre respeitando a diferença. Cardoso, Siba-Siba, Cistac... e muitos outros... muitos mais... e agora recentemente Machava... todos abatidos cruelmente, mortos pelas suas ideias, pela sua coragem, pelos seus ideais... Porque amavam muito esta terra e porque sempre lutaram por um Moçambique mais justo e mais humano. Assassinos... Até quando vão abater as vozes que se erguem na multidão... Até quando vão abater a vontade de um povo inteiro, de uma nação... Até quando vão mutilar, disparar, sangrar, cortar, violentar... Até quando? Mais uma voz se calou... Mais um corpo caiu... Mais um... Mais um...! Destes corpos todos inertes no chão ao longo dos anos, cravejados de balas....Desse sangue derramado em vão, dessa revolta irão nascer muitas mais vozes que não se vão calar... e serão cada vez mais, e serão muitas e mais fortes... e um dia... seremos livres! Malditos sejam... assassinos!


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PLANTAÇÕES NÃO SÃO FLORESTAS

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A JA! viajou recentemente para Durban para participar na primeira Assembleia Geral da Global Forest Coalition ou GFC (Coligação Global de Florestas) de 31 de Agosto a 5 de Setembro. Posteriormente, de 7 a 11 participou ainda na reunião alternativa que juntou a sociedade civil durante a Conferência Mundial das Florestas. A GFC é uma coligação internacional que foi fundada no ano 2000, e que agrega como membros 79 IPO’s (Organizações de Povos Indígenas) e Organizações não Governamentais de 47 países. O seu objectivo é garantir os direitos dos povos indígenas e combater a perda de florestas. Durante a primeira semana foram apresentados vários projectos comunitários de gestão florestal. Entre os debates e a troca de experiência, trabalhou-se em grupos por continente para uma análise a nível mundial da temática das florestas. No 4º dia, a Aliança Global Contra o REDD (The Global Alliance Against REDD), e a Rede Africana Contra o REDD (NRAN – No REDD in Africa Network), apresentaram a Declaração de Durban sobre o REDD aos participantes e membros da GFC. A segunda semana começou com as palavras sábias de Bobby Peek da organização Groundwork, seguido por Kumi Naidoo da Greenpeace, que alertou os presentes da urgência da crise que vivemos, em que apesar da maioria dos governos terem a noção da situação, nada fazem. Apelou para que, mesmo sabendo que não temos muito tempo, não desistamos e continuemos a lutar pela sobrevivência da humanidade. De tarde, no painel sobre REDD, Bioenergia e mudanças climáticas, Daniel Ribeiro da JA!, Ruth Nyambura em representação da NRAN, Simone Loverna e Mary Lou Malig da GFC e Almuth Errnsting the Biofuelwatch, trouxeram à sala um debate sobre falsas soluções para combater mudanças climáticas, e sobre a importância da conservação comunitária de florestas, debate esse em que os participantes levantaram varias questões e partilharam as diferentes realidades dos seus países. No dia seguinte os debates e estratégias continuaram, desta feita os participantes eram na maioria jovens. Ficámos impressionados com a adesão das escolas locais, bons exemplos que Moçambique devia seguir. O espaço foi então concedido às plataformas internacionais, clima e floresta com Daniel Ribeiro da JA!,Nimmo Bassey da HOMEF e Ruth Nyamura e Cassandra Smiethes em representação da NRAN. Os panelistas decidiram transmitir aos jovens em palavras simples o que se está passar no mundo, dentro da temática de Justiça, Terra, Florestas e Plantações. Sentimo-nos extremamente motivados por estes jovens, com 03


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as suas perguntas e o seu enorme envolvimento. Depois de mais de duas horas o debate terminou, seguindo a conferência de imprensa para o lançamento da declaração de Durban sobre o REDD, que só em três dias teve 71 assinaturas das ONG’s e pelo menos 17 singulares. A declaração, que está aberta a assinantes até Novembro, a seguir à conferência de imprensa registou um aumento de assinaturas substancial. Nem tivemos tempo para almoçar, porque a JA tinha outro painel às 13:30, desta vez mais especificamente relacionado com os problemas em Moçambique. Fizeram parte do painel mais uma vez Daniel Ribeiro, Ruth Nyamura e Adrian Nel da UKZN Geography, que falou sobre um caso de estudo sobre florestas e créditos de carbono, e por último Almuth Ernsting que abordou a queima de florestas para energia. No fim do dia houve um evento de pequenos agricultores e agricultura ecológica, onde se falou sobre a importância das sementes nativas para a soberania alimentar. Para nosso deleite, de seguida serviram um jantar vegetariano só com ingredientes orgânicos: a comida estava fantástica! O dia seguinte foi dominado por várias apresentações sobre agroecologia e ficou marcado por uma apresentação sobre os impactos dos pesticidas não só no ambiente como nos seres humanos. Foram chocantes as fotos apresentadas sobre um caso no Panamá. O dia terminou com a preparação da marcha que decorreu na Quinta-feira, 10, contra as falsas florestas – plantações – em que mais uma vez ficamos impressionados, não só com o envolvimento de estudantes, mas com o que eles escreveram nos posters e com a sua clara noção de que Plantações Não são Florestas. Realmente só ignorantes é que podem pensar que uma plantação é uma floresta. A marcha teve a participação de mais de 3,000 pessoas e terminou na famosa Speakers Corner, que em 2011 foi o ponto de encontro de manifestações durante o falhado COP 17. Lá, Kumi Naidoo entregou as mais de 100,000 assinaturas contra plantações ao oficial de programas do WFC (Conferencia Mundial das Florestas) Motsamai Nkosi. Enquanto, no espaço alternativo, o povo debatia e encontrava soluções para as questões florestais e directamente ligadas à crise climática, os nossos governos e as corporações, na Conferência Mundial de Florestas, só se preocupavam em negociar as nossas florestas, preocupados com o seu valor comercial e com o lucro que estas podem gerar, tentando convencer-nos com soluções falsas, colocando um preço nos nossos direitos à vida neste planeta e no futuro da humanidade. 04


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Declaração de Durban sobre REDD Durban, África do Sul 9 de Setembro de 2015

Nós, as comunidades locais, os movimentos campesinos, os Povos Indígenas e as organizações da sociedade civil de África e de todo o mundo, apelamos às Nações Unidas, ao Congresso Florestal Mundial, à Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), ao Banco Mundial e aos estados para que rejeitem modelos de desenvolvimento de cima para baixo, incluindo as falsas soluções para as mudanças climáticas e conservação das florestas e biodiversidade que apenas servem às economias dominantes do mercado. Estamos unidos para nos opormos e rejeitarmos a comodificação, privatização e pilhagem da natureza, o que inclui REDD+1 e outros mecanismos baseados no mercado incluindo compensações de biodiversidade e de conservação que põem o lucro acima do bem-estar da humanidade e do planeta. Estes mecanismos incluem a “financeirização da natureza”, que comodifica, separa e quantifica os ciclos e funções do carbono, da água, das florestas, da fauna e da biodiversidade do planeta – tornando-os “unidades” passíveis de serem vendidas em mercados financeiros e especulativos. Contudo, a Mãe Terra é a fonte da vida, que necessita de ser protegida, e não transformada num recurso para ser explorado e comodificado como um “capital natural”. REDD+ é também o pilar da Economia Verde. REDD+ está a ser equivocadamente anunciado como o salvador das florestas e do clima do planeta e é o principal resultado antecipado do Acordo da ONU em Paris sobre as mudanças climáticas em Dezembro de 2015. Além disso, REDD+ é uma falsa solução para as mudanças climáticas que já inclui florestas, plantações e agricultura no mercado de carbono. Os relatórios mostram que a desflorestação e as emissões relacionadas continuam, e que o REDD+, ao invés de reduzi-las, está a ameaçar e a difamar as comunidades dependentes das florestas e aqueles que produzem a maioria dos alimentos do planeta – agricultores de pequena escala. Além do mais, • REDD+ promove plantações de monoculturas de árvores e árvores geneticamente modificadas REDD (Redução das Emissões da Desflorestação e Degradação Florestal) é uma iniciativa global para criar um valor financeiro para o carbono armazenado nas florestas e em todos os outros ecossistemas para compensar os governos e as companhias ou proprietários de florestas e agricultura nos países em desenvolvimento para que não cortem as suas florestas ou que reduzam a sua taxa de desflorestação e degradação florestal como um mecanismo de mercado para evitar emissões de gases de efeito de estufa. O REDD+ expande o REDD para desenvolver métodos de sequestro de carbono através da conservação das reservas florestais de carbono (e zonas pantanosas, sistemas agrícolas), gestão sustentável de florestas e incremento das reservas florestais de carbono nos países em desenvolvimento.

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• REDD+ aumenta a usurpação de terras e as violações de direitos humanos • REDD+ restringe o acesso às florestas, ameaçando meios de subsistência e práticas culturais • REDD+ causa violência contra camponeses, Povos Indígenas, mulheres e comunidades que habitam as florestas • REDD+ é combinado com outras formas de compensação incluindo o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) • REDD+ impõe às florestas o neoliberalismo orientado para o mercado, o que debilita e monetiza a conservação comunitária e os processos sociais/culturais e cria desigualdades • Projectos REDD+ tendem a forçar as comunidades de subsistência na direcção da economia monetária e do trabalho assalariado explorador • REDD+ obstrui e impede políticas muito necessárias que apoiam abordagens endógenas e bioculturais de conservação e restauração da biodiversidade. Desta forma, juntamo-nos à Rede Contra o REDD em África e à Aliança Global contra o REDD para exigir que os governos, as Nações Unidas e as instituições financeiras parem com a experiência desastrosa que é o REDD e comecem de uma vez por todas a lidar com as causas subjacentes da perda florestal e das mudanças climáticas! Apresentado pela Rede Contra o REDD em África (NRAN, na sigla em inglês) e pela Aliança Global contra o REDD, aprovado e apoiado pelos que seguem. Para ser apresentado ao Congresso Florestal Mundial 2015, CQNUAC COP21 e além: Organizações: Rede Contra o REDD em África Aliança Global Contra o REDD Rede Ambiental Indígena JA!/Justiça Ambiental – Amigos da Terra Moçambique All India Fórum dos Movimentos da Floresta/Índia Observatório do Mercado de Carbono CENSAT Agua Viva – Amigos da Terra Colômbia

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Diz-me com Quem Andas Dir-te-ei Quem És Monsanto, Syngenta, Dupont Pioneer, Bayer, Dow e companhia

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Este mês, nesta nossa rubrica dedicada a desmistificar as escolhas problemáticas do nosso executivo, decidimos escrever algo sobre, irrevogavelmente, algumas das corporações mais poderosas do planeta – as companhias agroquímicas e de biotecnologia que outrora fabricavam armas químicas, venenos, insecticidas e pesticidas, mas que agora “fabricam” a nossa comida – e explicar como é que o nosso governo está a permitir que entrem no nosso país e quais serão as consequências dessa sua entrada. Antes de mais, para aqueles que não estão familiarizados com o tópico, uma breve explicação do que está em causa: A par dos respectivos insumos agrícolas, companhias como a Monsanto, a Dupont Pioneer, a Syngenta ou a Bayer, fabricam sementes geneticamente modificadas dos mais diversos vegetais, alegando que estas são mais resistentes a pestes, às mudanças climáticas, que necessitam de menos água para crescer, que resultam em produtos de maior qualidade, etc. Tais promessas nem sempre correspondem à verdade, e são um engodo envenenado que está a ameaçar seriamente a variedade genética (sementes) de diversos géneros e a ajudar a erradicar a agricultura familiar e os pequenos agricultores, que ao trocarem as suas sementes nativas por estas se colocam nas mãos destas empresas, pois das suas sementes resultam grãos estéreis, quebrando assim o ciclo natural e criando uma relação de dependência. Há ainda a questão ética destas empresas não terem como garantir ao público que os OGM’s que produzem não terão quaisquer consequências a longo prazo na saúde de quem os consome. Enquanto alguns países perceberam a tempo o que está em jogo e já proibiram o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM’s) em seu território, em outros como o nosso, onde os governos são mais “maleáveis”, estas empresas aliam-se à classe política e apoderam-se do sistema chegando até a criminalizar a ancestral livre troca de sementes nativas para cimentar o seu monopólio, como aconteceu por exemplo no México. Em 2011, a falta de escrúpulos e de integridade destes (e de outros) actores foi denunciada pelo African Centre for Biosafety (Centro Africano de Biossegurança) da nossa vizinha África do Sul, que emitiu um comunicado em que acusou a Monsanto de, através da WEMA (Water Efficient Maize for Africa) – uma organização subsidiada pela Fundação Bill e Melinda Gates – tentar aproveitar uma variedade genética de milho que fora proibida na África do Sul por ser defeituosa, doando-a a outros países africanos entre os quais figurava Moçambique. Supostamente, tal não terá ocorrido cá porque então a nossa legislação não o permitia... outros países não tiveram a mesma sorte e tiveram de arcar com os prejuizos de aceitar uma doação de milho supostamente “melhorado”! Haja descaramento não?! Esta história não é um episódio isolado. É uma de muitas. Em 2008, por exemplo, o Daily Mail1 publicou uma noticia que dava conta de uma vaga de suicídios de mais de 125 mil camponeses na Índia, fruto dos devastadores resultados de uma http://www.dailymail.co.uk/news/article-1082559/The-GM-genocide-Thousands-Indian-farmers-committing-suicideusing-genetically-modified-crops.html

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safra de algodão geneticamente modificado da Monsanto que lhes fora impingido. A crescente aposta do governo moçambicano no agronegócio, em projectos agrícolas megalómanos que abarcam milhões de hectares e as revisões legais que têm sido feitas nos últimos anos para acomodar a dita componente tecnológica de investigação agrária desses projectos, constituem, literalmente, o escancarar das portas do país a essas companhias e seus vassalos. A entrada em cena destes actores, conforme mencionado acima, não só acabará com o campesinato moçambicano, como também ameaçará a nossa biodiversidade, arruinará os nossos solos e colocará em risco os nossos cursos de água. Perguntamos ao nosso governo: E tudo isto para quê? Para produzir soja para exportação? Para alimentar porcos e vacas na Ásia? É para isso que estamos a aniquilar o camponês em Moçambique? Com falsas promessas de integração num modelo de produção que utiliza muito pouca mão-de-obra, estes projectos já usurpam e continuarão a usurpar a terra camponesa. Consequente e inevitavelmente, um enorme êxodo rural resultará destes projectos. Êxodo esse que, por sua vez, criará milhares de desempregados (camponeses “sem terra”) e conduzirá milhares de famílias rurais que hoje são aliciadas face à sua pobreza, à mais absoluta miséria. Num prisma mais amplo, faremos algum dinheiro que certamente será “tão bem distribuído” como aquele que o país faz com a exploração de recursos minerais, continuaremos a produzir poucos géneros alimentares, como tal, continuaremos a combater a fome, perderemos as nossas sementes crioulas para sempre, perderemos as nossas terras, perderemos uma larga porção da nossa biodiversidade, colocaremos em risco a nossa água (que já é tudo menos abundante) e em compensação ganharemos uma série de parceiros de negócios que são, sem papas na língua, a escória do planeta. Parece-lhe um bom negócio? Porquê que cegos pela ganância de “ganhar agora” temos de recorrentemente enveredar pelos mesmos trilhos errados palmilhados pelos ditos países desenvolvidos? Será que os nossos dirigentes não se questionam porque terão o Japão, a Irlanda, a Áustria, a Hungria, a Grécia, a Bulgária, a Suíça e o Luxemburgo proibido o cultivo de transgénicos nos últimos anos? Porque será o cultivo de milho geneticamente modificado proibido até na Alemanha e em França (MON810)? Com quase tudo por fazer para desenvolver a agricultura em Moçambique, porquê este rumo? Foram consideradas outras opções? Não haverá aliados mais apropriados e modelos de desenvolvimento mais compatíveis com a nossa estrutura social e com as nossas necessidades e aspirações? “E quem financiaria essa utopia que vocês apregoam?” Perguntarão certamente os críticos dos hippies da JA. Respondemo-vos com outra pergunta: Se não temos quem financie o óptimo, a solução é avançar com o péssimo? Sem querer ofender a inteligência de ninguém, burrice não é acreditar em utopias, é acreditar num plano que para promover a agricultura, mata o agricultor.

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Portucel inaugura o Maior Viveiro de Plantas de Ă frica 10


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Este foi um dos títulos de inúmeras notícias que retrataram a inauguração do maior viveiro de plantas de África... A bem dizer, o maior viveiro de eucaliptos que serão utilizados nas plantações de monoculturas com os seus inúmeros impactos, mas vamos celebrar que temos em Moçambique alguma coisa que é a maior de África! Um imenso viveiro de eucaliptos! Iuuupiii!!! Curiosamente nenhum dos artigos que tive oportunidade de ler fizeram qualquer referência a esta aposta do nosso governo em plantações de espécies exóticas, nem tão pouco ao enorme e declarado orgulho que o actual governo sente nas suas novas conquistas a ponto de ser o nosso próprio presidente a proceder à inauguração do mesmo. A peça de notícia que passou na televisão (STV – Jornal da Noite de dia 8 de Setembro) mostra trechos do discurso do Sr. Presidente no acto de inauguração e confesso que me surpreendeu bastante ouvir o que o Sr. Presidente pensa das questões que têm sido colocadas relativamente aos postos de emprego na Portucel, aos casos de alegada usurpação de terra e ainda sobre as motivações das organizações que trabalham com algumas comunidades na área... Prefiro acreditar, Sr. Presidente, que pode ter sido uma falha na edição da peça, e que de facto o Sr. Presidente não teria falado nestas questões da forma como foram apresentadas, até porque um presidente de todos os moçambicanos como o Sr. não iria obviamente referirse nesses moldes sobre as intenções dessas organizações e pessoas sem nunca ter ouvido o que de facto pensam, nem tão pouco porque pensam assim. O Sr. Presidente questionou os

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trabalhadores da Portucel se estavam felizes, ou se preferiam continuar na pobreza sem emprego, disse ainda que esses que vão lá não querem ver a região a desenvolver, querem mantêlos na pobreza enquanto vivem bem... Oh Sr. Presidente, quem vive bem??? O Sr. Presidente sabe tão bem quanto nós que a maioria das pessoas que trabalham e vivem de forma honesta não vivem assim tão bem, sobrevivem e alguns nem isso! O que é viver bem Sr. Presidente? É viver com medo de, se me expressar de forma mais aberta de seguida ser chamado a responder em tribunal por crimes contra o estado? Mas então e as injustiças todas que presenciamos todos os dias, não podemos falar nelas? Viver bem é viver com medo de falar demais e um dia num passeio levar um tiro, a mando de algum cobarde sem rosto? Ou será viver bem, viver em casas que mais se assemelham a cofres de tanto gradeamento que têm, com medo de tudo e de todos, pela completa ineficiência da nossa polícia em proteger-nos? Ou será que viver bem é esperar horas a fio para ser atendido num hospital e finalmente chegar a sua vez e afinal o médico já está tão cansado que não lhe resta qualquer paciência para si? Ou ainda ter que subornar professores e directores de escolas públicas para conseguir uma vaga para o filho estudar, e sonhar assim com uma vida melhor? É assim que se vive bem Sr. Presidente? Quem vive bem Sr. Presidente? Muitos de nós vivem sim melhor que a maioria, mas viver bem requer uma série de condições que nos faltam... Sabe tão bem quanto nós que quem vive bem mesmo são alguns membros do seu governo com os seus salários e inúmeros subsídios à custa deste mesmo povo que agora pretendem calar


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com meia dúzia de empregos precários, são ainda os nossos deputados que se atribuem regalias que o povo contesta mas avançam à mesma! E porquê Sr. presidente? Porquê que continuamos a fechar os olhos a estas injustiças? Porquê que aceitamos que uns tenham tanto e outros nada? Porquê que para o povo basta um emprego com salário baixo, muitas vezes sazonal, e para os representantes do mesmo as regalias absurdas que todos nós conhecemos? Porquê que perpetuamos a pobreza num país com tanta riqueza? Uma das nossas maiores riquezas é a nossa terra, é a terra onde os milhares de camponeses e camponesas produzem e é esta mesma terra que temos visto a ser levianamente “emprestada” a tantos e tantos projectos de investimento, mesmo contra vontade do povo... Se os empregos da Portucel são tão bons, e a vida agora é bem melhor porque a Portucel lá está, se calhar não seria má ideia mandar lá alguns dos inúmeros deputados que temos para um estágio, remunerado é claro, pois não concordamos com nenhuma forma de exploração... Quem sabe então o Sr. Presidente iria perceber que afinal podem não ser tão bons assim...

que pensava que ia ganhar algo mais em troca da sua machamba e não apenas 1500 meticais como alguns nos informaram. Não acredito que alguém tivesse coragem para, perante a situação, afirmar que não estamos bem, em vez de preferimos isto ou aquilo... E sabe porquê Sr. Presidente, porque a sua questão não foi colocada para ter resposta, a sua questão foi meramente para convencer aos demais que estão bem... e as considerações feitas sobre as organizações e pessoas que trabalham com as comunidades são incorrectas e injustas, e vindas de si Sr. Presidente, mais incorrectas se tornam, afinal o Sr. é o presidente de todos os moçambicanos, incluindo desses que o Sr. criticou sem conhecer, desses que o Sr. diz que vivem bem e que só querem atrasar o desenvolvimento da região e manter as comunidades na pobreza. Nós também fazemos parte desses que o Sr. criticou, e lamentavelmente Sr. Presidente, o Sr. está a ser mal informado.

Um projecto tão maravilhoso fala por si, não precisa que ninguém o venha defender como tem acontecido com a questão da Portucel, não precisa de esforço nenhum para desacreditar Sr. Presidente estamos do mesmo quem quer que seja pois os factos lado, trabalhamos pela justiça social e falam por si! ambiental, por acreditarmos que juntos podemos ajudar a construir um país Se pretende ouvir o seu povo, apresentede que nos possamos todos orgulhar, se de forma humilde, apresente-se de onde possamos todos viver bem e não forma espontanea, não permita que seja apenas alguns! tudo planeado ao mais infimo detalhe como quem pode e o que pode falar, O Sr. Presidente colocou questões aos que são sim Sr. Presidente as queixas trabalhadores da Portucel, mas não que temos ouvido, se são verdade ou acredito Sr. Presidente que alguém vá não, não sei dizer, mas acredito que o responder honestamente e dizer-lhe Sr. tenha como verificar... que o emprego que tem não é seguro, ou que o salário é demasiado baixo, ou E viva a democracia!

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21 de Setembro

Dia Internacional Contra as Plantações de Monoculturas Arbóreas Assinala-se no próximo dia 21 de Setembro, em todo mundo, o Dia Internacional Contra as Plantações de Monoculturas Arbóreas, num período em que Moçambique tem sido o destino preferido de vários investimentos privados e estrangeiros destinados ao estabelecimento de plantações comerciais para diversos fins e com maior destaque para a indústria de produção da polpa de papel a partir da monocultura de eucalipto. A data foi oficialmente lançada no Brasil, há 11 anos, e é um meio importante para denunciar os graves impactos do modelo de produção industrial de árvores em grande escala sobre comunidades e ecossistemas. Assim sendo, todos os anos, organizações e movimentos sociais realizam várias acções durante o mês de Setembro para dar visibilidade às suas lutas e denunciar os impactos negativos das plantações comerciais de árvores sobre os meios de subsistência e territórios das comunidades locais. Mas, acima de tudo, o 21 de Setembro é um dia para celebrar a força e a solidariedade e dizer: basta de monoculturas de árvores! Os impactos sociais e biofísicos do crescimento da indústria de plantações comerciais têm sido por várias vezes reportados por diversas entidades nacionais e estrangeiras com algum conhecimento nesta matéria. No que a Moçambique diz respeito, poucos têm sido os esforços para minimizar os impactos das mesmas, pelo contrário, encoraja-se cada vez mais iniciativas do género de forma a aumentar incondicionalmente as estatísticas de investimento, sem no entanto,

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analisar com maior profundidade os reais impactos sócioambientais a médio e longo prazos. Aliás, está cada vez mais evidente e sem margem de dúvida que em Moçambique, a gestão dos recursos florestais não se rege pela dinâmica do ecossistema, sendo esta demasiado centrada nos seus benefícios económicos, colocando assim em risco a sua sustentabilidade. Todavia, é falso o argumento que a implantação de plantações comerciais constitui alternativa viável ao desmatamento que se verifica, melhoria do meio ambiente e que serve para reduzir a pressão sobre as florestas. Pois, pelo contrário, as plantações comerciais promovem o desmatamento na medida em que o seu estabelecimento é precedido pela remoção e queima de florestas nativas, igualmente, contribui para degradação de solo causando erosão principalmente pelo facto do solo se encontrar exposto nos primeiros anos da plantação e na fase da colheita, com o agravante do uso de máquinas pesadas que compactam o solo, aumentando deste modo o escoamento superficial. Ademais, as plantações para além de alterar o ciclo de nutrientes, contribuem também para a destruição de habitats naturais promovendo a perda da biodiversidade e influenciam a alteração de distribuição espacial e temporal da precipitação. Mesmo no que diz respeito às questões sociais, continua sendo falso o argumento de que com a vinda de vários investimentos de plantações comerciais, as comunidades locais terão maiores oportunidades de emprego e por via desta melhorares condições de vida com o alívio da pobreza, e tornar-se-ão cada vez mais autónomas e activas no processo de tomada de decisão. Ao contrário deste argumento, este tipo de investimento gera emprego directo fundamentalmente nas fases de plantio e exploração, tanto que após o plantio o número de trabalhadores reduz substancialmente, e os escassos empregos gerados são, em muitos casos, de muito baixa qualidade, geralmente de carácter temporário, com baixos salários e com contratos precários. Em adição, o modelo deste tipo de produção industrial abre espaço para expropriação de terras das comunidades rurais, visto que, contrariamente ao aproveitamento de terras marginais como tem sido comummente referido, as empresas recorrem a terras férteis e com acesso a água de forma a garantir maior rendimento das suas monoculturas, tirando o direito às comunidades de acesso a terra e água para produção de comida. Fruto desta situação, são vários os casos de conflito que têm surgido no nosso país entre comunidades locais e empresas florestais, sobretudo pela disputa de terra arável, água e justiça nas questões laborais. Ainda assim, continua sendo recorrente a postura do governo moçambicano em encorajar e acarinhar modelos de produção desta natureza, sem acautelar todos estes cenários adversos, que por sinal, já começaram a causar danos directos às comunidades locais e ao ecossistema como um todo.

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NotĂ­cias Internacionais

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Em 25 anos, planeta perdeu superfície florestal do tamanho da África do Sul Ao todo, 129 milhões de hectares de floresta, o equivalente, aproximadamente, a uma superfície do tamanho da África do Sul, sumiram do mundo nos últimos 25 anos, revelou um relatório divulgado nesta segunda-feira pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). “O desmatamento continuou, mas o ritmo reduziu, apesar de mais do que nunca serem usados produtos florestais”, afirmou o diretor-geral da entidade, o brasileiro José Graziano da Silva, durante a abertura do XIV Congresso Florestal Mundial (WFC) na cidade sul-africana de Durban. De acordo com o relatório deste ano sobre os recursos florestais mundiais, a superfície de florestas continua diminuindo à medida que a população cresce e a demanda por alimentos e terras se intensifica, porém o ritmo anual de desmatamento caiu em mais de 50% nos últimos cinco anos. Esta mudança se deve ao fato de a taxa de desmatamento ter diminuído em alguns países e em outros ter aumentado a superfície florestal, uma grande evolução se for levado em conta que nos últimos anos a extração anual de madeira e o número de habitantes aumentaram. Segundo o estudo, a maior perda de superfície de florestas ocorreu nos trópicos, especialmente na América do Sul e na África. As florestas, que em 2015 representam menos de 4 bilhões de hectares, absorvem o carbono e reduzem as emissões de gases do efeito estufa à atmosfera. Mas sua degradação em nível mundial em terras destinadas para outros usos, como a agricultura, levou a diminuição das reservas mundiais de carbono na biomassa florestal em quase 17,4 gigatoneladas nos últimos 25 anos. O desmatamento é um fenômeno difícil de medir, inclusive através de imagens de satélite, pois os lucros e as perdas na mata ocorrem continuamente. O grosso da floresta mundial é natural, reduzida de 8,5 milhões de hectares anuais (de 1990 a 2000) a 6,6 milhões anuais nos últimos cinco anos, uma tendência que deve continuar no futuro, sobretudo nas zonas tropicais. Por sua vez, a superfície de floresta plantada aumentou em mais de 110 milhões de hectares em 25 anos e representa 7% do total no mundo. Em 2015, 30% das florestas do mundo tinham função produtiva e, aproximadamente um quarto delas tinha múltiplos usos ao fornecer madeira, produtos florestais não madeireiros, água, lugares de lazer e condições para a gestão das fauna e flora silvestres. A conservação da biodiversidade constitui o principal objetivo da gestão florestal. O estudo Ressaltou que houve progressos “substanciais” rumo à gestão florestal sustentável, pois aumentaram os planos, o monitoramento, as certificações e as estatísticas relacionadas. Além disso, cresceu a superfície de floresta destinada ao uso florestal permanente por porte de governos e proprietários privados, entre os quais se destaca o caso da China. Apesar dos esforços realizados, o relatório advertiu que as práticas insustentáveis e o desmatamento continuam, ao tempo que em alguns países as comunidades locais continuam sem conseguir o benefício suficiente das florestas.

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Estados Unidos acumulam 40% da “dívida ambiental” do mundo, aponta estudo Os Estados Unidos acumulam 40% da “dívida climática” mundial pelos danos causados ao meio ambiente, aponta estudo divulgado nesta segunda-feira pela “Nature Climate Change”. A análise foi realizada por um grupo de pesquisadores da Universidade Concordia de Montreal, no Canadá, que estimou os débitos climáticos dos países e quanto deveriam pagar pelos danos ambientais causados ao planeta. Os autores explicaram no relatório como os países que contribuíram para o fenômeno em maior medida adquiriram uma dívida ambiental com as outras nações que tiveram participação menor no aquecimento global. Além disso, o estudo sugere que as dívidas ambientais - que incluem a exploração dos recursos naturais, a poluição ou a emissão de gases estufa - sejam utilizadas para decidir quem deve pagar pelos custos globais da mudança climática. O relatório afirma que os países com maior dívida de carbono, ou seja, aqueles que contribuíram em maior medida à mudança climática por meio da emissão de CO2, são os EUA, Rússia, Alemanha, Canadá, Reino Unido e Austrália. Por outro lado, os países “credores” da dívida pelas baixas emissões de gases poluentes são Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão, Nigéria, Brasil e China. “Se colocamos a mudança climática em termos de dívida e crédito de cada país, podemos ver quais contribuíram em maior ou menor medida ao aquecimento global, através do tempo, em relação a sua parte da população mundial”, explicou Damond Matthews, pesquisador do Departamento de Geografia, Urbanismo e Meio Ambiente da Universidade de Concórdia. Para estabelecer as diferenças nas emissões e as responsabilidades históricas do ano ambiental, Matthews e sua equipe calcularam os débitos de carbono de cada país tomando como base os registros de emissões per capita desde 1990. A partir dessa data, os pesquisadores comprovaram como as emissões aumentaram em todos os países devedores em 250 milhões de toneladas de dióxido de carbono. Segundo o estudo, o “custo social” das emissões é de, aproximadamente, US$ 40 por tonelada. “Essa estimativa de custos mostra quanto os países industrializados devem pagar aos menores emissores para que façam frente aos custos da mudança climática ou para que desenvolvam suas economias através de alternativas livres de carbono”, explicou. Fonte: noticias.terra.com.br



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