País Verde - Fevereiro 2008

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Suplemento

Sexta-feira: 15 de Fevereiro de 2008

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O País

O PAÍS VERDE Propriedade da JA! Justica Ambiental no, Rua Marconi 110, 1º andar - Maputo -Tel: 21496668 E-mail: ja-news@tdm.co.mz, ja-ngo@tdm.co.mz Directora: Anabela Lemos * Editor: Marcelo Mosse * Periodicidade: Mensal * 15 de Fevereiro de 2008 * Edição nº: 7

Nota Editorial Para quando o EITI em Moçambique? O Presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, visitou Moçambique nos dias 3 e 4 deste mês. No final da visita, Zoellick, na companhia de Aiuba Cuereneia, Ministro da Planificação e Desenvolvimento (MPD), prestaram declarações à comunicação social. Segundo o matutino Notícias, na sua edição de 5 de Fevereiro, Robert Zoellick “falou da necessidade de uma maior transparência na gestão dos recursos naturais, criando condições para que a sua exploração seja não só sustentável, como também beneficie os cidadãos”. Este é um pronunciamento que tem como base a Iniciativa de Transparência nas Indústrias Extractivas (EITI, na sua sigla inglesa), um programa lançado pelo então Primeiro-Ministro Britânico, Tony Blair, em 2002, e que tem o suporte político da comunidade internacional e de organizações multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o próprio Banco Mundial (BM). A iniciativa é direcionada aos países ricos em hidrocarbonetos e minérios (como Moçambique) e visa imprimir regras de transparência na gestão de recursos naturais esgotáveis, transparência essa que consiste, entre outras acções, na publicação de todos os contratos rubricados pelo Governo no sector, a publicação dos pagamentos que as empresas do sector efectuam ao governo e a publicação das receitas que o Governo recebe dessas empresas. Desde Maio de 2007 que o governo moçambicano diz estar interessado em aderir à EITI. Mas de lá até cá nada tem sido feito. Ainda no ano passado, o Governo, através do MPD, efectuou um estudo (até aqui não publicado) visando avaliar a realidade moçambicana para à adesão à EITI. Até hoje nada de concreto tem sido feito que mostre interesse das autoridades moçambicanas na EITI. É um facto que o quadro legal nas áreas mineira, petrolífera e do gás natural tem evoluido significativamente. Em 2001 uma nova Lei de Petróleo foi aprovada (Lei n o 3/2001 de 21 de Fevereiro) e em 2002 surgiu uma nova Lei de Minas (Lei n o 14/2002 de 26 de Junho). No ano passado, a Assembleia da República aprovou novos dispositivos legais, nomeadamente: • A Lei nº 11/2007 de 27 de Junho, que visa “actualizar a legislação tributária, especialmente relativa a actividade mineira (...)”; • A Lei nº 12/2007 de 27 de Junho, que tem em vista a actualização da legislação tributária, especialmente a relativa à actividade petrolífera; • A Lei nº 13/2007 de 27 de Junho atinente à revisão do regime dos benefícios fiscais das áreas mineira e petrolífera. Em nossa opinião, estas inovações nunca poderão ser içadas como bandeiras de vitória na luta contra a falta de transparência na gestão da receita dos recursos naturais, nem de longe serem usadas como argumento da não adesão de Moçambique à EITI, como deu a entender o Ministro Aiuba Cuereneia no briefing à imprensa no final da visita do Presidente do grupo Banco Mundial. Cuereneia disse o seguinte, citado pelo Notícias de 5 de Fevereiro: “O que se pretende com estes dispositivos legais é que as negociações para a concessão de exploração de recursos naturais não sejam feitas de forma discricionária”.

Alimento para reflexão Por Anabela Lemos Fazendo uma breve análise do ano 2007, verificamos que um dos assuntos que nos chama mais a atenção é a contínua ou, diria até, uma agravante falta de informação e transparência em relação aos investimentos e mega projectos no nosso país. A nossa Constituição da República entre outros consagra, no artigo 30°, o direito a uma permanente e democrática participação dos cidadãos em todos os problemas da Nação; no nº 1 do artigo 48 o direito à informação; no nº 1 do artigo 90 o direito do cidadão a viver num ambiente equilibrado e o dever de o defender. A Lei do Ambiente consagra, no artigo 4.° d), o princípio da ampla participação dos cidadãos como aspecto crucial da execução do Programa Nacional de Gestão Ambiental. A mesma Lei do Ambiente garante a todos os cidadãos, no seu artigo 19°, o direito à informação em relação às matérias relacionadas com a gestão do ambiente no país. O Decreto n.° 45/2004, de 29 de Setembro, aprova o Regulamento sobre o Processo de Avaliação de Impacto Ambiental onde garante, no n.° 1 do artigo 14, um acesso pleno a toda a informação no contexto da participação pública em processos de Avaliação do Impacto Ambiental. E ainda, Moçambique participou, no contexto internacional, na Conferência do Rio de Janeiro, realizada em 1992, em cuja Declaração se estabeleceu, no princípio X, que “a nível nacional, cada pessoa terá acesso adequado às informações relativas ao ambiente”.

Posto isto gostaria de trazer para reflexão algumas questões: Depois da polémica das cheias de Fevereiro de 2007, e devido às contraditórias informações trazidas a público, mais uma vez a JA considerou ser fundamental obter da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) informações que permitissem chegar a conclusões tecnicamente sólidas quanto aos factores ambientais determinantes das referidas cheias. A JA tem vindo, sem sucesso, a solicitar informações à HCB desde 2005, referentes aos dados hidrológicos e operacionais que são usualmente disponibilizados por todas as grandes barragens. A falta de resposta aos pedidos efectuados levou a que a JA elaborasse uma petição à Procudaria Geral da República (PGR), para solicitar esses documentos. A petição foi entregue em Maio de 2007 e em Julho do mesmo ano a JA recebeu uma cópia do despacho da PGR, instando a HCB a conformar com o disposto na Lei e disponibilizar a informação solicitada. Até à data ainda não tivemos uma resposta. Mphanda Nkwua! Que mais poderemos dizer para além do que temos escrito, falado, debatido e comentado nos últimos 6 anos? Até hoje, ainda não temos respostas às nossas preocupações e continuamos sem ter acesso ao estudo de 2005 que tantas vezes solicitamos; também ainda não tivemos oportunidade de analisar a revisão do estudo de 2007. Segundo alguns órgãos de informação, citando o referido estudo, ficou decidido que o projecto era viável e como tal foi aprovado, sem consulta pública, sem participação dos cidadãos e sem ter em (Cont. na pág. seguinte)

Mas isto não é verdade pois mesmo com as inovações legais que foram operadas, as concessões são ainda feitas de forma discricionária, uma vez que são mediante concurso público (quando se trata de novas áreas) ou mediante negociação directa (quando se trata de áreas que já tinham sido concessionadas e, depois, foram abandonadas). No concurso público, segundo uma fonte do Instituto Nacional do Petróleo (INP), há uma Comissão de Avaliação que apura (de forma discricionária) o vencedor. Na negociação directa, segundo a mesma fonte, o governo escolhe (também de forma discrionária) uma operadora com a qual negoceia a área a ser concessionada. Nas duas modalidades, o Governo atribui as concessões sem qualquer requisito de consulta popular ou validação do Tribunal Administrativo. O visto deste tribunal não é tido nem achado quando se trata de grandes negócios nesta área. O que na verdade as novas leis trouxeram são avanços em termos de redução dos incentivos fiscais e um certo nível de descentralização em termos de concessão de áreas menores de exploração mineira, as quais podem agora ser concedidas pelos governos distritais e provinciais, consoante a dimensão da área.

AMBASSADE FRANCE AU MOZAMBIQUE ET AU SWAZILAND

Apreciamos bastante os esforços no sentido de se melhorar o quadro legal no sector extractivo em Moçambique. Mas o mesmo continua incipiente. É preciso haver maior transparência através, por exemplo, da desagregação das receitas no Orçamento do Estado. Nos actuais moldes é impossível saber o que é que as empresas estão a pagar ao Governo. Os contratos nesta área têm que ser mais abertos, permitindo que o público saiba não somente que empresa ganhou determinado concurso, mas sobretudo por que é que ganhou a empresa A e não B. Marcelo Mosse

A publicação do País Verde foi possível graças ao apoio da Cooperação Francesa. O conteúdo nele expresso não reflecte necessariamente os pontos de vista da embaixada da França, é da responsabilidade exclusiva da Justiça Ambiental


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