País Verde - Novembro 2007

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Suplemento

Sexta-feira: 16 de Novembro de 2007

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O País

O PAÍS VERDE Propriedade da JA! Justica Ambiental no, Rua Marconi 110, 1º andar - Maputo -Tel: 21496668 E-mail: ja-news@tdm.co.mz, ja-ngo@tdm.co.mz Directora: Anabela Lemos * Editor: Marcelo Mosse * Periodicidade: Mensal * 16 de Novembro de 2007 * Edição nº: 5

Nota Editorial Legislação ambiental e oportunidades para a corrupção Robert Klitgaard é, se calhar, um dos autores que melhor definiu o conceito de corrupção - não pela sua abrangência, mas pela clareza com que elaborou uma fórmula muito recorrida na literatura académica. Para ele, corrupção é uma forma de mau uso do cargo público para benefícios privados ou para fins não oficiais. Ele desenvolveu a seguinte fórmula: C=M+D-A Onde: C= Corrupção; M=Monopólio; D=Discricionariedade; A =Accountability Para Klitgaard, seja tratando-se de uma actividade pública ou privada, seja de uma actividade não lucrativa, aconteça em Kigali ou em Bruxelas, podem-se encontrar práticas de corrupção quando uma organização ou uma pessoa tem o monopólio de poder sobre um bem ou determinados serviços, tem a discricionariedade de decidir quem vai recebê-lo e em que quantidades, mas não pesa sobre ela nenhuma regra ou prática de responsabilidade, ou seja, essa organização ou pessoa não tem a obrigação de prestar contas. Por outras palavras, o excesso de monopólio e discricionariedade e a ausência de responsabilidade propiciam oportunidades para a corrupção. Sendo assim, para que as oportunidades sejam reduzidas e a corrupção controlada, os sinais da equação deverão ser trocados: reduzindo o monopólio, limitando a discricionariedade e aumentando a responsabilidade. Uma das formas de discricionariedade que pode abrir espaço para a corrupção é através das excepções que a legislação dá às lideranças políticas nalguns diplomas legais. Em Moçambique, a legislação ambiental está cheia de excepções perniciosas, as quais deveriam ser removidas se quisermos promover um quadro de integridade e transparência na gestão do meio ambiente. De acordo com uma pesquisa do Centro de Integridade Pública (ainda no prelo) existem oportunidades de corrupção que resultam de leis que não são especialmente dedicadas à luta contra a corrupção, como as leis que regulam a actividade económica. Um exemplo, refere o estudo, é o constante na Lei n.º 10/99, de 12 de Julho (Lei das Florestas e Fauna Bravia). O artigo 10 desta lei estabelece as zonas de protecção que são destinadas à conservação da biodiversidade e de ecossistemas frágeis ou de espécies animais ou vegetais. O n.º 2 do artigo 11 desta lei enumera as actividades cujo exercício é interdito nestas áreas, a não ser por razões científicas ou por necessidades de maneio. Mas o n.º 8 do artigo 10 da mesma lei refere que: “Por razões de necessidade, utilidade ou interesse públicos o Conselho de Ministros pode, excepcionalmente, autorizar o exercício de certas actividades nas zonas de protecção referidas na presente Lei”. Trata-se, refere o estudo, de uma “mais uma excepção à proibição. Nem sequer se refere quais são as actividades que poderão ser autorizadas. Parece que todas, estando isto sob alçada da discricionariedade do poder público. Não se define nem se limita, muito menos se precisa em que deve consistir essa ‘necessidade’, ‘utilidade’ ou ‘interesses públicos’. Não se dão quaisquer critérios nem se obriga a uma fundamentação. Pode ser mais uma porta aberta à prática de actos de improbidade administrativa”.

Conferência sobre barragens começa segunda-feira Promovendo a Transparência e o Diálogo sobre as Barragens e o Desenvolvimento em Moçambique: Aprendendo com os Acontecimentos do Passado em Relação a Grandes Barragens em África 19-21 Novembro, 2007 Os recursos hídricos em África continuam frágeis, muitas vezes devido à má gestão da água e não propriamente à escassez de água. Porém, há uma preocupação crescente relacionada com o stress causado pelas grandes barragens nos recursos hídricos, pelo crescimento da população, pelas mudanças climáticas, pelos insustentáveis padrões de consumo e uso descontrolado. Moçambique está agora a entrar numa fase de crescimento industrial, que inclui planos de novas grandes barragens no rio Zambeze. De modo a reduzir os riscos, melhorar a partilha de benefícios e promover uma visão partilhada de desenvolvimento que leva em conta a voz das comunidades em relação a projectos de infraestruturas tão grandes assim, é importante analisar tanto as boas como as más experiências entre os países, os interessados e os indivíduos. Somente através de um diálogo aberto com os vários interessados “stakeholders” se consegue alcançar o uso verdadeiramente sustentável e eficiente dos nossos recursos hídricos afim de obter o desenvolvimento sócioeconómico. Nós propomos a realização de um ”workshop” público de 3 dias que trará oradores da região com experiência em lidar com os impactos de grandes barragens na África Austral. A intenção é abrir o diálogo através das lições aprendidas com as barragens existentes na região, e de discutir formas para que Moçambique possa evitar a “regra global” onde os custos reais de uma barragem excedem sempre os custos previstos, desempenho económico abaixo do previsto, ruptura social e destruição ecológica típica de projectos de grandes barragens. Histórico das Grandes Barragens O acesso à água e à electricidade já foi identificado como

o principal factor limitante do desenvolvimento sócio-económico em vários países. Mais de 1.1 biliões de pessoas no mundo inteiro não têm acesso a uma fonte de água segura e mais de 1.6 biliões não tem electricidade. A demanda da água para energia hídroeléctrica, para irrigação, para indústria, para água potável e saneamento, para a manutenção do ecossistema e para o desenvolvimento do turismo e recreação requer uma acção de uma forma integrada para o desenvolvimento sustentável da água. Durante milhares de anos, o Homem tem construído barragens para controlar a distribuição da água, para produzir energia hídroeléctrica e para muitos outros fins. Mas hoje em dia, as barragens cresceram em escala, e agora muitas vezes inundam grandes parcelas de terra e podem ter graves e irreversíveis impactos sociais e ambientais. Embora várias vezes referidas como um símbolo de desenvolvimento, as grandes barragens tem constantemente colocado o custo do desenvolvimento naqueles mais directamente afectados pelos seus impactos negativos, ao mesmo tempo que não trazem quase nenhum dos benefícios para os quais se constroem as grandes barragens. A Comissão Mundial de Barragens (WCD) revelou que as grandes barragens geralmente custam mais do que o previsto, e produzem menos benefícios que aqueles que os proponentes reivindicam. A WCD revelou também que 40-80 milhões de pessoas por todo o mundo tiveram que ser realocadas devido a grandes barragens, e muitos ficaram em pior situação. Os africanos não foram excluídos desta triste história. Desde realocações forçadas a fracas compensações e a impactos não compensados nos seus meios de subsistência, os africanos afectados pelas barragens e seus aliados estão a tentar alertar o público sobre as injustiças sociais e ambientais das grandes barragens, alternativas a tais projectos, e métodos futuros (Cont. na pág. 11)

Num cenário como o nosso em que é cada vez maior a promiscuidade entre a política e os negócios (cada vez mais políticos controlam sectores chave da economia e do investimento privado) e a legislação sobre conflitos de interesse é precária, as excepções atribuídas ao Conselho de Ministros podem ser usadas para fins que não os do interesse público. E isso ja aconteceu há bem pouco tempo, concretamente em projectos no sector do turismo. Não se trata de se estabelecerem leis sem excepções. A questão que se coloca, avança o estudo do CIP, “é a de saber se todas as excepções que existem nas nossas leis são necessárias, ou se não deveriam ser limitadas e precisar-se melhor quando e como essas excepções poderão ocorrer”. Mas, para além das excepções, a mesma lei contém disposições legais incongruentes, contraditórias ou ambíguas. Com efeito, os mesmos artigos referidos servem para exemplificar contradições e ambiguidades que podem criar oportunidades de corrupção. Por exemplo, fica-se sem se ter a certeza se a permissão excepcional dada pelo n.º 8 do artigo 10 de autorizar actividades em zonas de protecção abrange também as zonas de protecção total, tal como as referidas no artigo 11 (parques nacionais) e as actividades que neste artigo são expressamente proibidas. Moçambique tem dado, nos últimos anos, passos importantes no sentido do aperfeiçoamento da legislação ambiental, mas alguns deles não são sólidos: permitem escorregadelas e tropeços como os acima referidos. É pois urgente uma reforma legislativa que permita corrigir as lacunas e as fraquezas existentes, para limitarmos cada vez mais as oportunidades para o uso do cargo público para benefício privado através das excepções cobertas por lei. Marcelo Mosse

AMBASSADE FRANCE AU MOZAMBIQUE ET AU SWAZILAND

A publicação do País Verde foi possível graças ao apoio da Cooperação Francesa. O conteúdo nele expresso não reflecte necessariamente os pontos de vista da Embaixada da França, são da responsabilidade exclusiva da Justiça Ambiental


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