Suplemento
Sexta-feira: 19 de Outubro de 2007
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O País
O PAÍS VERDE Propriedade da JA! Justica Ambiental no, Rua Marconi 110, 1º andar - Maputo -Tel: 21496668 E-mail: ja-news@tdm.co.mz, ja-ngo@tdm.co.mz Directora: Anabela Lemos * Editor: Marcelo Mosse * Periodicidade: Mensal * 19 de Outubro de 2007 * Edição nº: 4
Nota Editorial O Governo e o défice de informação sobre a gestão ambiental Apesar de o Programa do Governo (2004-2009) enunciar um forte cometimento do executivo em matéria de gestão ambiental, a informação que é fornecida à opinião pública é ainda omissa no que diz respeito às boas práticas e, sobretudo, ao reforço da integridade e fiscalização no sector. O Balanço do Plano Económico e Social (PES) que o Governo produz semestral e anualmente é a principal fonte de informação oficial sobre o que vai sendo feito nesta área. Mas a qualidade e a quantidade da informação fornecida não permite avaliar se estamos no bom caminho ou se nos vamos enterrando paulatinamente, através da aceitação de projectos comprovadamente perniciosos (como a recente aprovação da construção de Mphanda Nkuwa, um projecto que tem não apenas implicações do ponto de vista ambiental – como temos vindo a dizer – mas também do ponto de vista de finanças públicas, endividamento, etc; e a imparável exploração ilegal dos recursos florestais – que pouco a pouco tem vindo a ser reconhecida pelas autoridades (um reconhecimento mais administrativo que político). Os balanços do PES apresentam apenas as proclamadas boas intenções e têm sempre o condão de quererem mostrar um empenho imaculado do Governo em matéria de gestão ambiental. Os balanços do PES fazem uma tábua rasa aos graves problemas que a sociedade civil e a comunicação social tem vindo a apontar. O mais recente balanço do PES é o referente ao primeiro semestre de 2007. É este documento que serviu de base para a recente reunião entre o Governo e os doadores (joint review) que se destinou a avaliar o desempenho do executivo na implementação do PARPA neste período do ano e fixar as metas para o próximo ano e os indicadores em que se baseará a avaliação anual de 2007, que será feita em Março/Abril de 2008. O relatório final dessa avaliação semestral de 2007 (o aide memoire) é uma fonte crucial para sabermos se o Governo (e os doadores) colocam as matérias ambientais num patamar elevado de importância no que diz respeito ao combate à pobreza. Mas não é o caso. O documento não contém uma única referência sobre o desempenho do Governo nesta área. As questões ambientais, que são consideradas transversais (tal como o HIV-Sida, o Género e o Desenvolvimento Rural) no quadro dos pilares estratégicos do PARPA, são relegadas para um plano secundário. Talvez por isso é que apenas um indicador foi estabelecido como elemento de avaliação do desempenho do Governo em 2007: o Nº cumulativo de planos estratégicos distritais de desenvolvimento (PEDD) com a componente espacial integrada (uso de terra) elaborados e aprovados. Não se tratando de minimizar a importância da gestão da terra no combate à pobreza, a gestão ambiental vive de muitos outros problemas que, se não constam das avaliações conjuntas, deviam, no mínimo, ser alvo de referência nos balanços do PES.
Afinal, petróleo é sinónimo de desenvolvimento? Por Carol d’Essen e Joshua Dimon (estagiário na JA)
Nas últimas semanas muito se ouviu falar sobre assuntos relacionados com a exploração de petróleo em Moçambique. No início do mês de Outubro foi anunciada a construção de uma refinaria de petróleo em Nacala-Velha, província de Nampula, com capacidade para a produção de 300 mil barris de petróleo por dia. Duas semanas depois, foi anunciado que a empresa norte-americana Anadarko, que está investindo 300 milhões de dólares na Bacia do Rovuma para os próximos cinco anos, em parceria com a empresa canadiana Artumas, anunciou que, depois dos trabalhos de pesquisa já realizados, está decidida a começar suas perfurações na área a partir do início de 2008.
substâncias mais importantes da economia mundial e tem alto valor de mercado. Além da gasolina, é do petróleo que se fazem produtos como parafina, GLP, produtos asfálticos, nafta petroquímica, querosene, solventes, óleos combustíveis, óleos lubrificantes, óleo diesel e combustível de aviação. Em resumo: é o motor corrente da economia mundial, actualmente tem um consumo de aproximadamente 83 milhões de barris por dia e movimenta cerca de US $5.5 biliões dólares por dia na economia mundial (do preço médio de 2006).
O website da Anadarko diz que a bacia pode conter entre 250 milhões até 3 biliões de barris métricos de petróleo. Por fim, o Presidente do Conselho de Administração do Instituto Nacional de Petróleo em Moçambique, Arsénio Mabote, disse, no último dia 8, que “dados até o momento recolhidos pelas pesquisas em curso são encorajadores e dão-nos confiança”. A existência de petróleo em Moçambique se aproxima cada vez mais da realidade, o que nos estimula a reflectir: afinal, o petróleo é sinónimo de desenvolvimento?
Além de gerar dinheiro, o petróleo também gera uma série de impactos, não só ambientais, mas também sociais, políticos e económicos. Para citar alguns exemplos dos impactos ambientais de explorações em alto mar, quando um furo é feito são aspiradas 22,000 toneladas de sedimentos, que muitas vezes são depositados no próprio local, diminuindo o número de microorganismos na água e alterando o ecossistema marinho. Outro problema está relacionado com o gás natural, que normalmente vem junto com o petróleo, e em caso de vazamentos,
A primeira associação que a maioria das pessoas faz ao pensar no petróleo é a riqueza. Isso porque é uma das
O outro lado da moeda
(Cont. na pág. seguinte)
Olhando para o balanço semestral de 2007, a ilação que se tira é que o governo continua a alimentar a exploração florestal sem colocar mecanismos de integridade e controlo no terreno. Apesar do crescente abate ilegal de florestas, o Governo tem vindo a aceitar mais operadores no terreno, sem reforçar a fiscalização. De acordo com o balanço do PES, o governo diz que só no primeiro semestre de 2007 foram emitidas 2036 licenças para a exploração florestal de espécies nativas, dentre as quais 608 para exploração de madeira em toro. Quanto a avanços em termos de capacidade de fiscalização nem uma linha. Todos sabemos que uma das formas de se reverter a actual situação da exploração ilegal é através de medidas de prevenção (e não apenas a repressão traduzida pela aplicação de multas). A nossa realidade mostra que a quantidade e qualidade de fiscais no terreno é insuficiente em comparação com a quantidade de operadores e a dimensão do território. Segundo dados do balanço de actividades da Direcção Nacional de Florestas e Terra, para o ano 2006 Moçambique tinha apenas 364 fiscais ajuramentados espalhados pelas 10 províncias do País. Em 2006, o número de operadores em regime de licença simples registou um aumento em cerca de 37% em relação a 2005, mas durante o mesmo período o número de fiscais ajuramentados no terreno subiu apenas em 4, passando de 360 em 2005 para 364 fiscais em 2006. As boas intenções do Governo em matéria de gestão ambiental têm de ser traduzidas em acções concretas. O papel do Governo não termina no mero licenciamento. A fiscalização e a integridade são essenciais para o equilíbrio da gestão. Por isso, os relatórios do Governo também têm de apresentar, neste caso concreto das florestas, o que é que tem vindo a ser feito para evitarmos tomar conhecimento dos desmandos apenas quando os toros ja estão nos portos, a um pé da exportação. X Marcelo Mosse
AMBASSADE FRANCE AU MOZAMBIQUE ET AU SWAZILAND
A publicação do País Verde foi possível graças ao apoio da Cooperação Francesa. O conteúdo nele expresso não reflecte necessariamente os pontos de vista da Embaixada da França, são da responsabilidade exclusiva da Justiça Ambiental