1 minute read
A NORMALIDADE E A JUSTIÇA
from 55º EDIÇÃO
As estatísticas são tramadas e muitas vezes aparecem-nos especialistas a vender o peixe que está em cima da bancada em vez de analisarem as causas que levaram à peixeirada.
Portugal, e haverá sobejas razões para isso nem sempre tem a melhor fotografia nacional e na estranja no campus da justiça no que respeita à qualidade e tempo de produção da máquina da justiça.
Os ditos especialistas, alguns pagos a pesadas barras de ouro, juntam-se às portas dum partido que não esteja no poder na altura e concluem que é pão para a boca colocar mais uns tijolos na despesa pública da justiça para que Portugal saia da ponta do rabo do desgraçado do diabo.
Isto a par das grandes e diárias manifestações nacionais em que (quase) toda a gente grita por menos e melhor Estado, mas com mais gente, activamente e passivamente...
Também há diagnósticos que descobrem que por debaixo do manto da justiça há bruxas que devem ser queimadas vivas ou mortas no pelourinho ou nos jornais ou telejornais por que se disfarçam com as manobras dos recursos, e delongas tudo com vista a safar os pré-condenados ou a prolongar-lhes a vida fora das prisões dos castelos dourados.
Falta pouco para que o pessoal da econometria entre todo em parafuso ou em burnout, que em Portugal é lume brando, por que o anormal é normal e a excepção a regra.
Imagine-se que a malta decide toda não pagar a conta do supermercado, ou a renda da casa, ou a conta do gaz e da luz e da RTP, EDP e primos, ou a farmácia, invocando que foi enganada pelo governo ou pelo chefe do governo, ou pelos chefes das oposições, que prometeu que as batatas e tudo seria de borla.
Neste cenário para resolver este imbróglio seriam necessários milhentos de operadores judiciários e originaria de facto um tremendo tremor de processos judiciais que afectaria todo o país, embora tivesse a vantagem de acabar com o desemprego e o salário mínimo.
Aqui todos perceberiamos que a doença não está apenas na máquina da justiça mas noutras maquinarias e engrenagens a montante e que a justiça é apenas a foz do pântano onde desaguam os dejectos sócio-económicos dos portugueses, sem pretender desculpar as culpas que naquela eventualmente possam existir.
A justiça deve ser um assunto residual em qualquer país, e não a regra, e se o não for algo está muito mal na terra onde isso acontecer, e toda a sociedade deve centrar-se no problema real em vez da venda do sangue.
Uma casa mobilada, sempre pensou, é a certeza de uma porta aberta de par em par, de mãos livres, de rua nova à espera dos seus pés.
Maria Judite de Carvalho, “George” em “George e Seta Despedida”, 2015, Porto Editora