Cultura em pauta são borja

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Cultura PSãoauta Borja

Edição Especial

em

Identidades culturais em São Borja

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A história dos Bairros de São Borja P.11

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A história da Igreja Matriz de São Borja

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Crenças populares da cidade

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A Cena Cultural de São Borja Uma viagem pela memória cultural, marcada em solo fronteiriço. Acompanhe a reportagem especial e conheça um pouco mais sobre a identidade do município.

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EDITORIAL Precisamos falar sobre cultura Falar sobre cultura pode parecer banal, fácil e sem tanta importância dentro das produções jornalísticas que estamos mais habituados a acompanhar. Na história contemporânea da imprensa no mundo, as editorias de cultura nunca tiveram tantas pautas possíveis para serem apuradas: o atual panorama de fenômenos culturais diversos, acoplado ao acesso à cultura que é potencializado, sobretudo, pelas redes sociais digitais de comunicação é exemplo disso. Paradoxalmente, as mesmas editorias – e seus profissionais de comunicação – àquelas ocupadas em tratar sobre a cultura e suas manifestações – são as que mais sofrem com as dificuldades econômicas enfrentadas pelo modelo de negócios do jornalismo. Talvez seja por isso que dedicar uma edição inteira à temática da cultura possa parecer num primeiro olhar estranho aos leitores de uma revista. Nosso modo de leitura midiática, forjado principalmente pelo acompanhamento dos jornais diários, preconiza as editorias ditas clássicas – política, economia, geral, cidades, internacional, esportes, dentre outras. À cultura, resta o espaço, geralmente dominical, composto por resenhas de eventos, agendas de shows, espetáculos, etc., sem que se estabeleça uma crítica aprofundada sobre como a cultura atravessa todas nossas práticas cotidianas e é formadora de nossas experiências sociais ao longo da vida. Pensar possíveis pautas culturais vinculadas ao município de São Borja era tarefa dos estudantes de jornalismo que produziram essa revista. As reportagens

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que os leitores encontrarão nas páginas seguintes foram pensadas com cuidado, considerando a riqueza histórica da região, seus fatos inusitados, curiosidades e sabedorias populares que são seculares no município. Produzir uma revista que pudesse servir, também, como documento histórico à região era um dos desafios. Aos estudantes, não bastava tratar a cultura e seus fenômenos como já fazem costumeiramente os jornais mais conhecidos dos leitores. O trabalho precisava ser aprofundado, fruto de pesquisa, de apuração minuciosa e com entrevistas planejadas cuidadosamente. O resultado dessa experiência realizada no âmbito acadêmico é visualizado nas páginas seguintes. Convidamos os leitores a acompanhar nhar e desfrutar parte da vasta história cultural de São Borja, recortada e trazida pelos estudantes nas suas produções. Cultura em Pauta São Borja é fruto de componente curricular Produção de Revista, disciplina que faz parte do 5° semestre do curso de Jornalismo da Unipampa. ‘

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Lívia Saggin Editora Chefe


EXPEDIENTE Reportagem e Diagramação Letícia Dorneles Louise da Campo Marcela Cartolano Maria Isabel Ramos Matheus Bernardes Matheus Charão Mayara Santos Michele Franco Nadine Marino Nathália Trindade Rudy Pinheiro Sara Meireles Stephanie Vieira Tamires Hanke Thaisy Finamor Wenandra Sommer

Projeto Visual e Gráfico

Finalização Visual e Gráfica

Karine Bianchin

Karine Bianchin

Cultura em Pauta

Alexia Saner, Aline Bacelar André Rodrigues Andressa Silveira Barbara Krieger Barbara Moraes Camila Iann Danielly Engelmann Emanuelli Rigui Gabriel Lentz Gabrielli Leiria Karine Freitas Katielli Saraiva Larissa Burchard Larissa Silva Lauren Unamuzaga

Produção e suporte Revisão Jean Azambuja

Lívia Saggin

Orientadora

Diagramação Final

Lívia Saggin

Karine Bianchin

Editora Chefe Lívia Saggin

Fundação Universidade Federal do Pampa UNIPAMPA Endereço: Rua Vereador Alberto Benevenuto, 3200 - São Borja/RS Cep: 97670-000 Telefones: (55) 3430-9850 (55) 3430-9854

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Reportagem A história dos Bairros de São Boja

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Reportagem Identidades Culturais em São Borja

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Reportagem A história da Igreja Matriz de São Borja

P.19

Entrevista em Profundidade A cena cultural de São Borja Cultura em Pauta

Reportagem

P.23

A Era Vargas

P.28 Reportagem

Fotorreportagem A praça XV de Novembro

P.40

A estação férrea

P.33 Perfil Seu Lucena

P.38 Reportagem

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Festivais em São Borja

P.46


Reportagem

Reportagem

A história da escuta do Rádio

A Biblioteca Municipal de São Borja

P.59

P.76 Reportagem Crenças Populares na cidade

Reportagem

Reportagem

P.62

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A História do Jornal Impresso

P.54

A pesca no município

P.72

Reportagem A história do Parcão

P.84 Reportagem Os cinemas em São Borja

P.66 Reportagem

Reportagem

Festival da Barranca em São Borja

Os museus em São Borja

P.50

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Marcas do passado

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Personagens e histórias que contribuíram para construção da identidade cultural de São Borja

Comércio Formiga na região ribeirinha de São Borja | Crédito: Ulisses Souza Gonçalves, César Peixoto Oliveira

O rio que separa, também une. Fazendo fronteira entre São Borja, no Brasil e Santo Tomé, na Argentina, o Rio Uruguai é uma marca identitária para os ribeirinhos de ambas as cidades. Chibeiros e pescadores sustentavam suas famílias através do rio e contribuíram na construção histórica e social da região. Profissões que em um passado não muito distante permitiam que muitas pessoas enriquecessem. Hoje, os chibeiros já não existem e os pescadores muito escassos. O rio é o vizinho mais próximo dessas pessoas. Na lembrança estão os tempos em que o antigo Porto de São Borja era o principal ponto de encontro da população. Os chibeiros – homens e mulheres que atravessavam o Rio Uruguai para trazer mercadorias

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do país vizinho – vendiam suas mercadorias e os pescadores negociavam os valores de seus peixes neste local. Representação da identidade cultural são-borjense, os chibeiros e pescadores influenciaram a cultura sobre a região ribeirinha, fortalecendo os aspectos geográficos e tornando a história do Porto de São Borja única. Além das trocas comerciais, ocorriam também as trocas culturais entre brasileiros e argentinos. Para o historiador Edson Paniagua, que atua em pesquisas sobre as fronteiras, o “comércio formiga” representava não apenas uma forma de renda para os moradores ribeirinhos, mas um modo de vida e de socialização, onde o rio Uruguai não representava obstáculos, “a memória do Porto de São Borja durante

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los de união entre as cidades-gêmeas Santo Tomé e São Borja. Os pescadores estão presentes nas regiões ribeirinhas e se constituem como personagens importantes da história fronteiriça, pois fazem parte da identidade local. De grande importância no cenário social e econômico de São Borja, os pescadores conhecem o rio, a natureza e aprendem através desses elementos.

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o período do “comércio formiga”, ainda está presente na fala dos moradores antigos do bairro do Passo. Era um constante movimento de pessoas, de mercadorias que abrangia desde o pequeno comércio ao grande comerciante”, relata. Porém, as expressões culturais desse local foram transformadas à medida que a região se desenvolveu. A construção da Ponte Internacional entre São Borja e Santo Tomé e a crescente poluição do Rio Uruguai foram as principais responsáveis pelas mudanças ocorridas no exercício da atividade do chibeiro e do pescador. “Após a construção da ponte o transporte através das balsas e lanchas perdeu o sentido”, comenta o historiador Ronaldo Colvero, pesquisador nas áreas fronteiriças.

História de pescador

Os registros históricos da atividade de pesca no Rio Grande do Sul datam há mais de dois mil anos. Os povos-coletores formaram a primeira colonização e assim começaram suas relações sociais. A pesca ainda era rústica com a presença de anzóis feitos com pedras e dentes de animais. A sobrevivência deixou na sociedade de hoje um instinto de resistência comum entre os povos. Depois disso, a miscigenação de índios pampeanos e guaranis também teve grande papel na formação da pesca como elemento cultural. Nesse mesmo sentido, o rio Uruguai e os pescadores que dele retiravam seu sustento se tornaram símbo

Maria Mercedes foi criada na atividade pesqueira | Crédito: Louise da Campo

Pescadora por mais de 30 anos, Maria Mercedes (53), foi criada na atividade pesqueira e assim também ensinou seus filhos. “Toda minha família é de pescadores. Aprendi desde pequena a remar, nadar, agora não pesco tanto porque tenho os guris para isso”. Os pescadores carregam em sua história a presença da solidariedade e

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cooperação familiar no trabalho. Reflexo no trabalho, o conhecimento e domínio da pesca, construídos social e historicamente, passam a agir no processo e produção dessas famílias como a de Mercedes, pois assim ensinarão seus filhos e netos. Casada com o pescador Valdomiro Garcia (58) e mãe de sete filhos, Mercedes chegou a São Borja com 23 anos e desde então nunca parou de exercer a atividade. Ela faz parte da população ribeirinha e pesqueira de São Borja e até mesmo seu casamento se consolidou através da atividade. “Conheci meu marido com 16 anos, pescando e estamos a quase 38 anos de casados.” A presença da atividade pesqueira em São Borja resultou na instituição de movimentos sociais dos pescadores, ao todo são 234 pescadores artesanais divididos na Associação dos Pescadores com 160 associados e na Colônia de Pescadores (Z-21) com 74 pescadores. A pesca na região é principalmente artesanal, ou seja, com uso de recursos manuais, consumo próprio e vendas pequenas. É nessa atividade artesanal que se visualiza o envolvimento da cultura dos pescadores em São Borja, pois é ela uma das responsáveis por carregar tradições e histórias passadas de geração em geração. Na família de Mercedes, os homens saem para acampar durante três dias em Santa Luzia, no país vizinho, e depois voltam com as mercadorias. A proporção das vendas acontece conforme a demanda do mercado, em época festivas – como na Semana Julho/2017

Santa – os lucros aumentam consideravelmente. A pesca artesanal utiliza de recursos renováveis e possui baixo impacto no meio ambiente. Isso parte da própria cultura das famílias ribeirinhas com a preservação do Rio Uruguai. Apesar disso, a pesca ilegal ainda se mostra como um fator de impacto na poluição. De acordo com o doutor em Biologia, Edward Pessano, a poluição tem agido diretamente na genética dos peixes. “Há uma série de acontecimentos que são desencadeados pela questão da poluição. Nós temos investigado o rio Uruguai, não diretamente através da água, mas através dos peixes e temos verificado que a poluição vem causando danos genéticos e celulares para esses peixes”. A alteração celular prejudica os consumidores dos pescados e, consequentemente, o mercado da pesca. Durante os anos 1950 e 1960, São Borja e toda a Fronteira Oeste não foram diretamente influenciadas pela expansão das indústrias pesqueiras. Por outro lado, essa região foi afetada pela modernização dos materiais para capturas dos peixes. Com a modernização houve a diminuição na necessidade de pescadores, substituídos parcialmente por equipamentos com o uso de motores e novas técnicas de pesca. Porém, a demanda por pesca aumentou o esforço e volume na captura dos peixes. Já nos anos 1990, a baixa renda dos pescadores fez com que muitos procurassem serviços paralelos ou temporários aos da pesca. Outros pescadores acabaram por sair de suas cidades para procurar uma qualidade vida melhor para suas famílias. Porém,

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Aventuras de chibeiro No século passado, até aproximadamente os anos 1980, o município de São Borja era marcado pela presença de chibeiros que circulavam pelo rio Uruguai aproximadamente cerca de 4 a 30 toneladas de produtos em suas embarcações. Por muitos anos, o “Comércio Formiga” lotava o porto de São Borja, onde os moradores se encontravam para venda e troca de mercadorias.

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a falta de oportunidade fez com que muitos confrontassem condições mais difíceis, refletindo até hoje no crescimento da marginalização da atividade. Com a construção da Ponte Internacional em 1997, a facilidade da travessia de veículos também afetou na vida dos pescadores. Mercedes conta que a mudança da rotina de venda após a construção Ponte Internacional levou os consumidores embora. “A última vez que tivemos uma boa venda de peixe foi há dois anos. Agora está horrível, tiraram todas as promoções do porto, as festas e tudo o que tinha. Os barcos vão indo embora e os compradores também”. Os poucos registros e dados sobre a pesca no Rio Grande do Sul revelam uma diminuição na porcentagem de atividade da pesca artesanal. De acordo com dados do Desembarque de Pescados no Rio Grande do Sul, em 1997 as espécies de pesca artesanal representavam aproximadamente 30% nos desembarques. Já em 2011, o total chegava a 19,9% de todo desembarque do Sul. Apesar desse cenário permeado por dificuldades, a pesca continua sendo um elemento formador da identidade de São Borja. Na Festa do Peixe, realizada no Cais do Porto, os moradores celebram a atividade e o Rio Uruguai. Com atividades como corridas de chalanas, jantares com comidas típicas e artesanatos, a festa se constitui como uma manifestação dessa cultura. Os artesanatos são feitos dos materiais utilizados na pesca como a linha, a rede de espera, o arrasto de praia, arrasto de porta, caçoeira, tainheira, rede de agulha, tresmalho ou mangote, espinhel entre outros.

Zenóbio trabalhou como chibeiro desde seus 13 anos | Crédito: Louise da Campo

Meio de subsistência para diversas famílias, o chibo era uma atividade que exigia muito esforço físico, persuasão e esperteza para atravessar o rio com uma lancha carregada de mercadorias. Histórias de vendas, trocas, prisões e barreiras são lembranças bem vivas na memória do chibeiro Zenóbio Souza (61). “Foram nossos melhores tempos de trabalho. Na época do comércio do Porto era todo mundo rico.

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O que tu fazia tu conseguia vender lá: chá, arroz de leite, pastel… Era sempre cheio. Realmente um formigueiro”, relembra. Zenóbio trabalhou como chibeiro desde seus 13 anos, vivenciando o comércio formiga do porto de São Borja e a construção da Ponte Internacional. Aposentado pelo serviço militar, ele conta as dificuldades e alegrias que o chibo proporcionava. “Nós íamos para Santo Tomé com chalana, saiamos às 4 horas da manhã para chegar às 8 horas. Eram sempre duas pessoas para revezar. Chegava lá e carregava a lancha de mercadoria. Depois, escondidos, nós esperávamos escurecer para a guarda não nos pegar”. Os chibeiros não traziam apenas produtos para o Brasil, mas também levavam de São Borja para Santo Tomé mercadorias que agradavam os argentinos, como o açúcar e a cachaça, e em troca, traziam batatas e farinha para serem vendidas no Porto. Do outro lado do rio, os chibeiros compravam cerca de 500 bolsas de farinha e batata, e, como não conseguiam transportar os alimentos em apenas uma travessia, ofereciam dinheiro a outras pessoas para ajudá-los. É o que relembra o ex-fuzileiro naval Alberto Lucena, “toda carga trazida de Santo Tomé estava escondida em algum lugar de São Borja e a nossa missão era encontrar essa carga. Porque era ilegal, isso era um contrabando”. Um contrabando que poderia resultar em prisão, algo que esteve muito perto de acontecer com o chibeiro ZeJulho/2017

nóbio. Em um dia normal de trabalho, Zenóbio carregou cinquenta bolsas de farinha. Ao chegar na barreira (local onde era feita a revisão das mercadorias) os guardas o interromperam, entregando-o para dois militares, “eles não me algemaram. Aí eu olhei e pensei “vou fugir”. Empurrei eles e saí correndo. Só ouvi os tiros porque eles atiravam pra cima”. Depois de correr por muito tempo e chegar próximo ao rio, a solução que Zenóbio encontrou foi pegar uma madeira e se lançar à água. Ele conta, ainda, que boiou por quase toda noite até chegar em São Borja. A partir de 1994, com o início da construção da Ponte da Integração entre São Borja e Santo Tomé, tudo começou a mudar para os chibeiros. Os translados de embarcações no porto acabaram e com esse término muitas mudanças culturais e econômicas modificaram a região ribeirinha. Dessa forma, o fluxo de pessoas e do comércio, que era intenso, despencou drasticamente. Com a reestruturação do Cais do Porto e a finalização das obras da ponte, os chibeiros já não conseguiam mais trabalhar. Parte da história de São Borja que até hoje traz tristeza para Zenóbio, “a ponte terminou com tudo. Quem era rico ficou pobre”. Depois da instalação da ponte, ele trabalhou por mais três anos atravessando a fronteira de carro, trazendo cervejas, carvão e farinha para revender em São Borja. Para Zenóbio o que resta agora são apenas as lembranças do tempo de chibeiro.

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OS PASSOS QUE CONTAM A HISTÓRIA DE SÃO BORJA

Produção: Emanuelle Righi e Gabriélli Leiria

Foto:Emanuelle Righi

A reportagem viaja pelos principais bairros que construíram o futuro da Terra dos Presidentes. O trajeto começa pelas margens do Rio Uruguai com o Bairro Passo. Mais adiante é possível ouvir o apito do trem ao passar pela Várzea e a antiga estação Férrea. Em direção à outra metade da cidade, Maria do Carmo e sua religiosidade. Siga em frente até chegar ao coração da cidade, o Centro, cenário de importantes acontecimentos históricos e culturais do município.

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m torno do Rio Uruguai, entre suas margens e a Igreja Nossa Senhora Imaculada Conceição, existia em média 100 casebres e ranchos. Começava naquele ponto de São Borja, a história do bairro mais populoso e antigo da cidade – o bairro Passo – que foi cenário de grandes acontecimentos históricos, como a invasão Paraguaia no ano de 1865. A denominação passo está ligada à sua

localização. Por estar ao lado do município argentino de Santo Tomé, o bairro ganhou esse nome ainda na época das reduções jesuítas. Naquele período, era chamado como “um passo” de Santo Tomé, redução que fundou a cidade de São Borja. Considerado o ponto fronteiriço entre São Borja e Argentina, o bairro se desenvolveu a partir da importância da relação de

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Antiga estação ferrea e hoje atual arquivo histórico


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fronteira entre os países vizinhos. A valorização do Rio Uruguai como fonte econômica, social e como identidade ajudou a caracterizar a comunidade e contribuiu para suas particularidades. . Atividades como a cultura ribeirinha, comércio formiga e a relação aduaneira, determinaram a importância da construção do Cais do Porto, em 1938. Fato curioso é que os trabalhadores da obra usavam bombachas durante o trabalho, trajes típicos da cultura gaúcha da fronteira oeste. O Prof. Muriel Pinto da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), ressalta a importância dos bairros como elemento de organização política e social.

“A organização da cidade espacial e territorial depende de uma organização política administrativa. Os bairros são muitos importantes para as cidades, visto que trazem a representatividade histórica do município”. O transporte fluvial era a principal fonte de troca de mercadorias entre Brasil e Argentina. Com o tempo, o grande fluxo das práticas comerciais resultou em casos de contrabandos. Moradores mais antigos do bairro Contam que apesar de existir segurança (precária), era uma alternativa de sobrevivência e uma superação do isolamento que se vivenciado nessa região fronteiriça. O contrabando formiga era uma forma dos moradores da Vila de São Francisco de Borja e Santo Tomé realizarem comércio para a própria subsistência. Entre as principais trocas estavam produtos alimentícios, e que garantiam o sustento familiar. O transporte Julho/2017

e a travessia do Rio Uruguai, divisor entre os dois países, eram realizados por balsa, piráguas (embarcações com velas transversais) e os mais corajosos, enfrentavam as correntezas do rio a nado. O Passo cresceu alimentando-se das riquezas naturais do Rio Uruguai. Suas águas formaram grande parte da cultura do bairro, como a prática da pesca pela comunidade ribeirinha. É nessa comunidade que encontramos representado o modo de vida “passiano”, seus valores comunitários, sua identidade cultural, saberes e práticas sociais, como relata o livro “História, Memória e as Paisagens Culturais da Cidade Histórica de São Borja”, organizado por Muriel Pinto e Jardel Vitor Silva. Apesar das águas proverem o pão de cada dia da população do Bairro do Passo, as enchentes recorrentes castigam há anos os populares. O porto de São Borja está no corpo médio da nascente do rio, entre os rios Pelotas e Canoas. As comportas das usinas hidrelétricas existentes em seu curso, quando acionadas, descem com grande vazão para a localidade, causando enchentes constantes e de longa duração. Foi no ano de 1983 que a maior enchente da história ocorreu. Naquele ano, o volume de água chegou a 19 metros acima do nível normal. Deixou como lembrança um grande número de desabrigados e prejuízos. Atualmente, em frente do atual Clube Fraternidade, existe um pequeno marco que simboliza o alcance que água atingiu. As enchentes ensinaram a resiliência para comunidade: seguir em frente e reconstruir suas vidas. Os residentes do bairro aprenderam uma prática que move ações, constrói amizades e que segue construindo a história do Passo: Um bairro feito da troca de gratidão.

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Uma troca de gratidão

Foto: Emanuelle Righi

. 13 . Renato Costa, no seu bolicho no Bairro do Passo

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Em 1992, Renato Costa juntou suas economias e decidiu mudar-se do Bairro Boa Vista para o Bairro Passo, levou junto sua família e sua principal fonte de renda: seu bolicho, estabelecimento comercial típico do interior gaúcho, um armazém que vende diversos produtos, de alimentação até itens de bazar. Na verdade, os ditados populares dizem que você nunca sabe o que pode encontrar num bolicho. Renato visitou o Passo pela primeira vez ainda criança e relembra como tudo era no início: “Ele começou na Francisco Miranda emendando com a Júlio Tróis, eu era guri pequeno morava no interior, eu vinha com meus avós. Só tinha asfalto que desse no porto, e era um pouquinho de cada lado. Em 1983, que começou a nascer as vilas, como Porto Angico, depois nasceu a Ernesto Dorneles, a Arneldo Matter, veio a Vila Nova de tábua, desmancharam depois e construíram de material. Surgiu a Mario Roque Weiss, o bairro do Cemitério. O Passo foi crescendo muito”. Anos depois, ao retornar, agora como morador, lembra que ao chegar à localidade

era possível notar a precariedade da infraestrutura do bairro. Não existia calçamento ou algum tipo de pavimentação e para andar pela vila era preciso sujar os pés no bairro vermelho das ruas. Chegar ao centro da cidade era um exercício de paciência: só existia um ônibus a cada duas horas e se por acaso se perdesse o transporte público, melhor desmarcar o compromisso, porque ônibus novamente, só após de 3 horas de espera. O que mais marcou Renato junto à história do bairro foi sua trajetória como líder comunitário. Ele assumiu a liderança da Vila Promorar 2 no ano de 1997, período no qual a comunidade era conhecida pelos crimes violentos que haviam ocorrido no local. Seu objetivo era assumir o cargo e reunir a comunidade em busca de recursos para reconstruir a imagem da Vila. E o mais importante: dar nomes para as ruas. Em 2000, as ruas foram nomeadas e numeradas e uma sede para organização e realização de trabalhos comunitários foi construída. Renato reitera o quanto o Passo é um bom bairro para morar. Um dos fatores, segundo ele, é a razão econômica. A localidade é conhecida por ter os valores imobiliários mais baratos da cidade. Para Renato, ainda, a fama do bairro como um lugar violento é uma forma de preconceito por ser tratar de uma vila. Ele argumenta que os crimes estão presentes em todo o lugar, ele mesmo teve receio de ir morar no local, mas ao chegar descobriu o quanto o bairro podia ser acolhedor e seguro. Hoje não consegue pensar em outro lugar que possa lhe acolher tão bem. Foi com suas ações em prol da comunidade que ele encontrou uma forma de agradecer a recepção que recebeu há mais de 20 anos. Realizou trabalhos com as crianças, promovia festas e ações so-


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ciais. A ajuda vinha da própria população los campos e o som do sino que badalava que se dispunha a colaborar, promover e quando ele chegava. Foi por este local integrar a comunidade. Para arrecadação de fundos, a imprensa São-Borjense colaborava na divulgação das ações comunitárias, construindo, assim, uma troca entre gratidão e construção de credibilidade. Renato é otimista quando o assunto é o futuro do Passo. Suas perspectivas preveem um desenvolvimento ainda maior, como o ocorrido com a instalação da Universidade Federal do Pampa há 10 José Ernesto Lima ao fundo do açougue anos no local. que passavam o linho – produzido em “Vai vir mais gente para cá, essa gente São Borja – e que era distribuído para que vai vir vai adquirir alguma coisa aqui toda a fronteira,onde histórias de vida foram construídas sobre os trilhos do trem. na vila, são pessoas que vem para o Nascido no bairro, o açougueiro bem. Eles vem para aprender, estudar, trabalhar. A tendência é crescer o bairro. José Ernesto Almeida Lima relembra que Se não fosse a Unipampa hoje não tería- durante sua infância, na década de 1950, mos calçamentos aqui, o asfalto da Be- as rodas sobre os trilhos do trem faziam nevenuto (avenida onde está localizada parte do cotidiano das famílias. “Eu me lembro que tinham passagens dos trens a universidade)”. por dentro da nossa propriedade. Eu me O desenvolvimento tem auxiliado o criei vendo vários tipos de vagões de Bairro Passo a se manter como um local carga de linhaça, isso em 1958 mais ou de colaboração entre a população, grati- menos. Eles desembarcavam e batiam o dão e esperança. Sua própria história é sino e tocavam um apito que saia aquetestemunha disso: de um pequeno povo- la fumaça branca”. Antes de se localizar ado formou-se o maior bairro da cidade. no bairro José Pereira Alvarez o trem se Seus moradores, assim como Renato, encontrava no bairro Pirahy. Somente no acreditam que é preciso seguir em frente, ano de 1932 a Estação Férrea começou a alimentando o espírito comunitário que funcionar no local onde se encontra hoje. O bairro já tem histórias desde 1865 guia há décadas a população. quando São Borja foi palco da Guerra dos Bairro José Pereira Alvarez: uma Paraguaios, um conflito marcante sobre história sobre os trilhos do trem essas terras. Naquela época, Dom Pedro II veio de Portugal e, navegando pelas Os bairros são marcados por sua águas do Rio Uruguai, desembarcou em história e cultura, e o José Pereira Alva- solo fronteiriço para ver as consequências rez não é diferente. A principal lembrança que a guerra havia deixado. “Dom Pedro dos seus moradores mais antigos é baru- II veio de Uruguaiana depois da rendição lho dos vagões do trem que ecoavam pe- do exército do Paraguai. Veio de navio e Julho/2017

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Foto: Arquivo histórico

da época e reacende a imaginação. Maria do Carmo Fagundes, natural de Bagé, foi uma mulher à frente da sua geração. Segundo relatos históricos da época, foi assassinada em 27 de agosto de 1890. O crime foi cometido por um dos seus amantes, um cabo do exército de origem nordestina que estava de passagem pela cidade. Maria foi esquartejada e seus restos mortais foram encontrados por populares que a sepultaram no local onde hoje se encontra seu túmulo. Maria do Carmo era conhecida, também, por sua bondade e generosidade. Após sua trágica morte, os populares iniciaram rezas por sua memória. Não demorou muito para que histórias sobre possíveis milagres realizados por ela se espalhassem pela cidade. Em seu túmulo encontram-se muitos agradecimentos e pedidos oriundos de diversos locais, feitos, inclusive, em outros idiomas como o espanhol. Até hoje, existem diferentes versões sobre quem teria sido Maria do Carmo. Fato é que não existe constatação concreta sobre ela ter sido uma prostituta, como muitos moradores da região ainda comentam. Analisando a história e os registros daquela época se reconhece que Maria do Carmo causava espanto por sua postura diferenciada das demais mulheres dentro de uma sociedade conservadora. Mantinha mais de um relacionamento, morava sem familiares na cidade e partiu sem deixar descendentes. Seu túmulo teria sido obra do ex-prefeito Serafim Dorneles Vargas. Antes à sua construção, a veneração à santa popular ocorria diante de pedras e uma cruz que demarcavam o local. O bairro levou seu nome por sua história como figura marcante e por seu túmulo estar localizado nas proximidades.

. 15 . Chegada dos primeiros passageiros de trem

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passou por Itaqui e São Borja verificando a destruição que os paraguaios haviam promovido aqui. Então ele teve que vir a cavalo para bairro José Pereira Alvarez pois não conseguia vir de carruagem porque ela atolava. Era um bairro muito desabitado, justamente pela característica do seu terreno desregulado e alagadiço, mas em extensão talvez seja o maior da cidade” conta o jornalista Newton Falcão, do jornal “O Regional”. José Pereira de Alvarez, conhecido popularmente como Várzea, que foi, aliás, seu até o ano de 2009, é um bairro caracterizado como intermediário. Ao norte faz limite com o bairro do Passo, ao sul os bairros Maria do Carmo e Centro. Conhecido por seus alagamentos, hoje em dia sua população é de mil habitantes. O nome foi dado em homenagem a uma figura marcante para o povo são-borjense. José Pereira Alvarez foi um importante político da cidade, o primeiro interventor de São Borja nomeado pelo governo em 1964. Ele permaneceu por mais de 30 anos no cargo, sendo o político que mais tempo ocupou essa posição no município. Lugar de diversas histórias, o trem não trouxe apenas cargas, mas uma bagagem de cultura para a população que ali viveu e presenciou todos esses avanços que a ferrovia trouxe. Hoje em dia, o prédio da antiga Estação Férrea é o futuro Arquivo Histórico da cidade. A construção, ainda preservada, conta com algumas peças


Foto: Biblioteca municípal

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Túmulo da Maria do Carmo e os primeiros relatos sobre seus milagres

Pertencia antes a um bairro conhecido como Vila Saravá, conforme o Jornalista Newton Dorneles, do Jornal O Regional, constatou em suas pesquisas. Era um local de rituais, religiosidade e folclore. O bairro tem importância como elemento para a construção histórica da cidade, como conta o Prof. Muriel Pinto, da Universidade Federal do Pampa: “O bairro Maria do Carmo representa a cultura material e imaterial da cidade, desde as Missões, também é espaço profano, representa a questão da Santa Maria do Carmo, exaltada na cidade. É onde está a sede, a fonte missioneira São João Batista, uma fonte de água natural da época das Missões”. O bairro Maria do Carmo possui outros atrativos importantes para a cidade. Nele, encontra-se o ateliê do famoso artista plástico Rossini Rodrigues, que retrata nas suas esculturas o cotidiano missioneiro de São Borja. No interior do bairro está presente, também, a residência do poeta Apparício Silva Rillo, importante figura literária. Na sua casa existe um vasto acervo da Arte Barroca. A sede do Os Angüeras, grupo artístico e cultural e o Museu Ergológico, único museu dessa natureza do país. Foi no bairro, ainda, que o botânico Aimé Bonpland, médico, explorador, filantropo, educador, político, comerciante e industrial francês,construiu Julho/2017

seu horto florestal. A localidade representa uma rede cultural entre as diversas culturas existentes no município. Além da popularidade pelos fatos importantes da época das reduções, como o forno jesuítico ainda existente, responsável pela fabricação dos tijolos utilizados na obra da Igreja Matriz. É um local de manifestações religiosas, musicalidade e arte. Para Muriel que, além de pesquisador, estudou na Escola Apparício Silva Rillo durante a infância e é atualmente morador do bairro, o local foi importante na sua trajetória de vida, sendo que as experiências nele vivenciadas influenciaram, inclusive, seu caminho como pesquisador. “Ele tem uma representação cultural e social de grande representatividade para minha pessoa, tem uma grande importância na minha formação educacional e cultural. Em virtude a essa relação com a Maria do Carmo, sou devoto também, constantemente estou lá no tumulo, enfim, a gente está sempre limpando, plantando uma árvore e levando flores. É muito importante porque envolve uma questão de espiritualidade. Essa região é marcada pela espiritualidade, pelas crenças, não só pelos mitos, lendas e pela certificação, mas com o contato com o exterior”. Existe um grande apreço em relação às artes pelas pessoas que habitam a região. Residir no bairro é uma forma de despertar o gosto pela história, pesquisa e patrimônio da cidade. Clóvis Benevenuto, que cresceu em meio a essa realidade, é morador do bairro desde seu nascimento e conhece diversas histórias, crenças e mitos do local. Dentre essas histórias, relatos sobre as fontes missioneiras, a participação nas procissões e os relatos dos milagres que teriam sido realizados pela Santa Profana, como é

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Foto:Emanuelle Righi

Primeiro rei momo e rainha do carnaval de São Borja na avenida Presidente Vargas

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Esses fatores instigaram em Clóvis o gosto pela pesquisa histórica. Atualmente, ele trabalha como responsável pelo Arquivo Histórico do Munícipio. Independente se morador ou visitante, sempre que se fala em bairro Maria do Carmo diversas histórias envolvendo cultura, arte, mitologia e fé veem à tona. Essa é, talvez, uma das maiores riquezas do local: a pluralidade de dimensões Avenida Presidente Vargas Atualmente envolvidas para contar a história de uma gem a São Francisco de Borja, que era o região da cidade. terceiro general da ordem Jesuíta. Junto à Praça XV de Novembro encontraCentro: do comércio à história -se, até hoje, a sede da redução fundada O centro de uma cidade é, geral- pelos jesuítas. A igreja matriz da cidade mente, onde toda uma civilização come- nunca mudou de local e é marco histórico ça. É o lugar em que o comércio se de- fundamental da cidade. Para Clemar Dias, escritor do jorsenvolve, a história se inicia, local onde os principais acontecimentos de um mu- nal “Folha de São Borja” e que reside no nicípio são marcados para sempre. Em bairro há pelo menos 30 anos, o carnaSão Borja não é diferente. Rica de histó- val de rua, evento que por muitos anos rias e acontecimentos, a cidade nutre por foi realizado pelas ruas centrais da cidaseu bairro central uma dinâmica de acon- de é fato que marca histórias importantes tecimentos históricos importantes, a força sobre São Borja. Ele relembra do desfile do comércio e a circulação de moradores dos primeiros Rei Momo e Rainha da cie turistas. No meio disso está a Praça dade, que foi festejado, inclusive, no local XV de Novembro, palco de acolhida, por onde hoje é sua residência. Nesse local exemplo, dos primeiros Jesuítas, há mais também ocorreu o primeiro baile de carde 300 anos, e a Igreja São Francisco de naval, com a presença do bloco “Comigo ninguém Pode”, mais ou menos no ano Borja. Como primeira cidade a receber as de 1950. Clemar narra em detalhes como reduções dos padres espanhóis jesuítas, SãoBorja recebeu esse nome em homena sua sogra e sua irmã que ajudou a criar a sua esposa que eram doceiras e sempre Foto:Clemar Dias muito ativas, resolveram oferecer um baile de carnaval na cidade. Relata ele que as duas mandaram um telegrama, que seria o e-mail da época, contratando uma banda de músicos de São Gabriel para virem tocar em São Borja. Ao aceitarem o contato, os músicos avisaram que chegariam de trem à cidade. As duas foram, então, ao encontro da banda em uma carroça enfeitada, como conta Clemar:


“As dez da manhã chegou o trem, então

elas se embonecaram o que puderam e se foram para em direção a ferrovia. Quando saíram aqui toda a sociedade são-borjense foi ver o que estava acontecendo, imagina naquela época, estamos falando de oitenta anos atrás. Chegando lá os músicos subiram na carruagem e vieram para em direção ao centro da cidade. Quando começaram a chegar, a Jorgina que era uma delas mandou os músicos abrirem os instrumentos e tocar. Abriram uma marchinha de carnaval, e se vieram a “passo de ganso” aqueles cavalos, e o povo saindo para fora para saber o que aconteceu, o que era toda aquela barulheira”.

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Foto: Clemar dias

Sogra de Clemar Dias com os musicos

Eventos vinculados à política também são fortes na memória dos moradores do bairro. Em 1976, por exemplo, falecia o ex-presidente João Goulart. Natural de São São Francisco de Borja foi cenário histórico para o município, velando o corpo de Jango – como era conhecido. Cerca de 10 mil militares cercavam a igreja onde milhares de pessoas já esperavam no local o caixão. Pessoas do todo país estiveram presentes para homenagear o político. Jornalistas e a imprensa – nacional e internacional – cobriram a cerimônia. Entre tantos jornalistas presentes Julho/2017

estava Newton Falcão, morador de São Borja, atualmente jornalista do jornal “O Regional”, mas que na época trabalhava para o “Correio do Povo”, de Porto Alegre. Ele recorda da cobertura jornalística do velório: “foi uma das primeiras grandes coberturas jornalísticas que eu fiz. A morte do presidente João Goulart, o velório todo foi na igreja matriz, então juntaram-se pessoas do Brasil inteiro. Naquela época eu trabalhava no Correio do Povo e a gente distribuiu material para o mundo inteiro”. Atualmente, o bairro Centro é o local onde se localiza a maior parte do comércio, uma das principais atividades da economia da cidade. A Praça XV de Novembro, no coração do centro, é onde se encontra comerciantes ambulantes que ali ganham o seu sustento. É nela, também, que está sepultado Getúlio Vargas, outro ex-presidente brasileiro natural de São Borja. Logo à frente da praça, encontra-se a igreja matriz com sua arquitetura modernista, e, ao seu lado, a sede da Prefeitura Municipal. História, cultura, política, conflitos do moderno e o tradicional: estas são expressões ajudam a definir as características desse bairro onde a história está viva em cada canto, em cada olhar de quem passa entre suas principais avenidas, seja na correria do dia a dia, ou na visão atenta do turista.

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Foto: Emanuelle Righi


TEMPLO ALÉM DO TEMPO Produção: Danielly Engelmann, Matheus Bernardes, Nadine Marino e Tamires Hanke Foto: Matheus Bernardes

A Paróquia São Francisco de Borja é um lugar de comunhão onde passado e presente se encontram e juntos constituem a identidade de São Borja O sino avisa que a hora se aproxima. Trinta minutos para que os fiéis se dirijam à igreja e garantam seus lugares cativos. Ainda há tempo para pequenas cordialidades, antes do sinal da cruz, que marca o recolhimento exigido pela ocasião. Mais badaladas pontuais. Os moradores dos arredores sabem que são, exatamente, 19 horas. A missa começa na Paróquia São Francisco de Borja. Originária da Missão Jesuítica, criada em 1682 como uma extensão da redução vizinha de Santo Tomé – Argentina, ano no qual o padre jesuíta Francisco Garcia Prada fundou o primeiro dos Sete

Povos das Missões, a paróquia serviu como início do processo evangelizador das missões no Estado do Rio Grande do Sul. O nome São Francisco de Borja foi dado em homenagem ao arquiteto renascentista espanhol Francisco de Borja e Aragão. Na época, o nome que foi denominado em virtude da Companhia de Jesus, organização jesuíta que esperava que esse local possuísse potencial artístico e cultural. Em 1707 a redução junto ao Padre José Brasanelli já contava com 2814 habitantes, constituiu-se assim, a cidade de São Borja. Localizada ao lado da sede do go-

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Sede atual da Paróquia São Francisco de Borja.


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verno municipal e em frente à Praça XV de Novembro, sua instalação seguiu princípios arquitetônicos adotados como referência na época. “A estrutura urbana das antigas reduções jesuítico-guarani eram espelhadas em estruturas urbanas da Grécia antiga onde tinham uma importância central no espaço alguns elementos como a praça central, por exemplo, as apresentações artísticas e religiosas. A igreja também estava num local que tinha uma relação muito forte com o imaginário da época, onde quanto maior a centralidade, mais próximo de Deus” explica Muriel Pinto, professor e pesquisador da Universidade Federal do Pampa – campus São Borja. Presente por mais de três séculos na vida da comunidade são-borjense, a paróquia passou por diversas transformações sem deixar de influenciar na formação e formação religiosa da cidade. A estrutura arquitetônica teve distintas mudanças. Sua primeira versão reducional foi construída com a chegada de Giuseppe Bressanelli na antiga redução de São Francisco de Borja, entre 1696 e 1705. Durante a terceira década do século XIX, com o aumento do movimento da cidade e o agrupamento de lideranças políticas, fez-se necessária uma mudança na estrutura do prédio, que durou até a sexta década do século XIX. A terceira versão da igreja foi construída no século XX a partir de um novo movimento na cidade para fortalecer a igreja. É então, após 1960 que se tem início a construção da matriz atual, como relata o historiador Rodrigo Mauer. Inaugurado em oito de fevereiro de 1962, o prédio da nova paróquia foi construído em sua totalidade com traços inspirados no estilo do arquiteto brasileiro Julho/2017

Oscar Niemayer. O projeto assinado pelos arquitetos Francisco Forte Filho, Hélio Mendes de Amorim e José Maria Oliveira Villela faz referência a três ocas indígenas. “Essa é uma igreja com uma arquitetura modernista que acabou seguindo o caminho da construção da prefeitura. Na época, João Goulart era presidente do Brasil e trouxe muito da influência modernista, principalmente do Rio de Janeiro para São Borja” assegura Muriel Pinto. Mesmo com mudanças em sua estrutura física, o templo católico nunca deixou de ser referência para sua comunidade. Conhecido por características próprias, o local é um memorial não somente sobre a história de São Borja, mas também sobre a época de sua fundação. O rico acervo de imagens sacras presentes em seu interior caracteriza a importância como patrimônio histórico jesuítico e cultural.

Espaço de fé Logo que se passa pela porta central da matriz a luz dos vitrais preenche todo o salão. No altar, as imagens da Imaculada Conceição e de São Francisco de Borja com o braço estendido amparam e recebem cordialmente todos que visitam o local. As obras de José Abrasaneli tem lugar de destaque no templo, reforçando o sentimento de fé. A religiosidade e a história se misturam, conforme conta o atual pároco: “A pia batismal é ainda do templo jesuítico, ela está inteira talhada em pedra única. A imagem do São Francisco de Borja do fundo da igreja foi devolvida por João Goulart e tem uma história bem interessante. Ela foi levada como trunfo de guerra na guerra do Paraguai, e quando Stroessner, (Alfredo Stroessner, foi o

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Foto: Matheus Bernardes

Imaculada Conceição.

Foto: Matheus Bernardes

São Francisco de Borja.

as melhores estavam aqui por acusa do padre Brasanelli que era arquiteto e escultor” relembra o escultor são-borjense Rossini Rodrigues. Com um resgate cultural a paróquia expõe, desde o dia primeiro de março de 2017, uma parte do conjunto de imagens sacras que integrava o antigo templo demolido em 1959. São José, Santa Rita de Cássia, Santa Tereza de Jesus, Santo Expedito, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e São Francisco de Borja ocupam o pavimento superior da matriz, integrado ao estilo arquitetônica do prédio. Depois de um minucioso processo de restauro, comandado pela artista plástica Maria Thereza Salazar Rubim com o auxílio de Rossini Rodrigues, as imagens voltaram a integrar a vida de comunidade. “A Thereza entrou com o restauro e eu com a reconstrução” assegura Rossini. Para a restauradora, “ter a oportunidade de restaurar essas imagens, para mim, é poder valorizar um trabalho de arte que já foi feito há anos atrás. É um resgate para que as pessoas possam ter a oportunidade de ter acesso a esses ícones de fé que devem ser preservados” conta Maria Thereza.

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48º presidente do Paraguai, governou de 1954 a 1989) era presidente e Jango era presidente do Brasil, Stroessner fez a devolução da imagem, e o Jango, um bom tempo depois, manifestou que gostaria de entregar para a paróquia de novo. Em 2010 então, Maria Tereza, que é a esposa de Jango, fez a devolução da imagem para a paróquia” relata o Pároco Pe. Aodomar Wandcher. As esculturas dos Sete Povos das Missões são a representação de um dos legados mais substanciais e valiosos do passado do Estado do Rio Grande do Sul. A produção artística da época surgiu com o propósito de fornecer um auxílio visual à catequese dos índios. Orientada por modelos estéticos europeus, as imagens tiveram predomínio de formas barrocas, onde se incutiu o gosto pelas formas nativas que revelam o perfil dos habitantes da época. “São Borja era um dos polos de produção de imagem sacras. Aqui tinham grandes artificis (profissional que desenvolve trabalhos relacionados ao artesanato) que faziam essas esculturas e mandavam para as outras reduções. As outras (reduções) também faziam mas


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Integração com a comunidade Passado e presente unidos, materializados em cada prece, acontecimentos e encontros pautados pela memória que se mantém viva na paróquia. Templo católico, e também memorial sobre a história de São Borja, a Paróquia São Francisco de Borja é um local destinado à comunidade e recebe frequentadores independentes da religião. “Fora a oração, ela se tornou símbolo histórico da cidade e um centro de convergência de todos os grupos, mesmo aqueles que não compartilham da mesma fé que a gente compartilha, me parece que é um espaço social que as pessoas vêm, frequentam, participam e se sentem bem aqui” enfatiza o Pároco Pe. Aodomar Wandcher. A matriz desenvolve diversos projetos e ações ligadas à integração da comunidade. O incentivo e realização de movimentos sociais, como as Pastorais da Juventude, da Criança, da Saúde, o

Fieis acompanhando a missa na Paróquia.

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Movimento de Cursilhos da Cristandade e a Renovação Carismática Católica auxiliam no processo de tornar a paróquia um lugar de bem-estar para todos e que acima de tudo, incentiva a integração sem distinção. “Seja por doença, para trazer seus filhos e familiares para conversar. As pessoas procuram criar uma ligação aqui com a Paróquia São Francisco de Borja. E assim, essas pessoas passam a participar da vida da igreja do mesmo jeito que a igreja participa da vida delas, um ajudando ao outro” afirma a sacristã Nica Druzian. Futuro, devoção, gratidão, conjugação de fé, amor e esperança. A Paróquia São Francisco de Borja é um espaço de comunhão e, também, um importante marco histórico do passado que se faz presente no dia a dia de São Borja. Memória que perdura há três séculos na cidade. Foto: Matheus Bernardes

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Entrevista em Profundidade

Raízes missioneiras: a contribuição de Apparício Silva Rillo nas diversas expressões culturais Importante poeta gaúcho e pessoa influente na cidade, Apparício Silva Rillo foi um escritor de renome, promoveu e criou diversas atividades culturais em São Borja Barbara Moraes, Camila Iann, Katielli Saraiva e Mayara Rodrigues

As culturas locais e regionais possuem marcos históricos e seus influenciadores mais marcantes carregam consigo grande expressão cultural. Apparício Silva Rillo (1931 1995), poeta gaúcho, nasceu e viveu em Porto Alegre até sua vida adulta, quando se mudou para o interior do estado em busca de oportunidade de emprego, construindo sua história em São Borja. Imagem da Internet

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Poeta brasileiro foi um dos grandes influenciadores da arte em São Borja

Ao longo de três décadas, suas obras refletiram o apreço pelo resgate da tradição nativa e missioneira na região. Rillo é considerado, hoje, uma das figuras mais importantes para a cultura gaúcha e, com isso, é visto como um dos grandes influenciadores para diversos artistas, principalmente, os são-borjenses. O neto do poeta, Apparício Silva Rillo Neto, além de Rossini Rodrigues e Mano Lima, são alguns dos artistas que têm as suas origens ligadas à Rillo, como uma figura de inspiração e incentivo a vida artistica. No decorrer da reportagem, esses

importantes personagens da cultura nativista e missioneira contam suas ligações à Rillo, em meio a uma prosa, e detalham frases e incentivos que recebiam do poeta. Hoje, os três artistas são-borjenses contribuem para a cultura local e gaúcha carregando consigo a figura do amigo como uma inspiração para compor versos, canções e esculturas voltadas ao velho e conhecido Rio Uruguai.

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Mayara Rodrigues

-ão das missões. Rillo já dizia que “o poeta é o repórter do seu tempo” e a composição de músicas, poesias e poemas autorais mostram a identidade cultural que sofre mutações, mas que permanece a mesma em sua es

“O poeta é o repórter do seu tempo”

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“Apparicinho” relembra as histórias de seu avô

Apparício Neto foi o que menos teve contato com Rillo em sua vida artística, porém nunca esqueceu suas origens. Apesar de não saber detalhar de onde vem sua inspiração, passou a fazer parte do grupo Confraria Ventania, onde a gana por compor canções voltadas ao Uruguai aflorou em sua vida mesmo sem estudar a música. “Eu nunca estudei música e consigo compor, então é algo intuitivo, de troca de informações com os amigos. Natural, intuitivo, harmonioso. Quando tu estás bem, em um ambiente bom, as coisas acontecem”, reflete o músico ao lembrar da influência do ilustre poeta gaúcho. Tendo vivenciado alguns momentos com o avô, conta histórias sobre o Festival da Barranca e o festival de Músicas de Carnaval e vê São Borja como uma cidade que fomenta o cenário cultural. Para ele, esses festivais atraem vários artistas que, tocando seus instrumentos, buscam desafios para a composição das suas músicas e poesias. Neto ainda idealiza a cultura e a arte como uma questão social que traz afeto, futuro, educação, conhecimento e emoção à população. Apparício Neto se assemelha ao seu avô na busca por artistas com características fortes e autenticidade, que marcam a trajetória cultural na regi Julho/2017

sência. O grupo Os Angueras – cuja mitologia missioneira considera e compreende como aquele que é o patrono da música gaúcha – é uma das heranças deixadas por Rillo. O grupo serviu de inspiração para a formação do grupo Confraria Ventania, no qual Neto faz parte. A Confraria reproduz músicas compostas por Rillo e conta com composições próprias, trazendo uma diversidade de ritmos e dando uma visão mais atual às canções criadas em solo missioneiro. Em um universo onde os artistas tornam-se reconhecidos, na maioria das vezes, pela reprodução de outros compositores, a Confraria Ventania segue os passos d’Os Angueras e se difere dos demais, trazendo autenticidade e características da terra são-borjense e da região. O grupo composto por jovens artistas vem acumulando admiradores e ganhando novas experiências ao longo dos anos. Refletindo através da música as suas vivências e os seus olhares sob o mundo, Neto idealiza uma arte que nasce em terra gaúcha e se difere das grandes reproduções de conteúdos.

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lavadeiras, chibeiras, gaúchos e vários personagens típicos da região missioneira. Para ele, no mundo globalizado as pessoas acabam esquecendo das figuras e os artistas, como o próprio poeta Apparicio Silva Rillo. A partir desse olhar crítico sobre a apropriação da cultura, o escultor procura manter o legado das origens do seu povo. Rossini ressalta, ainda, que a influência de Rillo sempre esteve presente nas suas obras, contando que foi ele quem o direcionou aos caminhos da arte, de modo a incentivar a produção de obras voltadas às figuras locais, não permitindo esquecer sua essência missioneira.

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“A gente vive esse tempo, esse século, é isso que a gente faz e por isso que a gente se difere dos outros, a gente compõe. A gente busca falar o que enxerga e sente, essa é a nossa diferença. Eles (os artistas que não possuem músicas autorais) estão sendo somente reprodutores da arte, nós podemos ser mais, podemos ser transformadores dela.” Importante poeta gaúcho e pessoa reconhecida pelos trabalhos realizados na cidade, Apparício Silva Rillo foi um escritor de renome, promoveu e criou diversas atividades culturais em São Borja. Sempre amistoso, criou laços de amizade no pequeno município da fronteira oeste. Amizade que hoje ainda é lembrada pelo amigo escultor, que começou a se direcionar aos caminhos da arte por influência de Rillo, que o incentivou a dedicar seu amor por esculpir e em montar suas obras nas figuras que ele mais admirava. Essa é a história do escultor Rossini Rodrigues. Nascido em São Borja em 1966, seu gosto por esculpir surgiu ainda quando criança. Rodrigues relembra que teve uma infância muito pobre, sua mãe trabalhava de lavadeira às margens do Rio Uruguai, e, como ela não possuía condições financeiras de comprar brinquedos, o então menino Rossini, de maneira autodidata, começara a modelar o barro e madeiras, criando seus próprios indiozinhos, que na época eram famosos brinquedos entre as crianças. O escultor cresceu e com ele as responsabilidades também. Muito apegado a suas raízes, Rossini Rodrigues sempre fez seu trabalho vinculado ao cotidiano. Busca, através da arte, enfatizar em traços marcantes as figuras locais como as

Mãos que modelam a arte: Rossini em seu ateliê

Rossini já levou suas obras a diversas exposições no Brasil e no exterior. O trabalho O bolicho ficou entre os dez melhores em uma amostra Latino Americana realizada pela UNESCO. Para o escultor, servir como referência para os amantes da arte é uma grande honra, ainda mais por considerar que seu trabalho é um ato de amor às artes e à cultura: “fazendo o que gosta a gente não trabalha, a gente se diverte”, conta sorrindo. Apesar de receber diversos convites para amostras em vários lu gares, na memória de Rossini há um espaço

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“Fazendo o que gosta a gente não trabalha, a gente se diverte” especial reservado para sua primeira exposição. O escultor relembra que se deslocou a Porto Alegre para fazer uma oficina e lá foi convidado para a exposição na antiga galeria Marisa Soibelmann. Nessa galeria estavam presentes, nada menos que os 33 melhores artistas do Rio Grande do Sul. Rossini afirma que essa exposição foi divisora de águas em sua carreira, pois até o momento, acreditava que era apenas um aprendiz; essa experiência e o reconhecimento adquirido por ela foram marcantes para o artista, que passou a se enxergar, finalmente, como um escultor. Além de Rossini Rodrigues, Apparicio Silva Rillo influenciou vários artistas da região, e, de uma forma ou de outra, abriu caminhos para que eles pudessem descobrir o talento que talvez nem eles mesmos soubessem que tinham. É assim que o cantor e compositor Mano Lima relembra do amigo poeta, figura que o influenciou e encorajou dentro da arte missioneira. Mário Rubens Battanoli de Lima, ou somente Mano Lima, relembra da sua entrada na música e de como Rillo foi importante para que ela se concretizasse. Conta que, ainda meio contrariado, o convite de Rillo para participar do grupo Os Angueras. Mano brinca que foi praticamente forçado a entrar na carreira e exclama que “contra a força não há resistência”. Seu primeiro disco foi gravado somente depois de dez anos de experiência, ainda sem o Julho/2017

músico acreditar no seu potencial . Os primeiros discos foram distribuídos, e o músico conta que ficou apavorado: o que iria fazer com aquela pilha de discos? Diante de todo aquele material, decidiu distribuir suas canções à quem passasse na rua e, quando suas músicas viraram sucesso, não tinha mais discos para vender. “Quando o disco estourou eu não tinha mais para vender, tinha dado tudo. Foi aí que eu comecei a prestar atenção no Rillo, e por isso que eu acho que ele não era apenas um compositor, um grande compositor, ele era um cara iluminado, ele sabia”, relembra saudoso as proezas do amigo.

Camila Iann

O olhar saudoso de Mano ao lembrar de Rillo

Reconhecido ícone do tradicionalismo gaúcho, Mano Lima ainda se considera como um aprendiz da profissão que ocupa, entendendo a complexidade em trabalhar com elementos dacultura. Ele recorda que a vida o veio preparando para tornar-se cantor: “eu não tropeava porque eu era um tropeiro e nem campereava porque era um campeiro, eu fazia tudo isso para ser o cantor que eu sou hoje e para trazer esse diferencial”. Destaca, ainda, que na infância era uma criança tímisa,

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“O campo é a hemoglobina do homem campeiro” de todos aqueles que de alguma maneira acompanham seu trabalho se torna essencial para a continuidade da carreira artística. O cantor conta que não conseguiria viver sem a música e longe dos palcos. Para ele, sem a arte a vida teria sabor amargo. Na relação com seus públicos – formados por pessoas de diversas idades – o cantor compreende a importância da partilha de sentimentos vinculados à cultura nativista. São esses movimentos que, segundo ele, fortalecem a união com a comunidade e motivam a difusão da cultura. O cantor destaca, ainda, que possui duas terras, duas mães geográficas: Mário Rubens é itaquiense; mas Mano Lima – o artista – nasceu em São Borja, local que considera como sendo o berço da música nativista e que o acolheu e ensinou a ser músico.

Os três artistas são-borjenses entrevistados possuem mais que o amor pela cultura missioneira e nativista em comum: para eles, Apparício Silva Rillo foi um importante apoiador e amigo. O legado de Rillo para o fomento da cultura é inegável; sua postura aberta possibilitou, ao longo de anos, a visualização de novos horizontes e perspectivas para a cultura local, expandindo suas produções. Os frutos desse trabalho persistente são colhidos agora, a partir das experiências na música, na poesia e nas artes e de tudo o que elas oferecem aos amantes do mundo artístico e cultural.

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mas que alimentava uma afinidade com os animais e com a natureza. Nesse entrelaçamento de vivências, o cantor salienta que a cidade sem o campo perde o sentido e, na sua visão, uma coisa completa a outra. Para ele, o campo é o lugar onde o homem encontra a natureza e nessa interação a sua terapia particular, que torna o homem, por mais rústico que seja, mais humano. “O campo é a hemoglobina do homem campeiro, nem sei que palavra é essa, mas sei que é algo muito importante”. Nascido em Itaqui, Rio Grande do Sul, entretanto, com forte vinculação à cidade de São Borja, Mano diz ter uma afinidade grande com a Terra dos ex-Presidentes. Desde muito novo carrega um sentimento especial, uma intimidade e uma identificação maior com a cidade do que por qualquer outro lugar. Estar marcado pelos apelidos de Lobisomem do Arvoredo e Filósofo dos Pampas, por exemplo, simboliza o carinho e admiração que o público tem com o seu trabalho. O reconhecimento por parte dos fãs e de todos aqueles


As várias faces de Vargas

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Vida e história do são-borjense que mudaria pra sempre a história do Brasil O Brasil conta hoje com um sistema de leis que regem e defendem o trabalhador. A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) é um direito fundamental da classe trabalhadora. No país, cerca de 120 milhões pessoas trabalham com carteira assinada, correspondendo a quase 60% da população. Consideradas como importantes na atualidade, as leis trabalhistas não vigoravam no país antes da presença política de um personagem são-borjense, e que até hoje divide opiniões entre pessoas do país e do mundo: Getúlio Vargas. Ditador para uns, herói para outros, Getúlio Dornelles Vargas nasceu em 19 de abril de 1882 em São Borja, Rio Grande do Sul, na fronteira com a Argentina. Região conhecida como primeiro dos Sete Povos das Missões Jesuítas, São Borja também viria a ser conhecida como “Terra dos Presidentes”. Vargas pertencia a uma família de estanceiros que gozava de muito prestigio social e político. Filho de Cândida Dornelles Vargas e Manuel do Nascimento Vargas, seu pai foi considerado herói por sua participação na Guerra do Paraguai, entre 1864-1870, e a Guerra dos Farrapos, entre 1835-1845. Além de Getúlio, a família tinha mais três filhos. Getúlio veio a casar com a também estancieira Darcy Lima Sarmanho em 1911 e com ela teve cinco filhos. Getúlio Vargas foi governante do Brasil durante 15 anos ininterruptos de mandato e mais três anos e meio Julho/2017

na presidência da república, já com o uso do voto direto, marcando uma época histórica no país. Sua atuação teve forte impacto nas mudanças passadas pelo Brasil, tanto no aspecto econômico quanto social. O presidente tinha muita liberdade e poder para concretizar as transformações que pretendesse assumir.

Baralho político retratando faces de governantes, incluindo Vargas. Foto: Rudy MP Kuffner Fonte: Museu-casa Getúlio Vargas

Quando adolescente, Getúlio pretendia seguir carreira militar, porém, logo sua vida tomou novos rumos. Formou-se em direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, e atuou como advogado em São Borja na sua própria casa, a qual mais tarde viria a se tornar sede de um dos museus criados em sua homenagem. Posteriormente, Getúlio exerceu a função de promotor, em Porto Alegre. No entanto, trabalhou pouco na área do direito, pois desde muito jovem teve forte aptidão para a carreira política, mudando os planos feitos ainda em terras são-borjenses. “Getúlio em 1911 era advogado em São Borja, em uma casa que existe até hoje o que mais tarde se tornaria o museu de Getúlio Vargas. A partir dali, como ele era filho de um influente

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homem da elite rural do Rio grande do Sul, o General Vargas, que tinha sido herói na guerra do Paraguai, e que em virtude disso era o grande comandante político da região. Sendo filho dessa pessoa, Getúlio foi convidado a ser deputado estadual, pelo Borges de Medeiros”, conta Iberê Teixeira, advogado, escritor e estudioso da vida pública e política de Vargas.

VARGAS FORA DOS PALANQUES

Vida Política

Governo provisório 1930 – 1934

Durante sua trajetória de vida, Vargas sempre teve propensão à liderança no meio em que atuava. Começou sua trajetória como Deputado estadual, e, após, foi Deputado Federal, Presidente do Rio Grade Do Sul (antiga denominação para governador) e, finalmente, chegou à presidência da república, em 1930. “Da deputação estadual, ele logo foi chamado para ser chamado ministro

Getúlio assume o poder em 1930 em meio a uma crise econômica e política que, não só no Brasil, mas também, no mundo afligia a classe operária. No país, o contexto era de instabilidade político-econômica, pois Vargas daria fim a um regime de revezamento de políticos mineiros e paulistas no poder, a famosa política do

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“Getúlio era um homem correto, honesto, de fala mansa como um gaúcho. Eu estive no último Natal da vida dele, em 1953. Já era um homem cansado de tantas obrigações que caíram sobre suas costas. Teve 19 anos lá (no poder) e nunca andava se vangloriando disso. Era um homem simples. Tratava todos sempre do mesmo jeito, pobres, ricos... sempre um homem correto, não gostava de coisa fora de uma normalidade”. VIRIATO VARGAS, SOBRINHO NETO DE VARGAS.

da fazenda do presidente Washington Luís e se elegeu governador do Estado, que na época se chamava presidente do estado. A partir dali o nome dele começou a ganhar vulto, ele era um estrategista político, era um homem muito inteligente, foi escolhido pra ser candidato a presidente da república junto com João Pessoa, perdeu a eleição de 1929 e 1930, e se conformou com a derrota, mas, começaram a surgir boatos de que houve uma fraude eleitoral. E nesse período, assassinaram João Pessoa lá na Paraíba, e esse fato foi o estopim para um movimento revolucionário. Com a frente feita por Getúlio, os gaúchos Osvaldo Aranha e a elite política do Rio Grande do Sul, apoiada por outros estados, na chamada revolução de 1930, que depôs o presidente da República. Depois Getúlio se empossou como o presidente revolucionário. Então, acostumamos dizer que ele foi um ditador, mas não um ditador no sentido de perseguir a população, mas um ditador com poderes para transformar o Brasil que ele recebeu da república velha e que só podia ser transformado de uma administração forte”, argumenta Iberê Teixeira.


café com leite.’ Em 1932, Vargas cria a “Carteira de Trabalho”, o que asseguraria direitos básicos aos trabalhadores. Esses direitos vigoram até os dias de hoje. Ainda no governo provisório ele cria a primeira constituição brasileira: A constituição de 1934. Antes disso, as decisões do país só eram tomadas através de decretos. “Nós tínhamos até ali a chamada República Velha e a partir de 1930 começou a surgir o Brasil como projeto de nação que até então nós não tínhamos”, comenta Iberê.

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Governo Constitucional 1934- 1937 Após aprovação da constituição de 1934, Vargas consegue se manter no poder, porém, agora de forma legítima. Contudo, sua eleição ainda era realizada de forma indireta, sendo votado pelos membros da Assembleia Constituinte.

Estado Novo 1937- 1945 No dia 10 de novembro de 1937 Getúlio instaura no Brasil aquele que seria conhecido como primeiro governo ditatorial brasileiro: O Estado Novo. Mesmo com caráter ditatorial, foi nesta época que o governo ficou marcado pela nacionalidade e pelo populismo: foram criadas as leis trabalhistas, buscando assim então, conquistar o apoio do povo. “Os pontos positivos do governo Vargas são a consolidação das leis trabalhistas e o início da industrialização do país com a nacionalização, evitandoao máximo a importação. Além Julho/2017

Retrato de Getúlio Vargas assumindo a presidência em 1930. Foto: Rudy MP Kuffner Fonte: Museu-casa Getúlio Vargas

disso, podemos destacar a criação de vários direitos para os trabalhadores, à transformação de um país agrícola para um país industrial e nacionalista”, comenta Adair Vicente da Campo, professor de história

Governo Democrático Em 31 de janeiro de 1951, Getúlio retoma o poder, porém desta vez de forma democrática, contando com uma vitória expressiva nas urnas contra o seu opositor, Eduardo Gomes. Foi nesta época que foram criadas importantes instituições públicas no país, como a Petrobrás e a Eletrobrás. A criação destas empresas desagradou às elites brasileiras na época. Em um período de intensa atividade grevista, Vargas convoca outro são-borjense

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para fazer parte ser seu ministério do recebe a oposição de Carlos Lacerda, trabalho: O também são-borjense João no Rio de Janeiro, ligado à UDN, que Goulart, advogado e político brasileiro. por sinal era vinculada aos interesses norte americanos. Depois de algumas acusações de que seu governo contiA morte trágica nuava torturando os opositores, tam Após pressões políticas, desgas- bém perdeu apoio das forças armadas, tes com opositores e apoiadores, Var- o que levou o mesmo a cometer suicígas, já com 72 anos, toma uma decisão dio” destaca, ainda, o professor Adair drástica que mudaria a história do Bra- da Campo. sil: suicidar-se. Desde então, o dia 24 de agosto de 1954 ficou nacionalmente O outro lado de Vargas conhecido como um marco na história Medidas populistas, CLTs, criação do país. “O governo de Vargas acaba na da Petrobrás, defesa do trabalhador. Tomedida em que ele coloca uma série das são medidas tomadas e implantadas de imposições às empresas multinacio- por Vargas. Entretanto, se engana quem pensa que seu governo só teve aspectos nais, positivos ao longo da história. Há quem discorde das medidas governamentais tomadas por ele, bem como, de suas posisões pessoais. “Alguns pontos negativos do governo Vargas seria o autoritarismo com quem era contra o seu programa de governo. Também, podemos colocar que mesmo com todos os poderes que possuía, não conseguiu realizar as grandes transformações que o país necessitava como, a reforma agrária, pois na verdade ele era um grande latifundiário. Ele era apoiado pelo PSD (Partido Social Democrático) na época, os grandes ricos dos grandes proprietários, mas também pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) que era o partido dos trabaMedalhão dourado com a silhueta de Vargas. Foto: Rudy MP lhadores. Durante 15 anos ele fez muito, Kuffner Fonte: Museu-casa Getúlio Vargas mas poderia ter mudado a cara do país ,lideradas principalmente pelas empre- no sentido. sas norte-americanas, dificultando o Ele tinha muito poder e poderia funcionamento das mesmas no país. ter implementado uma redistribuição de Com uma tentativa de criação de im- terra o que acabou não fazendo. Além postos e ações para a importação de do mais, ele im pediu a realização das produtos de outros países, eleições presidenciais. Deixando assim


uma imagem – de um ponto de vista da propaganda – que sempre foi positiva, mas nos porões do seu governo, a tortura, que diz respeito aos direitos humanos, que eram evidentes” ressalta Adair Vicente da Campo.

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Participação da Segunda Guerra Mundial Em conversas com a professora história e funcionária do Museu Casa Getúlio Vargas Karine Sisti, há registros da época que indicam uma possível ligação de Vargas com dois dos mais conhecidos ditadores mundiais: Hitler e Mussolini. Este teria sido um dos motivos de seu enfraquecimento no poder, pois, ao propor alianças com estes ditadores, Vargas acaba cortando ligações com os EUA, o que resulta em perda de apoio político e industrial. Ao perceber que suas alianças com Hitler e Mussolini desagradaram os EUA, Getúlio tenta reatar ligações com os americanos ao permitir que estes construíssem uma base militar no nordeste brasileiro. Após isso, o presidente acaba tendo suas relações estremecidas, não somente com os EUA, mas também com países como a Alemanha de Hitler e a Itália de Mussolini.

como Escola Cândida Vargas, também localizada no bairro do Centro, além de diversas homenagens à família Vargas, como nome de ruas, por exemplo.. Sem contar a enorme contribuição econômica relacionada ao turismo no município. Em um documentário produzido pela TV Brasil em 2014, denominado “Getúlio – a construção do mito” é questionada a maneira como as pessoas da região agem e pensam quando o assunto é nacionalismo. O estado do Rio Grande do Sul teria um diferencial no modo de pensar esse tema, pois é a primeira fronteira viva do Brasil. Sua localização geográfica permitiria, então, a construção de um ideal sobre a afirmação da presença nacional. É um estado que vê o Brasil por uma perspectiva diferente, de fora para dentro, por isso a necessidade de provar de que lado da fronteira pertence. Por essas questões, o documentário argumenta que Getúlio, ao assumir o governo, sente a necessidade de provar o valor do Brasil ao restante do país.

A herança de Vargas em São Borja e região Além do museu Casa Getúlio Vargas a cidade conta também com o Parque General Vargas, homenagem póstuma ao pai de Getúlio. Além disso, existem o Colégio Getúlio Vargas, localizado no centro da cidade, bem

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Busto em homenagem a Vargas localizada na principal praça da cidade de São Borja.

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Foto: Gabriel Lentz Fonte: Praça XV de Novembro


O adolescente que queria seguir carreira militar logo teve seu destino mudado por suas vocações políticas. Após decidir se aventurar nesse mundo, iniciou uma jornada que iria mudar o rumo do país mais do que havia imaginado. Depois de vários conflitos, internos e externos, e de tomar decisões polêmicas e que até hoje geram discussões por todo o país, o são-borjense que se tornou líder de uma nação saiu da vida estancieira do interior do estado para entrar na história.

PELOS TRILHOS DA CULTURA Aline Bacelar Bárbara Krieger Michele Franco Sara Meireles

Quadro Centro Cultural de São Borja Créditos- Michele Franco

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Você já parou para pensar ou onhecer melhor as histórias e memórias que a sua cidade tem para lhe contar? Talvez não tenhamos muito tempon para isso, nosso dia a dia é tão corrido que não percebemos as vastas histórias que podemos encontrar ao nosso redor. Antigamente São Borja possuia uma Estação Ferreviária de Trem, construida em 1929, antes mesmo do primeiro governo de Getúlio Vargas. Essa estação férrea ligava as cidades de Jaguari, Santiago e São Borja. Após a estação férrea ser desativada, o prédio foi ocupado pela família de um funcionário da estação, que realizava as manutenções necessárias do mesmo.


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Por muito tempo o prédio ficou de responsabilidade da LL América Latina, uma empresa responsável pelas linhas de trem. Depois passou a ser patrimônio da prefeitura que, em 2015 realizou reparos na estrutura da casa. As reformas começaram com a ajuda do 2‘ Regimento de Cavalaria Mecanizada (RCEMEC) da cidade, e foram feitas reformas principalmente no teto do prédio. Houve troca de madeira e reconstrução dos painéis que sustentam a estrutura , recebendo, também, pinturas e reparos no piso. A reforma foi feita para que a prefeitura pudesse começar a usufruir do local como um patrimônio histórico. A secretária de Turismo, Cultura e Eventos, Caroline Aquino, conta que hoje a secretaria está focada no trabalho de recuperação da estação férrea como um ponto turístico da cidade, por conta de seu valor arquitetônico e de toda história dos ferroviários que ali viveram. Atualmente, o prédio conta com um arquivo histórico municipal, e nele também

acontecem os ensaios da Banda Municipal de São Borja. A maior parte da estrutura continua original desde a época em que foi construída. Através de fotografias que se encontram no local é possível fazer uma comparação de como eram e como estão hoje partes fundamentais da antiga Estação Férrea, como a bilheteria e os pisos da sala de espera. A visita ao local demonstra a riqueza desta parte da história do município, no entanto, boa parte da população são-borjense não tem o conhecimento das dependências da estação férrea, tampouco da história de seu funcionamento. Atualmente a prefeitura cedeu algumas salas da estação férrea para o Centro Cultural de São Borja (CCSB). O CCSB, foi foi fundado em 1985 e é considerado uma instituição filantrópica. Nessa época a sede da instituição localizada no antigo cinema Presidente, situado no centro da cidade. Depois de algum tempo o cinema foi fechado e o CCSB ficou

Legenda: Prédio da Estação Férrea, onde está localizado o Centro Cultural. Créditos: Sara Meireles

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Nele, havia, ainda havia Departamento de Teatro, de Literatura, e de xadrez, onde chegavam participar mais de 60 jovens. eram realizados seis torneios por ano, trêsn no Clube Recreativo e três no Clube Comercial. Estes mesmos clubes faziam o patrocínio dos torneios. “É fundamental a importância que o tem xadrez na educação e na formação, desde que tenha regras e disciplina. Ele é uma ferramenta que vai aguçar, e reforçar a intelectualidade do jovem, porque ele terá que pensar”, acredita Weber. O Centro Cultural foi criado para buscar um trabalho em a favor da cultura e da arte de São Borja. O trabalho é feito de uma maneira voluntária e gratuita, onde as pessoas que fazem parte do CCSB realmente fazem por amor a cultura, podendo desenvolver cada vez mais o conhecimento de quem participa da entidade. . O Centro Cultural é uma instituição sem fins lucrativos, pois apenas foram cedidas as salas para que pudessem trabalhar em seu projeto.

03- Coral Polifônico formado na Paróquia do Passo. Créditos: Arquivo Centro Cultural

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Atualmente a prefeitura cedeu algumas salas da estação férrea para o Centro Cultural de São Borja (CCSB). O CCSB, foi foi fundado em 1985 e é considerado uma instituição filantrópica. Nessa época a sede da instituição localizada no antigo cinema Presidente, situado no centro da cidade.Depois de algum tempo o cinema foi fechado e o CCSB ficou sem sede, pois não tinha como se manter. Os custos eram muito altos e a instituição ficou sem ter uma sede própria durante praticamente oito anos. Augusto Weber, que esteve com o CCSB desde o início e hoje é o primeiro tesoureiro da nova secretaria, lembra dos departamentos em que eramdesenvolvidas várias atividades, como o departamento de música, onde foi criado um local polifônivo na paróquia do bairro do passo. Weber conta que acontecia, também, um festival de mostra de músicas instrumentais, apresentando músicas populares e clássicas com cantores de São Borja, que teve apenas quatro edições.


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‘ AEstação Férrea é um prédio de poder público. Na época em que o CCSB ficou sem sede própria, os membros em qualquer outro lugar que lhe fosse cedido, relata a Secretária Caroline Aquino. Hoje, o Centro Cultural possui dez departamentos em andamento voltados a diversas expressões artístico-culturais. De acordo com o atual presidente do CCSB, Alex Belmonte, somente nos últimos quatro meses já foram executados cinco atividades. Os departamentos em andamentos são: departamento de Letras; de Artes Plásticas, de Educação, Ciência e Tecnologia; de Patrimônio, História, Memória e Cultura Missioneira; de Música; de Dança e Teatro; de Design e Arquitetura; de Cinema e Fotografia; de Artesanato, Gastronomia e Turismo; de Esportes (especialmente o Xadrez e Capoeira). No ano de 2016, o Centro

Cultural estava passando por dificuldades financeiras e precisavam manter suas demandas. Foi então que o presidente do Centro na época, Fernando Rodrigues, entrou em contato com a Professora Carmem de Abreu, professora do curso de Relações Públicas da Universidade Federal do Pampa, pedindo auxílio para que pudessem ser realizadas atividades para a arrecadação de fundos. Desde então começou a parceria do CCSB com o curso de Relações de Públicas, o qual realizou um leilão de artes. Para o leilão, a artista plástica Thalita Chagas arrecadou peças juntamente com outros artistas plásticos da cidade. O evento foi realizado no Museu dos Angueras com o auxílio de professores e alunos. E com as vendas das obras foi arrecadado o valor necessário para o pagamento das dívidas do Centro Cultural.

Prêmio 1‘ Torneio Infanto- Juvenil de Xadrez Créditos- Michele Franco

Em 2017 aconteceu uma eleição para a nova diretoria, e Alex Belmonte, discente do curso de Relações Públicas foi eleito. O novo diretor do Centro Cultural firmou a parceria com o curso, e através desse contato gerou a ideia de fazer um projeto de extensão que pudesse reunir novamente tanto o leilão, que já era realizado pelo curso, quanto outras atividades. Julho/2017

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Alguns quadros que são produzidos nas atividades do Centro Cultural. Créditos- Michele Franco

Olavo Bilac, que agora conta com uma oficina de criação em audiovisual, criada através do projeto de extensão juntamente com o centro cultural. Neste projeto também acontece a exibição de filmes para a comunidade. Desde sua criação o CCSB já contribuiu muito para a cultura são-borjense. O auge da associação foi quando ela era também cinema, até 1994. Até aqui já são diversas as mentes criativas que endossaram a sociedade são-borjense, de alguma forma. O centro ainda está passando por uma fase de adaptação e organização do espaço, para que o público que queria conhecer tenha uma melhor recepção. Para quem visita pela primeira vez, é citado o esforço e a luta pela qual a associação passou e vem passando para poder manter-se. A sensação que fica é de que os visitantes se empolgam com toda a história e acabam levando para a vida um sentimento especial em relação à cultura. O Centro está aberto de segunda à sexta-feira, em horário comercial, e a entrada é gratuita.

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Atualmente existe um projeto de extensão atribuído ao centro cultural juntamente com o curso de Relações Públicas. O projeto visa a revitalização do patrimônio, preservação e valorização do Centro Cultural de São Borja, e reúne várias atividades para viabilizar as questões culturais da cidade. Dentro deste projeto de extensão estão envolvidos discentes, docentes e técnicos do curso de Relações Públicas. O projeto também é um incentivo de produção cultural para os alunos em situação de vulnerabilidade social de escolas públicas, pois tem atividades de oficinas culturais de leitura, literatura e outras que estejam ligadas na área da cultura e relação à memória para divulgação do centro cultural. A professora Carmen afirma que o trabalho do projeto irá contribuir para a formação acadêmica, artística cultural e profissional tanto para os discente da universidade quanto essa divulgação junto às escolas. Um dos objetivos alcançados do projeto pode ser visto na Escola Estadual


Entrevista Perfil

Amor pelo meio ambiente A trajetória do homem que reflorestou a costa do rio Uruguai Barbara Moraes, Camila Iann, Jean Azambuja, Katielli Saraiva e Mayara Rodrigues Katielli Saraiva

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Seu Lucena relembra sua história em São Borja

Após servir por 22 anos na Marinha do Brasil, desses, cinco anos no 1º Batalhão de Operações Especiais de Fuzileiros Navais, no Rio de Janeiro, Edgar Lucena Schenkel recebeu baixa do serviço militar e resolveu morar em um lugar mais calmo. São Borja, localizada ao extremo oeste do estado do Rio Grande do Sul, lhe parecia um bom local para continuar sua história. O município, que faz fronteira com a Argentina, tinha um grande movimento de comércio no Cais do Porto e foi ali que o seu Lucena, como é conhecido na cidade, conseguiu seu primeiro emprego depois de deixar a carreira militar. Seu Lucena, sempre muito prestativo e organizado, foi então notado pelo capitão dos portos que, em uma conversa, sugeriu ao ex-fuzileiro que fizesse o curso de Capataz do Porto, nome designado a um funcionário responsável pela atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transpor-

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te interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, função normalmente exercida por um ex-militar da Marinha. Lucena aceitou o desafio, porém, com as mudanças políticas que aconteceram no Brasil, o cargo que ele aguardava foi extinto. Mesmo com esses desencontros ele seguiu trabalhando e ajudando no Cais do Porto da maneira que podia. Com o passar do tempo a sua dedicação e amor ao meio ambiente lhe trouxeram muito mais do que esperava. Através de seu trabalho no Cais do Porto, Lucena começou a ser reconhecido e admirado pela comunidade são-borjense. Por estar a todo o momento organizando ações que ajudassem na preservação do local, ele acabou finalmente recebendo do prefeito municipal a nomeação de Capataz do Porto e, junto dela, uma equipe para lhe auxiliar no que fosse preciso.

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Inicialmente formado somente por meninos, o grupo passou também a receber meninas, que ajudaram na organização e disciplina da turma. Com a chegada das novas integrantes, Lígia Schenkel, esposa de Lucena, já então aposentada, começou a participar integralmente das atividades desenvolvidas pelo grupo. Muito apegado aos escoteiros e às atividades que ali desenvolvia, em 2006, Lucena teve que encerrar suas atividades por questões de saúde, mas nunca deixou de lado seu amor pela natureza e por São Borja. Seu trabalho, sempre muito reconhecido pela comunidade, fez com que fosse, por diversas vezes, homenageado em escolas e eventos relacionados à história do município. Por ter escolhido a terra dos Ex-presidentes para viver e continuar sua história e ser um personagem tão ativo na comunidade, a ele foi concedido o título de cidadão São-Borjense pela câmara municipal dos vereadores da cidade através da Lei nº: 2508 de 16/05/1997 e a Comenda Chico Mendes na Lei nº: 3770 de 04/05/2007. Hoje, aposentado, Edgar Lucena Schenkel tem sua oficina de reciclagem nos fundos de casa, localizada no bairro do Passo, onde desenvolveu sua própria terapia e na qual é encontrado sempre muito amistoso e querido por todos. Edgar Lucena Schenkel Nascido em 25 de dezembro de 1944 Natural de São Francisco de Paula Recebeu os títulos de Cidadão São-Borjense e Amigo da Marinha

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Lucena ficou encarregado não apenas do porto, mas de toda área da praça do bairro do Passo até o Cais, assim como pelos ribeirinhos e seu destino em épocas de cheia do rio Uruguai. Mas seu trabalho em favor de uma cidade melhor não parou por aí. Após receber algumas ideias, Lucena criou um grupo de escoteiros, o Comando de Defesa da Natureza, que, em seu primeiro ano, reuniu cerca de onze meninos e sob sua supervisão e auxílio, reflorestaram a costa do rio Uruguai em São Borja. O grupo também contou com dois funcionários da prefeitura que faziam o trabalho mais pesado e os meninos ficaram encarregados de plantar as mudas das árvores. A falta de conhecimentos técnicos sobre a plantação foi um dos entraves que atrasaram o reflorestamento da costa, mas, instigado a sempre buscar conhecimento, Lucena aprofundou seus estudos e descobriu a melhor maneira de realizar aquele trabalho. A tarefa foi ganhando visibilidade e com o apoio da prefeitura o Comando de Defesa da Natureza recebeu um local para a construção de sua sede própria.


Praça XV de Novembro

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Produção: Andressa Silveira, Letícia Dorneles, Marcela Cartolano e Wenandra Sommer

A praça central da cidade de São Borja, inicialmente se chamava Praça da Matriz em decorrência da região missioneira a qual o município faz parte. Somente em 10 de janeiro de 1890 na quarta sessão, o Vereador Aparício Mariense entrou com a indicação para a mudança do nome, em decorrência da Proclamação da República. Assim por unanimidade foi aprovada a lei que renomeava o local para Praça XV de Novembro.

Praça XV nos anos 70

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O lugar foi e ainda é palco de grandes eventos como: as marchinhas de carnaval, semana farroupilha, semana da pátria, feira do livro, feira do peixe e deu lugar a discursos de ícones da política local e brasileira como, Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Jango e Tancredo Neves. Acompanhe ao longo dessa fotoreportagem histórias de elementos que compõe esse cenário tão querido pelos são-borjenses.

Imagem da internet

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Parque João das Balas Crédito: Wenandra Sommer

O carismático sujeito faleceu em uma pescaria em 02 de junho de 1969 e em sua homenagem, no dia 16 de junho de 1971 foi denominado por lei o parque construído pelo poder público municipal na área integrante a Praça XV de Novembro, de Recanto de Recreação João das Balas. Imagem cedida gentilmente por Clóvis Benevenuto

Parque João das Balas 2017

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João Adão Batista vendia balas caseiras no estilo “puxa-puxa” feitas por sua tia “Chininha” aos arredores da Praça XV de Novembro. Quando não vendia toda a sua mercadoria, jogava as guloseimas para as crianças que brincavam no local. Assim, se tornou uma figura popular na cidade, conhecido como João das Balas. A esquerda o João Adão das Balas e a direita sua tia dona Chininha

Parque João das Balas 2017

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Crédito: Andressa Silveira

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Mausoléu Getúlio Vargas

Palanque Teotônio Vilela

O Mausoléu Getúlio Vargas, projeto elaborado pelo arquiteto Oscar Niemayer, foi inaugurado no dia 24 de agosto de 2004 em homenagem ao cinqüentenário da morte do ex-presidente. Crédito: Marcela Cartolano

O palanque oficial da cidade sempre serviu como palco para apresentações e discursos. Desde antes de sua construção, o espaço era usado por importantes políticos como, por exemplo, Getúlio Vargas, Jõao Goulart, Leonel Brizola e Tancredo Neves. Atualmente, é utilizado em datas comemorativas e serve de palco para eventos que são realizados na semana da pátria. Há, também, uma estrutura apropriada para manifestações da cultura gaúcha, como na semana farroupilha, que todo ano conta com a chama crioula que é acesa na pira do local

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Crédito: Marcela Cartolano

Mausoléu Getúlio Vargas projetado por Oscar Niemayer

A obra foi construída com materiais trazidos de Minas Gerais e Santa Catarina, desde então, a construção passou a manter os restos mortais do político. A carta de testamento, escrita e deixada por Getúlio Vargas, também foi registrada no monumento. A inauguração contou com autoridades de todo o país, tornando-se um dos principais pontos atrativos da Praça XV de Novembro. Palanque utilizado para apresentações

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Bugios no centro da cidade

Crédito: Andressa Silveira

Bugios vivem em banda na praça principal da cidade

Crédito: Andressa Silveira

Crédito: Wenandra Sommer

Os animais vivem soltos e se alimentam geralmente com frutas dadas por pessoas que trabalham ou passam diariamente pela Praça, sempre em grupos de cinco ou seis eles descem os galhos e divertem quem está por perto, principalmente as crianças que adoram ter contato próximo com eles. Bugio na Praça XV de Novembro

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Bugio sendo alimentado por moradora

Palco de visitas e olhares curiosos seja de turistas, moradores da cidade ou fotógrafos, a Praça é lar de um bando bem inusitado que vive por lá, um grupo de macacos bugios que residem há mais de duas décadas nas copas das árvores do local.


Os festivais e eventos de São Borja Ocorrem anualmente proporcionam visibilidade e desenvolvimento cultural e econômico para o município Algumas cidades são caracterizadas pelos grandes eventos que oferecem aos públicos que participam. Eles se tornam um ponto de referência para aquela localidade, inclusive em conversas do cotidiano é referido como, por exemplo, para Pelotas: “a cidade da feira do doce’’, ou então no exemplo de Caxias do Sul como a “cidade da festa da uva”. Já no caso de São Borja ela é reconhecida pelos vários festivais que promovem para todas as idades e preferências: Pampa Stock, Festival da Barranca e a Fenaoeste. O Pampa Stock é um espetáculo que tem o estilo rock como a primeira opção, mas que não deixa de incluir outros ritmos musicais no repertório. Todo ano, o evento tem um tema guia para a causa que está sendo apoiada e divulgada no momento. Neste ano, a sétima produção do evento foi chamada Por um Mundo sem Muros, com o principal intuito de quebrar barreiras do contexto atual, preconceitos sociais, violência e também a democracia.

Em outras edições já estampou alguns nomes como Por uma sociologia do Rock, Cevando o Rock na Fronteira e Todos Pela Fronteira. O festival foi criado em 2010 pelo Professor da Universidade Federal do Pampa - Unipampa - César Beras que ministra o componente curricular Sociologia do Rock, disciplina responsável para a criação da festa. O Pampa Stock é um projeto de extensão da universidade com três objetivos: servir de portfólio para os estudantes, desenvolver com a comunidade de São Borja e fortalecer as bandas independente. Além da parte artística do festival, existe o simpósio de apresentação de trabalhos e palestras. A terceira edição abordou a temática Construções Inovadoras na Sociedade e Academia, na qual foram apresentados 55 trabalhos e os eixos de assuntos foram divididos em 3: formas de resistência ao capitalismo, tribos sociais e identidades e construções criativas.

Créditos: Alexia Saner

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Por Alexia Saner, Matheus Charão e Nathália Trindade

Palestras e apresentações de trabalhos no 3º simpósio internacional do Pampa Stock.

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Esse momento é a chance que os universitários têm de dar visibilidade e adquirir aprendizados com a exposição dos seus artigos, como é o caso da acadêmica Letícia Balbueno. Leticia pesquisa sobre a Cultura Japonesa e, principalmente, sobre a Tribo Otaku. A acadêmica explica a importância de poder divulgar o tema, “eu posso expor algo novo que poucas pessoas conhecem. Aqui na academia poucas pessoas souberam sobre o que era o meu tema. E é também uma chance de achar novas pessoas que também façam parte dessa tribo’’, argumenta Leticia. O festival ainda conta com apresentações de bandas de todos os ritmos musicais, mas com uma condição: as músicas devem ser autorais. O organizador busca incentivar a independência dos músicas através dessa ação. Para os artistas, a oportunidade de participar do festival gera benefícios, assim comentam os membros da Banda SomS7, um projeto de extensão do Instituto Farroupilha de São Borja “É uma meio de apresentar canções originais para um público seleto de pessoas. Além de ter o contato com bandas de outras cidades, algumas com anos de estrada, e saber que aquelas dificuldades que bandas iniciantes passam são idênticas entre quase todas’’, explicam. O nome da Banda SomS7 surgiu através de um anagrama da Palavra Sunset, Pôr-do-Sol em português, junto ao costume de ouvir músicas dos anos sete: 67, 77, 87, 97. Dessa forma, eles apresentam músicas com referências no rock clássico. Sobre participar do Pampa Stock, a banda ressalta que a interação com bandas que já estão na estrada é fundamental. . “A companhia com outras bandas já de renome e com participações no

Fonte: Internet

Créditos: Alexia Saner

Pampa, poder mostrar nossas canções, trocar ideias com amigos da música, é uma sensação indescritível’’, finalizam. Um dos atributos do Pampa Stock é lembrar e refletir sobre o olhar ao próximo. César Beras explicar o quanto a empatia é fundamental para os dias atuais. “É importante para reafirmar a nossa condição humana. Hoje em dia o crescimento do preconceito é muito grande, as pessoas batem em outras pela orientação sexual.

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Nós conduzimos violências contra nós mesmos’’, explica o professor. Por isso, “Um Mundo sem Muros’’ visa quebrar paradigmas, como conclui Beras. “É fundamental discutir como barrar o preconceito e lembrar que nós somos seres humanos. O seminário vai fazer isso, vai tentar lembrar que nós somos seres humanos e temos que respeitar as diferenças e fazer um mundo diferente’’, argumenta. Ao contrário do Festival da barranca, onde os próprios participantes compõem e cantam suas canções, com certo número limitado de público, há também um dos eventos mais aguardados e prestigiados na Terra dos Presidentes, que se trata da famosa Exposição Feira Agropecuária de São Borja, promovida há quarenta e quatro anos pelo Sindicato Rural e que em dois mil e dez, se transformou em FENAOESTE – A maior feira de negócios agropecuários da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. Em cada primeira quinzena do mês de outubro, um público composto por cerca de noventa mil pessoas comparece ao parque Serafim Dornelles Vargas, para acompanhar não só as atrações musicais, como também a maior exposição de máquinas e implementos agrícolas, remates e palestras. Nas quatro primeiras edições, a feira contava apenas com uma atração principal, após isso, da sexta até a oitava edição, esse número dobrou e já nos anos de 2015 e 2016, subiu para três shows nacionais e um regional, o que fez com que passaportes para todos os dias dos shows, começassem a ser vendidos cerca de dois meses antes, gerando uma fila que durante horas, preencheu inteiramente a calçada do local que é ponto de venda. (Em relação ao ano passado, na praça XV de Novembro), a fila dobraJulho/2017

va a esquina desde antes das sete horas da manhã. Dentre as diversas bandas e grupos famosos que passaram pela “Fe-na’’ (apelido pelo qual o evento é reconhecido por todos) estão Gusttavo Lima, Capital Inicial e Thiaguinho, ou seja, variados estilos musicais para alcançar a maior quantidade de público possível. Já para as crianças, peças de teatro envolvendo personagens de desenhos animados são a grande opção. O evento também conta com praça de alimentação, estandes com produtos agropecuários e

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Fonte: Fenaoeste

Créditos: Alexia Saner


para indústria, feira de animais, entre outras atividades. Segundo a secretária executiva do Sindicato Rural, Joice Leão, a FENAOESTE é um acontecimento que movimenta toda a região, devido a grande quantidade de pessoas de fora da cidade, como, por exemplo, Alegrete, Itaqui e Uruguaiana. “é importante trazer um evento assim para São Borja porque além

de ser um entretenimento, também traz muita gente de fora que vem prestigiar a Fena”, comenta Joice. As festas que ocorrem nas cidades são essenciais para o desenvolvimento cultural e econômico do município, já que muitas pessoas vêm de fora para participar dos eventos. Além disso, servem como entretenimento para o público.

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Além de shows, tratores são algumas das vendas que acontecem na Fenaoeste.

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Comício de espíritos na beira do Rio Uruguai: quatro décadas de música e poesia tradicionalista O comício de espíritos, assim denominado pelos barranqueiros, é uma tradição cultural de São Borja, englobando causos, histórias, música e poesia nas barrancas do rio

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Foto: Emílio Pedroso

Por: Lauren Serpa, Maria Isabel Ramos, Stephanie Vieira e Thaisy Finamor Um dia – quem sabe através de um espírito - durante uma pescaria en- tre amigos, surgiu a ideia de criar um grande evento, o tradicional Festival da Barranca ou Comício de Espíritos. Incialmente inspirado na Califórnia da Canção Nativa, que acontece em Uruguaiana, o evento é organizado pelo grupo amador de arte, “Os Angüeras”. Então, desde 1972 as margens do rio Foto: Emílio P Uruguai em São Borja nunca foram as mesmas. Apparício Silva Rillo e José Lewis Bicca parceiros de pescaria e integrantes dos Angüeras foram os pioneiros do evento, que hoje está em sua 47ª edição. O Festival reúne apenas homens, sejam eles de classe social, crença ou religião diferente. O que une esta diversidade é a música, poesia e o dinheiro próprio, entre outras peculiaridades inesquecíveis para quem participa. Música no festival. As famosas pescarias entre amigos sempre eram realizadas na Semana San- quanto ela permanecer viva, escolhida ta e Semana da Pátria, segundo Apparí- nesses fatores, principalmente no chegar cio Silva Rillo Neto (27). Elas eram uma no mais puro do ser humano”, ressalta tradição para, na primeira cumprir o jejum Apparício Neto. O desafio do evento é, de carne; e na outra semana, fugir dos além de permanecer alguns dias sem o desfiles cívicos considerados entedian- conforto de suas casas, interagir do cotes. O Festival da Barranca preservou a meço ao fim. A pescaria da barranca – pescaria no evento, mas acrescentou em assim como momento de lazer – também sua essência a mistura de música e po- envolve a produção musical e literária, esia. Para participar do festival, apenas que se destaca como sua principal caracconvidados do grupo “Os Angüeras”. “A terística. Um tema é escolhido pelo júri barranca detém a escolha de seus con- e os participantes tem apenas 24 horas vidados e assim espero que continue en- para produzir uma música inédita. Julho/2017

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Foto: Emílio Pedroso Antônio Augusto Fagundes (Nico Fagundes), vencedor da primeira edição do festival da barranca.

Naquela edição, se consagrou como vencedor Antonio Augusto Fagundes, conhecido como Nico Fagundes, que compôs e interpretou a música “Eu e o Rio”. Na Barranca, além do troféu principal, existem outras premiações, como a “Cigarra de Acampamento”. Um troféu é recebido por aquele que cantar por mais tempo e que divertir a turma. Apparício Neto relembra que um dos participantes do festival ficou mais de trinta horas tocando gaita, isto já com 70 anos de idade. Além deste, também existe o Troféu Quá-Quá, que premia a música mais audaciosa e mais bem-humorada. E o troféu “O Comendador”, concedido ao amigo que alcançar um grau alcoólico alto. Ainda, para diferenciar o festival dos já existentes pelo Rio Grande do Sul, surge como forma de introduzir um sentido único e ao mesmo tempo de homenagear um grande amigo do festival, Cláudio Rodrigues, conhecido por Tio Manduca, a moeda oficial do evento. As notas do real são convertidas em Manduca, que tem valor apenas no festival. Segundo Apparício Neto, “o dinheiro foi uma forma de homenagear o Tio Manduca, porque todo mundo que lá chega, pega o real e compra o Manduca, não quer usar o dinheiro, quer usar o Manduca”. O Comício de espíritos, assim denominado pelos barranqueiros, conquistou o Estado, trazendo diversos ícones rio-grandenses para o festival. Um personagem marcante e fiel do festival da barranca desde 2000/1, é o ex-governador do Estado, Olívio Dutra, que participa assistindo, compartilhando as rodas de

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Para o vencedor, o prêmio principal poderia ser uma gratificação em dinheiro ou uma grande homenagem, mas é apenas um singelo troféu intitulado Apparício Silva Rillo. O grande presente do festival é o fortalecimento do companheirismo e a troca de experiências de diversas gerações. A primeira edição do festival aconteceu no dia 10 de março de 1972, durante a Semana Santa e na barranca do rio Uruguai em São Borja. O evento se destacou desde o início ao reunir artistas de todos os estilos e regiões do Brasil e exterior, para juntos exaltarem a cultura do Estado através da música e poesia. No primeiro Festival da Barranca, o presidente e responsável pela comissão julgadora daquela edição era Cláudio Rodrigues, mais conhecido como “Tio Manduca” e foi quem escolheu o tema: “Acampamento de pescaria”.


conversas, histórias e tertúlias de poesia e música. Olívio recebeu o convite por um dos integrantes dos Angüeras, Apparicio Silva Rillo, através de uma carta que guarda com muito zelo até hoje, conta o ex-governador.

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Foto: Emílio Pedroso

Ex-governador Olívio Dutra prestigiando o festival da barranca.

Apparício Neto ressalta que o Festival da Barranca para a cultura do Rio Grande do Sul tem um ponto crucial. “Se passaram tantos largos anos e o festival tem uma quantidade imensa de artistas do Brasil e da Argentina. De todas as esferas, do samba, do chamamé, do rock, da bossa nova. A barranca tem esse “Q” de um laboratório de músicas e experiências acontecem lá dentro a cada ano”, destaca Apparício. Há 35 anos, Eduardo Bicca (50) também é um dos participantes do Festival e auxilia na organização do evento. A grande satisfação, segundo Eduardo, está além do exercício da arte poética e musical, mas sim na importância de fazer, conservar e regar as amizades. “Acredito que o evento contribui de maneira significativa para a conservação Julho/2017

e renovação da música e da poesia do Rio Grande do Sul como um todo, não somente para a cidade de São Borja”, ressalta o participante. O festival tem suas peculiaridades, o que o torna tão único. Segundo o historiador Ruben Bitencourt (55) pós-graduado história, cultura, memória e patrimônio (Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI campus Santiago), o que torna o evento importante para a região missioneira é ser um festival totalmente inédito, diferente dos demais, pois todas as melodias e canções escritas nesse período são elaboradas no simbolismo da Barranca do Rio Uruguai, o que exige muita criatividade e conhecimento dos participantes. De acordo com Olívio Dutra, “o festival enriquece a região, por ser um evento rico de histórias, tradição e cultura, mas também de poetas e músicos populares nessa fronteira de mundo latino-americano que o rio Uruguai não separa, mas integra”. Uma outra peculiaridade do evento é ser aberto apenas para homens, mulheres não são convidadas. O ex-governador do Estado conta que no princípio era um punhado de amigos que “fugia” de casa em alguns feriados, em especial na Semana Santa, e ia para a beirada do rio pescar e ficar à vontade, sem os confortos da cidade. “Dizem também, os mais antigos, que suas mulheres expressavam satisfação em “se livrar” deles nessas ocasiões, porém se considera um traço do machismo secular gaúcho, em especial do homem do campo”, ressalta Olívio. Em todas as edições do festival, Os Angüeras e outros participantes, se mobilizam para uma apresentação pública, conhecida como caravana da

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bado que antecedia a Páscoa de 1982 aconteceu a apresentação das músicas do festival na Praça XV de Novembro com a presença de grande público. Segundo Eduardo, o vencedor daquela edição foi Miguel Bicca, e o segundo lugar ficou com os irmãos Nico e Bagre Fagundes com uma composição que até hoje faz a abertura do Programa Galpão Crioulo na RBS TV. “Foi, sem dúvida, uma Barranca muito especial” declara Eduardo Bicca. O festival da barranca pode ser considerado um grande patrimônio histórico, não só de São Borja, mas sim do cenário brasileiro. O evento contribui durante anos de maneira significativa para renovar e contribuir com a música e a poesia. Eduardo Bicca comenta que, “trata-se de um grande encontro de nomes de nossa cultura e funciona como um laboratório de criação nessa área”. O evento repercute em diversas mídias e se torna uma grande oportunidade para aqueles que estão começando na carreira. Com toda essa importância para a cultura rio-grandense, foi proposta através do deputado Eduardo Loureiro (PDT/RS) uma Lei que reconhece o festival como evento oficial no calendário do Estado, reconhecendo assim ainda mais sua importância e preservando o nativismo.

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“Debruça em sono a barranca deslisa a balsa sonhando Por entre nuvens rogando Mistérios dos aguapés” Eu e o Rio Primeira canção vencedora do Festival, em 1972. Julho/2017

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barranca. A caravana se apresenta para a população de São Borja, onde artistas renomados e tradicionalistas fazem seu show aberto e gratuito. Segundo Apparício Neto os artistas vêm a São Borja gratuitamente. “20... 30 artistas do cenário, do nosso Estado, da nossa aldeia, cantando a nossa música para a população” explica Apparício. A caravana ganhou grande importância ao longo dos anos, pois contribui para a integração do público com os artistas e envolve o amor pela tradição. O festival da barranca proporcionou, ainda, em todas as suas edições uma série de fatos inusitados, que enriquecem cada vez mais a sua história. A participação de pessoas de diversas regiões, do Estado e do mundo, várias idades e etnias acrescentam ainda mais a cultura do festival. “Nesta edição da barranca, um senhor de 82 anos que já viajou o mundo, não vinha ao festival faziam quatro anos, mas esse ano pegou seu jipe e saiu de São Paulo, passando três dias na beira do rio. Antes de ir embora no domingo de manhã, ele arrumou a barraquinha dele, deu um abraço e chorou e disse: Se Deus quiser até daqui não sei quando, mas eu volto”, relembra Apparício Neto. Eduardo Bicca participante ativo do festival também possui grandes recordações. Para ele, um fato que aconteceu no festival de 1982 ficou guardado em sua memória. “Em 1982, se comemorava os 300 anos de São Borja e, em homena-gem a esta data, os organizadores resolveram, pela primeira e única vez, abrir o festival de músicas da Barranca para a comunidade”, comenta Eduardo. No sá


Maria do Carmo e o Túmulo do Anjinho

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Personagens marcantes das crenças populares de São Borja, Maria do Carmo e Anjinho – história em torno de uma criança da cidade – mobilizam várias pessoas através da fé.

Placa de agradecimento deixada no túmulo de Maria do Carno, em São Borja.- foto: Gabriel Lentz

Contos populares fazem parte da história de praticamente todas as regiões do Brasil, como o Padre Cícero, que possui um santuário em sua homenagem na cidade de Juazeiro do Norte, no Ceará; e também Nhá Chica, Irmã Franciscana considerada santa em Minas Gerais e por boa parte dos brasileiros. Esses contos possuem em sua essência o poder que humanidade detém sobre a imaginação, divergente e peculiar em cada ser humano. Quando um determinado fato acontece e se destaca, origina-se um processo de consciência coletiva em torno do ocorrido, como é o caso das mitologias em torno da morte trágica de “Maria do Carmo” e conto do “Anjinho”. Foi na cidade de São Borja, localizada na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, na região dos Pampas Missioneiros que se criou a mitologia em torno dos contos referidos. Conhecida como Terra dos Ex-Presidentes, pois foi berço de Getúlio Vargas e João Goulart, possuindo uma forte tradição Julho/2017

cultural e histórica. Também conservam em seu legado outras faces que são pouco conhecidas, a dos mitos, especialmente “Maria do Carmo” e “Anjinho”. Cada história possui um papel essencial na formação identitária da região, e em São Borja não é diferente. São culturas que veem sendo contadas há anos, e que até hoje possuem um papel fundamental na história mítica da cidade. Os mitos da cidade são histórias que ainda percorrem no imaginário popular, sendo transmitidas de geração em geração, dos pais para os filhos, dos avós para os netos e assim sucessivamente. Todos que vem à cidade explorar um pouco mais sobre a sua identidade cultural se deparam com suas crenças mitológicas, pois fazem parte da história são-borjense. Percebe-se que a existência de contos se dá através da oralidade, da capacidade de criar e imaginar de cada pessoa e ainda da sua eficiência em repassar o que sabe para outras pessoas.

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Maria do Carmo: A santa profana

Bebidas, cigarros e festas eram rotina desta bela mulher nascida em Bagé, em 1850. Morena e de cabelos negros e longos, Maria do Carmo Fagundes, ou somente Maria do Carmo, atraia vários olhares de todos os homens por onde passava. Por isso, teve vários amores durante toda sua vida.

Suposição como seria o físico de Maria do Carmo. - Modelo: Karine Freitas - foto: Rudy MP Kuffner

E foi justamente por meio um de seus amantes que Mara do Carmo foi brutalmente assassinada e esquartejada, especificamente por um militar que dela tinha ciúme. A mulher que outrora era vista com desprezo pela sociedade da época, por ser uma livre e independente, foi santificada após sua morte e até hoje é tida como uma santa não só local como regional e sua fama se espalha pelos quatros cantos do Brasil e da América Latina. Onde seu corpo foi encontrado, hoje é um templo de adoração, promessas e agradecimentos à ela, que foi canonizada pelo povo da região. Ramão Aguilar, historiador e pesquisador da cultura local, conta uma das versões sobre a vida e morte de Maria do Carmo. “A história dela era o seguinte: Ela era uma moça de vida airada, ela gostava de beber, gostava de fumar, gostava de se divertir, ela era muito bonita, tinha os cabelos escuros longos, ela era uma morena clara, muito bonita, ela gostava de namorar bastante,

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Para a professora de jornalismo e pesquisadora de cultura e identidade regional, Adriana Duval “toda crença popular, toda a vivência na sociedade ela se dá sobre tudo a partir da oralidade, então, uma pessoa contando a história para a outra, um vizinho um amigo”, afirma. A importância que a imaginação desfruta para a consolidação de mitos é extremamente vasta, visto que, é através dela, das histórias ouvidas e contadas das mais diversas maneiras e formas de reprodução e de entendimento individual de cada um, que um mito vai se repassando com a mesma finalidade, porém, alguns possuem uma forma diferenciada de contar sua versão. “A questão do imaginário social é que ele se alimenta daquilo que se vê, daquilo que se escuta e daquilo que se vai contando e que nem sempre condiz com a realidade, mas a gente revendo essas informações de várias ordens vai solidificando aquele mito, e ele vai permanecendo no seio da sociedade”, explica Adriana Duval. Os mitos partem da ideia de que são verdadeiros por quem o concebeu, desde sua primeira história. Portando, em São Borja, “Maria do Carmo” e “Anjinho” são considerados sagrados.


esse era o perfil dela, relacionada a questão da vida íntima e pessoal dela.

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A outra questão era, a disposição dela de prestar favores a todos, sempre que as pessoas lhe pediam ajuda, ela sempre procurava uma solução para o problema, ela em vida já era conhecida por esse lado. Ela (Maria do Carmo) foi morta a machadada, segundo o relato do delegado que fez ocorrido da onde se lavrou o atestado de óbito, ele teria encontrado partes da Maria do Carmo. Partes do esquifo dela carregadas pelos cachorros, e foi juntando aos poucos.

Maria do Carmo era uma mulher vaidosa e que gostava de beber - foto: Rudy MP Kuffner

Ele enterrou no cemitério municipal. A Maria do Carmo, foi em morta 1890. Existia aqui a dona Joana que contava que os irmãos dela é que recolheram os restos da Maria do Carmo. Dizem que quando eles chegaram os cachorros já haviam tomado conta. Estavam comendo já a carne dela. Daí na época eles enterraram ali onde é o tumulo dela, plantaram uma cruz de madeira e cercaram de pedra porque era campo e era paro gado não chegar ali”, conta Ramão. Julho/2017

Por ser uma jovem muito caridosa e bondosa, sempre ajudando quem mais precisava, Maria foi santificada pelo povo e até hoje, mesmo com tantos anos após seu falecimento, seu santuário, localizado no Bairro Maria do Carmo, batizado em homenagem a personagem, recebe várias visitas de pessoas de todo o Brasil e também de países vizinhos. “No túmulo dela, até hoje recebe bastante visitas, e apesar de ser conhecida como uma prostituta, é uma santa para que as pessoas pagam promessa, e como ela gostava de beber e fumar, no túmulo dela você acha garrafas de bebida e carteiras de cigarro. Até fitas que representam o amor. Você acha também placas de argentinos, porque ali no norte da argentina, na região aqui de Santo Tomé, Posadas, são lugares também que as pessoas pagam promessa” fala Ramão. Segundo Pedro Emílio Rocha, diretor do acervo histórico de São Borja e morador do Bairro Maria do Carmo, o turismo em torno da santa são-borjense gira a economia local e traz diversos visitantes até o túmulo de Maria do Carmo. “A gente encontra no túmulo diversas placas de pessoas que foram beneficiadas com os seus pedidos para a Maria do Carmo ajudar. Tem da argentina, tem da republica do Uruguai tem da Bolívia tinha uma de Portugal que ai depois, alguém tirou de lá, mas era muito interessante de Portugal alguém recebeu uma graça através do pedido para a Maria do Carmo. Então é um dos locais, eu que moro ali perto sempre estive vivenciando a visitação, nos fins de semana é muito grande a parte da visitação do povo que vem ali, trazer os seus agradecimentos e ao mesmo tempo seus pedidos de ajuda para a Maria do Carmo” conta Pedro Emílio.

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Túmulo do Anjinho

Estatueta no tumulo do anjinho com algumas oferendas - foto: Gabriel Lentz

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Anjo: do dicionário, ser celestial, divindade. Para o catolicismo, são guerreiros que auxiliam na paz dos céus e regem pelos homens na Terra. Na crença popular, anjos são seres iluminados capazes de transmitir paz e fazer milagres. Frequentemente, anjos são representados (em produções audiovisuais, revistas, gibis, desenhos) na forma de crianças. Em São Borja, outra lenda que permeia pelo tempo é a do Túmulo do Anjinho. Localizado no Cemitério Municipal Jardim da Paz, o local mexe com o imaginário de quem o visita. Chupetas, flores, balas e brinquedos são frequentemente vistos sendo deixados como oferenda para o ser celestial são-borjense. Geralmente, são deixados pedidos de saúde e prosperidade para os recém-nascidos. Porém, qual a verdadeira história por trás desse fenômeno que afeta com o imaginário não só dos são-borjenses? Ramão Aguilar, admirador dessas lendas locais, fala sobre as versões dessa lenda: “Tem duas versões que são as mais aceitáveis, a primeira é bastante dramática, a criança é oriunda de fora de um casamento, o pai da moça não aceitava crianças fora do casamento, então ele matou a criança e fez o túmulo, e disse que esse túmulo estava pronto antes da criança nascer, e logo quando ela nasceu ela foi assassinada. E a outra versão é que esse túmulo foi mandado construir pelas pessoas da comunidade, por um anjinho que foi sepultado ali. Também dizem que esse túmulo apareceu da noite para o dia” diz Ramão. Também conhecida como Gruta do Anjinho, a construção em questão é data da de 1922 e está localizado logo no início do cemitério

Municipal Jardim da Paz, em São Borja e recebe visitas quase todos os dias, segundo funcionários do cemitério. As oferendas são inúmeras, mas geralmente tem a ver com a temática da infantil. “Essa gruta ela está permanentemente recebendo visitação, colocam flores, fitas, bico seco, bonecas, bonecos. Ele realmente se tornou um lugar de visitação profano religiosa. Profano por se tratar de um anjo, um santo. E religiosa porque, eles vinculam a crenças, a milagres que podem ser atendidos, e como pagamento de promessas, vão lá se ajoelham, rezam, e levam seus objetos que prometeram depositar lá na gruta” conta Ramão. Apesar de mexer tanto com a imaginação e a fé dos fiéis, há quem duvide da veracidade desta lenda, como José Fernando Corrêa Rodrigues, administrador, especialista em história das missões e mestrando em Patrimônio Cultural na UFSM. Para ele, a história pode ter sido criada para um túmulo que foi colocado


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no cemitério municipal, ganhando espaço no imaginário popular com o passar do tempo. “Essa crença do anjinho, eu tenho pra mim que foi criada, uma explicação pra um túmulo que estava no cemitério municipal, e a partir duma lenda criada se espalhou pela comunidade, e ela vem se propagando e sendo instigada desde a infância e a adolescência nesse sentido, passando de pais para filhos o processo pagar promessas, então essas pessoas crescem e vão passando isso para os seus filhos. Acho que por isso essa crença do anjinho é a que mais tem se propagado em função disso, porque se criou um ritual de pai pra filho em função da lenda” relata o professor. Os mitos partem da ideia de que são verdadeiros por quem o concebeu, desde sua primeira história. Portando, em São Borja, “Maria do Carmo” e “Anjinho” são considerados sagrados. Basta conhecer a cidade e explorar um pouco mais sobre sua cultura que consequentemente essas histórias irão aparecer como parte da dela. Maria do Carmo e o Anjinho são considerados milagrosos e possuem uma imensidão de crentes. Histórias populares como essas duas inspiraram poetas até os dias atuais. São histórias ouvidas das mais diversas pessoas, curiosidades que despertam a atenção dos poetas, como Aparício Silva Rillo,

Chupetas deixadas como oferendas no túmulo do anjinho - foto: Gabriel Lentz

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e Clemar Dias , escritores são-borjenses. Essas várias facetas dos contos são retratadas por cada artista em forma de arte. Clemar Dias, por exemplo, exalta que jamais se conseguirá separar o real do imaginário, pois já se passaram muitos anos destas histórias: “Não se consegue separar do imaginário do real, não dá para fazer uma separação, ninguém estava lá, ninguém viu. Só podemos confiar no que a realidade nos trouxe. A importância maior nisso tudo é a oralidade, sem a oralidade do povo, não teríamos nos reunido” afirma Clemar. “Maria do Carmo” e o “Túmulo do Anjinho” são mitologias que perpetuam até os dias atuais, e que levam multidões de fiéis a visitarem seus túmulos e fazerem promessas. É uma mulher que ficou considerada milagrosa, é um bebê que também ficou considerado anjo. Há muitos relatos de pessoas devotas que já foram atendidas em seus pedidos, e é isso que faz dessas mitologias algo tão importante para a cultura e a religiosidade uma sociedade. Há quem acredite, há quem prefira a incredulidade frente a esses fenômenos. Porém, é de consenso da grande maioria, sejam historiadores, pesquisadores e até populares, que as crenças formam e reforçam a identidade de um povo, de um local, de uma nação.

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DE LOCUTOR PARA OUVINTE Produção: Danielly Engelmann, Matheus Bernardes, Nadine Marino e Tamires Hanke Foto: Danielly Engelmann

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Radialista durante a transmição de seu programa.

“Alô, bom dia! Bom dia você minha amiga, bom dia você meu amigo, bom dia você meu amor. Bom dia minha São Borja que me ensina coisas tão lindas a respeito do amor e de amar” assim o locutor Ibaro Rodrigues faz sua saudação ao ouvinte no início de seu programa na Rádio Butuí. Do outro lado, dona Eloí da Silva Marques, 71 anos, ouve atenta a voz do amigo enquanto cuida de seus afazeres. “Eu escuto rádio para saber as notícias, gosto de compartilhar com eles, ligar pra lá, pedir música” conta Eloí, que assegura, “eu gosto de ouvir as musiquinhas do padre, o padre falando. Eu escuto o programa do Eugênio Dutra. O Ibaro Rodrigues eu conheço, meu amigo, mas o Eugênio não, tenho vontade

de conhecer”. E essa é uma das maiores gratificações que o trabalho radiofônico oferece ao locutor, como declara Eugênio Dutra, radialista há 30 anos. “Ter gente que me acompanha há muito tempo é um prazer, tenho ouvintes que me seguem há anos. O público jovem não é tanto, ele já tem um gosto diferente de músicas e tal. O meu público são pessoas de mais idade. E morar do interior me deixa mais feliz ainda, porque me permite um dia conhecer aqueles que estão sempre me escutando”. Com uma voz marcante e o desejo de transmitir não só informações, mas também sentimentos, o radialista chega a lugares que nenhum outro meio alcança. Fazer parte da rotina de diversas famílias faz do rádio, um dos primeiros meios

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Foto: Danielly Engelmann

de comunicação, o veículo que pendura há séculos, se renovando e adaptando-se ao tempo. “O rádio segue e seguirá sendo o meio de comunicação mais difundido do mundo. Produzir rádio se tornou uma tarefa um pouco mais difícil nos últimos anos em função da exigência dos ouvintes e do avanço de outras mídias. De qualquer modo, é uma tarefa muito prazerosa especialmente quando você descobre que o seu trabalho é reconhecido pelo público”, assegura Edson Arce, pioneiro no radialismo em São Borja.

Ajustes de som para a transmição.

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A Rádiofusão em São Borja As ondas de rádio transmitem notícias e acontecimentos, músicas e emoções. A palavra que se transforma em sentimento, a emoção que se transforma em companhia. Presente na vida de São Borja desde 1967, o rádio relata os principais acontecimentos da cidade e região. A história do Rádio em São Borja está marcada pela presença de profissionais ilustres que configuram a identidade do rádio na cidade. Desenvolvendo um papel social de interação com a comunidade, José Antonio Degrazia, 76 anos, conta que em 1975, período em que o país passava pela ditadura militar, o governo fechou a única rádio que existia em São Borja, a Fronteira do Sul, e o município ficou aproximadamente dois anos sem nenhuma rádio. Tento em vista a falta de comunicação entre a população interiorana com a citadina, em 1977, “um grupo de empresários locais, que não tinham nada a ver com rádio se uniu, foram até Brasília, porque todos tinham ligações partidárias e conseguiram a concessão de uma rádio para São Borja, a Julho/2017

Rádio Cultura” relembra. No período de desenvolvimento entre 1977 a 1989 a rádio ganhou corpo. Sobre o comando de Roque Andres, entre os anos 1985-1986, época que surgiram as primeiras emissoras de frequência modulada no Brasil – foi concedida uma nova frequência radiofônica, dando origem a Rádio Fronteira, que acabou por impulsionar o desenvolvimento local. “Eu acredito que ele (Roque Andres) é o grande incentivador e motivador do desenvolvimento da rádio em São Borja. Então nessa era, a rádio quando abriu, mudou a ideia de que se tinha um vinculo político porque abriu a rádio para a cidade, passamos a chamar a rádio da comunidade, transmitíamos esporte, notícias e informações a todos”, conta Degrazia. Em tempos de censura, o rádio, especificamente a programação esportiva passou a ser, muitas vezes, o único momento com espaço de total liberdade de expressão. “Na época havia muita censura, muitas coisas eram censuradas, as músicas vinham censuradas e a progra

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passaram a sintonizar fielmente a estação de sua preferência. Responsável por integrar as comunidades, o rádio, em função de sua capacidade de ao mesmo tempo em que informa, diverte, tornou-se uma atividade indispensável.

Mais que um hábito Consolidado historicamente como um veículo de utilidade pública, o rádio manifesta o pensamento, a criação, a expressão e a informação demandada pela sociedade. Ouvido em qualquer lugar: em casa, no trabalho, em meio a outras atividades, em qualquer horário, transformou-se no meio de comunicação com maior ligação com a comunidade. Valores sociais, éticos e culturais perduram com responsabilidade e valorizam a cidadania. “Eu escuto rádio há mais de 50 anos, não me lembro nem da primeira vez, eu era moço quando o rádio chegou. Hoje eu estou sempre com o rádio por perto, estou fazendo minhas coisas e com ele ali do lado, o pessoal de lá é bem comunicante, ajuda quem precisa e dá notícias de toda parte aqui de perto” conta o fiel ouvinte Beijamin Lourenço, de 84 anos. Partida de futebol, debate político, espaço de vendas, músicas, notícias, mensagens de otimismo, as ondas do rádio transmitem muito mais que só informações, trazem consigo alegrias e sentimentos. Compartilham momentos, crises, expectativas. Ouvir rádio, para aqueles que ao acordar sintonizam automaticamente na sua estação, significa muito mais que um hábito, é sinônimo de companhia, amadurecimento, de aconchego e de satisfação.

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mação era primeiro aprovada pelos censores. O futebol foi a válvula para isso, a comunidade abraçou a sociedade de São Borja e foi por muito tempo o carro chefe da rádio” afirma Degrazia. As rádios passaram a ocupar o tempo das pessoas, passando a trabalhar pela comunidade. O fortalecimento desse veículo de comunicação propiciou o início de diversos profissionais como Ibaro Rodrigues e Eugenio Dutra. “Geralmente o radialista começa por acaso, e eu não fugi muito dessa regra. Eu me recordo que na minha época de garoto a gente tinha muito futebol em campinhos de bairro, a gente jogava e eu me inspirava em narradores e jogava narrando e foi mais ou menos dai que iniciou a minha carreira na rádio” relata Ibaro. Com longa experiência no ramo radiofônico Eugenio Dutra relembra seu início como radialista. “Eu comecei em rádio exatamente quando foi inaugurada a Rádio Cultura de São Borja, e já se vão 40 anos, de lá pra cá eu trabalhei na Rádio Caiçara em Porto Alegre por alguns anos, trabalhei algum tempo na Rádio Comunitária Butuí FM e a maioria desse tempo todo foi na Rádio Cultura de São Borja. Também trabalhei um pequeno período na Rádio Fronteira FM”. Segundo o radialista, “me identifico mais com programas populares, aquele que você interage com o ouvinte, eu entendo que o rádio tem esse mecanismo, essa facilidade de prender um pouco o ouvinte, interagindo até mesmo com ele”. Ferramenta de cunho social, o rádio trouxe novas perspectivas à comunidade. Mudanças na linguagem, no cenário social do país e na formação de opinião afetaram não somente os locutores, mas também todos aqueles que


A tradição do Jornal Impresso em São Borja

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Produção: Emanuelle Righi e Gabrielli Leiria

Foto: Emanuelle Righi

Casal sentado na praça lendo o jornal

Ao amanhecer, ainda com os primeiros raios de sol anunciando um novo dia, a pequena cidade do interior desperta, ao um som conhecido, é possível ouvir o freio da bicicleta e o barulho da sua viagem da mão do jornaleiro até as portas das residências são-borjenses: o jornal está entregue na porta, para lhe informar sobre as principais notícias do dia.

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ão precisa ser assinante para ter a informação em suas mãos, basta ir até a banca da Praça Matriz, XV de novembro, lá você encontra os mais antigos moradores, que sentam nos bancos da praça para saborear a leitura do jornal impresso, enquanto tomam seu sol da manhã Os mais jovens vivem correndo contra o tempo, mas não se preocupe em qualquer semáforo você vai ouvir o vendedor do dia: JORNAL DE HOJE. Basta uns trocados para ter em suas mãos o jornal

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impresso, tradição na cultura da Cidade de São Borja. Mas não é por ser uma cidade pequena que ela não carrega histórias, no jornalismo, principalmente no jornalismo impresso. Essa narrativa começa antes mesmo do jornal impresso estar presente em forma industrial de produção, pode-se dizer que começa na transmissão de informação entre pessoas. Tem início com os jesuítas onde escreviam as chamadas cartas anuas (chamadas assim porque eram escritas anualmente), para seus su-

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junto sem ter um espaço especifico para cada assunto, era um formato mais rudimentar sem a ajuda visual de fotografias. Em formatos standard, sua linguagem era mais rebuscada e formal se aproximando da literatura, pois o jornal era direcionado para as elites da cidade, pois a leitura desses materiais era para poucos. Em seguida, 1907, fecham-se as portas do jornal “Uruguay” e em 1922 o jornal “O Garoto” faz uma homenagem em uma de suas edições ao 15º aniversário do jornal “Uruguay”. Com circulação toda a quarta-feira, pertencia ao General Manoel do Nascimento Vargas, pai do ex-presidente Getúlio Dornelles Vargas, com seu conteúdo que se definia como integrante do partido republicano, foi o jornal que mais durou em relação aos outros, há indicações que tenha circulado até 1952. Não apenas o jornalismo, mas o jornal impresso teve várias fases. Os jornais da época não se mantinham por muito tempo, pois, existia revoluções de governos, onde a primeira coisa que faziam era tomar a prefeitura e logo tomavam o jornal para divulgar suas ideias. Ao viajar um pouco mais entre as páginas do jornal impresso, em 1940 começa a circular o “Jornal de São Borja” fundado pelo são-borjense João Belchior Marques, conhecido também como Jango. Com uma postura de oposição ao Partido Trabalhista Brasileiro (PDT), suas publicações não mostravam explicitamente suas ideologias, o que diferenciava dos outros periódicos da época. O curioso de se observar nas páginas do jornal era como os cobradores faziam notas requerendo seus devedores, inclusive citando o nome, ato que hoje é proibido. A família Grisólia de São Luiz Gonzaga havia comprado a “Folha de São Borja” onde o jornalista Newton Falcão come-

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periores hierárquicos em Roma, relatando os acontecimentos de atividades feitas em cada povoado, assim transmitindo a informação para outros lugares. A maioria das pessoas que aqui habitavam eram compostas por pessoas analfabetas e índios, então assim a informação tinha que ser passada pelos padres jesuítas de forma oral. Se tratando de jornal impresso tiveram que se passar 200 anos da fundação de São Borja para vir o primeiro periódico. 1884 o jornal “Eco das Missões” foi o que a abertura para a informação impressa. Em seguida foi substituído pelo “O Município”, mas logo encerra. Em 1888 surge “O Movimento” fundado pelo Dr. Álvaro Baptista da Costa a favor do abolicionismo republicano. Em meados de 1895, Aparício Mariense da Silva funda o jornal “13 de Janeiro” de circulação semanal que era tido como um órgão do Partido Republicano, criado para seguir como se conhece hoje um jornalismo doutrinário. A história do jornal impresso se destaca com grandes publicações no século XX. Em 1902 é fundado o jornal “Missioneiro” dirigido por Genaro Bejarano que anteriormente dirigia o jornal “13 de janeiro”. As diagramações destes jornais eram bem diferentes de como são conhecidos hoje, em modelo standard era dividido em quatro colunas, redigidos de uma forma muito semelhante de um livro, mas o que diferenciava era algumas propagandas. A história continua em 1906, não há afirmações sobre a data de surgimento o jornal “Uruguay”, distribuídos todos os sábados, continha cinco colunas de texto, distribuídos com notas de casos de polícia, assuntos sobre saúde, coluna social, que seriam notas sobre os aniversários, viagens, chegadas de pessoas importantes da comunidade, enfim diagramado tudo


Foto:Emanuelle Righi

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Newton Falcão na sede do seu jornal

çou sua carreira, ganhando um concurso pois procuravam de um redator. Falcão ainda com seus 15 ou 16 trabalhou ali por dois anos, até a família Andres comprar a folha. O “Jornal de São Borja” surge quando os Grisólia vão para periódico e convidam Newton para ir trabalhar lá onde fica por um ano. Logo sai para ir para Porto Alegre estudar jornalismo. Ele teve sua história baseada em jornais, cresceu no meio das notícias e da escrita, fez parte de vários jornais da cidade e segue até hoje no jornal “O Regional”: “Eu participei da criação de vários jornais, o “Jornal de São Borja” foi o primeiro, depois teve o jornal “Tribuna da Fronteira” desde o primeiro exemplar eu trabalhei, e depois eu comprei e fiquei uns oito ou dez anos trabalhando. Depois o jornal “O Exclusivo” também trabalhei e assim foi 1974 até hoje eu passei por quase todos”. Após 1974, o jornal passou a pertencer a família Andres, o atual proprietário do maior jornal em circulação da cidade, Roque Andres, conta que a oportunidade apareceu após o desejo dos Grizólia’s em se desfazer do Jornal e sua vontade em Julho/2017

fazer algo que gostava: escrever. Entre os fatos históricos e cronológicos dos jornais impressos que já circularam por São Borja, o jornalismo modificou-se conforme as mudanças tecnológicas e o crescimento econômico da cidade. A produção de um jornal na década de 70 era um processo demorado e precário, precisava-se de tempo e habilidades manuais para conseguir “ fazer a forma” do jornal diário. Se nos grandes centros do país o processo era complicado, em São Borja a editoração era um desafio constante. O processo da montagem dos textos e manchetes eram feitos em formato de “boneco”, as letras eram recortadas e enfileiradas uma por uma, afim de construir o texto. Errar significava recomeçar do zero, se hoje os jornalistas reclamam das funcionalidades dos programas de diagramação, naquele tempo parecia um sonho distante, imaginar a produção de um jornal em horas. Roque relembra as viagens que o impresso fazia para chegar às mãos dos leitores, era preciso dirigir até Santo Ângelo para realizar a entrega do material que iria para a impressão. Foto: Emanuelle Righi

Roque Andres no escritório do jornal A Folha de São Borja

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A modernização do Jornalismo e a inserção do webjornalismo não atingiu a cultura são-borjense de assinar e ler o jornal impresso. A comunidade ainda traz nas suas raízes a magia de encantar-se com o manusear da folha de jornal entre suas mãos. O jornalismo impresso permanece forte como o principal veículo informativo da cidade. A inserção da Universidade Federal do Pampa e o Curso de Jornalismo, tem sido elementos fundamentais para manter a vida a tradição. A Prof. Mara Ribeiro do Curso de Jornalismo trouxe na sua tese de doutorado, a história da imprensa em São Borja e seu papel como principal canal de informação durante a ditadura militar. Para a cientista, o jornal na cidade colabora para a construção de identidades, representações e debates, ainda que envolvam interesses econômicos e partidários. O curso de Jornalismo tem contribuído para fomentar o debate sobre a pratica jornalística na cidade e na região e a perspectiva crítica para a sociedade. As produções despertam novos sonhadores, como um dia o jornalismo Newton Dorneles, sonhou em viver para levar informação, ou Roque Andres que investiu seu dinheiro para manter viva sua paixão pelo jornalismo. As folhas cinzas seguem acompanhando os antigos moradores, informando os que passam de viagem por aqui, despertam o gosto pela leitura daqueles que o leem pela primeira vez, ainda na infância e aguçam a vontade dos jovens em contar histórias. As páginas do jornal impressos ainda contarão muitos fatos e histórias sobre São Borja e para a cidade São Borja, essa edição parece que nunca chegará ao seu fim.

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Cultura em Pauta

As horas de espera até o momento de levar o jornal para a circulação, só chegaram ao fim em 1992 , com a era da internet. Mas, apenas em 1995, o material passou a ser enviado via internet e retornava pela inha intermunicipal de ônibus, atividade constante até hoje, como uma forma de conter gastos. Um jornal tem importância no desenvolvimento de uma cidade, o jornalismo tem a capacidade de informar, fomentar reflexões e formar o senso crítico na sociedade do meio que está inserido. ¬Newton Falcão reflete como a tecnologia possibilitou a abrangência, colaboração e interatividade entre o Jornalismo e seu leitor, porém ele relembra que na sua época de repórter os textos tinham uma qualidade e preocupação com as técnicas jornalísticas. Para o jovem jornalista, a dificuldade em entrar em contato com as fontes e a precariedade dos meios de comunicações existentes, não eram motivos para não realizar um excelente trabalho. Ele relembra como batalhou por furos de notícias e como era a sensação de conseguir enviar e fechar uma reportagem com todas as diversidades da época. Todas as dificuldades enfrentadas foram essenciais para reforçar a importância da impressa em São Borja e mantê-la viva, a cidade tem grandes acontecimentos históricos, uma cidade com um forte berço político, sempre precisou que suas histórias fossem contadas e informadas a sua população. O proprietário da Folha de São Borja, reconhece a importância como um veículo informativo, mas também como um meio de fiscalizar e cobrar dos poderes públicos pleitos que venham em benefício da comunidade. Além disso, serve como um registro histórico da vida na cidade, funcionando, assim, como uma espécie de arquivo.


LUZ, CAMÊRA E AÇÃO

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São Borja em um passado não muito distante possuiu muitos espaços para exibição cinematográfica. Atualmente, sem nenhum cinema na cidade, ações tentam resgatar a experiência de viver essa arte

O Cinema Vitoria foi o primeiro cinema de São Borja, abriu suas portas no início do século XX. Crédito: Página São Borja de outros tempos

No dia 20 de junho de 1915, mais precisamente em um sábado, o Jornal Missioneiro circula pela cidade de São Borja na sua edição nº 49. Uma das chamadas no papel era um tanto peculiar: “Cinema Familiar” anunciando a exibição de um drama policial chamado “Os Abutres de Paris”. Essa seria, então, a primeira exibição cinematográfica que marca a história da cidade. Hoje, passados mais de 100 anos, São Borja não possui mais cinemas. No entanto, a história da cidade sempre contou com diversas salas de exibição cinematográfica. Foi assim que, no início do século XX, o primeiro cinema de São Borja abriu suas portas. O Cinema Vitoria, com capacidade para cerca de 200 pessoas virou a principal

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atração da cidade. Uma presença sempre marcada em cada sessão do Cine Vitoria era o vendedor João das Balas, que hoje nomeia o espaço infantil da Praça XV de Novembro no centro da cidade. Parte das boas lembranças da adolescência de Jane Almeida Devens foram vividas na sala desse cinema. Encantada pelos filmes de faroeste que passavam na tela, Jane aproveitava as tardes para entreter-se. “Era o único divertimento que havia. Estava sempre cheio nos fins de semana e nas quartas-feiras. Era um tempo bom”, conta saudosa. O primeiro cinema a abrir foi também o primeiro a fechar as portas. Por volta de 1920, o “Cine Teatro Municipal” surge na cidade. Registros

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apontam que o primeiro proprietário foi Carlos Drago. Suas exibições eram do cinema mudo acompanhado de música ao vivo – comum para aquele tempo. Já em 1970, o local muda de nome, passando a se chamar “Cine Variedades”. Naquela época, seu proprietário, Joaquim Macedo conquistou com uma grande aceitação do público São-Borjense.

ao mezanino. Um ponto específico era reservado para venda de balas e caramelos. As crianças aproveitavam a ida ao cinema para trocarem seus gibis. A sala para exibição era grande e acomodava cerca de 500 pessoas. Assim como o Cinema Vitoria, todas as poltronas eram de madeira. “Segundo minha pesquisa, esse era o cinema mais popular, tinha um teto alto, palco elevado em relação ao piso onde estava fixada a tela e tinha um segundo andar que parecia algo como um camarote”, explica Godoy.

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Apenas a placa do Cinema Variedades continua em seu antigo local. Crédito: Louise da Campo

O estudante de jornalismo, Ricardo Godoy desenvolveu seu interesse pelos cinemas da cidade através das histórias de seu pai que havia trabalhado na juventude em um deles. Godoy, após entrar no grupo de pesquisa O fazer e exibição cinematográfica no interior do estado, coordenado pelo professor Alexandre Augusti na Universidade Federal do Pampa, realizou um estudo a respeito dos antigos cinemas da cidade. “Não considero que tinha um cinema mais importante. Cada um proporcionava interação entre as pessoas e trazia filmes do gosto do público. Um exemplo disso é o filme do Teixeirinha que reuniu filas e filas nos cinemas”, conta. Duas escadas de concreto marcavam o saguão do Cine Variedades. A escada ao lado esquerdo levava à cabine de projeção e às gerais. Enquanto a do lado direito,

Onde hoje é a Câmara Municipal de São Borja costumava ser o “Cinema Municipal” Crédito: Louise da Campo

Quando encerraram as atividades do “Cine Variedades” surgiu o “Cinema Municipal” criado pela prefeitura de São Borja em parceria com Joca Mateus. Com capacidade para 380 pessoas não vingou por muito tempo, o prédio precisou ser cedido para se tornar a atual Câmara de Vereadores. Joca Mateus não perdeu tempo, comprou os equipamentos do “Cinema Municipal” e abriu o “Cine Presidentes”. Quem recolhia os ingressos na entrada do Cine Presidentes era o pró

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O projeto Cine Campus do IFFAR une a exibição de filmes ao debate Crédito: Louise da Campo

prio Joca, mais conhecido como “Seu Joca”. Com a idade avançada, Seu Joca não conseguia se manter acordado por muito tempo e acabava dormindo sentado. Com isso, muitas pessoas aproveitavam para entrar no local sem entregar os ingressos. Essa é uma memória viva na mente de Antônio Cândido da Silva que, aos 41 anos, tem o Cinema Presidentes como parte importante de sua trajetória. Quem comandava o cinema era a “Dona Maria”, esposa do Seu Joca, uma senhora séria e ranzinza que conseguia dominar toda juventude e garantir respeito. “Teve uma sessão que eu era muito pequeno, era o Let Be Rock do AC/DC, que era um filme de rock. Foi uma loucura porque eu lembro de estar assistindo e começarem a explodir bomba dentro do cinema. O pessoal gritava muito e a Dona Maria foi lá tirou o som do filme e falou: ‘Olha, eu só vou colocar o som se vocês se comportarem’”, relembra Antônio. Um marco para São Borja, o Cine Presidentes, além das sessões de seJulho/2017

gunda a segunda, o lugar também causava polêmicas. Pelo menos duas vezes por semana eram exibidos filmes pornográficos para o público adulto. “É engraçado pensar que tinha isso em uma cidade conservadora como São Borja”, diz Antônio. Atualmente Antônio é o coordenador do projeto de extensão “Cine Campus” do Instituto Federal Farroupilha, projeto que tem como objetivo proporcionar um espaço para exibição cinematográfica e debate. O amor de Antônio pelo cinema começou cedo. O primeiro filme que assistiu foi com cerca de três anos, Superman (1978). Seus pais precisaram se retirar da sala de cinema, pois no momento que o filme começou Antônio não parou mais de chorar. O pavor com o tempo se tornou paixão. Na adolescência, ia ao Cine Presidentes assistir o mesmo filme mais de uma vez, só para ter a experiência de estar na sala escura em frente a uma grande tela. Porém, para tristeza de Antônio, em 1989 o local fechou. “Quando ele fechou, eu e meus amigos ficamos ór-

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fãos do cinema, aquilo era muito importante para nós”, comenta. A frente do Cine Campus há quatro anos, Antônio aproveita suas experiências com o cinema como uma forma de aprimorar o projeto. Apesar das dificuldades estruturais, o técnico administrativo adaptou a sala cobrindo as janelas com papel pardo para evitar entrada de luz, produziu trilha sonora com músicas de filmes e colocou trailers antes das exibições com o intuito de tornar o mais próximo possível de uma real experiência no cinema. “Não é uma sala de cinema, mas é quase”, explica.

dora de DVD’s e uma lancheria. Porém o empreendimento, assim como o Cine Teatro Municipal, acabou em um ano por falta de recursos para a manutenção. Desde então São Borja não contou com mais salas de cinema.

Cinema em casa

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Assistir a um filme no conforto de casa, essa é a praticidade que a chegada das fitas VHS e dos DVD’s trouxeram para São Borja. A diminuição dos públicos do cinema se deu através desse conforto que as videolocadoras traziam. A chegada da internet também facilitou o acesso aos As últimas cenas filmes com custo e comodidade muito mais vantajosos, fazendo com que as Em 1998 o Centro Cultural parou pessoas escolhessem outros filmes suas atividades e o Cine Presidentes aos que o cinema passava. Mas esacabou. São Borja passou cinco anos ses fatos não impactaram apenas São sem cinema. Entre os anos de 2003 e Borja. Segundo levantamento divulga2009 a cidade teve suas últimas salas do pelo IBGE em 2015, apenas 8,7% antes de ver um dos seus maiores en- dos municípios brasileiros possuíam tretenimentos acabar. Em 2003, o em- cinema em 2006, logo depois da expresário Oneron da Rocha fundou o plosão dos DVD’s no Brasil em 2003. “Cine Teatro Municipal”, mesmo nome Outro fator para a falta de cinemas em do antigo. Com ambiente mais moder- São Borja é o custo para os habitanno, o cinema possuía cadeiras estotes. Segundo o professor Alexandre fadas, climatizador e capacidade para Augusti, pesquisador na área, o preço 150 pessoas. Localizado na esquina para ingresso nos cinemas da cidade entre as ruas Riachuelo e João Palnão eram caros, mas a preferência por meiro, o Cine Teatro Municipal durou outras atividades de entretenimento apenas um ano e fechou em 2004. O entrava em prioridade diante das salas empresário Oneron Rocha então pas- de cinema. “Naquela época, o ingresso sou a realizar espetáculos itinerantes era um pouco mais que uma cerveja, pelo estado com o cinema Cineron. mas não era prioridade. As pessoas Em um intervalo de quatro anos surgiu até valorizavam cultura, mas não valoa sala de cinema JR Entretenimentos, rizavam mais do que outras coisas que de propriedade de Jussara Radiske. A tinham como prioridades, como sair”, sala era localizada junto a uma locaexplica o professor.


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A falta de público diminuiu o lucro de empresários dispostos a empreender no ramo cinematográfico no município. Apesar do levantamento sobre investimento da cultura do IBGE indicar um aumento de 19,5% de municípios brasileiros com salas de cinema, os números ainda não incluem São Borja. A secretária de Cultura Caroline Aquino conta que a manutenção de um cinema vem com gastos que os proprietários não conseguem arcar. “O grande problema que eu vejo hoje é a manutenção do custo, e da não fidelidade do público. Pois quando eu ia ao cinema rodavam o filme para dez, cinco pessoas. Os empresários não conseguiam manter a infraestrutura com o tempo”, relata Aquino.

Um novo público

Com pesquisas, estudos e projetos envolvendo filmes, séries e documentários, São Borja volta a pensar na possibilidade de trazer o cinema. Não faltam motivos para que a cidade projete uma sala de cinema, já que os estudantes vindos de outras cidades formam um novo público interessados na cultura da arte cinematográfica. A secretária Caroline Aquino ressalta que os jovens surgem com uma curiosidade pelo mundo audiovisual. “Temos a questão de pessoas e jovens que gostam de trabalhar na arte, então esperamos que algum investidor se interesse, mas a curto prazo não posso dizer que existe algum investidor em cinema”. A secretária trabalhou no Cine Presidentes, quando jovem vendia ingressos e balas na bilheteria. “Faço votos de que alguém Julho/2017

se atreva a buscar esta clientela. Hoje nós temos tantas salas de cinemas em outras cidades que são investimentos que geram retorno e levam a arte para a comunidade”, afirma Aquino.

Cinema em sala de aula Enquanto a cidade ainda não possui um cinema fixo, a população criou outros meios de reproduzir a sensação de estar em uma sala de cinema. A pesquisa na universidade e nas escolas da cidade faz com que a cultura cinematográfica se mantenha e também ajuda na formação de estudantes mais críticos. O professor Alexandre Augusti destaca a importância das pesquisas para registro da memória audiovisual de São Borja. “Existe uma solidificação destas instituições de nível superior nas regiões de fronteira, para estas cidades se desenvolverem mais. Os estudantes trazem a pesquisa do cinema para sua valorização profissional e os projetos que desempenham dentro da universidade”. Na Unipampa - Campus São Borja, os estudantes e docentes promovem grupos de pesquisa e projetos de extensão voltados ao cinema. O “Sessão Pipoquinha” acontece desde 2008, com a coordenação da professora do curso de Jornalismo Mara Ribeiro. O projeto propõe ciclos de filmes temáticos na universidade. Com o apoio do Sindilojas, o conta com estudantes voluntários que ajudam na realização das

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professores e técnicos do IFFAR podem contribuir com a discussão sobre os filmes. As questões são apresentadas pelos próprios alunos e debatidas como modo de aprendizado. O Cine Campus acontece na forma de ciclos e a cada mês apresenta uma temática para a exibição. Atualmente, a Secretaria de Cultura de São Borja tem trabalhado, em parceria com a Rio Grande Energia (RGE), para a exibição de filmes através do Roda Cine. No mês de junho a cidade recebeu o cinema drive-in Cine Autorama, no qual as pessoas podem assistir as exibições em seus carros. O Cine Autorama passou por entorno de 20 cidades de São Paulo e do Rio Grande do Sul. A tela grande passando filmes clássicos como “Grease – nos tempos da brilhantina” e atuais como o filme “Elis” sobre a cantora Elis Regina, trazem a nostalgia dos tempos em que a Terra dos Presidentes oferecia à população espaços para exibições cinematográficas. Hoje, resta na memória as lembranças de quem pode um dia conhecer esses cinemas. “O cinema era um espaço que representava diversão ligada a filmes. Agora mudou tudo, tudo funciona olhando pela internet. Era outro mundo”, desabafa saudoso Antônio Cândido da Silva.

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sessões. Para a estudante de Jornalismo e ex-bolsista do Sessão Pipoquinha Bárbara Ramos o diferencial do projeto é o debate pós-filme que inclui a interatividade entre o público. O projeto acontece dentro e fora da universidade para que os públicos que não estão inseridos no meio universitário também possam participar. “O fato de ter uma exibição de filmes em sala remonta no imaginário dos participantes a ideia de estar em uma sala de cinema e faz com que tenham essa experiência, ter acesso a esse tipo de cultura em uma cidade que teve todas as salas de cinema fechadas”, destaca Bárbara. O projeto de extensão “CINE FILO – Provocações filosóficas da Arte Cinematográfica” do professor de Serviço Social da Unipampa, Sérgio Ricardo Gacki promove a interação entre o público, o filme e assuntos contemporâneos. O Cine Filo tem como audiência a comunidade acadêmica e traz discussões, reflexões e debates acerca do que acontece no Brasil e no mundo. Em um de seus últimos eventos o tema era voltado à crise política brasileira e a ascensão do aplicativo de jogo Pokémon Go. O Cine Campus do Instituto Federal Farroupilha (IFFAR) – Campus São Borja coordenado pelo técnico administrativo Antônio Cândido, começou suas atividades em 2012 e oferece um ambiente de estudo, cultura e lazer. Estudantes,


Peixes: patrimônio social e econômico

A cidade interiorana do sul do país é caracterizada pela produção e cultivo de peixes, um fator econômico importante e uma forma de renda para muitas famílias

Localizada na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, São Borja é conhecida por ser uma cidade que se desenvolve através de atividades rurais. Porém, há décadas o município também promove o comércio de peixes, consequência da atividade de pescadores artesanais, piscicultores e proprietários de restaurantes que transformam o peixe em produto de sustento. A fauna ictiológica (fauna de peixes) do município compreende mais de 100 espécies já catalogadas no rio Uruguai. Banhada pelo Rio Uruguai, a pesca artesanal, atividade antiga e tradicional no município, é exercida por aproximadamente 250 pescadores. A piscicultura, criação de peixes, surgiu na região da Fronteira Oeste no setor agropecuário com o intuito de diversificar e gerar renda em propriedades. Não existem dados estatísticos sobre a atividade no município, mas aproximadamente dez famílias praticam a atividade. O cais do porto é um ponto forte de favorecimento ao comércio da espécie, pois os estabelecimentos do local oferecem pratos de peixes diversificados, movimentando a economia da cidade. O peixe, além de alimento rico em nutrientes e proteínas, se tornou fonte de renda essencial para parte dos são-borjenses. A Empresa de Assistência Técnica e Rural do Rio Grande do Sul (EMATER) é uma das principais parceiras nas atividades de pesca e piscicultura em São Borja. Segundo o chefe de escritório da

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Foto: Thaisy Finamor

Por: Lauren Serpa, Maria Isabel Ramos, Stephanie Vieira e Thaisy Finamor

Pescaria no Rio Uruguai.

EMATER-RS Odacir Decol(36), a função da empresa é apoiar a categoria de pescadores e piscicultores ajudando na melhoria das condições de trabalho. “Orientações e incentivo com relação ao processamento do pescado e comercialização, visando agregar valor e aumentar a renda das famílias é um de nossos objetivos” afirma o secretário. Aos piscicultores a empresa proporciona auxilio tecnológico. “Nossas atividades envolvem toda a tecnologia para a piscicultura, que envolvem desde a questão técnica para a construção do açude, adubação dos açudes, orientações sobre os sistemas de criações, orientações sobre as espécies e outros processos” comenta Odacir. A determinação do lucro da comercialização dos peixes depende de fatores como o rendimento dos açudes nas propriedades, para quem cria as espécies e das condições do Rio Uruguai para quem pesca.

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“Em açudes não se tem a garantia de quando vai dar certo, não se sabe quantos peixes morreram e quantos se desenvolveram” comenta o produtor. Essa possibilidade reafirma a importância da capacitação para quem lida com a produção de peixes. O manuseio, higiene, condições de transporte e armazenamento são quesitos considerados básicos para quem faz o comércio das espécies, conta Geraldo. O produtor e a esposa Marisa Pereira (66) vivem da venda de tudo que produzem e a produção de peixes está entre as atividades mais lucrativas. Na propriedade de Geraldo, a criação de peixes é chamada de despesca, pois há cuidados para retirar os peixes dos açudes em tamanho apropriado para a venda, o que a pesca comum não realiza. Uma variedade de peixes é retirada dos açudes da propriedade, como: pacú, carpa, cabeça grande, prateado e carpa capim. A partir do tipo da variedade são inseridos os valores para comércio, que variam de 14 a 18 reais o quilo. A venda é realizada diretamente para o consumidor que vai até a propriedade. O Cais do Porto, ponto turístico de São Borja é banhado pelo Rio Uruguai e é nesse local que pescadores artesanais praticam a pescaria. A pesca em rio exige preparação técnica e instrumentos de trabalhos adequados para a captação dos peixes. Até mesmo para quem se criou na beira d’água, como o pescador Paulo Siqueira (46). O pescador comenta que é preciso trabalhar todo dia para obter um bom lucro. “Quando se tem bastante material, se tira 15 a 20 quilos por dia” ressalta Paulo sobre sua rotina. Paulo vende peixe avulso em sua própria casa e tem o negócio como fonte de renda única.

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É notório que para a cidade de São Borja a produção da pesca tem grande importância para a economia e renda dos produtores. No município se encontra uma série de pescadores artesanais que dependem economicamente dessa renda para a sobrevivência. No quesito de produção e comércio de peixes, o secretário da Agricultura e do Meio Ambiente Fábio Fronza (32) conta que o município ainda está em processo de desenvolvimento, mesmo assim, a atividade continua sendo significativa para a cidade. “São Borja é uma cidade que vive da agricultura, da pecuária e da pesca. É um município extremamente rural e eu incluo a pesca nesse meio”, destaca. A pesca e a criação de peixes proporcionou a pessoas desconhecidas um ofício em comum. Através destas atividades se formaram em São Borja a Associação de Pescadores APANBRU e a Colônia de Pescadores Z-21. Segundo o secretário, através de reuniões, pescadores e piscicultores puderam firmar uma relação visando a melhoria das atividades. Além do comércio de peixes ter um valor econômico para os produtores, ele também é visto como elemento cultural da cidade. “O município é abençoado por ter o rio Uruguai. Os comércios no Passo que vendem peixe são culturais da nossa cidade, oferecem essa refeição para os visitantes” ressalta Fábio. A criação de peixes exige técnica e grandes investimentos. Geraldo Pereira (69) produtor rural e piscicultor conta que, o principal gasto foi com a construção dos açudes e o lucro aconteceu somente após alguns anos. Segundo ele, a piscicultura pode ser considerada um negócio incerto.


Foto: Thaisy Finamor

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Açude da propriedade de Geraldo onde são cultivados diversas espécies de peixes.

Para quem vive da pesca como ele, não há melhor época para pescar, pois a atividade proporciona grande satisfação. “Eu não vejo dificuldades na pesca, eu levanto as cinco horas da manhã e vou para o acampamento. É só gostar de pescar e ter material” ressalta Paulo. Para agregar valor ao trabalho de pescadores e piscicultores, o munícipio conta com eventos temáticos, como a Feira do Peixe. Tradicional há aproximadamente 20 anos, o evento acontece durante a Semana Santa e tem como objetivo oferecer diversas espécies de peixes para os são-borjenses. O secretário Fábio Fronza comenta que a feira foi criada com o objetivo de complementar a renda dos produtores. “Inserir alimento de qualidade na alimentação das pessoas, o peixe é um alimento de excelente qualidade e que temos em abundância no município de São Borja, esse é um dos objetivos da feira”, ressalta. De acordo com o secretário, o governo do município está planejando a organização de mais evenJulho/2017

tos que estimulem o comércio de peixes. A participação na Feira do Peixe se tornou fundamental para quem lida com a atividade da pesca ou criação das espécies. O piscicultor Geraldo Pereira, que participa há 10 anos da Feira do Peixe, comenta que a mostra lhe proporciona um lucro extra, pois já trabalha com o comércio de peixes em sua propriedade. “No município a feira é feita com o objetivo de oferecer um produto bom com um preço razoável e que toda população tenha acesso”, afirma Geraldo. O peixe é considerado um dos alimentos mais saudáveis que se pode encontrar na natureza, concentrando nutrientes, vitaminas e proteínas. Em geral, todos os peixes são benéficos para a saúde e por essas qualidades e pelo seu sabor, cada vez mais pessoas buscam pratos feitos à base deles. Em São Borja a procura por estes pratos acontece constantemente. O Cais do Porto à beira do Rio Uruguai alémde concentrar pescadores artesa-

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nais na busca das espécies, conta com um grande movimento de turistas à procura de um bom restaurante que sirva praO peixe garante um lutos com peixe. A proprietária de um rescro significativo aos dotaurante Ana Luiza Gomes (49) comenta nos dos restaurantes em que, “a procura pelo peixe é muito granSão Borja, além de ser a de, o que mais servimos é o peixe frito e base da subsistência de o pastel de peixe, normalmente pessoas muitas famílias. de fora vem até aqui a procura”. Devido à forte influência da pesca no município e também as qualidades nutricionais do peixe e de seus pratos, as vendas de refeições servidas da carne da espécie tendem sempre a aumentar. O peixe garante um lucro significativo aos donos dos restaurantes em São Borja, além A forte venda de rede ser a base da subsistência de muiceitas produzidas com tas famílias. peixe vem da influên-

Foto: Thaisy Finamor

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cia da pesca do município, e também da qualidade nutricional dos pratos.

Restaurantes do cais do porto optam por receitas com peixes para obter lucros.

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Um local da imaginação ao conhecimento A Biblioteca Pública Municipal Getúlio Vargas divide espaço com o Museu Apparício Silva Rillo e é uma das mais completas do Rio Grande do Sul Por Alexia Saner, Matheus Charão e Nathália Trindade

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de Quevedo Acosta. “Tem leitores que, ao observar como os nossos livros são cuidados, compram um livro, fazem a leitura dele e já nos trazem para doar’’, comenta Cristiane. Outra forma de possuir obras clássicas e lançamentos é através da compra, assim esclarece a agente. “Algumas obras foram adquiridas com compras através do nosso caixa das multas pelos atrasos de devolução’’, informa. O acervo é vasto e conta com livros que perpassam todos os temas. Desde a história de figuras importantes para a história de São Borja, os vários exemplares de dicionário e de enciclopédias, a Biblioteca ainda dispõe de obras essenciais para a literatura e lançamentos, também oferta aos leitores revistas de história em quadrinhos e o acervo de livros infantis e um espaço destinado a concursos e exames, como o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM).

Créditos: Alexia Saner

A Biblioteca Pública de São Borja iniciou os trabalhos envolvendo o acesso à cultura, educação, informação e inclusão da população no ano de 1960. Durante alguns anos, o espaço funcionava na sede da Prefeitura do Município, no entanto, o local tornou-se pequeno para a quantidade de livros e de leitores que ali frequentavam. Por isso, foi necessária a criação e mudança para um ambiente mais espaçoso e que pudesse melhor abrigar o acervo e também receber os leitores que visitavam a Biblioteca. A fim de obter um espaço agradável ao público e a estética do acervo literário, um novo prédio, localizado na Travessa Albino Pfeiffer, número 84, tornou-se o espaço de literatura e educação e, até hoje, é utilizado para ser o lar da Biblioteca Pública Municipal Getúlio Vargas. Já no ano de 2006, a biblioteca passou, mais uma vez, por reformas. Dessa vez, foram incluídos computadores de mesa para a realização de pesquisas para trabalhos escolares e universitários. Além disso, o local oferece mesas de estudo e um espaço dedicado somente às crianças e a literatura infantil. Com um total de 22.869 mil obras, o acervo de São Borja é considerado um dos mais completos do Estado. Para atingir esse status, a Biblioteca conta com o apoio anual do Sistema Nacional de Bibliotecas que proporciona grande parte das obras expostas nas prateleiras também conta com doações de livros realizadas por leitores, como explica a agente e responsável pela Biblioteca Cristiane

A Biblioteca Pública Municipal Getúlio Vargas recebe livr os através da parceria com o Sistema Nacional de Biblioteca, da compra pessoal e também de doações de leitores.

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to. de jornais antigos, recortes de jornais e revistas de diversas temáticas e que podem ser consultados pelos visitantes. Por isso, o perfil dos leitores é composto por pessoas de diferentes gerações. Desde crianças interessadas pela literatura infantil, passando pelo público adolescente – leitor, principalmente, de clássicos e estrangeiros – até adultos e idosos. Segundo a responsável pela Biblioteca, as duas seções mais lidas são: romance e literatura estrangeira. O incentivo à leitura do público infantil é uma das ações efetuadas pela biblioteca durante sua história junto à comunidade de São Borja. Um dos projetos que se destaca é o Pequenos Escritores. Nele, alunos de escolas públicas da cidade participaram da escrita de poemas e textos, formando um livro que posteriormente foi publicado. Na contracapa da publicação, a introdução da obra informa “O projeto tem por intuito incentivar as crianças, nossas leitoras em potencial, à leitura e ao contato com os livros, pois é através de livros e dedicação que conquistamos nossos objetivos e realizamos nossos sonhos”, dessa forma, o objetivo do projeto é integrar cada leitor a ter um pedaço próprio na Biblioteca. Uma das participantes foi Bianca Obregon, acadêmica de jornalismo na Universidade Federal do Pampa (Unipampa) integrou do projeto no ano de 2009. Moradora do município, ela conta que desde os oitos anos de idade comparecia à Biblioteca Pública diariamente. Ter participado da escrita de um livro é motivo de orgulho para ela. “Hoje eu me sinto grata por ter sido escolhida e reconheço a importância do projeto e da minha participação ativa na biblioteca. Quando eu era criança, imaginava que todo mundo gostava de ler como eu, mas hoje eu

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Diferentes projetos de incentivo à leitura são realizados lá, como: Café literário; Pegue e Leve; Sacola Cultural; Banca de Troca, entre outros. O projeto Pegue e Leve acontece quando há vários livros repetidos nas prateleiras ou, atualizados, nesse caso, o mais antigo é doado aos leitores. Esse projeto também é aplicado quando algum livro já se encontra em condições de uso excessivo. Para essas publicações, a biblioteca oferece aos leitores interessados que levem os livros para casa de forma gratuita. Outro projeto realizado é a Banca de Troca, esse ocorre juntamente à Feira do Livro de São Borja. Obras que já existem em diversas edições no acervo da Biblioteca são separadas e lavadas até a feira para então serem adotadas pelos leitores. Para garantir qualidade, tanto na diversidade quantitativa do acervo quanto na conservação dos livros, é realizada uma reserva técnica, que, conforme explica a agente Cristiane Acosta funciona como uma forma de controlar o acervo literário. “São os livros bem novinhos que chegam à biblioteca e nós já temos dois ou três na estante, então nós deixamos eles na reserva”, conta a agente. Para chamar mais leitores e agradar os que já são assíduos no local, a Cristiane conta que a Biblioteca utiliza algumas estratégias, como a oferta de livros e autores reconhecidos no mundo literário. “Agatha Christie tem uma demanda enorme, tanto que no último projeto em que adquirimos livros, nós renovamos o nosso acervo. Nós já tínhamos alguns, mas estavam desgastados. Então fizemos essa renovação de autores que são bem lidos”, explica Cristiane. Além de ser um espaço para viajar no mundo das letras, ficção e contos, lá é oferece um armário de madeira compos-


são de pessoas com deficiência visual através da literatura é uma das preocupações centrais da Biblioteca Municipal. Anualmente, a Biblioteca Pública Municipal Getúlio Vargas recebe cerca de, 3.804 mil leitores. O número expressivo de visitantes – em tempos de digitalização crescente do mundo literário – gera curiosidade. Segundo a responsável pelo local, alguns dos fatores que ajudam a explicar tamanha procura pelo acervo e sua estrutura é a comodidade e a tradição de utilizar livros materiais. Possuir uma biblioteca pública com acervo atualizado e comprometido com a inclusão de toda a comunidade.

Créditos: Alexia Saner

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consigo perceber a deficiência literária que a maioria das pessoas possui. Me sinto feliz pelo reconhecimento que tive e por saber que desenvolvi esse gosto e hábito que hoje me auxilia muito em diversos setores da minha vida, como na faculdade, ou na comunicação em geral”, argumenta a jovem. Sobre o projeto, Bianca destaca que ele é essencial para quem está dando os primeiros passos na leitura. “Hoje em dia eu vejo a importância desse projeto pra abertura que ele oferece às crianças no mundo literário”. É um projeto que atrai as crianças, e mostra a importância de prática da leitura e da escrita’’, afirma. A inclu-

A Biblioteca é uma das mais completas do Estado do Rio Grande do Estado.

O apoio a projetos que trarão benefícios para a comunidade e que permitem o acesso àqueles que não têm outra possibilidade de informação é imprescindível. É nesse sentido que a Biblioteca busca manter em seu acervo obras que atendem a questão da acessibilidade. Essas edições oferecidas ao público estão em Braille e também no formato de audiodescrição, Julho/2017

atendendo um número maior de pessoas.é obrigatório para a melhora da cultura e da educação dos seus visitantes. Além disso, uma biblioteca também conta parte da história de uma cidade e de seus moradores. Reconhecer nesse espaço uma parte viva da história de São Borja encanta a todos que visitam e experimentam a viagem pelo mundo da literatura.

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MUSEUS DE SÃO BORJA: HISTÓRIA E VALORES CULTURAIS Um resgate da história dos museus de São Borja contando sua importante contribuição para a memória brasileira. Você sabe como surgiram os primeiros museus? A palavra “Museu” tem origem grega e significa “Templo das musas”. damental no estabelecimento do método museológico e teve origem em 15 de Janeiro de 1759, foi criado pelo parlamento Inglês com a coleção de Hans Sloane que foi um médico naturalista e colecionador irlandês. Desde quando era jovem adquiriu o gosto de colecionar objetos de histórias naturais e muitas outras curiosidades. Em 2012 o museu Britânico foi o terceiro museu mais visitado do mundo. No Brasil, o primeiro museu a surgir foi o museu do Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico Pernambucano no ano de 1862 em Recife, Pernambuco. Este museu é uma entidade da pesquisa e preservação histórico geográfica, cultural e de ciências sociais do estado, guarda também uma grande recordação do passado de Pernambuco, como as primeiras guerras que ocorreram no estado. O mais importante museu do Brasil é o MASP – Museu de Artes de São Paulo, foi criado no século XX, é considerado o mais importante dos museus por conter muita qualidade em seu acervo. Foi fundado em 1947 sem fins lucrativos, essa iniciativa foi tomada por Assis Chateaubriand, considerado um dos homens públicos mais influentes do país nas décadas de 1940 e 1960. Os museus representam a preser-

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Os museus modernos surgiram no século XVII através de doações particulares de grandes colecionadores. O primeiro museu a ser criado foi o Museu Ashmolean, a partir de doações feitas por Elias Ashmolean. Ele foi um antiquário, político, estudante de astrologia e alquimia, tornou-se um ávido colecionador de curiosidades e artefatos. Muitos desses artefatos pertenciam a outro grande colecionador John Tradescant, que foi viajante apaixonado por colecionar moedas antigas, livros, gravuras e outras curiosidades. Toda essa coleção foi doada por Ashmolean à Universidade de Oxford na Inglaterra, onde está localizado o museu o qual leva o nome do doador. Nessa época os museus eram elitizados, nem todos poderiam apreciar suas obras, mas foi em 1793 que surgiu o primeiro museu público. Ele foi criado em Paris, na França pelo governo revolucionário, com finalidades recreativas e culturais. Quem passeia pelo museu Louvre pode apreciar obras muito famosas como, Mona Lisa; a Vitória de Samotrácia e a vênus de Milo. É o museu mais visitado do mundo, em 2011 recebeu mais de 8,8 milhões de visitas. O segundo museu público, foi o museu Britânico. Ele foi um marco fun-


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vação de traços materiais que nos remetem a história e a memória de um povo. Nos permitem ter a possibilidade de desenvolvimento de atividades de caráter educativo junto às escolas, como a educação patrimonial, além de ser um vetor importante para o desenvolvimento de um turismo cultural no município e região. Em São Borja, podemos encontrar quatro museus muito importantes para a história do Brasil. A cidade fundada em 1682 por padres Jesuítas, é a primeira dos Setes Povos das Missões, por abrigar em seu seio a nação Guarani e por ter sido o lar de Sepé Tiaraju. Tem a civilização mais antiga do estado e do país. Está situada na fronteira oeste do estado e é conhecida como “Terra dos Presidentes”, oficialmente declarada pela lei estadual 13.041/2009 por ser cidade natal de dois ex-Presidentes do Brasil: Getúlio Vargas e João Goulart.

O diretor da secretaria de Turismo, Cultura e Eventos, Ayrton Poerschke, relata que São Borja está na rota dos Caminhos das Missões, que são trilhas de caminhadas e ciclismos feitas através de uma empresa de Santo Ângelo. O passeio turístico inicia-se em São Borja passando por Garruchos comunidades e estâncias próximas ao rio Uruguai. Seguindo a estrada, chega em outros municípios que possuem grandes patrimônios nacionais como, os Sítios Arqueológicos de São Nicolau, São Lourenço Mártir, São João Batista e São Miguel Arcanjo. A chegada é no município de Santo Ângelo na praça Pinheiros, onde se encontraa catedral Angelopolitana. Ayrton ainda diz que os museus de São Borja tem parceria com a rota através do caminho das Missões, estando sempre à disposição para visitação dos peregrinos, assim chamados as pessoas que vêm conhecer a cidade.

Memorial João Goulart Créditos- Michele Franco

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Museu GetĂşlio Vargas CrĂŠditos - Michele Franco

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Um dos Museus que podemos encontrar em São Borja é o Museu Ergológico de Estância. O nome foi escolhido a partir da sugestão feita pelo poeta e historiador Aparício Silva Rillo. Foi fundado em 1982 pelo grupo amador de artes “Os Angueras”. Este museu guarda as histórias de São Borja, com especialidades em materiais campeiros, que são elementos da cultura gauchesca que ajudaram o homem da região das Missões no trabalho das estâncias ou fazendas. De acordo com Vilmar dos Anjos, monitor do museu, as visitas são gratuitas, sejam para moradores de São Borja ou turistas. No ano passado, o número de visitantes chegou a 3577 mil. Por ser considerada a Terra dos Presidentes, São Borja abriga o Museu casa de Getúlio Vargas. A casa onde hoje abriga o museu, foi construída em 1910, um ano depois passou a abrigar o ex-presidente. O Professor Dr. Edson Paniágua, Doutor em história pela Universidade do vale do Rio dos Sinos, diz que o museu pelo seu acervo nos remete de certa forma a década de 40 e 50 do século XX, proporcionando não só um contato com uma cultura material, como simbolismo de uma época e um legado que chegou até o século XXI. Este museu foi tombado como patrimônio cultural pelo Estado do Rio Grande do Sul, foi plenamente restaurado e ampliado recentemente. Esse movimento proporcionou que a história e a memória brasileira de Getúlio Vargas fossem preservados em várias dimensões, como o material e o intelectual. O maior número de visitação acontece nos meses de Abril e Maio, por ser o período de nascimento e morte de Getúlio. Os visitantes mais comuns são grupos escolares que são convidados a conhecer a casa, e o número de visitas Julho/2017

chega em torno de 1.300 ao mês. O Memorial João Goulart foi inaugurado em 1º de outubro de 2009, e o local onde está localizado pertenceu à família do ex-presidente da República João Goulart, popularmente conhecido como “Jango”. A iniciativa da construção do memorial aconteceu em 2001, pelo prefeito de São Borja na época Juca Alvarez, pois a casa estava abandonada e tinha sido ocupado por mendigos. O prefeito começou a tentativa de desapropriação da casa, e foram longos sete anos de luta, até que em 2008 iniciou o restauro da casa e em 2009 foi entregue a população são-borjense. O local permite que as gerações mais novas conheçam a trajetória de João Goulart e parte da história brasileira. No primeiro mês da inauguração do Memorial, foi registrado em média de 100 visitas diárias, no total de 3.152 visitantes no primeiro ano. Segundo a monitora do Museu Marisa Batista, em 2016 teve em média 4.344 visitantes no museu, as visitas são gratuitas. Na semana dos museus deste ano o memorial João Goulart passou uma cronologia com fotos e documentos desde quando a casa foi recuperada até os dias atuais. Segundo o professor Edson Paniágua o museu possui um acervo que nos diz do particular e do público do ex-presidente João Goulart, de um período de intensidade política e social. No museu é a história do país que se apresenta e nos permite algumas reflexões, entre uma delas o legado do ex-presidente Jango. O Museu Municipal Apparício Silva Rillo, foi instalado no local atual em 1969, com um único objetivo de criar um espaço de resguardo e exposição de objetos que fizeram parte da história de São Borja. Através da lei nº 2559, de 1997 o museu

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Museu Ergoógico

Créditos - Michele Franco

Instituto Federal Farroupilha Eliane Coelho, os museus tem como objetivo preservar acervos significativos para a cidade, pois têm o papel de resgate e acesso a história de São Borja. Segundo a professora os museus da cidade são espaços representativos da história do município em seus diferentes momentos e aspectos culturais. Sendo que cada museu tem seu significado e representatividade muito bem estabelecidos e conseguem muito bem cumprir seu papel naquilo é proposto para cada um. Os museus são casas que guardam e apresentam sonhos, sentimentos. São intuições que ganham forma através de imagens e sons históricos. São Borja é o primeiro dos sete povos das missões, trazendo nela quatro museus de suma importância para a história da cidade e do Brasil, pois existem dois museus sobre a vida dos ex-presidentes da República. Sabemos então que museu não é sinônimo de local antigo, mas sim de instrumentos de proliferação de conhecimento. Os museus são ligações entre pessoas, culturas e espaços de conhecimentos. Um local de riquíssimas histórias de luta, política, e revoluções.

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passou a ser denominado Apparício Silva Rillo como forma de homenagear o poeta, compositor e historiador que era dedicado a história da cidade. O museu foi criado tendo como principal missão, tornar-se um local de intercâmbio entre pessoas, culturas e conhecimentos através das divulgações e também mantendo a valorização da história missioneira de São Borja. Tentando preservar a história através de ações culturais que interagem com a sociedade de forma dinâmica e contemporânea, por meio de estudos e pesquisas sobre a cultura missioneira da cidade, o que é assunto muito amplo. Segundo o professor o aspecto mais importante do museu municipal é ter um enfoque local e regional, pois nos coloca em contato com alguns elementos da cultura missioneira e da cidade, bem como diversidade étnica, social, econômica e política de São Borja. Segundo a mediadora efetiva do Museu Iris Hoffmann, 2016 teve em média 7.050 visitantes no museu, sendo 6.665 visitantes do município e 385 de outros lugares. Assim como nos outros museus as visitas são realizadas gratuitamente. Conforme a professora de Turismo


Parque General Vargas “A história ficou preservada na memória dos antigos nativos que tiveram o privilégio de acompanhar a sua construção”

Produção: Andressa Silveira, Letícia Dorneles, Marcela Cartolano e Wenandra Sommer

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O Parque General Vargas, mais conhecido como “Parcão”, é um dos pontos turísticos mais freqüentados pela população da cidade, seja para tirar horas de lazer, tomar chimarrão, fazer caminhadas, praticar esportes, passear com animais ou apenas esperar o ônibus na parada. Embora movimentado diariamente, pouco se conhece sobre ele. A história ficou preservada na memória dos antigos nativos que tiveram o privilégio de acompanhar a sua construção. Mas, afinal, por que a história deste parque merece ser contada? O que a torna tão importante e especial que farão com que os turistas e os próprios moradores de São Borja passem a olhar de maneira diferente?

Crédito: via página São Borja do Alto

Parque General Vargas atualmente

Crédito: Marcela Cartolano

Uma coisa é certa, há muita história para contar antes deste local ganhar a estrutura de hoje. Acompanhe nas próximas páginas a reportagem com todos os detalhes do famoso Parque General Vargas de São Borja e fique por dentro do que será realizado nele. Frequentadores do parque praticando esportes e tirando tempo de lazer

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Estádio General Vargas

Crédito: Marcela Cartolano

O parcão antes de ser parcão Tudo começou em 1950, quando o terreno da família do ex presidente, Getúlio Vargas, foi usado para a construção de um novo estádio de futebol. A homenagem prestada pelo neto, Serafim Dornelles Vargas, para com o avô, General Vargas, fez a diferença também na vida de muitas pessoas que por ali passaram.

O “Stadium G Vargas”, assim denominado no portal, trouxe grandes momentos de conquistas, foi um lugar concentrado de emoção e alegria de todos que o freqüentavam. com esse novo estádio que a terra dos presidentes ganhou na época, o outro que já havia na cidade, Vicente Goulart, ficou apenas como campo de treinamento para os times locais que existiam, o Internacional de São Borja e Cruzeiro.

Em 1978, houve uma fusão entre esses dois times da cidade, que deu o surgimento para a Sociedade Esportiva São Borja. O campo foi usado para a disputa de clássicos de famosos times do Rio Grande do Sul como, por exemplo, Internacional e Grêmio, e também utilizado por vários jogadores conhecidos na região. Para relembrar alguns momentos, um dos ex jogadores do time que fez parte da história de São Borja e que ainda mora na cidade relata como era freqüentar o estádio no auge dos campeonatos “Diferente dos campos de hoje, lá tinha uma lotação de aproximadamente duas mil pessoas e tinha a lotação total no estádio, se chama no futebol a famosa ‘panela de pressão’, é aquele campo que o time que vem de fora é pressionado pela torcida mais próxima” conta José Luis Moreno, mais conhecido como ‘Pimpim’, ex jogador do Internacional de São Borja. “Fui a quase todos os jogos do estádio e era maravilhoso assisti-los aqui”, completa.

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A obra foi realizada através da ajuda dos militares que dedicavam o tempo de trabalho na construção do estádio. A paixão pelo futebol se concretizou e trouxe também uma nova perspectiva para os são borjenses, considerando que a cidade era menos desenvolvida comparada aos dias de hoje. Surgiu, então, um novo espaço de divertimento e lazer nos finais de semana para os moradores do município, além de contribuir com algo moderno na cidade e que sempre uniu tantos brasileiros: o jogo de futebol.

Arquibancada do parque


Estádio General Vargas O fim Apesar de toda a trajetória conquistada na cidade de São Borja e a importância que esse espaço trouxe ao o município, o estádio não conseguiu se manter, pois o time havia decretado falência e seria inviável prosseguir. Segundo Clóvis Benevenuto, funcionário público municipal “Foi feito um clube social do time, teve piscina, reunião dançante, alugaram para rodeio, tudo para angariar fundos para o clube de futebol”. Cultura em Pauta

Imagem cedida por Greice Meireles via Ciber de São Borja

O esforço para arcar com as despesas do time e do estádio não foi suficiente para que continuassem a funcionar. Sendo assim, com o fechamento do clube, muitos funcionários e atletas não foram pagos, o que gerou uma pendência judicial. “Esse estádio entrou numa dívida trabalhista para os jogadores de São Borja e houve um ganho para esses jogadores com o INSS e estaria sendo loteado aquele local, inclusive já estava sendo cercado”, afirma Ibaro Rodrigues, Diretor de Esporte da Secretaria Municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.

Parcão

Acordo que deu início ao Parque General Vargas

Com o fim do estádio, houve uma negociação do prefeito daquela época, José Pereira Alvarez (Juca Alvarez), de assumir e pagar as dívidas trabalhistas dos funcionários e, em troca, adquirisse o estádio como poder do município. O acordo feito por Juca garantiu o lugar para a prefeitura ter a oportunidade de tornar em uma área pública. Foram derrubados os muros, mas manteve-se o portal com a homenagem ao General Vargas e a arquibancada, que foram restaurados.

Portal de entrada do Parque em 2010

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A característica e a estrutura continuaram no lado esportivo e com a reforma que prefeitura estava realizando, a cidade estava ganhando um local para entretenimento e explorando mais um ponto de turismo.

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O parque nos dias atuais e seu espaço

Pista de skate

Depois de toda transição que o Parque General Vargas passou, o resultado vem sendo positivo para as pessoas que moram na cidade, inclusive quem vivenciou quando ainda era um clube de futebol, “Eu era um dos sócios aqui, íamos montar piscinas, mas no final das contas não saiu do papel. Aí a prefeitura trans-

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Moradores utilizando as quadras de esportes do parque

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Não faz muito tempo que o parcão está com essa estrutura dos dias de hoje, a primeira fase de sua construção foi apenas em 2008. A necessidade do aproveitamento do espaço para recreação era relevante, prova disso é que em 2010 o local já contava com uma pista de skate e três quadras de esportes. “A pista de skate é muito importante para nós skatistas, porque é a única pista da cidade e Crédito: Marcela Cartolano o único lugar que dá para a gente andar, antes disso, a galera costumava a andar formou no parcão que foi de grande utina Praça XV” conta o skatista Kevin Fiolidade para todo mundo, se tornou essa ravante. maravilha que a gente vê” diz o aposentado José Cogo. Em dezembro de 2011, houve a conclusão e a inauguração da primeira Os eventos que ocorrem na cidaetapa do projeto e tinham adquirido pisde são concentrados no parque devido tas de caminhada, quadras poliesportivas a sua importância e centralização. Atualde vôlei, baseball, futebol e basquete, e mente, o parcão é uma referência para a um espaço para ginástica e academia ao população, sua localidade contribui para ar livre, com o total de 12 equipamentos, a freqüência e a movimentação que ocore embora não tenha um profissional ature diariamente, principalmente nos finais ando no local, todos estão com instrução de semana. de como utilizá-los. As outras etapas preCrédito: Marcela Cartolano viam a colocação de mobílias urbanas como lixeiras, bancos e a decoração do parque como os mastros para as bandeiras.


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E, para quem mora mais afastado, o parque possui uma parada de ônibus que dá acesso a todas as linhas para quem vem em direção ao centro. Essa área de lazer que o Parcão se tornou deu oportunidades para além de um espaço para recreação da população que são as opções e oportunidades de trabalho, como aconteceu para Valdemar Contreira, churrasqueiro do parque “Eu trabalho aqui há três anos, escolhi aqui porque é onde mais tem movimento na cidade, tenho meus clientes fiéis. Sou aposentado e só com o dinheiro que eu ganho não da pra viver, tenho que fazer mais alguma coisa pra sobreviver”, que também diz que a cidade precisava de um espaço como esse. O Parcão é realmente um lugar

que coleciona histórias, a quantidade de pessoas que o visitou e o apreciou é significante. “É um local que agrupa muita gente, um lugar central e o nosso plano de ação aqui na Secretaria Municipal da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer vários eventos estão sendo programados ao longo do ano naquela estrutura ali do parcão” comenta Ibaro Rodrigues, Secretário de Esportes. Já aconteceu nele, inclusive, o “Cine Parcão”, projeto que visava a utilização de DVD para que os moradores pudessem participar da sessão de filme ao ar livre, proporcionando a interação cultural. E, também, festas juninas, o famoso “arraiá”, junto com apresentações artísticas e comercialização de comidas típicas.

Crédito: via página São Borja do Alto

Parque General Vargas a noite

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Dicas de frequentadores “O que seria legal é ver parcerias com lugares que proporcionam atividades como aula de zumba, yoga e até mesmo aulas públicas para contribuir com o crescimento cultural e político.” (Bruno Pozzebon, estudante) “É um ótimo lugar para o comércio assim como para a divulgação de Museu do Esporte eventos, promoções, enfim, qualquer tipo de propagação de informação, Você sabia que o Parcão vai ter um além de proporcionar um belo pôr do museu do esporte? sol e uma vista que a arquibancada proporciona.” (Lucas Aquilles, estu Isso mesmo! O museu do esporte dante). terá um rico acervo da história do Futebol de São Borja, visto que atletas da cida- Curiosidades! de já participaram de olimpíadas, outros foram campeões brasileiros, da seleção. O Secretário de Esporte conta “Tem uma • O avô homenageado, General Varlenda viva aqui São Borja chamado Lito gas, era o pai do ex presidente Getúlio VarDiogo, que atuou o Sport Club Corinthians gas e na sua estreia em um clássico contra o Santos defendeu um pênalti nada menos • Serafim Vargas, quem construiu o esdo que do Pelé, então o atleta do século tádio, era sobrinho de Getúlio Vargas. tem uma história com São Borja e tantos outros esporte.” • Tinha um busto do General Vargas Crédito: Marcela Cartolano

que ficava no parcão e agora se encontra na Secretaria da Cultura. • A entrada do estádio está escrito com a letra inicial ‘S’, Stadium General Vargas, que vem do latim, como era escrito antigamente. • Na época do estádio, já aconteceu jogo do GRENAL

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Este museu já está construído, o pavilhão está sendo modernizado e falta montar o acervo. Depois de toda essa história da trajetória do parque, nada mais justo que utilizar desse espaço para a inauguração de um museu e deixar registrado todos esses momentos. Isso dará a chance das pessoas que não acompanharam na época poder compreender os relatos e para os nativos de relembrar o passado.



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