À Procura do Meu Lugar - a participação cidadã das crianças no planeamento do território

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À Procura do Meu Lugar - a participação cidadã das crianças no planeamento do território Seixas, D., Mota, J.C., Moreira, G., Isidoro, C., Nogueira, F. Universidade de Aveiro


1. A participação das crianças no planeamento do território As práticas de democracia participativa têm vindo a conquistar um espaço crescente na elaboração de políticas públicas (Dias, 2016). Contudo, iniciativas que envolvam a consulta infantil no âmbito do desenvolvimento territorial, atendendo às suas necessidades e particularidades, ainda são escassas ou pouco relevantes do ponto de vista político e técnico (Sullivan, 2021; Gonçalves, 2015) e os modelos utilizados são insuficientemente inclusivos para a linguagem das crianças, o que faz com elas não participem (Gonçalves 2015).


1. A participação das crianças no planeamento do território 1989 - Há 32 anos a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC; Nações Unidas, 1989) formalizou o estatuto da criança enquanto sujeito de direitos; Desde então gradativamente vem a crescer o incentivo à participação infantil e à manifestação da opinião das crianças e jovens nas temáticas das comunidades em que estão inseridas (Gonçalves, 2015; Sullivan et al., 2021).

2010 - Cresce a base de evidências documentais à consulta e participação de crianças no planeamento e sobre os benefícios de tais abordagens têm vindo a robustecer o corpo teórico e académico (Danenberg et al. 2018; Freeman e Cook 2019; Witten e Field 2019)


1. A participação das crianças no planeamento do território As crianças têm um ponto de vista do mundo diferente dos adultos e também sua forma de interagir com o ambiente construído é diferenciada; Podem identificar problemas e desenvolver soluções inovadoras para as políticas públicas, no que respeita, p.ex., aos riscos à segurança e a outros atributos que impactam diretamente na sua autonomia para realizar as atividades do dia a dia (Sullivan, 2021). O grau de segurança de uma cidade se mede pelo número de crianças que brincam no espaço público (Tonucci). Quanto mais crianças ocupam o espaço público, mais segura e coesa é uma cidade.


2. As cidades e as crianças em Portugal Nos últimos anos, os espaços públicos foram capturados por outros usos que não a fruição pública, em particular das crianças e jovens. Em 40 anos, a população portuguesa até aos 19 anos passou de 3,3 milhões para 1,9 milhões. Reduziu-se em 40% o número de crianças e jovens. No mesmo período, mais do que duplicou o número de automóveis nas cidades. Temos por isso hoje quase 2,5 vezes mais carros (5,2 milhões) que crianças e jovens com menos 19 anos (1,9 m). Estes carros ocupam muito espaço nas cidades e nas vidas e interfere gravemente na ocupação do espaço público. As crianças e jovens são privados de usar o espaço público que os seus pais e avós tiveram para brincar porque ele está hoje ocupado com outras atividades.


2. As cidades e as crianças em Portugal Esta noção do risco de utilização do espaço público teve várias consequências. Uma delas foi a criação de hábitos de vida mais sedentários. O estudo Childhood Obesity Surveillance (2016) revela que «quase 1/3 das crianças portuguesas tem excesso de peso ou é obesa»; A deslocação casa-escola é considerada insegura (64,1%) pelos pais/encarregados de educação - e «mais de 76% das crianças do 1.º ciclo vão para a escola de carro» (Childhood Obesity Surveillance Initiative, 2016); Em consequência, as crianças portuguesas são hoje das que possuem a mais baixa autonomia na deslocação para a escola na Europa.


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar Desenho de um processo participativo para crianças e jovens na revisão do Plano Diretor Municipal de Valongo, que pretende envolver as crianças do 1.o e 2.o ciclo na reflexão sobre o futuro dos seus espaços de brincar, nomeadamente o recreio da escola, o parque infantil, a praça, o jardim ou outros lugares perto das suas residências. Procura olhar a cidade a partir dos seus olhos e interesses. Fortalece os objetivos de Valongo enquanto Cidade Educadora na “construção da comunidade e de uma cidadania livre, responsável e solidária, capaz de ...trabalhar “pelo bem comum””


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar

OBJETIVOS


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar - metodologia O exercício tem a forma de um caderno de atividades, apelou a três tipos de competências observar, perguntar e inventar - num apelo à interação com professores, familiares, amigos, vizinhos e até com técnicos do município e complementadas pela quarta componente partilhar – onde são chamados a mostrar suas ideias, seus anseios, suas aprendizagens. Utiliza como recursos os métodos visuais escrever, desenhar, recortar e colar.


3. O Projeto À Procura do Meu Lugar - metodologia

Observar

Perguntar

Inventar

Partilhar






4. Resultados


4. Resultados A primeira etapa do projeto foi dinamizada durante o confinamento devido à pandemia, com a divulgação das brochuras online (15/02 a 15/04). A segunda etapa do projeto ocorreu com a distribuição de mais de 4.000 exemplares da brochura para todos os estudantes de 1. e 2. ciclo das escolas do Concelho (26/04 a 16/05). Foram devolvidos cerca de 800 cadernos e, destes, alguns não estavam preenchidos ou ilegíveis. Foram considerados para análise total ou parcial aproximadamente 500 contribuições.


4. Resultados Os lugares preferidos das crianças são muito diferentes – os Jardins, os Parques, os parques infantis, o espaço na traseira do prédio e a Serra. Há uma enorme diversidade de geografias do brincar, da micro à macro-escala. 1) Mapeamento dos espaços favoritos e identificação daqueles que, segundo as crianças, merecem atenção. Há uma enorme diversidade de geografias do brincar, da micro à macro-escala. Desta análise, até o momento, foram identificados mais de 150 lugares no município de Valongo, onde destacam-se como de maior relevância: a. O parque Urbano de Ermesinde (40 referências); b. O Parque do Vale do Leça e São Lázaro (37 referências); c. A Vila Beatriz (23 referências); d. Áreas de lazer ao longo do Rio Ferreira (20 referências); e. O Parque Radical de Valongo (16 referências); f. O Parque da Cidade de Valongo (15 referências). Produção de mapa na ferramenta Epicollect


4. Resultados 1) Classificação segundo a tipologia dos espaços. Espaços verdes e parques surgiram como área-chave de interesse, que somado ao espaço público de proximidade às casas (como ruas, jardins, largos, pracetas e praças), somam 58% das preferências; Outros 13% ainda são espaços verdes, mas diretamente ligados às Serras de Valongo; 29% dos lugares referem direta ou indiretamente a equipamentos (escolar, desportivo, cultural ou outros serviços)


4. Resultados - As propostas Melhoria da oferta de Equipamentos o Mais áreas de brincar (Baloiços, escorregas, trampolins, jogos tradicionais); o Mobiliário urbano de apoio, bancos e áreas de picnic, mesas e contentores de lixo; o Espaços de convívio intergeracional, para atividade ao ar livre com pais e avós; o Melhoria da conectividade para mobilidade pedonal e ciclável; o Mais espaços desportivos - piscinas ao ar livre, skateparks e campos de futebol; o Melhoria física do recreio escolar e necessidade de espaços abertos/cobertos de permanência.


4. Resultados - As propostas Relação com a natureza e a comunidade, preocupação social e ambiental: o Espaços de fruição com mais árvores, sombras, flores, que permitam interagir com os rios e ribeiras, brincar com a água, espaços de floresta, montes e da Serra; o Criação de espaços de promoção cultural, como cinemas ao ar livre, áreas de estudo e pesquisa fora do horário escolar, cafés e espaços de convívio; o Espaços próximos da casa ou da casa dos avós; o Criação de lugares para terem mais contacto com os animais.


4. Resultados - As propostas “Os meninos que passam fome

podiam vir para Alfena e dávamos comida, família, amor e carinho” “...todas as crianças deviam ser felizes com a sua família e ter o que comer, o que vestir e ter muito carinho, amor para serem sempre felizes...”

Preocupação Social e Ambiental: o Criar abrigos para os animais; o Ajudar as pessoas sem abrigo e as crianças que precisam; o Muitas crianças apelam para a despoluição dos rios e para a redução do lixo e educação ambiental; o Algumas crianças referem o Aterro como um local que precisa de atenção e sugerem a reconversão em espaço de natureza e do brincar;


4. Resultados - As propostas Proposições de caráter imaginativo: o Construir foguetões, viajar por todos os planetas do universo, transformar as casas e os carros em naves espaciais, voar sem asas; o Criar um beliche de 100 andares com elevador; o Inventar uma máscara invisível que proteja do covid; o Passagens secretas entre as casas; o Criar livros mágicos, em hologramas, bolas de futebol virtuais e mobiliário flutuante; o Gelados infinitos e gratuitos;


4. Resultados - O que aprenderam? Quando perguntámos o que aprenderam, referiram as saudades de brincar ao ar livre, o compreender a história do lugar (explorar muito um lugar; quem morou no lugar; saber a história do lugar; como era a natureza; como eram as pessoas do lugar), valorizar o que existe perto das suas casas (a proximidade). Aprenderam que podiam e deviam dar opinião - que têm de dar a sua opinião sem medo, que é preciso fazer mudanças e que, naturalmente, existem coisas que gostam no seu lugar favorito e outras que não gostam. Por fim, pensar no futuro é também imaginar a concretização, pensar como levá-lo à prática.

“Devemos interessar-nos pelo passado da nossa região; ajudar a melhorar os lugares que gostamos; aproveitar o tempo em família; preservar a natureza; valorizar o que é regional; desligar-nos das tecnologias e fazer mais caminhadas por lugares únicos e cheios de vida; valorizar as inovações da região; valorizar o que a natureza dá e não destruí-la”


4. Resultados (indiretos)

18 DE JUNHO SWITCH TO INNOVATION SUMMIT


4. Resultados (indiretos)

14 DE MAIO A CIDADE DAS CRIANÇAS

Luiz Fernando Arantes Machado Miguel Anxo Fernández Lores Abel Coentrão José Manuel Ribeiro Francesco Tonucci Rosinha Madeira https://www.facebook.com/portaljuventude.valongo/videos/233577535198812


4. Próximos passos Está a ser planeada uma exposição de todos os trabalhos, que terá um caráter participativo. Será mais um momento de envolvimento das crianças e das suas famílias no projeto. A exposição pretende ser a base da conversa e da seleção de algumas das propostas para promover ações de experimentação, de baixo custo e impacto rápido, de algumas das melhorias propostas pelos mais novos. O mapeamento e a sistematização das propostas das crianças serão, junto com as propostas dos adultos, parte da agenda de preocupações dos cidadãos de Valongo para o território e para a revisão do PDM.


5. Conclusões ● Atividades desenhadas especificamente para o público infantil, aliadas à divulgação e adesão pelas escolas, podem ser eficazes enquanto ferramentas de ensino-aprendizagem, para o desenvolvimento de competências da cidadania e especialmente para o direcionamento de políticas públicas adequadas aos interesses e necessidades do público infantil, e também são um contributo útil para o ordenamento do território; ● A abordagem contribui para ampliar o espectro da consulta a crianças no desenvolvimento do território e pode ajudar a robustecer o corpo teórico e académico no âmbito português; ● Nenhuma abordagem é necessariamente melhor do que a outra, mas os processos ideais dependem do contexto.(Sullivan, 2021) ● Os desafios do presente podem ser uma forma de reinventar o futuro e de capacitar as crianças para serem cidadãos mais ativos e interventivos; ● Esforço contínuo para mobilizar os atores (escolas, pais, educadores, autarcas, comunidade)


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