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CADEIRA 34 - CERES COSTA FERNANDES

CADEIRA 34 PATRONO - LUCY DE JESUS TEIXEIRA 1º OCUPANTE - CERES COSTA FERNANDES

IMPRESSÕES DE VIAGEM

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Ceres Costa Fernandes

Estou de volta. E confesso que sou dos que partilham a opinião comodista de que o melhor da viagem é o regresso. Lembram aquele personagem do filme “O Turista Acidental” que, obrigado a viajar, procurava fazêlo como se não saísse de seu país, de sua cidade, enfim de sua casa? Essa é uma atitude extremada, mas não há como negar um paradoxal desejo do cotidiano, do familiar enquanto se busca o novo e o desconhecido. Talvez um modo de obtermos mais segurança ou de confirmar nossa identidade pátria em meio a culturas estranhas. É no terreno gustativo onde isso mais se evidencia. Aquela coisa do brasileiro querer tomar café com jeito e gosto de café brasileiro, e se pôr a reclamar do “chafé” que se serve por aí, com especial referência ao americano. Ou ensinar ao garçom que, de olhos arregalados, tenta compreender nosso linguajar, como se faz um bife de verdade: grosso, macio, tostado por fora e vermelho por dentro, em contraposição ao servido pelas europas, fininho, sem cor ou gosto definido. Ficamos irritados com a mania dos povos do hemisfério Norte servirem qualquer prato com batatas, cozidas, fritas, assadas, sautés... E com um arrozinho, não vai nada? Vai daí, para não correr riscos, vão direto às casas de fast food. Ruim por ruim, pelo menos não terão surpresas. Nesse afã de conferir o conhecido – tenho uma amiga que, fora do Brasil, invariavelmente, pede banana como sobremesa. Vai-se a oportunidade de provar e descobrir o novo, que talvez traga boas e inusitadas sensações. Deve haver uma relação com o retorno ao conhecido, ao passado idealizado, um fenômeno que ocorre nas grandes cidades: os points mais concorridos dessas metrópoles, o lugar cult de encontro , são justamente os que reproduzem o ambiente de pequenas cidades. Lugares de ruas estreitas, casas baixas, pequenos largos de igreja, que propiciam a convivência e o contato ausentes na pólis. O Convent Garden londrino é exemplo disso, suas ruelas e pracinhas fervilham à noite; da mesma forma que as vielas tortuosas de Bruxelas, próximas à Grand Place e os barzinhos empoleirados nas ladeiras do bairro de Alfama, na entrada de Lisboa. Montmartre, em Paris, é um bairro emblemático. Há séculos, artistas, escritores, intelectuais se refugiam em suas ladeiras, morando em pequenas casas ou estúdios, dando bom dia aos vizinhos, papeando com as comadres da redondeza e com o padeiro, como o faziam nas suas cidades de origem. E depois, quando essa praga que são os turistas permite, frequentam a Place de Tertre. Não deixa de ser paradoxal que pessoas abandonem suas cidades provincianas, cidades de muro baixo, em busca de maior privacidade, da anonimidade, e procurem esses núcleos reprodutores do cotidiano invasivo das pequenas comunidades para o lazer e moradia.

E continuamos na busca do próprio rosto. Se vamos a uma casa de fados, por exemplo, queremos ouvir – e reconhecer – aqueles mais cantados no Brasil. Explodimos em aplausos se o gajo canta “Teus Olhos Castanhos”, “Nem às Paredes Confesso” ou “Mouraria”, fartamente divulgados aqui, por meio de novelas, inclusive. Na verdade, aplaudimos menos o cantor que nossa capacidade de reconhecimento, congratulando-nos intimamente pela nossa sapiência e acuidade. E agora uma pergunta e uma observação desvinculadas do capítulo “eu quero a minha mãe”. Quem alguma vez entrou de gaiato naquelas verdadeiras romarias a Veneza, Sant Michel e outras cidades famosas, em que pessoas percorrem ruas estreitas espremendo-se em intermináveis filas – uma indo outra voltando -, como gado num brete? Experimentaram observar a cara dos outros turistas? Pois é, então constataram que quase todos exibem uma cara de enfaro e um olhar bovino , como a dizer: “E eu com tudo isso”?.. Sobre esse enfaramento de quem cumpre uma obrigação “cultural”, mas não está entendendo nada, lembro-me de um grupo de turistas em Pompéia, da vez que lá fui com um grupo guiado – que ninguém percorre sozinho o labirinto de Pompéia, impunemente. Compunha o grupo um falante casal de novos-ricos paulistas, acompanhado do filho, um garotão armado de uma filmadora supermoderna a reclamar, a todo instante, que não ia gastar filmagem com aquele monte de velharias. Lá pelas tantas, chegamos a um lugar onde estão expostas reproduções famosas de moradores da cidade cujas formas foram preservadas pelos moldes de lava que recobriu seus corpos, permitindo, à moda dos fósseis, sua reconstituição. Diz o filhote, Olha quanta estátua de gente feia! Responde o sábio pai, Não diz besteira, menino. Não tá vendo que são múmias?

Depois dessa, resolvi deixar o grupo e gozar sozinha daquela cidade mágica. Não preciso dizer que me perdi. E pior, na volta, a correr para não perder o ônibus, recebi uma salva de palmas dos passageiros, já todos acomodados, o que, na linguagem do turismo organizado, equivale a uma bem dada vaia.

Ceres Costa Fernandes

Alguns chamam de sonhos, outros de planos ou desejos, eu acho mais adequado dizer expectativas. Expectativas, até os mais céticos e os chamados pés-no-chão não deixam de ter. Tempos atrás, desejávamos que nossos filhos crescessem educados, saudáveis, bons cidadãos, ingressassem nas careiras de profissionais liberais, industriais ou comerciantes, as mais cotadas, namorassem, noivassem e se casassem com moças ou rapazes igualmente educados e de futuro assegurado, saudáveis e bonitos para que os netos acompanhassem o padrão. E mais, cada filho deveria a sua própria casa e ser feliz para sempre com o companheiro, sem nunca se esquecer dos velhos pais, trazendo os netos para o nosso orgulho e gáudio. E elas, as expectativas, foram minguando, minguando... Apenas estudar, em si, passou a ser suficiente. O curso? Ora o curso quem faz é o estudante. Aceitamos até os mais esdrúxulos, aqueles que nem os cursantes sabem bem o que vão fazer com eles. E, tem mais, se não cursarem coisa alguma e nem tiverem emprego, que continuem morando com os pais, que as estatísticas já revelam como o comportamento usual da maioria. Os netos? Ora, se não vierem, tem tanto pet por aí precisando de adoção... As expectativas atuais resumem-se em desejar que os filhos não se tornem drogados nem marginais. Se quiserem estudar alguma coisa será lucro, mas não vamos aperrear os coitados, podem se estressar e piorar as coisas. E, convenhamos, arranjar emprego está tão difícil, com essa crise... E ficamos nos herdeiros? Bom seria. O que esperamos hoje do Brasil, dos nossos governantes, dos nossos políticos? O mínimo: que não sejam ladrões, estelionatários ou, se o forem, que roubem pouco e realizem muito. Aceitamos que nossos parlamentares sejam condenados a 19 anos de prisão e que, aos dois anos cumpridos, já saiam de tornozeleira, o que, de resto, não envergonha mais ninguém. Em algumas classes, já configura status. Dos nossos prefeitos, não esperamos grandes obras, nem obras mínimas de infraestrutura, mas que asfaltem as ruas, fechem os buracos, recolham o lixo de vez em quando, pintem as faixas de segurança, consertem os sinais e conservem os ônibus trafegando. Ah, também um tanto de esparadrapo e mercurocromo nos hospitais. Não mais estranhamos os engarrafamentos e atropelamentos diários de motociclistas. Transporte de massas moderno? Bonitos, o das outras capitais, né? A população também se acostumou a dormir nas filas de marcação de consultas, acha até normal. Já tem até emprego de guardador de lugar nas filas e o dos que vendem lugares bem na frente, emprego de aluguel de cadeira e venda de água e lanche. Nos tempos de hoje, não vale a pena desempregar mais pessoas. Do governo, consideramos suficiente que seus dirigentes e comandados paguem os ordenados em dia e não deixem faltar água e luz, embora a gente não se importe de comprar água de vez em quando, os carros-pipa fazem parte da nossa paisagem, não é? Segurança, isso a gente nem pensa que seja possível. Com tudo o brasileiro se acostuma. Não tem gente que mora em encosta de vulcão; perto da praia, onde, de vez em quando, sobe um tsunami; em lugar, onde a terra treme quase todo dia; em outros, que sofrem bombardeios diários até em colégios e hospitais? Vai morar na Ucrânia. Está se queixando de quê? De uns bandidinhos que entram em sua casa, lhes dão umas coronhadas e roubam tudo o que cabe no seu carro e em mais outro? Sorte sua se não matarem ninguém. Aprendemos táticas de guerrilha, andar vigilante, não resistir, não deixar carro em lugar deserto, não sair com relógios, brincos, pulseiras, celulares, bem vestidos, tênis de grife, não tirar dinheiro em bancos – se tirar, fique algumas horas dentro do estabelecimento, para o motociclista da saidinha, que está lhe esperando, ficar de saco cheio e ir embora –, não voltar tarde para casa; não sair de casa naqueles horários em que os bandidos sabem que as pessoas vão ao trabalho ou deixar filhos e netos na escola. De preferência não sair de casa. Andar com cópias dos documentos e não ser aceito nos lugares em que é necessário apresentar os documentos originais. A lista é longa, não terminará. Enfim, quem não tem expectativas não se decepciona. Tá tudo bom. Amém.

Qual o seu conto de desfecho mais impressionante? Quanto a mim, marcou profundamente a minha mente de jovem leitora "O Barril de Amontillado", de Edgar Allan Pöe. Bem construído, o conto é narrado em suspense crescente até o clímax da história, coincidente com seu final - como deve acontecer em todos os bons contos -, um dos protagonistas, vítima de vingança, é emparedado vivo em uma adega. Essas histórias de emparedar gente, seja na ficção literária, sejam em outras histórias verídicas sempre me causaram forte impressão. Quando criança, sonhava entrar em canos estreitos ou caindo em poços profundos. É uma neura – juntamente com a de ter o pé preso em um trilho de via férrea, sem nunca ter morado perto de trilhos de trem.

Dia desses, descobri que o emparedamento não é uma tortura reservada apenas às pessoas, deparei com uma casa emparedada em plena Rua dos Afogados. Boquiaberta com a visão, parei na calçada em frente à casa. Foi vê-la e sentir, logo, a conhecida sensação de sufoco. O proprietário rodeou o imóvel – que é paredemeia com um pequeno edifício –, na frente e no lado livre com um muro muito alto, que ultrapassa o telhado. Só por uma pequena e acanhada porta de ferro, fechada por uma grossa corrente, têm-se acesso à casamata. Uma fortaleza ou será a torre de Rapunzel? Inacessível. Fiquei a matutar. Que tremenda culpa teria aquela pobre casa para merecer o castigo supremo de ser emparedada. Sofrer um tão completo isolamento como se fosse o foco irradiador de um terrível mal.

Depois de muito, entendi que a razão do isolamento poderia ser oposta à inicialmente considerada: seria o temor de que a casa contraísse o mal que anda a assolar os prédios vizinhos. Nessa mesma rua, bem próximo a ela, desabou um sobrado revestido de belíssimos azulejos, na esquina de Santaninha com Afogados. Mais adiante, uma outrora imponente casa que serviu, nos seus anos magros, de abrigo a estudantes universitários, reduziu-se a um monte de escombros. E como se não bastasse, subindo ainda um pouco a rua, já meio emparedada, está, cai não cai, uma meia-morada, com as janelas tapadas por tijolos, de modo a servir de sustento às paredes carcomidas. É de assustar. Talvez seja mesmo necessário emparedar as casas vizinhas antes do contágio fatal. Mas ao invés do suposto vírus moderno, as casas de São Luís bem podem estar sendo acometidas de nossa velha e conhecida lepra.. E não pensem que invento coisas. Casas acometidas de lepra são fatos consabidos, desde a época de Moisés, e devidamente registrado no Grande Livro, mais precisamente no Levítico, Capítulo 14. Lá se trata da lepra das casas e também do importante modo de curá-las. Receita exclusiva dos sacerdotes de Israel. .

O primeiro sinal visível do contágio são as tabuletas de VENDE-SE ou ALUGA-SE pregadas nas portas. Tratase de um disfarce - sabemos que elas jamais serão vendidas ou alugadas. Estas tabuletas são como palimpsestos, nas quais, por detrás do anúncio, podemos entrever o aviso: AFASTE-SE, CASA CONDENADA. Elas nos contam, de modo resumido, o drama da fuga dos moradores. Após muita relutância, esses moradores abandonaram as belas casas senhoriais, abrigo de suas famílias por gerações. Fugiram do perigo do isolamento das noites e dos finais de semana, que os impedia até de abrir a janela; da vizinhança de bocas de fumo que se instalam em escombros de casas próximas; do inferno das buzinas e dos engarrafamentos durante os dias ditos úteis.

Nas casas abandonadas, rapidamente instala-se o mal. Trepadeiras enroscam-se nos beirais de faiança e, mercê das chuvas, eles desabam junto com os telhados mal cobertos. Perdida a proteção maior, as paredes interiores de taipa grossa, umedecidas, começam a esboroar. As paredes exteriores de pedra-e-cal permanecem de pé. Se cobertas pelos preciosos azulejos, são despidas, num piscar de olhos, por mãos piedosas que não querem as pequenas peças de porcelana, assim, mal empregadas. Melhor conservá-las decorando as paredes de suas modernas casas. E, com os azulejos, vão-se as grades artísticas de ferro fundido, as portas almofadadas de madeira de lei, as bandeiras das portas com vitrais coloridos, os beirais de faiança, os portais de cantaria...

Ao fim e ao cabo, o cenário é de cidade bombardeada. Onde a guerra não noticiada? E assim, uns poucos moradores renitentes, que se recusavam a abandonar tão inóspito lugar, logo se vêem rodeados de escombros. E rendem-se, fugindo, eles também. Condená-los, quem há de? Vai longe o tempo em que as residências das ruas dos Afogados, do Alecrim, do Sol, da Cruz, Pespontão, suas transversais e outras mais de endereço nobre eram disputadas pelas famílias de fino trato. Valorizava-as a brisa fresca do mar, a bela vista da baía de São Marcos, sempre à disposição das janelas dos mirantes. Contava também a proximidade com o comércio, repartições públicas, bancos, igrejas e logradouros importantes. Na São Luís de alguns anos atrás, morar fora desse núcleo, onde se alcançava tudo a pé ou em românticos bondinhos, era morar no arrabalde. O Mal se propaga acelerado pelas casas do Centro Histórico desta São Luís tão bela, Patrimônio da Humanidade, uma das cidades mais singulares do Brasil. Urbanistas, engenheiros, autoridades, mães-desanto, empenham-se em debelá-lo. Debalde. Resta-nos contemplar as ruínas dos casarões como contemplamos as do Partenon, as do Palácio do Rei Midas, as de Alcântara, e reconstituí-las, em todo seu esplendor, com a nossa imaginação Ou recorrer, urgente, aos sacerdotes da tribo de Levi.

Ceres Costa Fernandes

Quanta companhia nos faz um peixe? Nenhuma, dirão alguns; dentro d’água, nadando, traz tranquilidade, diriam outros; bastante mais do que a presença do meu marido, dirá a mulher desamada. Alguns glutões materialistas podem preferir a companhia efêmera, enquanto dura uma degustação, do peixe frito com arroz de cuxá. A resposta é complexa, envolve solidão, coisa fina e dorida. Difícil de lidar. E, então? Qual a razão desta pergunta despropositada? Veio da leitura de umas cartas, alguém ainda escreve cartas, criatura? Nem os Correios se animam a entregá-las mais. Sabe aquela propaganda antiga que dizia: Os Correios entregam cartas nos endereços mais estranhos, assim: na Rua Direita, primeiro canto, dobrar à esquerda, atravessar três ruas e, defronte de um pé de caju, está o nº 13, da D. Ritinha. Pois sim, remeta uma carta sem CEP e veja o que acontece, nem o procuram na Internet. Devolvem a cuja cheia de carimbos, destinatário não encontrado. Em áreas perigosas, mesmo com o CEP, não vão lá. Carteiro-herói enfrenta cachorro, diz o folheto, mas bandido já é demais. Penso que o gênero epistolografia se acabou. Que fariam, hoje, Abelardo e Heloisa, Fernando Pessoa e Ofélia, Sóror Maria Alcoforado, Carlos Drummond e Mário de Andrade? Penso que os casais enamorados e a freirinha ardente trocariam confissões manuscritas, tão frias, pelo celular. A voz aquece o amor. Trocariam emojis: um coração pulsando! O par de grandes escritores certamente pertenceria a um grupo de whatsaap de literatura. Não sobraria nada no baú para a posteridade bisbilhotar e editar. Ora, estou a enveredar por caminhos outros. Que cartas são estas que eu li? Aquelas que as crianças escrevem para Papai Noel – mito perverso pra deixar criança pobre esperando brinquedos que não terá – e que são “respondidas” por pessoas dispostas a colaborar com os sonhos dessas crianças. Os Correios promovem esse contato epistológrafo entre as crianças e adultos imbuídos, digamos, de espirito natalino. A mecânica é assim: as crianças escrevem para Papai Noel com o pedido e o endereço para entrega; as pessoas vão ao correio, leem e escolhem as cartas, deixam os pacotes dos presentes, identificados com os números das cartas, ao pé da árvore armada lá na agência. De lá, véspera de Natal, os funcionários, com muita pompa, levam os presentes em caminhões para a entrega. Sentei e li algumas cartas. Muitas pedindo celular e jogos eletrônicos. Colaborar com a alienação? Huum, não. Ainda mais, querem Iphones e jogos caros. Não é para meu bolso. Algumas, mais factíveis, pedem helicópteros, bonecas, dinossauros, bolas de futebol. Melhor. De repente, Joanilsson, 8 anos, pede um peixe, isso mesmo, um peixe. Para fazer companhia a ele e a sua avó, que moram sós. Puxa, não é um cachorro, um gato, mas um peixe. Obviamente dentro de um aquário. Ele não especifica. Fico com vontade de atender. E se alguma loja montasse o aquário na casa do menino? Quebra o sistema de entrega, é uma exceção. E a manutenção, alimento, luz, muito caros. E se o peixe morrer antes? Descartei o peixe. Atendi a outros pedidos. Mas o peixe não me saiu da cabeça. Nem a solidão dos dois. Os pais morreram? Separaram-se? Abandonaram o menino? Hoje, cada vez mais, avós criam netos, cercando-os de muito amor e dedicam a eles o tempo que os pais não mais possuem. Os resultados são bons e desmentem a expressão pejorativa “criado(a) por avó”. Gostaria de saber se Joanilsson ganhou o seu peixe.

PATRONO - DOMINGOS VIEIRA FILHO 1º OCUPANTE - JUCEY SANTOS DE SANTANA

CADEIRA 36 PATRONO - JOÃO MIGUEL MOHANA FUNDADOR - RAIMUNDO DA COSTA VIANA

CADEIRA 37 PATRONO MARIA DA CONCEIÇÃO NEVES ABOUD 1º OCUPANTE - JADIR MACHADO LESSA

CADEIRA 38 PATRONO - DAGMAR DESTÊRRO E SILVA 1º OCUPANTE - JOSÉ NERES

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O EMBATE, OPS... DEBATE

Basta o eleitor ouvir alguns minutos do "debate" para perceber que, não importa quem ganhe, o Brasil estará em boas mãos. Todos os candidatos têm ótimos projetos, excelentes planos de governo, são puros, refinados, educados, honesto e nada têm o que esconder dos eleitores. Mas... Houve quem vociferasse. Houve quem fizesse pose de galã, Houve quem prometesse o céu e quem até quisesse saber sobre o inferno. Houve quem apontasse o dedo em riste. Houve quem implorasse por um direito de resposta. Houve respostas que não respondiam. Houve dúvidas que se eternizaram. Houve dúvidas que viraram dívidas e dúvidas divididas que se multiplicaram ao infinito... Propostas rasas para todos os gostos.. Houve profundas falta de senso. Houve quem decorasse uma resposta de efeito com tanto afinco que, ao ser confrontado, tivesse que voltar ao começo para lembrar palavra por palavra o que deveria dizer, mesmo sem acreditar em nem mesmo uma das palavras que saltavam dos lábios nervosos. Houve quem fosse chamado de ladrão, de corrupto, de aproveitador, etc. etc. etc. Mas houve também que se sentisse ofendido por ter detalhes públicos de sua vida devassados e levados à tela. Parece apenas pelo menos até onde vi, que por ali não passou o tal de respeito ao próximo, nem a chamada empatia. Diante das câmeras, cada um procurava o melhor ângulo, fazia a melhor inflexão de voz , mostrava o rosnado mais ameaçador e... fugia da perguntas feitas. Contudo não fugiam por acidente, mas sim como ensaiada estratégia para não oferecerem ainda mais munição para os adversários. Interessante... Todos ali eram extremamente capacitados, honestos, dignos, mas viam diante de si alguém incapaz, desonesto e indigno... Parecem que se viam diante de um espelho... Sem refletir, reflito no outro o que sou, o que fui e o que serei. Reflexo de um hoje a ser refletido no amanhã. Como diversão, o debate foi interessante. Vários esquetes de humor, terror, distopia e de vergonha alheia preencheram uma programação vazia. Como anedota foi quase bom... Mas para decidir um voto foi uma verdadeira inutilidade.... e de mal gosto... No final, todos os candidatos e seus simpatizantes se sentiram vitoriosos. Caladinho, aqui no meu canto, só consigo fechar os olhos e repetir mil vezes: "Pai, perdoai, eles realmente não sabem o que dizem"

JOIZA COSTA SOBRE A OBRA DE JOSÉ NERES: "...PARA ALÉM DE UMA ESTRUTURA MÉTRICA IMPECÁVEL"

JOIZA CAMPOS

convidada da Academia Poética Brasileira

Joiza Costa e José Neres

A DOR SANGRA EM NOSSOS OLHOS

Joizacawpy Muniz Costa

José Neres com seu fazer poético em “A dor sangra em nossos olhos”, nos presenteia com uma poeticidade abundante, em estrutura de sonetos riquíssimos na costura poética de cada verso e de cada estrofe. Para além de uma estrutura métrica impecável, Neres traz em forma de poema a realidade nua e crua que muitas vezes é desagradável. De um jeito sensível e atento ele sobrevoa todo um panorama da realidade social desigual, em especial a ludovisense, dispensando arranjos de “brilhos” trazendo a realidade que às vezes se mostra na fome, na orfandade, no que ele denomina de sub-viver. “Fome inimiga e feroz mortal/Mercadoria que não se consome/Que não sai em coluna social/Famélicas crianças em orfandade/Social lutam pelo sub-viver/Mãos que pedem, roubam para comer/Restos de fétida sociedade...

O poeta externa toda sua indignação diante de um cenário social recheado de injustiça, traz para os versos um ar de revolta e denúncia. Evoca temas que muito são vistos, porém muito ignorados, principalmente por aqueles que devem resolver problemas de ordem social e humana. Mas para além dos que tem o compromisso oficial de resolver tais questões, traz também para nós cidadãos comuns momentos de reflexões sobre essas pequenas grandes responsabilidades e sobre nossas contribuições a essa sociedade ferida e marginalizada. Para além desses aspectos de incômodo diante das duras realidades sociais, José Neres oferece nesse título outros aspectos com um fio de filosofia dentro de sua tessitura poética, onde o lirismo transborda o refletir. “Na dura angústia em que me encontro/ Todo cheio de um vazio imenso/ Luto só por um pouco do nada/ para continuar vivendo.” Onde cabe o entendimento da enchente do vazio? Ou o entendimento de um preenchimento pelo nada para continuar vivendo? Entendimento? Talvez algum, mas o aspecto filosófico é provocar indagações, e o autor o faz com maestria.

Em” A dor sangra em nossos Olhos”, cabe um pouco de tudo, sociedade, amor, mentira, desilusão, tudo cuidadosamente costurado por um lirismo elaborado da mais alta qualidade que o escritor tem a oferecer.

JOSÉ NERES

Ignoradas por muitos, vista com desconfiança e/ou com preconceitos por outros, as obras literárias que valorizam as minuciosas descrições ou que pelo menos insinuam parte da intimidade das personagens são muitas vezes tidas como subprodutos literários. Sempre foram, contudo, consumidas na calada da noite ou mesmo por trás das diáfanas vestes de moralidade que constantemente ornamentam os diversos períodos de nossa sociedade.

Ao longo da história da humanidade, algumas obras foram consideradas obscenas e tiveram sua leitura desaconselhada para um público considerado muito jovem para ter sua inocência “corrompida” por autores que constantemente desrespeitavam a moral e os bons costumes. Obras como “Sonetos Luxuriosos” (Aretino), “Satíricon” (Petrônio), “Teresa Filósofa” (Autor desconhecido), “O Sofá” (Clébillon Fils), “120 dias de Sodoma” (Marquês de Sade), “Fanny Hill” (John Cleland), “O Decameron” (Giovanni Boccaccio), “Trópico de Câncer” (Henry Miller), “O Delta de Vênus” (Anaïs Nin), “A Vênus das Peles” (Sacher Masoch), “O Amante” (Marguerite Duras) e “História do Olho” (Georges Bataille), entre outros, divertiram e escandalizaram o público leitor e causam polêmicas que perduram até o presente momento. A literatura brasileira também é farta de exemplos de obras consideradas obscenas por alguns leitores, como é o caso de “O Elixir do Pajé” (Bernardo de Guimarães), “A Casa dos Budas Ditosos” (João Ubaldo Ribeiro), “Tara” (Cassandra Rios), “O Comitê” (Adelaide Carraro), “Pornochic” (Hilda Hilst), “Bom Crioulo” (Adolfo Caminha), “A Carne” (Júlio Ribeiro) “O Amor Natural” (Carlos Drummond de Andrade) e “Poética na Política” (Glauco Mattoso). Essas e outras obras dividem opiniões e são, não obstante o sucesso alcançado por seus autores, constantemente questionadas ou vistas como trabalhos de qualidade duvidosa. Isso ocorre às vezes por desconhecimento ou talvez por um preconceito atávico que inibe o contato com textos considerados “impuros” ou desaconselhados para determinadas faixas etárias, o que em muitos casos é bastante compreensivo. Conforme ocorre em todos os Estados da Federação, no Maranhão existem alguns autores e autoras em cujas obras podem ser encontradas cenas consideradas “quentes” demais. Em alguns casos, os livros são

verdadeiros clássicos com algumas pitadas de cenas picantes. É o acontece, por exemplo, em O Cortiço (Aluísio Azevedo) – impossível esquecer as cenas quem a sedutora Rita Baiana aparece e as peripécias de Pombinha, O Dono do Mar e Saraminda (José Sarney) – autor que descreve algumas cenas consideradas eróticas com grande maestria, e Noite sobre Alcântara (Josué Montello), onde o autor estimula o leitor a espiar pelas frestas de situações que podem até mesmo ruborizar os menos afeitos a algumas narrativas.

Mais recentemente, alguns autores têm reservado algumas páginas para apimentar a imaginação do leitor com cenas e descrições de corpos e de situações que oscilam entre a sensualidade e o erotismo. É o caso, por exemplo, de Bruno Azevêdo, que em “A Intrusa” e em “Breganejo Blues” discute temas como homossexualidade masculina e feminina, desejos carnais, fetiches e coloca suas personagens em uma infinidade de situações que tanto podem levar ao riso quanto à reflexão a respeito da sexualidade humana. Nessa mesma linha, entre o trágico e o riso, Joe Rosa, escritor mineiro há bastante tempo radicado no Maranhão, publicou os romances “O Gosto Amargo da Cereja” e “Sol para Quarto Mofados”, livros que trazem à tona discussões acerca de contágio por infecções sexualmente transmissíveis, principalmente a Aids, preconceitos sociais, adultérios, sexo na terceira idade, violência sexual, vingança e psicopatologias ligadas às frustrações sexuais. Em uma linha mais delicada, a romancista Dorinha Marinho publicou a novela “As Diferentes Faces do Amor”, que trata das relações amorosas entre duas mulheres, enfatizando dúvidas, prazeres e percalços que podem advir de relações amorosas como a que é trabalhada no livro, mas sem remeter a julgamento de valores e sem incentivar preconceitos. No entanto, quando se fala em páginas literárias “quentes” na literatura maranhense contemporânea, não se pode deixar de citar pelo menos quatro escritoras que, cada uma dentro de seu estilo, têm investido com mais intensidade nessa vertente. São elas: Eliane Morais, Ahtange Ferreira, Mônica Moreira Lima e Everlany Corrêa.

Autora, até o presente momento, de dois romances, “Comensais” (2014) e “Rol das Faces” (2019), Eliane Morais é uma premiada escritora que costuma trabalhar com personagens cosmopolitas e ambientar as narrativas em diversas partes do mundo. As mulheres de seus livros são geralmente fortes, decididas e sensuais. As descrições das cenas mesclam a delicadeza da paixão com o furor das entregas físicas. As descrições são detalhadas e costumam seguir uma sequência de começo, meio e fim, como se houvesse um ritual universal a ser inconscientemente seguido pelas personagens. As histórias são bem construídas e prendem o leitor ao longo de todo o livro. Já em Ahtange Ferreira, autora de livros como, por exemplo, “Marcas Indeléveis – é possível recomeçar” (2012), “Psicopatia – o inimigo pode estar ao seu lado” (2013) e “Teu Olhar – uma mulher, dois homens e um desejo” (2015), a narrativa costuma correr em ritmo de bestseller. As tramas são minuciosamente elaboradas e as cenas eróticas beiram à sofreguidão, desenhando na mente do leitor cada detalhe da relação física, mas sem deixar de lado as implicações sociais e psicológicas que podem resultar dessas entregas. Ahtange não se limita a contar uma história, ela acaba tecendo uma rede de intrigas que serve também para alertar o leitor sobre algumas relações aparentemente banais, mas que podem ser perigosas. A jornalista e escritora Mônica Moreira Lima é autora de dois livro de contos cujos títulos algumas pessoas preferem nem mesmo mencionar, por considerarem ofensivos: “Sexo para maiores de 18 (cm)” (2008) e “Pirocadas Avulsas” (2015). Em um estilo que prima pela brevidade e pela explicitação das intimidades das personagens, a autora consegue fazer o leitor rir das situações que são narradas. Os textos são curtos e certeiros, mas não são gratuitos. Deixam sempre alguma lição sobre temas que muitas vezes são vistos como intransponíveis tabus. Os contos de Mônica Moreira Lima são bem escritos e patrocinam bons momentos de leitura.

Por sua vez, a professora e escritora Everlany Corrêa, autora de “Diário de uma Separação” (2021), “Confissões de uma Amante” (2018) e “Amante para Casar” (2019) investe em uma literatura na qual a narradora apresenta um tom confessional, teoricamente fazendo um pacto autobiográfico com a autora, mas com trechos devidamente selecionados com a finalidade de causar a empatia com seu público-alvo. As histórias são geralmente narradas de uma forma cronológica e buscam manter uma coerência com relação

às obras anteriores. Ao longo dos textos, a autora discute violência, fetiches, relacionamentos abusivos, tudo mesclado com descrições de cunho erótico em narrativas sem primeira pessoa. Essas obras são geralmente voltadas para um público adulto. Algumas apresentam uma tessitura narrativa mais elaborada do que outras, mas todas podem oferecer bons momentos de entretenimento e até mesmo de aprendizagem. E, principalmente, seus autores e autoras merecem respeito, pois cada trabalho desse só chega às mãos dos leitores à custa de um grande investimento de tempo e de dinheiro por parte desses(as) escritores(as). A literatura maranhense tem diversas facetas, e essas obras consideradas eróticas por muitos ajudam a compor nosso cenário literário. Vale a pena ler esses trabalhos.

NOTAS DO EDITOR

ELIANE MORAIS é escritora, poetisa e romancista. Lançou seu primeiro livro, o romance intitulado “Comensais”, em novembro/2014. Tem contrato assinado com a Chiado Editora de Lisboa / Portugal. Pertence a SOBRAMES MA (Sociedade Brasileira de Médicos Escritores MA), membro correspondente da UBE RJ (União Brasileira de Escritores RJ). É participante ativa em congressos nacionais e internacionais, possui diversas poesias e contos em Anais e Antologias.

AHTANGE FERREIRA é imortal da Academia de Letras de Paço do Lumiar, palestrante e militante contra a violência doméstica, em Paço do Lumiar, coordena a campanha “Maria da Penha em Ação: Por um Paço sem violência”. Participou em 2015 do projeto Mochila Literária em Fortaleza, participou fazendo lançamentos nas bienais do Rio e de São Paulo, Feira do Livro de São Luís entre outros eventos no cenário literário. Dona de uma narrativa ágil, em que a constante movimentação das personagens se torna um imperativo para prender o leitor, a autora utiliza-se de diversos recursos para manter e compor sua narrativa. De acordo com Ahtange, ao mergulhar nas páginas de “Teu Olhar”, qualquer leitor estará diante de um livro que, apesar de algumas cenas mais próximas à estética neo-naturalista, prima por uma visão romântica da realidade, com uma divisão maniqueísta da vida, com o bem e o mal claramente delineado..

jornalista, escritora e radialista MÔNICA MOREIRA LIMA Aos 47 anos, ela se tornou líder de audiência no Maranhão e musa nas redes sociais. O motivo é um só: o jeito desinibido e provocativo com que trata de sexo no programa “Sem vergonha”, da TV Guará, afiliada da Record no Maranhão. Com 30 anos de carreira, Mônica sempre chamou atenção por sua fala enérgica e posicionamento contundente — e até mesmo parcial — em assuntos políticos ou mesmo em pautas policiais. Mas foi no comando do programa, criado especialmente por e para ela, que seu nome caiu na boca do povo.

EVERLANY CORRÊA - Escritora | Conteudista São Luís, Maranhão, Brasil - Professora efetiva, aprovada em concurso público pelo munícipio de Santa Helena-Ma. Escritora nata e por paixão; autora de "O mal do século", "Amor proibido", "Os encantos de Helena" e "Confissões de uma amante". Muitos amigos próximos e alguns conhecidos, me procuram bastante, já faz algum tempo, para que eu possa ajudá-los de alguma forma. Seja para fazer uma revisão de um texto, um artigo científico, uma simples mensagem de aniversário para um amigo ou namorado(a) e, por incrível que pareça, até um status para o Whatsapp.... então, devido a isso fiquei refletindo sobre quantas milhares de pessoas espalhadas por aí, têm essa mesma dificuldade e, foi pensando nisso que decidi criar um meio de ajudar a quem precisa, e, é claro, sendo remunerada por isso. Em suma, eu gostaria de oferecer o meu trabalho como FREELANCER, para executar revisões de textos, elaborar artigos para blogs, conteúdos para sites, mensagens exclusivas de aniversários de namoro, casamento, de reconciliação e até rompimento. O conteudo não importa. O cliente é quem diz.

JOSÉ NERES

NEURIVAN SOUSA – UM SEMEADOR DE PALAVRAS - Região Tocantina (regiaotocantina.com.br)

Imagem fornecida pelo autor. Como praticamente tudo no mundo, a literatura está sempre em processo de renovação. Novos livros e autores iniciantes convivem com obras consagradas e com nomes que são considerados referência nos vastos terrenos das letras tanto em prosa quanto em verso. Apesar de algumas pessoas ficarem presas ao passado e à tradição, é sempre importante observar o surgimento de novos valores, que nem sempre aparecem com o objetivo de desafiar um sistema literário hipoteticamente solidificado, mas sim como forma de oportunizar novas experiências de leitura para os admiradores da literatura. Um desses talentosos escritores que vem conquistando espaço entre os leitores é o poeta Neurivan Sousa, que tem se dedicado à poesia e às obras voltadas para o público infanto-juvenil. Nascido no município de Magalhães de Almeida, quase na metade dos anos de 1970, quando o Brasil enfrentava um momento histórico bastante complexo, o jovem mudou-se para a cidade de Santa Rita, onde fincou raízes. Além de poeta e prosador, Neurivan Sousa é também professor e já participou de diversas antologias, tendo publicado os seguintes livros: “Polifonia do silêncio”, “Lume” (2015), “Palavras sonâmbulas” (2016), “Minha estampa é da cor do tempo” (2017) e “O pequeno poeta” (2015-2017) e “Ribamar: o menino peixe” (2020), voltados para o público infanto-juvenil, mas recomendados para leitores de todas as idades. Desde seus primeiros trabalhos, Neurivan Sousa demonstrou uma criteriosa preocupação com a escolha das palavras. A construção de seus poemas evoca sempre um cuidado com as escolhas lexicais e com o conteúdo a ser transmitido. Não são poemas escritos com o objetivo de apenas preencher uma página ou de solidificar imagens poéticas sem profundidade. O que se percebe é que o poeta está sempre atento aos acontecimentos do mundo, seja com relação às questões sociais, seja nas incursões do ser humano em suas próprias angústias e (in)decisões. Em “Lume”, no poema As palavras (pág. 42), ele leva o leitor a atentar para a ideia de que: as palavras não ditas se tornam fantasmas daqueles que um dia cortaram as suas asas. Essa luta com as palavras, como diria Carlos Drummond de Andrade, é uma constante na poética de Neurivan Sousa, conforme pode ser visto no poema que dá título ao livro “Palavras sonâmbulas” (pág. 34), no qual é possível encontrar a seguinte estrofe inicial:

As palavras me vieram transversas e sonâmbulas, teimando em fazer ninhos na poeira de meus olhos. A escrita parece fazer parte do metafórico cardápio essencial desse poeta que procura sempre as melhores soluções para condensar suas ideias nas páginas dos livros. Como faz parte de uma necessidade premente, o convívio com as palavras acaba servindo como uma espécie de válvula de escape para tudo o que atormenta o eu lírico, conforme pode ser visto no poema Móbil, na página 51 de “Palavras sonâmbulas”: Escrevo. Escrevo… para não morrer de silêncio. Afogar-me neste mar, onde as palavras sempre nadam para o fundo, para o nada, seria morrer inutilmente na exorbitância de ser eu. Logo no primeiro poema de seu livro “Minha estampa é da cor do tempo”, o poeta explicita sua relação com as palavras, que não são vistas como “espuma ou pétalas / Nem como aço ou brasas” (pág. 13), mas sim como um poderoso meio de transformação do ser humano normal em uma espécie de demiurgo capaz de desafiar até mesmo as mais poderosas forças do universo, “porque o oficio do poeta / é rivalizar com Deus” (pág. 13). Imbuído da concepção de que: O poeta É um sujeito E-GO-ÍS-TA! Não se sujeita A cabrestos (pág. 42), O poeta se permite dessacralizar imagens e palavras sem ser ofensivo ao dizer que: Ser poeta é ouvir O estrondo do trovão E dizer dentro de si: “Deus soltou um pum!” (pág. 43) Para esse escritor, as palavras podem ser utilizadas de modos diversos. Às vezes, elas patrocinam experiências inefáveis, em outros momentos, elas podem servir como instrumento de denúncia social e como grito de desespero diante das injustiças do dia a dia. As palavras são capazes de reproduzir situações ou de reconstruir universos inteiros. Eliminam ou potencializam a sensação de alegria ou frustração. Constroem muros ou derrubam paredes. Servem como açoite a fustigar feridas ou como lenimento que alivia as dores do mundo. Podendo, inclusive, como aparece em seu mais recente livro – “No éter da voz” – ser um refúgio para as inúmeras batalhas internas que enfrentamos no dia a dia: No útero da palavra me refugio de mim para desintoxicar o sangue das ideias (pág. 30) Neurivan Sousa é um poeta consciente de que a palavra é sua matéria-prima e que ela pode (e deve) ser moldada e trabalhada para dali obter o melhor resultado possível. Mas ele não se contenta com essa matéria em forma bruta e passa o tempo a lapidar os versos até conseguir extrair as imagens poéticas que julga mais pertinentes. Em seus versos, mesmo o leitor menos atento ou menos afeito às lides com as metáforas acaba percebendo que a junção entre a melodia das palavras e o contexto onde elas estão empregadas pode trazer um novo e talvez inusitado sentido àquelas ideias que antes pareciam comuns e isentas de poesia. Como as letras estão sempre em processo de renovação, é importante estar atento ao surgimento de poetas como Neurivan Sousa e muitos outros que despontam pelo Brasil afora. O tempo não para e está sempre pronto para trazer novidades a nossos olhos. Afinal de contas – conforme este escrito em “No éter da voz”:

As folhas do calendário não carregam pétalas ou pólen (…) Porque sabem que a vida é vento Em semeadura circundante. (pág. 33) Que venham muitos outros poetas nesta eterna semeadura de palavras. O mundo precisa de poesia!

O PROF. JOSÉ NERES E O VEREADOR MARCIAL LIMA, HOMENAGEADOS DO 50O. SARAU DE ATHENAS (ACADEMIA ATHENIENSE DE LETRAS E ARTES), COM O MÉRITO ATHENIENSE, POR SEUS RELEVANTES SERVIÇOS À CULTURA DE NOSSA CIDADE.

PATRONO - JOSÉ TRIBUIZI PINHEIRO GOMES FUNDADOR - JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA

O METAVERSO CONSTITUCIONAL

outubro 6, 2022 por a pena do pavão, publicado em opinião

O METAVERSO CONSTITUCIONAL – A PENA DO PAVÃO (apenadopavao.com) Ano 10 – n. 61/2022 Por volta de maio me deparei com esta temática e me pus a refletir sobre a influência desse novo conceito, pelo menos para mim, introduzido de forma maciça nas redes sociais. Busquei informações e me indaguei: Onde, afinal, caberia falar de metaverso? Qual a sua utilidade no Direito e como, especialmente, eu poderia abordar o assunto no campo jurídico, particularmente, no Direito Constitucional?

A reflexão não chegou ao término, porque as ideias acadêmicas, quando comprometidas com a Ciência, demandam sobretudo a boa fé do estudioso, transitam pela neutralidade científica (alguns a negam), exigem imparcialidade de abordagem e, sob pena de se desconfigurar, devem desembocar na honestidade de propósito. Por isso, já afirmo que meu propósito é abordar o assunto apenas sob uma perspectiva sintética, dada a natureza do texto. Dito isto, que me seja permitido refletir. Nesta data me deparei com uma declaração atribuída a um ministro do Supremo Tribunal Federal – no caso o ministro Gilmar Mendes – de que, ao se manifestar sobre os 34 anos de vigência da Constituição da República, destacando a “coragem dos ministros da Corte em proteger a democracia”, teria afirmado que quem achar que o STF interfere nos demais Poderes da República “vive no metaverso do mundo institucional”. Será mesmo? É preciso considerar que não se exige “coragem” de nenhum servidor público que receba sua retribuição financeira para aplicar a Constituição da República. Não é ela norma de etiqueta que possa ou não ser afastada. Ao assumir o “munus” que lhe entrega a República o dever é de dar cumprimento ao compromisso, que não se mistura com promessas. Logo, o desempenho da função dispensa coragem e exige sentimento e fidelidade constitucional.

Ora, não preciso invocar números de processos, causas, “causos” e acontecimentos para considerar que a Corte já conseguiu colocar seu Regimento Interno sobre a Constituição, quando confundiu a extensão física do seu prédio com a abrangência da jurisdição territorial na aplicação do Direito vigente. Isto não é pouco, porque desafiou até mesmo a “GRUNDNORM” do memorável Hans Kelsen, tão decantado pelo decano. Mas posso relembrar fatos como o impedimento de nomeação de autoridades pelo Presidente da República, em que foram discutidas conveniência e oportunidade do ato. A reiterada concessão de prazos para explicações sobre fatos e motivações de viagens e deslocamentos do mesmo Chefe do Executivo, inclusive

quando, como Chefe de Estado, no exterior. A adoção de matéria jornalística desmentida para cercear a liberdade de manifestação assegurada pela Constituição. A instituição de pena sobre tipo penal inexistente para assegurar a sobrevida de uma investigação que, de tão atípica e teratológica, foi batizada por um dos membros do Tribunal de “Inquérito do Fim do Mundo”. A subtração de reconhecimento da legitimidade penal exclusiva do Minsitério Público. A limitação do exercício dos poderes do Presidente da Câmara sobre prerrogativas assesguradas pela Constituição, em função da inviolabilidade de mandatos de parlamentares. A desconstituição de medida legislativa de câmara de vereadores sem qualquer dimensão de sopesamento de princípios constitucionais, como no caso de Curitiba. As prisões de parlamentares, as buscas e apreensões e as prisões de jornalistas e advogados que perduram até hoje. Note-se: em muitos casos monocraticamente.

Tudo isto homenageou a Constituição da República? A resposta eu deixo com o leitor, porque da Ordem dos Advogados do Brasil, que ficou em silêncio sepulcral, quando não coonestou com algumas das medidas, nada mais posso esperar. É habitual na Academia, no primeiro dia de aula, eu afirmar, com a liberdade de cátedra que ainda me é assegurada, que tentarei ensinar a Constituição da República de 5 de outubro de 1988, nenhuma das outras 11 existentes informalmente no Brasil. E por que digo isto? Bom, porque com mais de 30 anos lecionando Direito Constitucional jamais vi tanto ativismo judicial com os sutis rótulos de “mutação” (que suprime competência do Poder Legislativo), releitura constitucional, adaptação constitucional, construtivismo, concretização de normas, protagonismo edificante para enfrentar a fossilização da norma no tempo, e um “Aurélio” de substantivos e adjetivos que douram a violação aos artigos 2o. e 60, parágrafo 4o. da Constituição da República. Quem está no metaverso? Os que criticam, no exercício moderado do direito de manifestação, com o propósito de defender o aperfeiçoamento institucional e democrático do Brasil? Como defensor incondicional do sentimento constitucional eu celebro a releitura cívica da Constituição, onde o subjetivismo não ganhe espaços para subverter as decisões da Assembleia Nacional Constituinte que, em nosso nome, na impoluta figura do deputado Ulysses Guimarães, declarou que era um documento que deveria ser respeitado e cumprido. É necessário celebrar, sim, os 34 anos da Constituição da República, já não tanto autêntica ou original quanto a que restaurou liberdades que, pelo visto nos últimos anos, tem sido alvo de ultrajes e até supressões. A segurança jurídica é uma condição necessária e inafastável para que as instituições permaneçam sólidas, porque estáveis, em atenção à Constituição. Ela não é uma folha em branco entregue a nunhum dos Poderes da República. Mas para isto não deve haver espaço para criativismos judiciais que escrevam uma norma paralela, superior à que nos identifica como nação soberana perante a comunidade internacional. O metaverso é um espaço virtual em 3D, de certa forma abstrato, em que uns poucos pretendem ressignificar operacionalmente a relação humana. É uma possibilidade de inteiração em ambiente virtual. Não é nada além disso. Apenas é uma alternativa onde a interrelação de pessoas pode ocorrer, com seus mesmos vícios. É na realidade cotidiana que as coisas acontecem e precisam obedecer, fielmente, as normas postas pelo legislador. No mais, só estaremos diante da realidade virtual do metaverso constitucional. Viva os 34 anos da Constituição da República, até do metaverso, que não necessita de censura apelidada de regulação.

CADEIRA 40 PATRONO – JOSÉ RIBAMAR SOUSA DOS REIS 1º OCUPANTE - ROBERTO FRANKLIN

Roberto Franklin

O poder que a fotografia tem, o que ela produz em nossas mentes, as lembranças, o tempo passado, pessoas que partiram, pessoas que foram importantes, tudo isso nos revela uma fotografia antiga quando abrimos, tem o poder de reaproximar pessoas que não convivem mais, a fotografia nos traz muitas lembranças e decepções, tem o poder de reunir outra vez, produz em quem está revendo, no caso de uma pessoa ou de uma paisagem um momento, ele nos enfeitiça, ela produz em quem está revendo uma dose excessiva de adrenalina, saudades ou não. Isso aconteceu hoje quando me dirigir ao meu escritório, local que passo minhas manhãs, recebi um e-mail one drive avisando que teria fotos para recordações, ao abri deparei com várias fotografias do meu irmão que infelizmente já partiu e hoje está vivo em nossas lembranças, fotografias de 1995 em uma viagem que ele realizou com sua esposa Aída e seus dois enteados, pelo Nordeste. Uma foto chamou-me a atenção, ele estava sentado em uma cadeira num bar de praia, de chapéu de palha de calção de banho e o que mais me tocou, na foto ele mandava um beijo levando sua mão até a boca, esse era meu irmão Franklin, ou melhor Franklinho como nós o chamavam, uma pessoa alegre, gozadora, amava o Botafogo e o seu Corinthians, gostava de uma cerveja bem gelada. Ao visualizar a fotografia sentir-me beijado, com aquele beijo que no passado recebia, isso provocou uma dose exagerada de saudade e de boas recordações. Franklin era boa praça, lembro-me que sempre nas noites de sábado, após saímos das casas de nossas namoradas nos juntávamos e geralmente íamos para um bar que agora não recordo o nome, ficava no bairro do Felipinho, assim com em determinadas boates de nossa ilha, lá encontrávamos os amigos que eram sempre dele, eu ia de gaiato, não trabalhava na época só estudava e ele era quem pagava sempre a conta. Aos domingos íamos sempre para a saudosa praia do Olho d´água, saudosa pois agora não está mais como antes, tomávamos banho ele com a namorada e eu somente paquerava. Franklin juntamente com sua esposa era cativo aos sábados aqui em casa. Quantas partidas de futebol assistimos juntos no estádio Nhozinho Santos, quantas alegrias, quantas decepções tivemos juntos. No carnaval era outra festa, íamos para o querido Jaguarema, depois sempre ao final das festas íamos comer uma peixada ou lanchar em um dos abrigos da Praça João Lisboa, foram tempos de muito companheirismo e trocas de confidências. Esta foto me fez rolar lágrimas de uma saudade imensa. Quando soube que ele estava doente, quando soube que ele estava internado, não tive a coragem de ir visitá-lo, Franklin era alegria, aquele lugar, não era o dele, tenho a certeza de que mesmo ali ele ria e gozava de todos. Não quis guardar uma imagem de Franklin numa cama de um hospital, preferi guardar a imagem igual à da foto, ele sentado alegre a mandar beijos para todos. Franklin era alegria, as coisas que aparecem fazem-me lembrar de bons momentos, hoje meu irmão está longe, já não ouço mais a sua foz já não sinto mais seu sorriso, sua gozação, era uma expressão que ele gostava muito ele sempre dizia: “EU QUERO É SEGAR “, assim como gostava de cantarolar: “EU QUERO É BOTAR MEU BLOCO NA RUA” Assim era meu irmão, que Deus te guarde e te reserve um bom lugar, MEU IRMÃO FRANKLINHO “.

Nesta quinta-feira pela manhã, estava no escritório escrevendo o quarto capítulo de um conto, baseado numa parte que publiquei na semana passada em minha página do Face, quando o amigo Sérgio Azevedo mandou uma mensagem pelo WhatsApp. A mensagem mostrava uma pessoa do sexo feminino tocando no acordeom uma música da banda Os incríveis, que na nossa época, não era uma banda, e sim um conjunto, então, corrigindo, uma música do conjunto Os Incríveis. A música se chamava O Milionário, acho que lançada em 1967. Nesse ano eu estava com os meus doze. O sucesso foi tamanho que perdurou por um bom tempo. Voltando ao vídeo que o Sérgio mandou, eu já tinha ouvido várias interpretações da música, porém ao som de um acordeom (sanfona), não. Imediatamente após ouvir a música, fui levado mais uma vez para época da juventude,uma época de ouro, uma época de ingenuidade, em que o máximo era vestir calça boca de sino, calça de toureiro aquela da cintura alta, botinha buzolin, cinto de couro, tendo como fivela o emblema da Volkswagen, assim como anéis de carcará. Lembram o que era? Pois bem, carcará era aquele dispositivo que vinha nos fuscas para lavar o para brisa, agora não me perguntem como nós arranjávamos os tais acessórios. Ao som da música, que embalava nossas tertúlias, fui levado para anos distantes, onde nós nos encontrávamos com aquelas, sabe, as meninas que paquerávamos no colégio e não tínhamos a coragem necessária para nos declarar. Pois bem, fiz uma viagem no tempo, senti o gosto maravilhoso do ponche... isso mesmo, era nossa bebida da época, com um grau de álcool muito baixo, parecia mais um refresco. Era servido em um pode de vidro com uma concha, nós a enchíamos e colocávamos no copo, aquilo era maravilhoso, podíamos beber ponche, era um grande momento, como falei anteriormente, uma época ingênua, em que no máximo tomávamos essa bebida. Devo dizer que também estávamos começando a fumar. Cara, era o maior lance, já estávamos virando adultos! Assim era nossa juventude ao som dos Incríveis, Renato e Seus Blue Caps, Golden Boys, e muitos outros, embalavam nossos sonhos. Dançávamos com as mãos entrelaçadas levando ao peito, rosto colado aos das meninas, dava para sentir o perfume, acho que até hoje muitos ainda guardam a essência do perfume das garotas com as quais dançávamos. É isso quando recebi a mensagem, imediatamente falei para o Sérgio: “meu amigo, sou saudosista e sentimentalista, guardo recordações de épocas, de fatos que vivi, de momentos ingênuos, de situações que fazem o coração bater forte, as mãos suam e as lembranças afloram. Ao som de uma única música, este fato foi o bastante para levar ao passado e nele voltar a sentir-me jovem, escutando as músicas que marcaram minha vida. RobertoFranklin -ALL, ALTO, AVLA, AMCL, SCLMA

ARTIGOS

Jornal ‘O Estado do Maranhão’, 24.7.73.-Ilustração: foto do poeta Carlos Cunha, no Salão nobre da Academia Maranhense de Letras, ao saudar ‘Silêncio Branco’, livro de estréia de Fernando Braga, na noite de 30 de dezembro de 1967, vendo-se ainda o jornalista Elbert Teixeira [também de saudosa memória] que transmitia o evento para a Rádio Timbira.

POESIA DE ONTEM

É fácil escrever-se alguma coisa sobre poesias, principalmente quando essas poesias nos chegam fáceis e com forte conteúdo de comunicabilidade. Assim, são as poesias contidas no livro ‘Poesia de Ontem’, de Carlos Cunha [São Luis, 18.5.1933 -São Luis, 22. 12.1990]. Retirei o livro da estante, com afetuosa dedicação a mim, e reli com o interesse de sempre, as mensagens rítmicas que o autor, agora não só de ’poesia de ontem’, mas de hoje também, conseguiu, com a profundeza do seu talento e com o desassombro de sua vocação, justificar uma causa e harmonizar um conflito. Numa das muitas opiniões sobre esse trabalho chega-se a mergulhos mais densos na conteudística do poeta, vez que “sua poesia tem sido uma continuo campo de angústia, produto, talvez de sua infância de menino pobre, de bairro pobre, pobreza que ele estendia pelo futuro incerto, como ele mesmo faz questão de acentuar. Sua poesia é, ainda, como que o eco extravasado de sua alma,tem um grito revoltado de um poeta em que a vida malvada ainda o sufoca possivelmente com medo da sua pujança e do seu talento. Carlos Cunha trás na inquietude dos seus gestos, a marca registrada dos sofrimentos de uma vida prenhe de desilusões e fantasias inacabadas, válvula de escape para a criação de belas canções. E, foi assim, infelizmente, pelo memorial de toda vida... Vejamos o poeta se transportando para o Monte Castelo, antigo bairro do Areal, onde majestosamente se erguiam as “barrigudas” **, depois cortadas pela insídia costumeira dos governantes da Cidade de São Luis, que deveriam ser mais poetas que políticos para melhor compreenderem as coisas do espírito; mas sim, retomando, para o velho Areal, seu bairro de origem, para envolver-se nesta bela irradiação formal: “Eu quisera de novo ser criança, / perdida nas ruas, / nas ruas cinzentas, sem cheiro de sangue / e muros, pintados de misérias./ Eu quisera de novo ser criança, / para beijar aquela face nova, / e depois tomar banho de chuva./ Mas o tempo correu, / o rosto de mamãe se transformou / e eu jamais voltarei a ser criança!” Ou ainda num laivo de revolta ou desespero: “Menino pobre, menino do meu subúrbio, / Papai Noel não te quer...” Em cancioneiro do menino grande, Carlos Cunha com a mesma temática aproveita-se da paisagem distante, já perdida nos tempos para elaborar com grande felicidade este poema, uma constante em suas relíquias de retrospecção: “Ainda escuto a fala do meu pai, /iluminando o silêncio de tapeçaria, / de nossa casa de telhado verde. / Um rio que lavava a ruazinha estreita/ não vegetava as mágoas. /Ainda escuto a canção de aurora/que tocava o homem do realejo/ com seus olhares retos, e o sorriso de orvalho./Saudades de Maria, com seu olhar umedecido de alvorada./Muitas vezes, muitas, percorri a rua/ carregando sonhos nas mãos inocentes,/ brincando com meus irmãos/ que nesse tempo eram apenas anjos de porcelana,/ num país sem memória./ Hoje Rominha tem outro nome e outras crianças que ali residem,/ a perspectiva das casas tornou-se paralela./ Deuses tiranos caminham sobre a lama viva / e os jardins que sorriam como janelas são de nuvens”. [...] E prossegue: Como a infância corre depressa na terra grávida do tempo./ Os meus castelos, já não são fantasiados de papoulas,/ mas castelos de vento./ Os meus sonhos agora, já não tem cor de gerânio/ e o sol que havia no meu olhar tornou-se uma saudade ancestral.” Carlos Cunha é o representante autêntico da sua geração, surgiu por suas estrídulas declamações [o maior declamador de São Luis], mercadejando versos em saraus pela boêmia da cidade, que o ouvia encantada e agradecida, pela rítmica em dizer e pelos gestos comoventes que saiam de seu estar transfigurado... E à hora e a vez dessa liberdade, foi diante da estupidez da morte... Seu filho morto, longe de tantas Cristinas: “Gritos anônimos diluíram-se no espaço por sua causa -/ e a lua tornou-se imperfeita e confusa por sua causa -/ os homens serão peixes e pássaros por sua causa -“ Mas não estancou aí essa motivação maldita, o poeta ainda precisava fazer as pazes com a tragédia, para, infelizmente, enriquecer seu acervo literário de tristezas, bem

como de odes antológicas, o celeiro do Maranhão, berço de grandes poetas: “As rosas entreabriram-se magoadas,/ quando a plácida Tereza passou nos braços da multidão./Velhos e crianças, homens e mulheres choraram/ naquela triste manhã de agosto,/ só eu permaneci imóvel/ assistindo ao seu último passeio./ As luzes da vida se apagaram e dentro de mim mesmo,/ sem cravos e violetas,/ meu funeral passou nos braços doutra multidão!” Meu Deus, este poema de Carlos Cunha fora timbrado pelo estigma e pela dor da premonição... Algum tempo depois, morria Tereza, filha e enlevo maior do poeta, dentre as muitas Cristinas... Achei em ‘O Caçador da Estrela Verde’, livro de memórias de Carlos Cunha, que me foi generosamente presenteado pela minha querida amiga, professora Moema de Castro Alvim, já falecida, proprietária da alfarrabia ‘Papiros do Egito’, uma carta do Cônego José de Ribamar Carvalho, professor de Cunha na Faculdade de Filosofia e seu grande amigo, tanto que foi seu recepiendário na Academia Maranhense de Letras, a dizer, a ele, Cunha, em certa altura, que “a Poesia precisa ser sentida para se tornar percebida. Não há inovações. É a simples aplicação do axioma aristotélico de que vai ao intelecto sem antes passar pelos sentidos. Eu disse poesia. Verso obedece a leis de estéticas mais ou menos rígidas ou universalmente livres, conforme o gosto [do poeta e não do crítico]. Quanto à aceitação da mensagem poética, depende muito do hermetismo em que é vazada e da maior ou menor capacidade de expressão”. E Carlos Cunha, tal qual o mestre lhe ensinara, obedecera à risca! Carlos Cunha e ‘Poesia de Ontem’ se identificam com circunstâncias e coragem, com sofrimentos e lirismo. O poeta ficará presente [e ficou] em nossas letras... Era isso mesmo ‘poetinha’, isso mesmo que agora escrevi, aquelas mesmas palavras que num dia de chuva e grogue eu t’as disse.

__________________ ** “Barrigudas” eram os nomes popularesdados a enormes árvores, de troncos artisticamente talhados pela natureza, erguidas em frente, a hoje Igreja da Conceição, no bairro do Monte Castelo, decepadas pela incúria administrativa da Cidade.

• A PROSA GEOGRAFICAMENTE HUMANA NO HORIZONTE DA POESIA

• • • RESUMO - O presente artigo visa a fazer uma análise teórico-literária do livro intitulado “Os mapas sinalizam ilhas submersas”, do poeta maranhense Franck Santos, observando a ideia do espaço íntimo, da fenomenologia da imaginação poética, trazida à baila por Bachelard e a ideia de ilha, preestabelecida na obra de “A Ilha deserta e outros textos”, de Gilles Deleuze. Este artigo também põe em debate o aspecto interdisciplinar da literatura, quando propõe uma análise do espaço poético dentro de uma visão geográfica e à luz da psicanálise. A proposta também é permitir a contemplação da

Literatura do Maranhão, a partir de um olhar sob um poeta maranhense contemporâneo.

• • PALAVRAS-CHAVE - Poética do Espaço, Gaston Bachelard; Ilha deserta e outros texto, Gilles

Deleuze; Literatura maranhense; Teoria Literária; Poesia; Filosofia; Geografia. Desterritorialização.

• • 01 INTRODUÇÃO • • Este artigo tem como proposta fazer um estudo literário sobre o livro de poesias “Os mapas sinalizam ilhas submersas”, do autor maranhense Franck Santos. Trata-se de uma obra lançada pela Editora

Penalux, Guaratinguetá, São Paulo, publicada em 2018, qualificada como prosa poética, com 122 páginas. A obra se divide em duas partes: Terra e Água, e vai ser analisada dentro de um diálogo entre a literatura e a filosofia, tendo como norte o pensamento de Deleuze, em sua obra “A Ilha deserta e outros textos”; a “Poética do Espaço”, de Gaston Bachelard; o “Espaço literário”, de Maurice Blanchot e “O demônio da Teoria”, de Antoine Compagnon. • Escolheu-se fazer a análise do citado livro de poesia, para evidenciar quão importante tem sido o estudo da filosofia, alinhada à geografia, para a linguagem literária, ao mesmo tempo em que demonstra como os escritores maranhenses da atualidade têm evidenciado a importância das paisagens e espaços dentro do seu fazer poético. • A abordagem dos filósofos aqui selecionados dar-se-á pela noção com que esses autores desenvolveram suas teses voltadas para o espaço-geográfico e o espaço-literário. • Por meio da obra de Deleuze, estudar-se-á a “Ilha deserta”, na qual a proposta do objeto é uma forma de recriação do mundo, a partir de situações provisórias de confinamento que a própria ilha oferece.

Dentro desse contexto de imagem, observa-se-á o diálogo entre a literatura e a filosofia, em que também se descobre a dupla face etimológica da palavra Semiologia que, concomitantemente, é um ramo da medicina que cuida dos sintomas das doenças e a ciência geral que tem como objeto os sistemas de signos. Assim, trabalhar-se-á a filosofia deleuziana dentro do que ela se propõe, como um sistema “clínico” que perscruta os “sintomas” poéticos dentro do funcionamento da máquina do pensamento e da linguagem. Analisar-se-á, portanto, a tendência da poesia de Franck Santos dentro desse confinamento a que a ilha remete. • Em contrapartida, a “Poética do Espaço”, de Gaston Bachelard contribuirá para a determinação de um estudo fenomenológico das imagens poéticas, uma vez que o filósofo cuida da análise dos espaços íntimos, trabalhando a relação afetiva e psicoemocional, de modo a reconstituir a subjetividade das imagens e medir a sua amplitude. Do pensamento bachelardeano serão extraídos conceitos relevantes para este estudo literário, mormente por trazer, no primeiro capítulo de sua obra, conceitos básicos do espaço da casa; do porão ao sótão; de cabana; conceitos esses que se iniciam dentro de contexto subjetivo a que ele denominou de microcosmo, para relacionar-se dentro do contexto universal (macrocosmo). Usando, metodologicamente, o pensamento de Bachelard para análise da obra de

Franck Santos, analisar-se-ão também novos espaços microcósmicos levantados na “Poética do

Espaço”, como as gavetas, armários, cofres nos quais se guardam a memória, bem como o ninho, a concha que suscitam a ideia de proteção e amor, bem observados na poesia de Franck Santos. • Em relação à obra “O espaço literário”, de Maurice Blanchot, tem-se que ela contribuirá com este artigo, dados os conceitos trazidos à baila, como o de linguagem atinente à organicidade do mundo que o filósofo denominou de “palavra bruta”, linguagem do cotidiano, da comunicação diária, para contrapor-se à linguagem como palavra essencial, ou seja, a palavra literária; a primeira (bruta) não lapidada; a segunda (literária) como apresentação do próprio espaço discursivo, reportando-se a uma literatura que se refere a si mesma. • Usar-se, também, como complemento de recursos metodológicos, a obra “O demônio da Teoria”, de

Antoine Compagnon, para confronto daquilo que o autor chamou de “contraste entre teoria e senso comum”, observando as flexibilidades que transitam entre as correntes voltadas para a literariedade, a intenção do autor, a representação, a recepção, além de estilo, história e valor.

• • 02 DESENVOLVIMENTO • • Atualmente, tem sido comum usar-se a interdisciplinaridade para abordar aspectos interessantes dos fenômenos literários. A literatura tem sido alvo daquilo que os teóricos chamam hoje de geografia literária, abordando, por vezes, a questão dos espaços poéticos, como bem observado na obra de Gaston

Bachalard. É ele quem esclarece, de forma filosófica, o problema da imagem poética, ao conceituar a fenomenologia da imaginação: “Esta seria um estudo do fenômeno da imagem poética no momento em que ela emerge na consciência como um produto direto do coração da alma, do ser do homem tomado na atualidade” (BACHALARD, 1978, p. 184). • A leitura do livro “Os mapas sinalizam ilhas submersas”, do poeta maranhense Franck Santos, por seu turno, acabou contemplando a possibilidade de uma análise dentro dessa proposta bachalardeana, já que a obra produz esse diálogo com o coração, com alma, o ser do homem. • Ademais, as ilhas submersas, a que Franck Santos se refere, também sinalizam o mapa de viagem das

“Causas e razões das Ilhas desertas”, de Deleuze. Foi imediata a necessidade de encontrar, no filósofo, um sinal que levasse aos mapas do poeta, ou de criar uma nova relação entre a filosofia e a literatura.

Buscou-se, pois, uma luz, no texto deulezeano, com a qual se pudessem clarear as ideias rasas e nebulosas para chegar às ilhas submersas. Não é todo dia que a poesia chega aos nossos olhos e alma com uma cara nova, de uma contemporaneidade que viaja a outros continentes por meio do mar. • Deleuze explica que os geógrafos têm consciência dos dois tipos de ilhas, as continentais e as oceânicas: estas, originais, criadas de erupções submarinas; aquelas nascidas de uma ruptura, separadas que ficaram do continente. Ele complementa: “Separação e recriação não se excluem” (DELEUZE, 2004, p. 06). Na existência de dois tipos de ilhas, há uma oposição entre o oceano e a terra, observando que o mar está sobre a terra, e que a terra está sob o mar. Assim, a existência das ilhas reitera a oposição existente entre a terra e o mar. Deleuze (2004, p. 06) explica: • As ilhas continentais são ilhas acidentais, ilhas derivadas: estão separadas de um continente, nasceram de uma desarticulação, de uma erosão, de uma fratura, sobrevivem pela absorção daquilo que as retinha. As ilhas oceânicas são ilhas originárias, essenciais: ora são constituídas de corais, apresentando-nos um verdadeiro organismo, ora surgem de erupções submarinas, trazendo ao ar livre um movimento vindo de baixo; algumas emergem lentamente, outras também desaparecem e retornam sem que haja tempo para anexa-las. • “Os mapas sinalizam ilhas submersas” é um livro dividido em duas partes: TERRA e ÁGUA, elementos que se digladiam, criando essa oposição entre textos literários que sinalizam poesias reveladas em poemas em prosas, ora mimetizadas em narrativas curtas, que lembram crônicas e pequenos contos, e que atendem pelo nome de prosa poética, mas que são, na verdade, vozes do eu poético, que não impõem gêneros ao que está escrito e a quem o escreveu, porque é a existência de um ser continental e oceânico que se separa e se recria na concepção de um fazer literário. • Na primeira parte do livro (Terra), Vórtice faz-nos vislumbrar o desejo moribundo do eu lírico de inundar-se do outro, sob pontos de silêncio e solidão, na tentativa desgovernada de um encontro de paz em vez dos abismos costumeiros que levam à predação da relação a dois. Santos (2018, p. 19) se projeta entre o espaço geográfico e o poético:

• Quis umas tardes com você para caber no mar, quando os portos não tivessem navios, mas pontos de silêncio e solidão. • Umas tardes que nos levassem para onde o vento soprasse, como um vórtice. Um móbile. Pipas. • • Ademais, as TARDES (p. 21) são recorrentes: “Quero chegar também ao mar... (...) ... são essas tardes que espero cartas... Eu queria ser dessas pessoas que não se incomoda com adeus.” A relação entre o eu lírico e o ser amado é de desencontros. A distância entre o amado e o amante se estabelece por meio de esperas de cartas, telefonemas e e-mails e o adeus que incomoda. Apesar das despedidas e solidão, a tarde é o ponto de encontro de andorinhas (Ainda resta o colorido de um jardim), pássaros que voam (Na tarde pós-tempestade); amantes existencialistas e seus infernos (Nós dois); e do azul (Colisão). • A segunda parte do livro, Água, inicia um processo de desterritorialização simbólica oriunda das demandas afetivas do eu e do outro. O narrador poético necessita de novos espaços, quando seu território intrínseco sofre alterações, as quais o levam à (re) construção de viagens. • Ambos os autores, Deleuze e Bachalard, trabalharam a noção de desterritorialização dentro de suas obras, observando as noções de continuidade e descontinuidade, no sentido de que avaliassem o conceito da filosofia a partir de um contexto geográfico, colocando espaços como terra, casa e arte numa condição de paisagens capazes de dar novos rumos para a decifração do pensamento. • Em Abrigo, Santos (2018, p. 70), transfere suas emoções para um espaço-tempo em que casa e tarde dividem o mesmo território na alma do poeta: • Na tarde derretida, a tristeza prossegue, mesmo escutando gatos, cachorros, pássaros, homens e outros bichos, na casa quase vazia, quero uma solidão sem paredes, por isso, um guarda-chuva guardado numa tarde de chuva é um crime, mesmo que esta tarde dure anos.

• • A noção de desterritorialização defendida por Bachelard (1978, p. 201) coloca o tempo como elemento necessário para a dinamização da casa na sua ligação com o devaneio: • Nosso objetivo está claro agora: é necessário mostrar que a casa é um dos maiores poderes de integração para os pensamentos, as lembranças e os sonhos do homem. Nessa integração, o princípio que faz a ligação é o devaneio. O passado, o presente e o futuro dão à casa dinamismos diferentes, dinamismos que freqüentemente intervém, às vezes se opondo, às vezes estimulando-se um ao outro.

A casa, na vida do homem, afasta contingências, multiplica seus conselhos de continuidade. Sem ela, o homem seria um ser disperso. Ela mantém o homem através das tempestades do céu e das tempestades da vida. Ela é corpo e alma. É o primeiro mundo do ser humano.

• • Para Deleuze (2004, p. 6), o homem só poderá viver bem quando não mais existe o combate entre a terra e o mar: • O homem só pode viver bem, e em segurança, ao supor findo (pelo menos dominado) o combate vivo entre a terra e o mar. Ele quer chamar esses dois elementos de pai e mãe [12], distribuindo os sexos à medida do seu devaneio. Em parte, ele deve persuadir-se de que não existe combate desse gênero; em parte, deve fazer de conta que esse combate já não ocorre. De um modo ou de outro, a existência das ilhas é a negação de um tal ponto de vista, de um tal esforço e de uma tal convicção.

• • O que se observa, na poesia de Santos, é a busca de identidade que ele estabelece com a tristeza, perscrutando seus devaneios dentre de um espaço a que Bachelard chamou de casa, mas que, dentro da proposta de Deleuze, estende-se na mensuração de uma tarde derretida/líquida a que Deleuze denominou de mar, servindo de metonímia à água no plano poético. • Santos (2018, p. 65) trabalha esse processo de desterritorialização também em Do Oriente que há em nós: • Apesar dos saquês • Dos jogos de Yu-gi-oh aos sábados • Dos mangás das cerejeiras em flor • Do Oriente eu há em você. • Apesar do futebol aos domingos • Das caipiranhas • Das feijoadas

• Das novelas diárias • Do Ocidente que há em mim. • Apear de sermos parques de diversões, não quero mais esse amor kamikaze, • Somos brincadeiras arriscadadas. • Meu corpo ataques suicidas, seus sentimentos um pêndulo aos 360°.(2018) • • Ao contrapor o Ocidente com o Oriente, o poeta embarca no devaneio de uma relação suicida, porque misturando costumes e culturas, em um permanente exercício de viagens e transportes. Em contrapartida, o que se observa em Sobre laços e nós (Santos, 2018, p. 84) é o encontro daqueles que estão distantes, a criar os seus laços a partir das viagens oníricas ventiladas pela própria imagística poética: • Nas madrugadas, derretemos satélites, • Como nossos telefones interurbanos. • Conta-me do Texas. Lembro-me de Paris, Texas. • Imagino-o como o personagem do filme, vagando pelo deserto, • Em busca de sua identidade perdida. • • Em “Naquela Tarde” (p. 63/64), há recortes de leituras, existências e lugares, que sugerem a imagem da solidão extraída do passado. Esses recortes remetem às gavetas, às lembranças, da mesma forma que traduzem um certo recolhimento como símbolo de refúgio: • ...Fez-se um silêncio que você não foi capaz de romper, por isso, na tarde daquele dia, mostrei meu braço recém tatuado, falei de Paris com seus cafés e dos amores que deixei em repouso. (...) Daquela longínqua tarde que tinha uma rainha, um atlas, Patti Smith e Sylvia Plath, restou uma sensação de quase escuro, mas continuo anotando frases nas agendas e como um argonauta ainda fabrico minhas conchas. (SANTOS, 2018).

• • Os versos do poeta remetem a uma sensação de solidão, de ausência do ser amado, os quais também denunciam a tristeza por meio da expressão “sensação de quase escuro”, o que vai se consolidar na fabricação das conchas. Bachelard, em A Poética do Espaço (p. 277/278), confirma este estado d’alma: • Sabemos perfeitamente que é preciso estar só para habitar uma concha. Vivendo a imagem, sabemos que admitimos a solidão. Morar só, grande sonho ! A imagem mais inerte, a mais fisicamente absurda, como esta de viver na concha, pode servir de origem a tal sonho. (1978).

• • A obra de Santos (2018) é colorida de um azul que encharca a poesia, o mar que nela habita, a própria tarde, os pássaros... O azul, com seu semblante frio, imaterial, associado ao mundo dos sonhos, é a cor protagonista, no onirismo que mistura corpos dos amantes com terra e água, enquanto as outras cores, como o vermelho de batons, assumem papéis secundários. Nesse exercício de azul, o discurso poético decifra uma paisagem que, simultaneamente, é literária e geográfica, mas que só se realiza na atitude existencial dos amantes. Os mapas vão servindo de instrumentos de orientação e localização no âmbito geográfico, enquanto no contexto literário, os mapas de Franck Santos são a poesia com a qual ele traduz a busca de todo um universo paisagístico interior. • Esse fenômeno de interiorização transita entre o eu-que-sonha e o eu-que-existe para chegar à Ilha submersa (2018, p. 85) “Na noite, um grito, que não coube em mim. / âncora, suas mãos/ Asas, sua voz, me acalmam..” • O poeta consulta seus segredos ao mergulhar no horizonte híbrido do amor que se desvela em seu Tarô (p. 78): “Que importa a paisagem geográfica se a paisagem humana estiver ao nosso lado?” • Poesia e prosa se fundem em busca de um horizonte geograficamente humano. Os Voos (p.110) é uma peça literária à parte, de valor encantador. Os Escombros (p.111) é uma descrição do abandono, da solidão daquele que ficou no sentimento desértico de quem partiu. Café da tarde (p.108) é mais um encontro dos muitos desencontros. A relação de amor se mistura na Água com Açúcar (p. 90) e Água e sal (p.80). Açúcar e Sal são elementos dicotômicos de um convívio, diluídos que eles o foram pelas ausências, separação e distância. • Os mapas de Franck Santos também sinalizam um roteiro de viagem à teoria quântica, por meio da qual as esperas ecoam num Universo Paralelo (p. 55). É todo o tempo o amor sendo consumido e

redimido pela distância, em busca do encontro definitivo: “estarei nessa cidade líquida de casarões em ruínas, águas, conchas, sal e sol. Estarei aqui, no meu universo não paralelo, esperando você”. A expressão “cidade líquida” sintetiza a metáfora da água: se a cidade é líquida é porque ela assume as várias formas das esperas: espera de ruínas, de sal, sol, conchas e de águas. Ou, ainda, a “cidade líquida” assume a ideia de fragmento, dispersão, tudo determinado pela incerteza permanente, sobre a qual se debruçou a teoria da modernidade líquida, de Zygmunt Bauman (2001), ao traduzir as relações modernas, inconstantes, cheias de mudanças e, por vezes, imprevisíveis. Tudo é a síntese do querer embalsamado na Sessão da Tarde (2018, P. 57), na qual o encontro é a interiorização recíproca de um no outro. • Para Deleuze e Guattari, quaisquer que sejam os gêneros artísticos (literatura, música, escultura, pintura), os artistas se expressam por meio das sensações. Para eles, a sensação remete a um devir, já que implica em um “tornar-se”: • O artista é mostrador de afectos, inventor de afectos, criador de afectos, em relação com os perceptos ou as visões que nos dá. Não é somente em sua obra que ele os cria, ele os dá para nós e nos faz transformar-nos com ele. (Deleuze; Guattari, 1992, p. 227 – 228).

• • Dentro dessa proposta, tem-se, na obra de Franck Santos, “Os Mapas Sinalizam Ilhas Submersas”, uma produção de sentidos em que autor e leitores agem por meio das sensações para o alcance de um vir a ser para tornar-se. Pode-se, pois, ficar o tempo que se quiser nas ilhas submersas e encher-se de novas poesias as poesias sinalizadas nos mapas. Todos podem. O importante é a transformação causada pela tradução das sensações. Afinal, todos têm suas ilhas, suas terras e mares; e, ainda que não estejam mapeados, traduzem-se nesses perceptos trazidos à baila pela poeta Franck Santos. Todos os leitores, certamente, afetados, mexidos, tocados. Todos prontos para se transformarem na máquina de produção de afetos... Os mapas sinalizam...

• • 03 CONCLUSÃO • Assim, dentro desta pequena análise do livro de Franck Santos, observa-se quão grande é o fenômeno literário para a construção de sentidos. Esse tema recorrente da ausência na obra de Franck (grifo nosso), mesclada de lembranças e despedidas, também se incorpora à falta que esvazia a palavra, por conta da falta que há no mundo e nas coisas. Mas, como bem o disse Blanchot (2011, p. 50): • Todo escritor, todo artista conhece o momento em que é rejeitado e como que excluído pela obra em curso. Ela mantém-no à margem, está fechado o círculo em que ele não tem mais acesso a si mesmo, onde ele, entretanto, está encerrado, porque a obra, inacabada, não o solta.(...) • Uma obra está concluída, não quando o é, mas quando aquele que nela trabalha do lado de dentro pode igualmente terminá-la do lado de fora.

• • Franck Santos cria sua poesia dentro daquilo que Blanchot denominou de palavra performativa, porque ela se duplica, atuando de forma dúbia, afirmando-se e negando-se, pronta para ser interpretada, construída, descontruída, reconstruída, mesmo depois de acabada, mesmo sem o autor. • Conforme acentua Compagnon (2010, p. 251), “o objetivo da teoria é, na verdade, desconsertar o senso comum”. Contudo, observado o universo das correntes literárias, tem-se um leque de caminhos a seguir para a decifração de uma obra literária, sempre à espera de novas interpretações e descontruções.

Mas é preciso abraçar o que se pode alcançar. • A teoria da literatura, como toda epistemologia, é uma escola de relativismo, não de pluralismo, pois não é possível deixar de escolher. Para estudar literatura, é indispensável tomar partido, decidir-se por um caminho, porque os métodos não se somam, e o ecletismo não leva a lutar algum. (COMPAGNON, 2010, p. 156)

• • Assim, abordaram-se aqui, para análise dos textos poéticos, duas visões filosóficas. Ademais, os filósofos sobre os quais foram levantados os pressupostos teóricos aqui expendidos (Bachelard e

Deleuze) apresentam novas vias para a conciliação da relação entre transcendência e imanência dentro da filosofia, mormente no que tange às suas ideais voltadas para um equilíbrio ligado à terra, ou seja, aproximações observadas na perspectiva espacial e geofilosófica de ambos os autores. Essa contiguidade contribuiu consideravelmente para tornarem-se leves as análises aqui expostas. Ambos

os autores trabalham conceitos que se estendem desde a filosofia do animal até a crítica da estruturalidade do mundo, abrindo espaço para a observação do fenômeno da casa e da paisagem, que também são imagens recorrentes na obra do poeta Santos. • O que se deixa aqui, como conclusão de um trabalho de teoria literária, é a certeza de que a poesia também propicia essa possibilidade de viajar na fenomenologia dos espaços, seja pela via “clínicofilosófica” das viagens submarinas em busca das ilhas submersas, seja pela via dos espaços mais terrenos, dentro das casas e gavetas, de onde se extraem as lembranças e amores passados; ou ainda dentro das conchas, nas quais se protegem os sonhos e uma necessidade de solidão que, paradoxalmente, busca a companhia do outro, como a terra busca o mar, e o mar a terra, na incessante procura de sua completude. É a poesia do humano que se propaga em outro sistema: o geográfico; é a literatura e a geografia criando um só espaço para habitação; é a prosa que permite ser poesia para se transformar em prosa poética; é a prosa geograficamente humana no horizonte da poesia, com a qual

Franck Santos presenteia o leitor.

• REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA • • BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. • BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. Tradução de Antônio da Costa Leal e Lídia do Valle

Santos Leal. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os pensadores) • BLANCHOT, Maurice, 1907-2003. O espaço literário/Maurice Blanchot; tradução Álvaro Cabral. –

Rio de Janeiro: Rocco, 2011. • COMPAGNON, Antoine. O demônio da teoria: literatura e senso comum/Antoine Compagnon; tradução de Cleonice Paes Barreto Moura, Consuelo Fortes Santiago. 2. Ed. – Belo Horizonte: Editora

UFMG, 2010. • DELEUZE, Gilles. A Ilha Deserta E Outros Textos: Textos e entrevistas (1953-1974). Edição preparada por David Lapoujade. Trad. Brasileira. São Paulo: Editora Iluminuras, 2004. • DELEUZE, Gilles.; GUATTARI, Felix. O que é a Filosofia? Trad. Bento Prado Jr. e Alberto Alonso

Muñoz. São Paulo: Editora 34, 1992.

EspeciaisTextos Escolhidos: Da lavra do professor Natalino Salgado Filho:

"A IGREJA NO CONTEXTO DA INDEPENDÊNCIA"

Publicação autorizada pelo autor.

Montagem MHL: o autor com o padre Eraldo Leão

Natalino Salgado Filho*

A academia FIDES ET RATIO da Arquidiocese do Rio de Janeiro, comemorou, no último dia 10, o bicentenário da independência brasileira, com mais uma edição de um Simpósio sobre “O papel da Igreja na Independência do Brasil”, com uma palestra extremamente interessante do padre Eraldo Leão, Mestre em Teologia da PUC-Rio e Doutorando em História Social pela UFRJ. Foi uma tarde memorável, na qual o palestrante resgatou parte da história da igreja católica no que diz respeito a Portugal e Brasil, quando este ainda era colônia e depois império. Depois de uma condução por fatos pitorescos da época, o padre Eraldo Leão afirmou com clareza que coube à igreja o papel de contribuir para o sentimento de brasilidade e de pertencimento a esta nação que estava nascendo, por meio dos diversos padres espalhados pelo país que, em suas prédicas, sedimentaram no coração dos súditos do novo império. Da fala do palestrante, fomos informados de que, desde o início do trabalho de evangelização em terras brasileiras, os jesuítas se dedicaram a trabalhar também a educação tanto para alunos índios como para alunos descendentes de portugueses, numa iniciativa inédita para a época. O palestrante informou que as ligações entre a coroa portuguesa e a igreja remontam aos idos da independência daquele país, por volta do século XII, quando ambas se unem para retomar a fé dos cidadãos, num território dominado pelos mulçumanos. É dessa época que ouvimos falar da atuação da ordem dos templários e diversas outras ordens cristãs e militares. A partir do século 15, a Coroa resolve empreender a conquista de outros povos na costa do Atlântico e em países africanos, para expandir a fé e o reino em terras ultramarinas. Com essa iniciativa, a igreja foi se instalando e evangelizando povos nunca alcançados, com a introdução de um novo culto e uma nova fé. A atividade religiosa na chamada América Portuguesa era coordenada pela Mesa da Consciência e das Ordens e a igreja atuava em duas frentes: pelo clero secular, que incluía paróquias e bispados e pelo clero regular, com trabalho missionário e atividades sociais. Era a igreja, no entendimento de Padre Eraldo, uma espécie de agente intermediário entre a coroa e os súditos. Além dos tribunais civis, existia também os tribunais eclesiásticos para apreciar as causas. No ano da independência, 1822, a Igreja dava conta de que existiam aproximadamente 4 milhões de almas, que era como se fazia a contabilidade da época, 1 arcebispado, 6 bispados e 2 prelazias e cerca de 600 paróquias com 6500 fiéis, enquanto que, em Portugal, eram 850 fiéis por paróquia. 2

No contexto da independência, o catolicismo era um elemento da identidade nacional, atrelada à supremacia do Estado. Foi de dentro da igreja, lembrou o Padre Eraldo, que começaram a surgir vozes em favor da independência. Entre elas, a voz de Frei Caneca, um dos líderes da Revolução Pernambucana contra a dominação portuguesa em 1817 e a de Joana Angélica, que morreu defendendo o convento da Lapa pelos revoltosos portugueses, que não aceitavam o fim da submissão à coroa. Também citou outros importantes nomes, a exemplo de franciscanos cariocas, como Francisco de Santa Tereza de Jesus Sampaio, influência próxima ao imperador, visto ter muita amizade com Dom Pedro I; Dom Jose Caetano da Silva Coutinho, que presidiu a coroação de Dom Pedro I e também presidiu a Assembleia Nacional Constituinte de 1823. Também não menos importante foi o papel de Dom Mateus de Abreu Pereira, com suas ideias inovadoras.

Na Constituição de 1824, o catolicismo era a religião oficial e o padroado era mantido, ou seja, o imperador nomearia bispos. Mesmo com a independência, a Santa Sé achou melhor aguardar, com prudência, o reconhecimento internacional. Em 1824, numa missão de aproximação, o Monsenhor Vidigal vai para Roma e lá é recebido pelo papa em 1826, pelo fato de, em 1825, Portugal ter reconhecido a independência do Brasil.

A partir daí, comentou Padre Eraldo, a igreja reorganiza todo seu corpo eclesiástico no Brasil e se consolida como estabilizadora dessa nação, como uma grande consciência nacional e legitimadora do novo império. A igreja, disse o Padre, foi a responsável pela assimilação do rito do Ipiranga, unindo corações discordantes e apaziguando ânimos. Passados dois séculos, importante ouvir vozes diversas acerca deste imenso Brasil que nos foi legado. A história sempre tem muitas vozes e ouço dizer que cada uma tem sua parte de razão.

"ESTREIA LITERÁRIA: VANESSA CRISTINA FERNANDES BEZERRA"

Keila Marta é Secretária Regional da Academia Poética Brasileira, Seccional MA.

Vanessa e Keila Marta

Prestes a lançar o primeiro livro Laços e Honra, a jovem escritora Vanessa Cristina de Açailândia – Maranhão, acadêmica de Letras (Uemasul), conta a Keila Marta do Portal www.facetubes.com.br um pouco da sua história, da fase de escrita a saga para publicação. Nascida em Açailândia, no entanto, toda a infância e parte da adolescência foram vividas em um assentamento chamado “São Francisco”, no Município de Bom Jesus das Selvas. Mas, no ano de 2015 passa a residir em Açailândia afim de completar os estudos, pois onde morava, o ensino só chegava até o nono ano do fundamental. O importante é que as dificuldades não foram suficientes para que Vanessa se desinteressasse ou pensasse em desistir. "Sempre frequentei a escola, e na infância, apesar de ter que andar dois quilômetros para chegar à escola junto com o meu irmão mais velho, isso nunca um empecilho para continuar estudando. Acredito que isso só demonstra o quão imprescindível é a educação para minha família", disse.

O livro, um companheiro inseparável...

Mesmo morando no interior, sempre estive em contanto com muitos livros. Nas salas de aula havia estantes de livros de literatura infantil e juvenil, então, acesso a literatura não foi uma dificuldade. Acredito que foi exatamente por isso que sempre gostei dos livros em si, pelo fato de sempre ver vários deles perto de mim. E dessa forma, lia muito os livros na escola ou em casa, já que podia levar para ler em casa.

A importância dos livros e da escola como lugar de leitura...

Naturalmente, sou uma pessoa curiosa e com uma imaginação incrivelmente fértil. Pegar o livro, observar a capa e tentar imaginar a história antes de ler, e depois lê-lo de fato, nessa ordem, sempre foi um processo prazeroso para mim. Não consigo dizer com clareza desde quando gosto de literatura, acredito que vem dessa época do início da escola. A partir de então sempre estou lendo alguma coisa. Seja prosa, seja poesia.

O que mais a impressiona na literatura...

O que me impressiona na literatura, o que me instiga, me dá prazer nela, é o fato de ser universal. De poder conter um universo inteiro dentro de algumas páginas. Isso me fascina! Quando criança, eu ficava pensando muito sobre como alguém pode ter tanto talento, tanta criatividade para contar histórias muito abrangentes e complexas dentro daquelas páginas. Porque, quando você lê, inconscientemente você participa da história.

O despertar para a escrita...

Sobre a experiência com a escrita, até há algum tempo eu não diria que ela vem da infância, eu diria que é recente. Mas, refletindo, vejo que realmente vem desde muito tempo. Por volta dos nove anos mais ou menos, minha mãe comprava agendas ou diários para mim, onde eu escrevia diversas coisas. Falava do meu dia, das coisas que aconteciam comigo, rabiscava alguns desenhos, porque na infância eu gostava muito de desenhar também. E assim, com minha mãe comprando esses diários, agendas, revistinhas também, eu deixava minha criatividade voar. O que eu acho muito interessante nessa minha relação com a escrita, é que a minha forma de escrever, foi evoluindo muito com o passar dos anos. Antes, eu escrevia em diários em agendas, sobre o meu dia. Depois, passei a escrever em cadernos maiores, onde eu fazia ainda relato da minha vida, só que agora apenas os acontecimentos mais importantes, e passei a fazer colagens. Colava muita coisa. Eram fotos de artistas que eu gostava, recortes de textos, desenhos que fazia, paisagens que achava bonita, fotografias interessantes, acho que posso dizer que sempre fui uma apreciadora da arte. Já na adolescência, intensifiquei os desenhos, mas ainda tinha os cadernos de colagens, só que desde o início do meu atual namoro, quando estava com dezessete anos, tornei o caderno, um diário de romance. Já são cinco anos de relacionamento, e quase cinco anos de diário nesse perfil. Junto do diário, também passei a escrever cartas para ele. São muitas cartas desde então.

Gosto literário...

Da infância para cá, meu gosto pelos gêneros literários mudou muito, confesso. Antes, gostava demais dos gêneros de terror e mistério. Sou muito fã do Stephen King e de muitos livros desses gêneros. Mas depois de uns anos, me tornei uma leitora assídua de romance e fantasia. Ainda adoro terror e mistério, mas o meu gênero preferido é romance, especialmente os de época. Depois que conheci Jane Austen, as irmãs Brontë, Julia Quinn etc., vivenciei experiências ótimas, indescritíveis. Um fato muito legal, é que meus autores preferidos, na verdade, são todas mulheres, e são justamente as que citei anteriormente.

A nova fase com a literatura...

Depois de muito, muito tempo sendo leitora, resolvi me aventurar na escrita. Mas não comecei como uma escritora, realmente, por que na verdade, eu comecei a escrever Laços e Honra como uma terapia, digamos assim. Era e ainda é um Hobbie. Escrevia sem pressa, sem cobranças, apenas para me sentir bem, para ajudar a trabalhar minha ansiedade. Mas, isso é até engraçado, porque acho que isso intensificou a minha ansiedade. (risos). De um jeito que eu pude ver o quanto é bom, é claro. Porque me levou mais a frente, me motivou a continuar escrevendo e terminar a história.

Passei um ano escrevendo Laços e Honra. E no ano passado, uma das minhas melhores amigas, a quem devo muito por ter me incentivado na escrita e em me tornar uma escritora de verdade, me apresentou a editora com a qual estou me associando agora, e a partir disso, tive uma luz, um esclarecimento e passei a cultivar esse desejo que se tornou um sonho. As ideias para o livro já existiam muito antes. Como eu disse, tenho uma imaginação muito fértil, então sempre ficava matutando alguma coisa, um nome de personagem, criando um lugar diferente, uma sociedade totalmente nova, e depois pensava sobre qual seria a história desses personagens nessa realidade totalmente diferenciada da nossa em tudo.

Laços e Honra...

A história se passa em uma realidade totalmente tecnológica, com uma sociedade dividida em distritos, cada um especializado em algum tipo de ciência, estudo ou área do conhecimento humano. O enredo gira em

torno de cinco amigos, cada um com uma personalidade única, tentando aperfeiçoar suas habilidades para salvar o mundo de uma família perversa. A história vai fluindo para contar como cada um deles lidou com a dor sofrida na infância. E no meio disso, vai se revelando um pouco mais de cada um. Seus medos, suas habilidades, seus humores. Todos irão passar por altas aventuras. Desde provarem da amizade entre si, até se apaixonarem. Laços e Honra é na verdade o primeiro livro de uma série. Então, com a graça de Deus, ainda virá mais alguns livros para a coleção.

Foi professor, gramático, filosofo e escritor maranhense. Nascido na cidade de Codó, no ano de 1858, Hemetério mudou-se para a província do Rio de Janeiro em 1875, aos 17 anos. Era filho do Major Frederico dos Santos Marques Baptisei, proprietário da fazenda Sam Raymundo, e de sua escrava Maria. Seu pai pagou seus estudos no Colégio da Imaculada Conceição, em São Luis. Na capital do Brasil Império em 1885 se casou com Rufina Vaz Carvalho dos Santos, neta do prestigiado tipógrafo Francisco de Paula Brito , pai da impressa negra brasileira Aos 20 anos de idade Hemetério já era professor de francês do afamado Colégio Pedro II. No colégio, foi professor de francês, onde foi visto pelo próprio imperador, que o elogiou. Sua esposa Rufina também ingressou na carreira de Professora na Escola normal da corte. Hemetério foi nomeado professor adjunto de língua portuguesa do Colégio Militar do Rio de Janeiro pelo Imperador Dom Pedro II, onde, mais tarde, tornou-se professor vitalício. Cursou a Escola de Artilharia e Engenharia, conquistou a patente de Major, obtendo, depois, o galardão de Tenente-Coronel honorário em 1920.

A atuação de Hemetério como professor, ia além do fazer em sala de aula, pois o mesmo se utilizava desses e de outros espaços a fim de ministrar palestras e conferencias a respeito do ensino e do combate ao Racismo de cunho eugenista. Na opinião de Sílvio Romero, Hemetério ombreava com Olavo Bilac, Graça Aranha, Aluísio e Artur Azevedo, no uso da palavra escrita. Em seu ativismo, ele fez críticas a Machado de Assis, argumentando que o escritor teria ignorado os negros em sua obra, e quando os retratava, era de forma pejorativa (Machado se refere aos negros como vesgos e zarolhos, perpetuando a imagem preconceituosa vigente na literatura e na sociedade de seu tempo). As opiniões sobre a obra literária de Machado lhe renderam a fama de polemista, sendo chamado de discutidor, o que lhe angariava antipatias A história de Hemetério, dá início a uma trajetória familiar de professores e funcionários da administração pública municipal que, de acordo com os padrões de seu tempo, construíram um legado que combinava boas qualidades profissionais, intelectuais e morais. Hemetério foi fundador da Academia Brasileira de Filologia, ocupando a cadeira de número 25 do qual é patrono. Teve Obras publicadas como : Gramática Elementar da Língua Portuguesa; O livro dos Meninos; Gramática Portuguesa; Segundo Grau Primário; Pretidão de Amor (conferencias literárias); Carta aos Maranhenses; Da construção Vernacular; Gramática Portuguesa: adotada na Escola Normal do Distrito Federal; Frutos Cativos (poesia); Etimologia: “Preto”. Blog do CEMI (Centro de Memória Institucional do Iserj), clique aqui

Negro, intelectual e professor: Hemetério José dos Santos e as questões raciais de seu tempo (1875 – 1920), de Luara dos Santos Silva, in Saberes e práticas científicas, clique aqui

SILVEIRA, Alfredo Balthazar da. História do Instituto de Educação. Rio de Janeiro: Secretaria Geral de Cultura, 1954.

HEMETÉRIO, O PROFESSOR ABOLICIONISTA DE CODÓ

Por Antônio Carlos Lima (*)

Maranhense que nasceu em Codó é uma das personalidades emblemáticas dos movimentos negros no Brasil e virou tema de estudos em diversas universidades SÃO LUÍS– Depois de Maria Firmina dos Reis (1822-1917), reconhecida e celebrada como primeira escritora negra a tratar, na literatura brasileira, do tema da escravidão, chegou a vez de outro maranhense, o professor Hemetério José dos Santos (1858-1939), nascido em Codó, subir ao pódio das personalidades emblemáticas dos movimentos negros no Brasil. Assim como Maria Firmina (1822-1917), que ganhou notoriedade nos meios acadêmicos e estudantis depois de sua redescoberta nos anos 70 do século passado pelo poeta Nascimento Morais Filho, Hemetério dos Santos virou, repentinamente, tema de estudos em diversas universidades por sua contribuição, como professor e escritor, na luta pela inclusão do negro na sociedade e pelo fim do preconceito racial. O curioso é que nenhum dos dois esteve na linha de frente do movimento abolicionista, liderado por José do Patrocínio, Luís Gama, André Rebouças (negros, como Hemetério), Joaquim Nabuco e o maranhense Joaquim Serra, entre outros. Hemetério e Maria Firmina, que à época da Abolição tinham 30 e 66 anos de idade, respectivamente, atuaram como entusiastas, mas praticamente à margem desse que foi o primeiro movimento social brasileiro de abrangência nacional. A medida da curiosidade que hoje desperta esse maranhense quase ignorado no Maranhão desde sua morte há 81 anos foi dada há duas semanas pela Folha de S. Paulo. O jornal de maior circulação e influência no Brasil dedicou um podcast (reportagem em áudio, acessível pela Internet), de cerca de uma hora de duração, para contar, em tom quase épico, “a história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão”. Artigos e teses de mestrado, como a de Aderaldo Pereira dos Santos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sobre a trajetória do professor negro, multiplicam-se nos centros acadêmicos. Lembrou-se que, desde 1944, o professor codoense é patrono da cadeira número 25 da Academia Brasileira de Filologia. No bairro Jacarepaguá, na zona norte do Rio de Janeiro, uma escola pública o homenageia: a Escola Municipal Hemetério dos Santos. É quase a glória, para quem, não obstante os méritos intelectuais demonstrados como professor, filólogo, poeta e conferencista, foi vítima de preconceito racial no meio culto em que viveu.

A língua como libertação

Hemetério José dos Santos nasceu a 13 de março de 1858 em Codó, à época uma pequena povoação à margem do rio Itapecuru, formada por lavradores, a maioria escravos, e comerciantes. Filho da escrava Maria e do comerciante Theóphilo José dos Santos, antes dos dez anos foi levado para São Luís. Na capital, estudou no prestigioso Colégio Imaculada Conceição, dos padres Raymundo da Purificação Lemos, Theodoro de Castro e Raymundo Fonseca, instalado à rua São Pantaleão (depois, à rua do Sol), onde teve como colega, dentre outros filhos da aristocracia de seu tempo, o futuro governador Benedito Leite.

Em São Luís provavelmente também conviveu com os irmãos Aluísio e Artur Azevedo, os quais, adolescentes como ele, já se aventuravam no mundo do teatro e da literatura. Foi no Colégio Imaculada Conceição que Hemetério passou a cultivar o gosto pela gramática. Ali foi educado segundo os métodos do professor Francisco Sotero dos Reis (1800-1871), para quem o ensino da língua,“como instrumento político e como órgão das artes da palavra, primava sobre todas as disciplinas de Humanidades, e de todas era como base e fundamento único”, nas palavras do próprio Hemetério. Em 1875, aos 16 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde complementou os estudos e, aos 20 anos, tornou-se professor do Colégio Pedro II, o mais importante do Império, e do Colégio Militar. Publicou Gramática elementar da língua portuguesa; Livro dos meninos: contos brasileiros de acordo com os processos modernos; e outras versões de sua gramática para alunos da Escola Normal do Distrito Federal e do Colégio Militar. No mesmo ano em que Machado de Assis publicava “Memórias póstumas de Brás Cubas” e Aluísio Azevedo lançava em São Luís “O Mulato” (1881), Hemetério dos Santos trazia à luz o “Livro dos meninos”, compêndio de textos destinado a jovens estudantes sobre trabalho, higiene e instrução, no qual condena com veemência o escravismo. Também escreveu poesias (“Frutos cadivos”), crônicas e conferências, como “Pretidão de amor” e “Carta aos maranhenses”, documentos em que defende a dignidade dos negros após a abolição e, nesta última, mais enfaticamente, o ensino correto da língua portuguesa. Casou-se com Rufina Vaz de Carvalho, neta do editor e tipógrafo Francisco de Paula Brito, negro de grande prestígio nos meios intelectuais, o que pode ter contribuído para a sua inserção social.

Demolidor de preconceitos

Em artigo publicado na revista da Academia Brasileira de Filologia (Ano II, No. 2, Rio de Janeiro), em 2003, o escritor e filólogo maranhense Antonio Martins de Araújo já situava o professor Hemetério entre os grandes gramáticos de sua época. E assinalava que, “nascido em berço pobre, sabe-se lá quanto sofrimento e quanto preconceito ele teve de romper para chegar ao ponto que chegou”. O título do artigo resume a tese de Martins: “Hemetério José dos Santos, o demolidor de preconceitos”. O professor Hemetério era, segundo diversos testemunhos, pessoa de difícil trato. Polêmico, trajava-se de maneira extravagante. Usava fraque e cartola escuros e fumava charutos na rua, o que contribuía para alimentar o perfil caricato, alimentado pelo preconceito racial, com que era visto pela sociedade carioca branca e letrada. O jornalista e poeta satírico Emílio de Menezes (1866-1918), que desfrutava de grande popularidade, o desancou muitas vezes na imprensa, e sempre com viés racista. Das provocações feitas a intelectuais que julgava omissos ou pouco engajados na luta pela dignidade dos negros, antes e após a abolição (atacou o crítico José Veríssimo e o jurista Rui Barbosa), a mais prejudicial ao conceito público do professor Hemetério foi a que dirigiu ao escritor Machado de Assis. Poucos dias depois da morte do autor de “Dom Casmurro”, a 29 de setembro de 1908, publicou um artigo violento contra o escritor (“A arte de Machado de Assis é uma arte doentia, de uma perversidade fria”, “A sua poesia foi tão incolor como seus trabalhos ulteriores”), o acusa de omissão na causa antiescravagista e de ter abandonado a mãe adotiva. O episódio é narrado por Josué Montello no livro “Os inimigos de Machado de Assis”. Nele, o romancista maranhense transcreve o texto integral do artigo do professor Hemetério e a violenta reação da intelectualidade carioca Mas o tempo passou e, com ele, a indisposição e a ignorância em relação a esse maranhense negro do Codó, o “demolidor de preconceitos”, na definição precisa do professor Antonio Martins de Araújo. Assim como sucedeu com Maria Firmina dos Reis, também mestra e escritora esquecida durante um século, o Brasil começa a desvelar “a história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão”, como anunciou a Folha de S. Paulo em seu podcast. Antes tarde do que nunca.

Saiba mais

. “Pretidão de amor”, idem. . “Fortes laços em linhas rotas: literatos negros, racismo e cidadania na segunda metade do século XIX”. Tese de doutorado de Ana Flávia Guimarães. Universidade de Campinas, 2014 . “Arma da Educação: cultura política, cidadania e antirracismo nas experiências do professor Hemetério José dos Santos (1870-1930)”. Tese de pós-graduação em Educação, de Aderaldo Pereira dos Santos. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019. . “Hemetério dos Santos: o posicionamento do intelectual negro a partir das obras ‘Pretidão de amor’ e ‘Carta aos maranhenses’”. Artigo de Marcela Moraes Gomes, graduada em História pela Universidade Federal Fluminense. In Revista Cantareira, julho-agosto 2011. . “Hemetério José dos Santos: um homem de letras e de cor”. Artigo de William Câmara Barros e outros. Departamento de História da Universidade Federal do Maranhão. . “Hemetério dos Santos: o demolidor de preconceitos”. Artigo de Antonio Martins de Araújo, publicado na Revista da Academia Brasileira de Filologia, Rio de Janeiro, 2003. . “Pretidão de amor”. Artigo de Maria Lúcia Rodrigues. Em “Cor do magistério”, Rio de Janeiro, Eduff, 2006. . “A história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão”. Reportagem do jornal Folha de São Paulo. 9 de julho de 2020. Disponível em podcast. . “Os inimigos de Machado de Assis”. Josué Montello. Editora Nova Fronteira, 407 páginas, 1998. Minhas senhoras, vós que vos amamentastes do carinho sem igual da mulher negra, não consistais que a escola, esse céu iluminado por vinte e cinco constelações sonoras, seja fechado ao filho de quem formou este belo Brasil moral e hospitaleiro, amorosamente vos criando com o branco leite do seu amor”.Hemetério José dos Santos, em “Pretidão de amor”.

. (*) jornalista. Membro da Academia Maranhense de Letras. (Email: antoniocglima@uol.com.br)

"QUANTOS PORES DO SOL O MAR DE SÃO LUÍS PRECISA PARA SER FELIZ?" - LIVRO: "UM MAR DE MIM", DE VITÓRIA DUARTE.

MHARIO LINCOLN

MHL e a autora

(“AVISO:/ Tome cuidado/ Sou uma espécie de bomba atômica/ A qualquer hora/ Posso explodir de tanto amor”/VD).

"As águas de dentro irão vazar". Esse é o primeiro verso dessa obra gratificante. Assim começa a saga da jovem Vitória Duarte, autora de “Um mar de mim”. Ela faz aflorar um dos elementos cósmicos mais importantes para a ciência da alma: a água. A mesma água de Manuel Bandeira: "(...) A água não morre./ A água que é feita./ de gotas inermes". De Cecília Meireles: "(...) O choro vão/ da água triste, do longo vento,/ vem morrer-me no coração". De Mario Quintana: "(...) Um poema como um gole d'água bebido no escuro". E mais: o filósofo Thales de Mileto, o primeiro teórico a formular um pensamento mais sistemático fundado em bases racionais, chegou a afirmar: “Tudo começa na água”. Ora, qualquer um que se dispõe a ler esta obra, fatalmente vai sentir, nas entrelinhas, Bandeira, Cecília, Quintana e Thales. Aliás, que feliz coincidência! Desde esse primeiro verso, Vitória Duarte cresce como uma tempestade lírica molhando o solo fértil da criação humana, no rumo inverso das concepções elementares cheias, na maioria das vezes, de magia e mitologia, da mesma forma como Thales também as refutou, com base no elemento água: "uma coisa simples como a água pode transformar a concepção filosófica, tornando-a não absurda.". Assim fez Vitória Duarte transformando o elemento poético, mergulhado em mar, em uma coisa múltipla e rica, mesmo sendo simples e singela. O livro "Um mar de mim", sem dúvida tem a linguagem do coração, assim, simples. E porque essa linguagem "simples"? Perguntariam alguns. Então chamo para responder, Clarice Lispector: "(...). Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho". Ou Khalil Gibran, quando explicita: "A simplicidade é o último degrau da sabedoria". Conclui-se, destarte: é muito mais difícil fazer o simples,

agradar com o simples, perceber o simples, interagir com o simples, vencer com o simples. E Vitória venceu com o simples, nesta sua obra vestibular. “Ah, meu amar não é leve/ É loucamente exagerado/ E eu romântica/ Intensa em demasia”. Ou “AVISO:/ Tome cuidado/ Sou uma espécie de bomba atômica/ A qualquer hora/ Posso explodir de tanto amor”. Duas provas de que essa simplicidade explode por conter elementos incrivelmente retumbantes, numa correlação inversa aos soslaios românticos. Em ambos momentos líricos, senti uma poesia moderna, sem preconceitos, nem conceitos clássicos, livre de um ‘apaixonamento-amoroso’ exacerbado, sem pregas conceituais, sem "...alinhavos melosos, em busca de 'caçar' uma rima", como disse, certa vez, Ariano Suassuna. E olha que o “caçar”, nesse epíteto tem o significado tal qual. Confesso que "Um mar de mim" rejuvenesceu-me ao ver a poesia maranhense ganhar singularidade nova, um novo fôlego. O mesmo que Bruna Lombardi escreveu em seu Diário do Grande Sertão: “(…) talvez alguns queiram um respiro. Uma tomada de ar. Apenas isso...". Eu respirei de felicidade em ver a poesia ludovicense alçar voos e iniciar uma superação à acirrada disputa das sobras poéticas deixadas por figuras ímpares da poesia maranhense do século XX, sem dúvida, essa, importante base de sustentação de nossa história.

Ao ler este livro passei a ter certeza de que a diferenciada Vitória Duarte - “O mar não é perfeito (...)/ Sal nos olhos que confessa” - escrevendo assim, fará o coliseu ludovicense se desnudar das vestes clericais de antanho fazendo o olhar do leitor extasiar-se com uma poesia direta, eficiente, sem provocar estiramentos do músculo cardíaco, em razão da simplicidade ergométrica da sua bela lírica. Posso afirmar, sem nenhuma dúvida, que a partir daqui, meus sonhos pululam. Com certeza irei me deparar com obras similares porque o Maranhão passa por um momento de grande euforia literária e que novas e novos poetas já acordaram e esperam um pequeno grito das placas tectônicas da oportunidade, para ebulirem como vulcões, inaugurando uma nova era aédica. E como “’A memória é uma pele’/E ela nunca esquece”, na minha concepção, este “Um mar de mim”, ricamente ilustrado pela artista Isabela Pessoa, é um dos livros marcadores desse momento vaticinador, através do teodolito do hoje, a ser lembrado como uma mudança de página, como uma nova onda a quebrar no Golfão Maranhense, flamulando para sinalizar um profícuo momento na poesia da cidade chamada de "Athenas Brasileira".

Enfim, leio: “Ainda lembro de sentar-me a beira/ A fim de contemplar o mar/ Quando de repente ouvi o amor/ No canto da sereia/ Pronto pra me afogar”. Pura genialidade! Em cinco versos pluralizaram-se dores, amores, lendas e saudades. Pena que eu não tenha visto essa imagem. Deve ter sido abençoado por um dos maiores pores do sol do Mundo: o do quebra-mar da península da Ponta D’areia, na minha velha e saudosa Ilha de São Luís. Que assim seja, Vitória!

"A ÁGUA DESTE LIVRO É BOA; É DA MELHOR. ENTRETANTO, PARA BEBÊ-LA, NÃO BASTA TER SEDE"

EDMILSON SANCHES

* A Botânica até pode nos dizer que poesia não é árvore. Mas tem raiz. Tem origem. Filiação. "Pedigree". O melhor da interpretação, da declamação, da poesia e Cultura regional foi visto, ouvido e aplaudido em uma noite, há cerca de cinco anos, no Teatro Ferreira Gullar. Era Lília Diniz, atriz, poeta, artista, da Academia Imperatrizense de Letras, mulher que prende por sua Arte e empreende em toda parte. Lília é a ponte entre a capital do país e seu interiorzão. Vive em Brasília e revive e convive em Imperatriz e região. Além dos muitos conteúdos que traz, Lília traz Cora Coralina dentro de si. E a bota para fora, em poesia, canto e encanto --no espetáculo. “Cora Dentro de Mim”, que Lilia interpreta, declama, produz e o levou para diversos estados brasileiros. Em uma dessas apresentações, durante um daqueles lapsos de 15 segundos, Lília Diniz convidou-me --com carinho e dengo, do jeito que só ela sabe convidar --para fazer o texto de apresentação da nova edição de seu livro "Miolo de Pote", cujo lançamento aconteceu naqueles dias e noites de bom gosto, Arte e Cultura. Sobre Lilia, escrevi: Varinha de marmelo, de condão, faça essa mistura em um caldeirão: um pouco daquela (e)terna menina (o nome dela: Cora Coralina); o canto de um pássaro de fé --cante lá, Patativa do Assaré --; mais Catulo da Paixão Cearense (apesar do nome, é maranhense) ---dessa química ou mágica feliz, distinto público: Lília Diniz! * Reproduzo a apresentação que vai no livro. * * *

APRESENTAÇÃO O babaçu é o boi das matas. Dele, sabe-se, nada se perde. Artesanato, alimento, combustível, medicamento. E mais: entre os muitos aproveitamentos e utilidades do babaçu também está a celulose, o papel. Vale dizer, assim, que de babaçu também faz-se um livro. Este, por exemplo.

E se do boi --o babaçu dos pastos --o cantor nordestino Ednardo aproveitou até o berro, Lília Diniz empresta voz à mudez do fruto e movimento à imobilidade da palmeira. Voz e movimento, denúncia e sentimento pendem aqui em cachos de letras. É com muita razão e sensibilidade que a escritora, “bicho do mato”, traz o babaçu para as primeiras páginas desta obra. Lília, cabocla, sabe das brenhas onde se embrenha, dos matos das matas que se desmata. É íntima das palmeiras e das conversas delas com o vento, quando farfalham e gargalham. Lília sabe da essência do babaçu, do âmago das amêndoas. É um gongo que fala --sobretudo, alerta. O líquido batismal de Lília deve ter sido azeite, que lhe marcou a fronte e a vida -- vida povoada de sonoridades, cheiros, sabores e histórias que vêm a partir dos palmeirais, dos cocos que se desprendem, das mãos que os (a)colhem. Mas uma vida rica de vivências, sofrências, persistências, ardências, consciência e coerência até pode ter um batismo de babaçu... porém háoutras plantas e plantações na selva da existência. Daí "MIOLO DE POTE DA CACIMBA DE BEBER" ir além das lembranças e essências da terra e das palmeiras. Lília sabe que há outros “elementos”, como dizem as xilogravuras que anunciam cada uma das quatro “partes” do livro: “Terra”, “Fogo”, “Água” e “Ar”, as quatro substâncias que sábios pré-socráticos diziam formar tudo e que, neste livro, compõem um quadrifólio poético --quatro pétalas, mesma flor. Se “Terra” é “essência”, que identifica, e “estrume”, que fertiliza, “Fogo” é luz e calor, energia e amor, que ilumina desejos e paixões e incendeia corpos e corações: é a mulher ardente em brasa, “acesa” em casa, “com tanto desejo a queimar”... até que, ao final, “as verrugas do tempo” tragam um certo “enfado” e uma (in)certa esperança de rever o ser objeto de tanto sentimento, tanta chama e incandescência. “Água” é a parte líquida e certa deste “miolo de pote”. Dela, dos últimos versos do poema “Alimento”, a autora tirou, com concha de comprido cabo, o título do livro. Neste segmento, a água soletra um “abc”, pois está presente, real e metaforicamente, na cheia dos açudes, no molhado dos beijos e no chocalho cuja água as faladeiras parece que tomaram. Águas e mais águas que lembram as lavadeiras, rios e ribanceiras, poços e pororocas, mares e amares -- águas onde corpos são lavados, roupas enxaguadas, sonhos banhados e sentimentos, quarados. Em “Ar”, quarta e última parte, Lília Diniz, com a autoridade natural de quem é dona e maior conhecedora de si mesma, traceja traços (auto)biográficos desde a nascença, pois que ela, deverbal, é sujeita derivada de “alicezear”, verbo formado pela união da cearense Alice com o carpinteiro Zé, dos quais é filha. Sem necessidade de esclarecimentos sobre manhas e artimanhas, mumunhas e mungangos de exercícios poéticos, somos levados a, sem reparos, reparar no poema “Buchuda” a solução visual com que a autora tratou a disposição dos versos, uma mulher grávida. Este recurso formal, de ascendência concretista, foi inicialmente utilizado na parte primeira do livro, em “Tanta terra”, onde os conceitos intelectuais são visualizados nas palavras postas em cruz. *

O “miolo” deste livro não é do pote. É da poeta. Verdadeira e visceral como é, Lília, em linhas, sublinhas e entrelinhas, revela muito de amor e dor. Muito de dignidade e indignações. Muito de talento e Arte. Muito de sua Vida. A água deste livro é boa; é da melhor. Entretanto, para bebê-la, não basta ter sede.

EDMILSON SANCHES

O 29 de outubro é o Dia Nacional do Livro porque foi nesta data, em 1810 (há 212 anos), que foi criada a Biblioteca Nacional, sediada no Rio de Janeiro (RJ). Ela se chama oficialmente Fundação Biblioteca Nacional e é do Governo Federal brasileiro.

O LIVRO - Além de jornais, revistas e outras publicações e suportes de informação, o Leitor tem, no livro, um dos principais e com certeza o mais simbólico e charmoso produto de expressão, acumulação, documentação e transmissão do conhecimento, das reflexões e das compulsões humanas. Como se situa o livro na esfera humana e científica? Leia a seguir. O livro é o mais simbólico dos elementos manuseados pelo Bibliotecário. Hoje, entretanto, esse profissional não lida (ou não deveria lidar) propriamente com livros, mas com pessoas. É a evolução da função socioprofissional do Bibliotecário, que sai do bibliocentrismo (isto é, voltado apenas para os livros) e vai para o antropocentrismo (o ser humano como finalidade do conhecimento e do trabalho de outrem). Para chegarmos ao livro como superproduto humano, passamos, antes pela LITOSFERA, que é a parte da terra (a crosta terrestre) onde está a BIOSFERA, o conjunto dos seres vivos (animais, vegetais). Na biosfera encontra-se a ZOOSFERA, o sistema onde se desenvolve o reino animal. Nesse reino reina a ANTROPOSFERA, a parte da Terra em que o ser humano vive, também chamada IDEOSFERA. É na antroposfera que se desenvolve a NOOSFERA, o sistema mental, cujos fenômenos, documentados de forma escrita, formam a GRAFOSFERA. Portanto, o livro é parte da Grafosfera. Para cuidar do livro -- e de outros suportes de informação -- existem grupos de conhecimentos próprios: as CIÊNCIAS DAS CIÊNCIAS. Como se sabe, existem as CIÊNCIAS DA NATUREZA, como as Ciências Exatas ou Descritivas (Matemática, Física, Química, Biologia) e as CIÊNCIAS APLICADAS (Medicina, Agronomia, Engenharia). Existem as CIÊNCIAS DA CULTURA, como as Ciências Sociais (Linguística, Antropologia Cultural, Sociologia, Economia, História, Educação, Administração) e Humanidades (Filosofia, Teologia, Psicologia, Letras, Artes Plásticas, Música). E, por fim, existem as CIÊNCIAS DAS CIÊNCIAS, que tratam de organizar, preservar e colocar à disposição os conteúdos das demais Ciências.

As Ciências das Ciências dividem-se em Teóricas (Teoria da Informação, Teoria Geral dos Sistemas, Metodologia) e Documentológicas (Bibliografia, Bibliometria, Bibliologia, Biblioteconomia, Arquivologia ou Arquivística, Museologia, Documentação). A evolução do conhecimento trouxe a evolução do conceito (ou seria o contrário?): seja encapsulada em disquetes, CDs, CDs-ROM, fitas e discos de cinema e vídeo (DVDs, blu-ray, HD-DVD); seja encasulada em livros, revistas, jornais; seja incrustada em outros suportes físicos ou fluindo no éter do mundo virtual da Informática e das Comunicações, a informação tem de ser colocada à disposição daquele que a gerou: o ser humano.

Assim é que a Biblioteca deixou de ser uma coleção de livros e outros documentos, classificados e catalogados, para ser uma assembleia de usuários da informação.

O Bibliotecário não é um alfarrabista que só tem olhos para os livros (função bibliocêntrica), mas um profissional academicamente preparado para uma função verdadeiramente “antropobibliocêntrica”, onde ser humano e livro (i. e., documento) interagem sob sua mediação. Existem vários tipos de biblioteca. Frances Henne considerava a Biblioteca Infantil como a “mais importante de todas”. Têm ainda as Bibliotecas Escolares, com material didático para professores e alunos. As Universitárias, as Especializadas (que se voltam para um tipo de usuário ou por tipo de documentos). As Bibliotecas Nacionais reúnem a produção bibliográfica e audiovisual do próprio país e de outros. As Bibliotecas Públicas são as dos governos estaduais e municipais. No Brasil, as primeiras bibliotecas chegaram com os jesuítas, em meados do século 16, na Bahia. Neste Estado também surgiu a primeira biblioteca de um mosteiro beneditino, em 1511, e a primeira biblioteca pública, em 1811. Em 1915, surgiu, no Brasil, o primeiro curso de Biblioteconomia da América Latina. Hoje, existem dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. A profissão de Bibliotecário surgiu com a Lei 4.084, de 30/06/1962, regulamentada pelo decreto 56.725, de 16/08/1965. (EDMILSON SANCHES)

“BIBLIOTERMOS” (alguns termos relacionados ao livro) ARISTOBIBLIOFILIA – sentimento de amor aos livros de luxo.

BIBLIOCIMELIOFILIA – sentimento de amor aos livros raros.

BIBLIOCIRURGIA – técnica que salva da deterioração a parte ainda sã do livro. BIBLIOCLEPTOMANIA – subtração de livros, por furto, roubo ou não restituição. BIBLIOFILIA – atribuição de valor ao livro, pela mensagem, pelo material, pela importância histórica. BIBLIOFOBIA – indevida incompreensão do valor dos livros. BIBLIOFOTOGRAFIA – técnica da reprodução fotográfica de livros, preservando-o em seu feiçoamento original. BIBLIOGNOSIA – conhecimento dos livros.

BIBLIOGRAFIA – disciplina que agrupa os livros segundo critérios sistemáticos vários. BIBLIO-HISTORIOGRAFIA – história do livro.

BIBLIOLATRIA – adoração ao livro, sem excluir seu uso, gozo e proveito. BIBLIOLOGIA – examina o livro do ponto de vista de sua sistematização. BIBLIOMANIA – preocupação obsessiva com os livros e a vontade de possuí-los. BIBLIOMÁTICA – aplicação de processos informatizados na produção e difusão dos livros. BIBLIOMETRIA – aplicação da análise estatística à bibliografia geral (MACROBIBLIOGRAFIA) e específica (MICROBIBLIOGRAFIA). BIBLIOPATOLOGIA – disciplina aplicada (química / física / parasitologia) que estuda o deperecimento material do livro sob a influência do meio, do tempo, de ações parasitárias. BIBLIOPROFILAXIA – técnica de proteção do livro contra as influências/ações de deterioração. BIBLIOSOFIA – conjunto dos saberes relacionados ao livro.

BIBLIOTAFIA – amor exagerado aos próprios livros (lidos ou apenas possuídos), ao ponto de ocultá-los ou torná-los inacessíveis para outrem. BIBLIOTECNIA ou BIBLIOTÉCNICA – corpo de técnicas relacionadas à produção do livro, do ponto de vista de seus elementos materiais.

BIBLIOTECNOGRAFIA – exposição sistemática dos princípios e normas de bibliotecnologia. BIBLIOTECNOLOGIA – sistematiza o corpo de técnicas da bibliotecnia. BIBLIOTECOCIRURGIA – técnica que salva da deterioração progressiva coleções e bibliotecas. BIBLIOTECOGRAFIA – cuida da disposição sistemática das coleções de livros. BIBLIOTECOLOGIA – disciplina dos livros como coleções agrupadas. BIBLIOTECONOMIA – armazenagem, acesso e circulação dos livros. BIBLIOTECOPATOLOGIA – disciplina aplicada (arquitetura / administração) que estuda o deperecimento e a deterioração das coleções e bibliotecas. BIBLIOTECOPROFILAXIA – técnica de proteção às coleções e bibliotecas. BIBLIOTECOTECNIA ou BIBLIOTECOTÉCNICA – técnicas relacionadas á criação de bibliotecas. BIBLIOTECOTECNOGRAFIA – exposição sistemática dos princípios da Bibliotecotecnologia. BIBLIOTECOTECNOLOGIA – sistematiza técnicas/conhecimentos da Bibliotecotecnografia. BIBLIOTECOTERAPIA – técnica de restaurar coleções e bibliotecas. BIBLIOTERAPIA – técnica de recuperação/restauração de livros materialmente deteriorados. ECDÓTICA – arte de descobrir e corrigir erros de um texto e, a partir daí, estabelecer uma edição o mais perfeita possível (“edição crítica” ou “edição exegética”). EDITORAÇÃO – preparação técnica de originais de um livro para publicação, envolvendo revisão de forma e de conteúdo e, em outra fase, a organização para a edição impressa. NOVAS PALAVRAS - Nessa linha, engendrei dois novos termos relacionados aos livros. Consultei o Google e o “Dicionário Houaiss” e não há menção aos termos nem a seus significados, com essa formação léxica / lexical. As palavras são formadas a partir dos elementos de composição gregos para “novo” (NÉOS-), “livro” (BIBLION), “cheiro” / “odor” (OSMÓS) e “amigo” ou aquele que deseja, quer ou gosta (-PHILOS). BIBLIOSMIOFILIA – Aquele gosto ou satisfação com o cheiro de livros. BIBLIOSMIÓFILO - Aquele que gosta do cheiro de livros. NEOBIBLIOSMIOFILIA - Gosto ao ou satisfação com o cheiro de livros novos. NEOBIBLIOSMIÓFILO - Aquele que gosta do cheiro de livros novos.

JOAQUIMHAICKEL

Por minha sugestão, o vereador Antonio Garcez apresentou na semana passada, na Câmara Municipal de São Luís, um projeto de lei que pretende homenagear uma das pessoas que mais trabalharam em benefício de nossa cidade: Luiz Phelipe Andrès. O projeto institui a medalha Luiz Phelipe Andrès, destinada ao reconhecimento de pessoas que se destaquem nas ações de preservação do patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e da memória do povo e da cidade de São Luís.

Abaixo, o texto do projeto e a justificativa dele. Art. 1º. Fica instituída a medalha ''Luiz Phelipe Andrès'', destinada a ser entregue anualmente, à dez pessoas, físicas e/ou jurídicas, naturais ou não deste município, que mais se destacarem nas ações de preservação do patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e da memória do povo e da cidade de São Luís. Art. 2º. A entrega das medalhas se dará ao dia 6 de dezembro de cada ano, data comemorativa da elevação desta cidade a categoria de Patrimônio da Humanidade pela UNESCO. Art. 3º. Ficam revogadas todas as disposições em contrário. Art. 4º. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. JUSTIFICATIVA

Luiz Phelipe Andrès nasceu a 20 de fevereiro de 1949, em Juiz de Fora-MG. Filho do médico Alberto Andrès Junior e da escritora Cordélia de Carvalho Castro Andrès. Estudou na sua cidade natal, no Colégio dos Jesuítas. Graduado em Engenharia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1972) e mestre em Desenvolvimento Urbano pela Universidade Federal de Pernambuco (2006). No Rio de Janeiro, estudou artes plásticas com Ivan Serpa, no Centro de Pesquisa de Arte. Foi ilustrador de livros de ciências do 1º grau para a Companhia Editora Nacional. Atuou como artista gráfico para a Revista Engenharia Sanitária, nos anos 1974 a 1976 (capas e ilustrações), e realizou trabalhos de artes gráficas para a Secretaria de Divulgação do antigo Banco Nacional de Habitação. Desde março de 1977, radicou-se no Maranhão, dedicando-se exclusivamente a atividades na área cultural, notadamente como um dos fundadores do Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís, do qual foi coordenador por mais de 27 anos. Autor do projeto de pesquisas sobre as Embarcações do Maranhão e criador do Estaleiro-Escola do Sítio Tamancão.

No período de 1993-95, foi Secretário de Estado da Cultura do Maranhão e, desde 2010, é Conselheiro do Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, como representante da sociedade civil. É diretor do Centro Vocacional Tecnológico Estaleiro-Escola, professor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas de São Luís do Maranhão e do Curso de Arquitetura da Universidade Dom Bosco, atuando principalmente nos seguintes temas: História, Patrimônio Cultural, Tombamento, Monumento Nacional, Construção Naval Artesanal. Coordenador da pesquisa para edição do livro Monumentos históricos do Maranhão, editado em 1979, pelo Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado – Sioge, contendo o primeiro inventário dos principais monumentos arquitetônicos e da arte sacra de São Luís, Alcântara e Rosário. Responsável pelo Setor de Pesquisa e Documentação do Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís / Projeto Praia Grande, onde descobriu 166 exemplares remanescentes da Coleção dos Livros da Câmara de São Luís dos séculos XVII, XVIll e XIX. Idealizador e coordenador do Projeto de Restauração e Transcrição Paleográfica desses Livros, financiado pelo CNPq.

Foi Coordenador Geral do Programa de Preservação do Centro Histórico de São Luís, Membro do Conselho Estadual de Cultura do Maranhão e Coordenador Geral do Patrimônio Cultural da Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão.

Estagiário no Centre d’Etudes Superieures d’Histoire et Conservation des Monuments Anciens – Paris. Coordenador da Unidade Executora Estadual-UEE do Programa BID/Prodetur do Maranhão. Coordenador Geral do Projeto São Luís Patrimônio Mundial, para preparação e apresentação do Dossiê à Unesco, com o propósito de obtenção do título. Responsável técnico que assina os originais do referido dossiê, que se encontra arquivado nos anais do Comitê do Patrimônio Mundial na sede da Unesco em Paris. Bibliografia a) Como autor: Embarcações do Maranhão; recuperação das técnicas tradicionais populares de construção naval. São Paulo: Audichromo Editora, 1998. Publicado através do Plano Editorial Documenta Maranhão, pelo Governo do Estado do Maranhão, em convênio com a Unesco e com recursos do Ministério da Cultura; São Luís – Reabilitação do Centro Histórico – Patrimônio da Humanidade. São Luís: Edgar Rocha, 2012. (Livro resultante de sua dissertação de mestrado). b) Como coautor: Monumentos históricos do Maranhão. São Luís: Edições Sioge, 1979; Centro histórico de São Luís, patrimônio mundial. São Paulo: Audichromo Editora, 1998. Publicado através do Plano Editorial Documenta Maranhão, pelo Governo do Estado do Maranhão, em convênio com a Unesco e com recursos do Ministério da Cultura.

c) Colaboração em outras obras: São Luís, Cidade dos Azulejos. Revista do Icomos-Brasil, editada pelo Icomos-Brasil em 2000; Programa de Preservação e revitalização do Centro Histórico de São Luís; Desenho Urbano. Anais Do II Sedur – Seminário sobre Desenho Urbano no Brasil – Coedição CNPq/FINEP/PINL. Brasília, 1986; São Luís, História e Magia. In: A arte do Maranhão – 1940/1990, editado pelo Banco do Estado do Maranhão em 1994.

d) Apresentação de obras: Caminhos de São Luís (ruas, logradouros e prédios históricos), de Carlos de Lima. São Paulo: Siciliano, 2002 (Coleção Maranhão Sempre); São Luís, preto e branco em cores. São Luís: Vale do Rio Doce, 2002; Centro Histórico de São Luís do Maranhão. In: Patrimônio mundial no Brasil. Unesco / Caixa Econômica Federal, 2002; Embarcações do Maranhão. In: Catálogo do 1° Seminário do Patrimônio Naval Brasileiro. Rio de Janeiro: Museu Nacional do Mar, 2005; A Arquitetura Maranhense e a Economia do Algodão. In: Arquitetura na formação do Brasil. Rio de Janeiro: Representação da Unesco no Brasil, 2006; Embarcações do Maranhão, na revista Velejar e Meio Ambiente, janeiro de 2007; São Luís – O Centro Antigo – Introdução Histórica e Temas Maranhenses: O Estaleiro-Escola e as Embarcações do Maranhão. In: Guia de arquitetura e paisagem São Luís Ilha do Maranhão e Alcântara. Junta Andalucía / Embaixada da Espanha e Prefeitura de São Luís em 2008.

De forma que, forte no significado simbólico extremamente relevante da presente homenagem ao nosso passado, assim como o futuro reconhecimento da grandeza dos atos de responsabilidade e consciência com a importância da preservação de nossa cidade, nossa cultura e nossos valores para evolução enquanto sociedade, conclamo os nobres pares a aprovarem este importantíssimo projeto.

BIOQUE MESITO, POETA, FALA SOBRE OUTRO GRANDE POETA: IMORTAL APB, PAULO RODRIGUES

Bioque Mesito sobre Paulo Rodrigues

ROTEIRO DE ESPERANÇAS

O poeta Paulo Rodrigues, desde O abrigo de Orfeu (Penalux, 2017), seguido de Escombros de ninguém (Penalux, 2018) e Uma interpretação para São Gregório (Prêmio Alvares de Azevedo/UBE-RJ-2019, Penalux, 2019), vem ganhando notoriedade em sua obra. Digo obra, e não um conjunto de poemas, pois há muito tempo já abandonou essa postura de colecionar poemas, e, sim, construir seu trabalho literário em livros cada vez mais próximos de uma densa atmosfera poética. Uma interpretação para São Gregório já demonstra um aporte mais apurado do que seus livros anteriores para a busca do estético. Explico. O que quero aproximar com o conceito de estético é que Rodrigues busca alinhar suas fontes internas com o que o mundo apresenta em seus olhos, ou seja, a metafísica do olhar deste poeta já brilha em condensar com mais poder de atração seus versos.

Paulo Rodrigues e sua obra.

Neste seu novo trabalho literário Cinelândia (Editora Folheando, 2021), observa-se que o cantar de grande parte dos poemas é o que André Cancian chama de metafísica moderna, pautada na investigação da realidade sem separar a natureza dos seres ou dos objetos, mantendo a compreensão mais próxima do leitor, como no enxuto e eficaz Roliúde, um dos melhores poemas do livro: sentava-se na esquina/de costas pra rua./a mesma camisa,/a mesma calça,/os mesmos sapatos./era um homem/invisível./catava feijão./nunca ouviu falar/em mais valia./sonhou com um barranco,/na Serra Pelada./curou-se da doença./não do feijão. (p.34). Paulo Rodrigues é sagaz e caminha pela densa busca do conceito de Antoine Saint-Exupéry que ensina que “A perfeição é atingida não quando não há mais nada a acrescentar, mas quando não há mais nada para tirar”. Porém, essa perfeição que denominamos de busca pelo apuro estético, é sofrida. Mas o homem nunca conseguirá a iluminação, o sucesso, a liberdade, o amor, o estranhamento... se não for pela senda do sofrer. Rodrigues escolheu o caminho das chagas, o olhar naureano do consumir toda a existência. Busca por fazer uma obra, repito: uma obra e não um amontoado de poemas e versos, para tentar colocar o corpo no paraíso da poesia.

Este seu Cinelândia é seco. Perambula pelo ontológico, pelo existencial, pelo realismo fantástico, liquefeito em histórias de heróis e anti-heróis, um bem elaborado roteiro de personagens que não são moradores da Europa, pequeno burgueses, pautados na fuga das sagas medievais ou no sertão sofrido, tão já mastigado por tantos autores nestes últimos tempos. Rodrigues narra seres urbanos, moradores próximos à realidade, o que tempera e deixa gostosa a leitura e a releitura deste livro. Vejamos, então: Alex cabeça de Gato Bebeu pingos de chuva Nas calçadas do Rio de Janeiro (Ninguém disfarça o azulejo quebrado, p. 40).

Ou:

Ou ainda: A vida, às vezes, é uma esponja de aço. Pior que bala. Ela fere. Arranha. Mete o ferro imperialista, entre a pele e a alma (Carta ao metalúrgico, p. 45).

Iriana mora na rua. foi comida pelo pai; pariu cinco filhos nas calçadas. (Gaia, p. 55)

Paulo Rodrigues cria um livro que muito bem poderia encenar trajetórias de roteiros de películas de Glauber Rocha, Quentin Tarantino ou Woody Allen, personas sofridas, identificadas com a existência e o cotidiano trágico. A observação pelos atrativos da Praça Floriano (Cinelândia-RJ) e seu entorno serviram como molde de barro para esta obra homônima: um canto de desespero, um sonhar com um mundo mais justo, um levitar de nossos piores medos.

Bioque Mesito, poeta

ANTROPONÁUTICA, CINCO DÉCADAS DEPOIS, OU PARECE QUE FOI ONTEM

LUÍS AUGUSTO CASSAS

1972. Tinha 19 anos. Amava os Beatles, Drummond, Caetano, Gullar e os Rolling Stones. E queria mudar o mundo pela poesia. O nome Antroponáutica, título de um dos mais belos poemas de Bandeira Tribuzi encerrado com o antológico “o infinito maior é o próprio homem”) foi a senha que nos agrupou (eu, Valdelino, Fontenele, Viriato e Chagas Val) em torno de objetivo comum: derrubar os falsos moinhos de vento da velha ordem que pretendia restabelecer o caos e o atraso quando se comemorava o cinquentenário da Semana de Arte Moderna. E, claro, vender o nosso peixe lírico-atômico assado nas brasas interiores. Ademais, Tribuzi tinha cada de guerrilheiro-zen. Trazia na travessia coimbrã de retorno à urbe a memória da revelação do sol português e repovoava a nossa imaginação com a encarnação moderna de outro grande incompreendido que comera o pão que o diabo amassou: Antonio Gonçalves Dias. Poeta, jornalista, consultor econômico de programas governamentais, esse perfil não o cindira da provedoria doméstica. Era comum cruzarmos com ele, na travessia para o Liceu Maranhense, retornando do mercado, trazendo em uma das mãos um côfo de legumes, e na outra, uma galinha viva. Essa simplicidade franciscana exibia rico simbolismo: era um mestre em repartir a luz. 2 O ambiente de 1972 era tóxico, mas alegre. Éramos felizes, mas não sabíamos. Erasmo Dias arranchado nos Apicuns, chorava desolado no enterro de Natasha Trupskaia, gata vadia que Erasmo proclamava de elite e Sérgio Brito,retrucava, afirmando que transava com todos gatos vagabundos dos telhados. Carlos Cunha em verve hecatômbica deixara empenhado o filho, Carlos Anaxímenes, no Bar Athenas e demorara resgatar o vale, o que valeu choro e ranger de dentes dos clientes. O velho sábio Rubão Almeida desanovelava aos ventos, a bola branca com cinco carreteís de linha zero, que alavancava os “bodes” de Zezé Caveira, até depositá-los no colo de Deus. Era questão de modernidade ou morte. A nossa juventude – todos estávamos no vintenário – exigia posição a altura. Afinal, tínhamos o necessário: duas mãos e o sentimento do mundo. Mas estávamos mais para desbunde poético-tropical que movimento, essa coisinha andróide, com manifesto, programação, parecendo prévestibular acadêmico. Éramos na anti-rotação da ordem, um contra-movimento. Nossa sede eram os bares da vida. Fontenele e Viriato, mais afoitos, passaram O comunicado de guerra aos jornais. Valdelino, era o public relation da guerrilha. Eu e Chagas Val nos especializamos em bastidores, operações especiai e profecias de bar. Todas deram certo. Depois, seguidos pelas mulheres, seguimos adiante para as nossas milionárias carreiras-solo. O IML não registrara nenhum cadáver passadista. Na verdade, já estavam mortos. O que fizemos foi cuspir o último gole na cova. 3 50 anos depois, releio a Antologia Poética do Movimento Antroponáutica (lançada pelo Departamento de Cultura do Estado,em 72),com capa do compositor César Teixeira. E um frio saudoso percorre-me a espinha. Tribuzi, o patrono virou adubo de rosas. Valdelino foi brincar de boi no céu. Chagas Val pulou nas águas do encantamento. O tempo que converte tudo em elegia, desfalcou-nos do “técnico” e “torcedor de bar”, José Ribamar Estrela Vasquez, que nos legitimava pela maturidade da presença etílica, compensando nossa jovialidade. 4 Refletindo na poesia os nossos enigmas, estigmas e paradigmas – o louco, o filosófico, o palhaço, o visionário, –vivendo e anti-vivendo nossa ira de ser, a lembrança do Antroponáutica sempre foi um sinalizador do menino

interior. Cincoenta anos depois, através de mergulho na psicoterapia, ascese do azul, cavalgado os portais do manicômio e paraíso, redescobrimos a essência do real, a poesia. Em 1972, éramos poucos. Agora somos muitos. Arrependimentos?. Deveríamos ter amado mais, ousado mais, errado mais, e ter cumprido a promessa feita a Tribuzi, no poema “Compromisso”, de “ República dos Becos.” Tocar fogo nessa Academia. Teria prestado serviço de utilidade às gerações vindouras. Em 1972, minha utopia era mudar o mundo pela poesia. Hoje, véspera de emplacar 70, nos idos de março, única certeza é que o mundo só poderá mudar pela poesia. + ++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++ Antroponáutica: éramos 5,em 1972. Valdelino Cécio, Chagas Val, Raimundo Fontenele,Viriato Gastar e Luis Augusto Cassas, este que vos escreve. 50 anos depois e duas baixas, Chagas Val e Valdelino Cécio, numa foto comigo em final da década de 90, o Antroponáutica retorna às bocas. Eis o meu depoimento.

50 ANOS DO MOVIMENTO QUE MUDOU A HISTÓRIA LITERÁRIA NO MARANHÃO: ANTROPONÁUTICA

NATAN CASTRO

Original em:http://literaturalimite.blogspot.com/2016/02/movimento-antroponautica-atitude-e.html

Poetas antroponáuticos - Foto: Viriato Gaspar, Raimundo Fontenele, Chagas Val, Valdelino Cécio e Luís Augusto Cassas.

A poética do Movimento Antroponáutica, em São Luís. Depoimento completo do Antroponauta Raimundo Fontelene.

No início dos anos 1970 cinco jovens poetas maranhenses resolveram propor uma ruptura com a tradição poético/literária do estado. Já vivíamos a segunda metade do século XX e por aqui ainda eram perceptíveis traços do simbolismo e parnasianismo nas obras de poesias que eram lançadas. Os cinco propunham uma renovação urgente no fazer poético no Maranhão. Eram eles Viriato Gaspar, Raimundo Fontenele, Chagas Val, Valdelino Cécio e Luis Augusto Cassas, todos poetas genuínos que tinham como interesse maior renovar a poesia no Estado do Maranhão, rompendo com as antigas escolas literárias do Século XIX que tanto influenciaram as gerações passadas. Deles somente Raimundo Fontenele possuía um livro lançado. O nome do movimento é uma homenagem ao poeta Bandeira Tribuzzi, Antroponáutica é o nome de um poema de sua autoria. O poeta inclusive era junto do grande Nauro Machado e José Chagas, os únicos da geração anterior que os Antroponautas enalteciam e citavam como influência. Por volta de 1971 começaram os encontros num bar no Canto da Viração no centro de São Luís, as reuniões eram regadas a cerveja e muita discussão em torno dos caminhos futuros da poesia maranhense. A princípio

o primeiro passo era chamar a atenção da elite literária da capital, o que foi alcançado logo depois que nomes como João Mohana, Nascimento de Moraes, Arlete Nogueira, Jomar Moraes e Nauro Machado perceberam a chegada dessa nova leva de jovens poetas que buscavam mudanças no meio literário do Maranhão. O reconhecimento devido foi buscado ferrenhamente pelos cinco, quase não havia espaço para publicação de seus artigos e poemas, como muita luta começaram as publicações no Jornal do Dia (jornal comprado pelo Sarney que veio a se tornar o Estado do Maranhão), o Jornal do Maranhão (da Arquidiocese), que tinha um crítico de cinema o José Frazão que também acolheu muito bem as novas ideias do pessoal. Após tanto esforço, de fato o primeiro passo havia sido alcançado, os Antroponautas haviam sido reconhecidos como novos nomes da literatura maranhense. Logo em seguida saiu a famosa Antologia Poética do Movimento Antroponáutica e logo depois foram convidados a integrar um projeto da Fundação Cultural que publicou os cinco juntamente com outros novos poetas na Antologia Hora do Guarnicê.

O lançamento do livro "Às Mãos do Dia", do Antroponauta Raimundo Fontelene

A seguir a narração detalhada do inusitado lançamento nas dependências da Biblioteca Pública Benedito Leite, pelo próprio Raimundo Fontenele, em entrevista dada a este que vos escreve. R - Vocês sabem. A história é feita de fatos, episódios, circunstâncias, eventos, mil acontecimentos distantes um do outro, mas que por esta força grandiosa que é a marcha da vida e da história se conjugam tudo e todos num momento único para deflagrar a coisa, seja revolucionária ou evolucionária, de reforma ou de acomodação. E por essa época aconteceu o lançamento do meu segundo livro individual, o Às Mãos do Dia, que era para ser uma coisa puramente pessoal, mas acabou transcendendo o particular e inseriu-se nessa paisagem do instante que vivíamos: a ditadura militar em todo o seu reinado e esplendor. Querendo fugir daquelas noites de autógrafos costumeiras, que achávamos até enfadonhas, decidimos que o lançamento do meu livro seria diferente. Aí a gente juntaria artes plásticas e música, e lembro do César Teixeira, do Josias, do Sérgio Habibe, do Jesus Santos, do Ciro, Ambrósio Amorim, Lobato, Tácito Borralho, tanta gente. E o lançamento aconteceu na Biblioteca Pública Benedito Leite. Na noite anterior, após tomarmos algumas cervejas, eu, Viriato, Valdelino e outros ficamos na escadaria da Biblioteca Pública conversando e só, de sarro, planejando o lançamento, e cada um saía com a ideia mais louca. Tipo: no lugar de cadeiras para as autoridades íamos colocar vasos sanitários; colocaríamos uma árvore de Natal com ratos pendurados, etc.; íamos convocar mendigos, loucos, os despossuídos para tomarem as escadarias da Biblioteca quando as autoridades e convidados fossem chegando. Ah, e no coquetel no lugar de bebida alcoólica serviríamos leite, mas não em taças e sim em penicos. Novos, claro. Naquele tempo a autoridade maior dos estados era sempre o militar mais graduado, no nosso caso o Comandante do 24 BC. Alguém nos ouviu falar aquelas bobagens e levou a sério. O certo é que o Governador foi acordado pelo Comandante do 24 BC que lhe ordenou visse do que se tratava pois algo de muito grave ia acontecer. Fui chamado às pressas no gabinete do Secretário de Educação (que havia permitido que eu fizesse lá na Biblioteca, órgão da SEC, o lançamento do livro), à época o saudoso Professor Luís Rêgo, um homem boníssimo. Quando entrei em seu gabinete levei um susto, pois ao seu lado estava um Major do Exército. Pálido e trêmulo, ali sentei e o professor Luís Rêgo passou a me interrogar acerca do lançamento e do que estava programado. Neguei tudo. Disse que era mentira. Jamais faríamos uma coisa daquelas e tal. Despachou-me dali, mas me recomendando prudência, e cuidado com o que ia acontecer, pois estavam de olho. Pela cara do oficial do exército nem precisava de me dizer mais nada. Pois, mais tarde enquanto estava na Biblioteca em companhia do poeta Viriato Gaspar, ultimando os preparativos do lançamento, eis que nos aparece um agente da Polícia Federal. E dirigindo-se a mim diz que estava a minha procura, e porque nada mandara o livro para a Censura, e cadê o livro e tal e coisa, e nos colocou em sua viatura fomos até onde eu residia, pegamos um livro, e enquanto eu lia, o motorista nos levou até a sede da Polícia Federal, naquela época ali na Rua Grande na altura do Ginásio Costa Rodrigues. Novo interrogatório pelo delegado de plantão. O Viriato saiu-se bem nas respostas. E quando o delegado quis saber dos mendigos (olha a subversão) que íamos levar, o Viriato disse que não tinha nada a ver, aquilo era uma peça de teatro que estávamos escrevendo e tão logo ficasse pronta levaríamos lá no Serviço de Censura. O certo é que à noite a Biblioteca lotou. Talvez até curiosos, além de meus convidados, muitas autoridades se fizeram presentes. Secretário de Educação, o Prefeito Haroldo

Tavares, e lá atrás de uma daquelas colunas reconheci o agente da PF de nome Mateus, esperando que eu saísse da linha no meu discurso para me grampear. Mas o resultado prático da repressão, que é o cerne desta pergunta, é que nós, os jovens (falo dos jovens em geral e não especificamente do nosso grupo), tomamos rumos diferentes: uns foram para o comodismo da vida privada, outros foram para luta armada, e no meu caso, no primeiro momento, abandonei tudo e embarquei numa carona com os hippies e fiquei vagando pelo país uns três a quatro meses, metido no universo da Contracultura, cujo estímulos vinham da geração beat, e era uma época rica e enriquecedora, chegávamos ao desregramento de todos os sentidos, na vida e na arte, aquilo que o poeta Arthur Rimbaud profetizara um século antes. E a nossa geração foi importante porque abriu caminho para todos vocês que vieram depois de nós. É o ciclo da vida, quer reconheçamos ou não. Ele existe. Ele é. O Maranhão desde Gonçalves Dias deu início a uma tradição literária que continua até os dias atuais, do Romantismo para cá apresentamos ao país e ao restante do mundo, uma quantidade satisfatória de grandes literatos, para não citar outros gêneros da arte. A geração da Antroponáutica que hoje nos parece quase esquecida pelos tais entes da cultura do Estado, possui um papel relevante, quando o assunto é a renovação dessa brilhante tradição. Os cinco jovens poetas buscaram espaço devido, sonharam com as mudanças e ao conseguir colocaram heroicamente seus nomes na história da arte e da cultura do Maranhão. Tudo isso num período em que a náusea artística era vista como algo peçonhento e altamente prejudicial ao poder estabelecido.

FERNANDO BRAGA

in ‘Conversas Vadias’, antologia de textos do autor. Ilustração: Foto de Oswaldino Marques, do acervo do professor e escritor Antônio Miranda.

Oswaldino Ribeiro Marques nasceu em São Luís do Maranhão, em 17 de outubro de 1916 e faleceu em Brasília-DF, em 13 de maio de 2003. Abriu seu caminho a golpes de tenacidade, à mercê de inquebrantável adesão aos valores da inteligência. “Se não fosse escritor, gostaria de ser matemático ou físico nuclear”, dizia convicto com as exigências que tinha consigo. Ao falar-se de Oswaldino é bom que se diga qual foi ele o ponto de ligação que houve entre sua geração maranhense de 30, com os ecos da ‘Revolução de Arte Moderna de 22’, e é justamente sobre isso que o escritor Rossini Corrêa, em seu belo livro ‘Atenas Brasileira – A Cultura Maranhense na Civilização Nacional’, Thesaurus Editora, Brasília, 2001, à pág. 187, nos diz: “O ambiente cultural ludovicense não foi contemporâneo do eixo construtor do modernismo brasileiro, na década de 20: ‘os revoltosos assustam no Maranhão’, reconheceria Odylo Costa, filho. Sem movimentos, sem manifestos, sem revistas, sem articulação interativa e sem livromarco de reconvenção estética inserto na moderna história literária do Brasil. São Luís, na realidade, ficou à revelia do itinerário imediato de expansão da mudança modernista em curso no País. São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, sim. Pernambuco, Paraíba, Rio Grade do Norte e Alagoas, também. No Pará, menos. No Maranhão, não. Se alguns poucos sonharam em ensaiar a luta renhida, perderam a batalha que, em visão crítica, não vingou em terras gonçalvinas. O principal modernista maranhense, jovem da década de 20, foi Nunes Pereira, uma espécie de Raul Bopp fugindo do passadismo, que estava diante do seu mestre Mário de Andrade, em Natal, vindo de Belém, onde frequentara tertúlias peripatéticas. E, no Maranhão, nada de Nunes Pereira”.

Avesso às academias e a ciclos literários, Oswaldino Marques, não sei por quê, pertenceu ao ‘Cenáculo Graça Aranha’, ao lado de alguns dos seus mais legítimos companheiros da geração de 30, como Josué Montello, Franklin de Oliveira, Manuel Caetano Bandeira de Mello, Amorim Parga, José Erasmo Dias, Sebastião Corrêa, Paulo Nascimento Moraes, Ignácio Rangel e outros, “a buscar o sonhado caminho’ apregoado pelos cânones

do modernismo de 22, o qual no Maranhão, como se viu, foi “febril e transitório, enquanto que, para o ideal de glória da mitológica tribo timbira, sempre a eternidade foram deusa e rainha sedutora”, como nestes versos do próprio Oswaldino Marques: “E sinto quanto mais contraditória/ é a fortuna de minha realidade:/ ter por órbita a vida transitória/ e em torno a mim só ver eternidade”. Não procuraram e nem acharam ideia modernista nenhuma. Sobre o ‘Cenáculo Graça Aranha’, é Josué Montello que nos diz: “Éramos românticos, e não sabíamos. O Cenáculo não publicou livros, não promoveu conferências, não empossou nem enterrou ninguém. Na verdade, pensando bem, foi uma bela ficção. Cada um de seus membros fundadores tomou rumo próprio, ficando em São Luís ou dali saindo. Tão completa foi a sua extinção que dele não restou o livro de atas, nem o álbum de recortes. Apenas uma tabuleta”.

Em 1936, Oswaldino zarpa de navio para o Rio de Janeiro, onde já lá estavam Montello, Franklin e Bandeira de Mello. Na velha capital, o mais tarde tradutor de Whitman, se torna um dos fundadores da União Nacional de Estudante-UNE, onde trabalhou como bibliotecário e tradutor, tendo sido um dos responsáveis pela divulgação da poesia moderna estadunidense no Brasil. Em 1965, mudou-se para Brasília, como servidor do Ministério da Educação, transferido do Rio de Janeiro. Por concurso, assumiu a cátedra de Teoria da Literatura na Universidade de Brasília [UnB]. Com o agravamento da ‘posição militar no Brasil’, o mestre Oswaldino a trilhar pelos caminhos do marxismo, foi demitido do cargo, se autoexilando nos Estados Unidos, aonde foi professor visitante das literaturas portuguesa e brasileira, na Universidade de Madison, Wisconsin. Algum tempo depois, em 1991, via anistia, foi reintegrado à UnB pelo Reitor Cristovam Buarque. Oswaldino Marques era por temperamento retraído e viveu os últimos anos praticamente isolado em seu apartamento em Brasília, onde dedicava seus dias à leitura e a ouvir músicas. Quantas vezes, a seu convite, participei desses momentos silentes ao seu lado, entre clássicos e músicas de câmera de sua predileção, a degustar, por vezes, um delicioso ‘mingau de milho’, à moda maranhense, que em outras plagas chamam de ‘canjica’, preparado por Maria do Carmo, sua mulher. Talvez por convicção ideológica, Oswaldino se dizia ateu, mas não por isso, mas por outros ‘caprichos’, deixou registrado em cartório, que não desejava qualquer tipo de cerimônia religiosa quando de seu sepultamento, nem discursos, e nem flores, e nem velas, o que foi seguido à risca por sua mulher e seus filhos, o gravador Igor Marques e o também escritor Ariel Marques. Sintamos o quanto o Padre António Vieira tinha razão quando proferiu o seu famoso sermão a ‘Quinta Dominga da Quaresma’ ou ‘Sermão das Mentiras’, Rossini Corrêa [op.cit.p.224], diz assim: “Tribo conflitada e desunida a maranhense, que, no passado, falava mal de si às escondidas, como Humberto de Campos a comentar livro de Coelho Neto, no ‘Diário Secreto’: “Recebi um livro de Coelho Neto. É um punhado de crônicas de jornal, em que seguem os lugares-comuns, se sucedem as expressões banais, os termos de gíria, as frases feitas, compondo páginas sem relevo, sem interesse, sem beleza, uma grande piedade, uma grande dó...” [...] Atualmente, porém o duelo travado em terra estranha é público e notório, à faca peixeira, com fratura exposta, massa cerebral perdida, hemorragia desatada e de vísceras caídas por terra, como o servido em BrasíliaRio, por Oswaldino Marques e por Josué Montello. Combate, este, que inspirou ao primeiro a corrosiva e inédita produção poética, que substitui, em sua concisão, todo um banquete psicanalítico. Em: ‘Auto-epitáfico’– “Osvaldino aqui jaz./ De vezo polêmico, /índole indomada. /Zero contumaz /na vida foi nada /nem mesmo acadêmico”.

O que Rossini Corrêa atiça acima, esmiúço abaixo, como ilustração a este dedo de prosa, e para que o leitor entenda melhor essa ‘luta corporal’ que em nada espantaria Ferreira Gullar: Oswaldino e Josué foram colegas no Liceu Maranhense por todo o curso de humanidades; tinham precisamente a mesma idade; ambos intelectuais de fina linhagem; Oswaldino foi ‘eminência parda’ de Montello quando este exerceu a direção da Biblioteca Nacional, mas, infelizmente, um pelo outro nutria uma ‘rezinga figadal’. Oswadino era

terno e generoso em gestos e delicadezas, mas quando se aborrecia, por qualquer coisa, perdia as estribeiras, sem medir consequências e sem economizar adjetivos, o mesmo acontecendo com Josué Montello, o que fazia dos dois, apesar de adversos, mais que semelhantes. Um belo dia, pela década de 80, um ‘Macunaíma’ qualquer, à guisa de fuxico, instigou Oswaldino em relação a um ‘disse-me-disse’ que Josué Montello houvera verbalizado sobre sua pessoa, o que na linguagem cibernética de hoje seria traduzido como ‘fake news’. Pelo sim, pelo não, Oswaldino surtou com que ouvira do ‘herói sem nenhum caráter’, e foi às pressas para o ‘Correio Brasilense’ onde abriu as ferramentas contra Josué, num artigo intitulado ‘Desmontele-se’, o que imediatamente, o autor de ‘Os Tambores de São Luís’ respondeu pelo ‘Jornal do Brasil’ ao tradutor de Blake, num outro artigo, intitulado ‘Arquive-se’. Foi uma ‘batalha romanesca e ensaística’ espetacular, o que me faz rir até hoje quando as leio; guardei esses artigos comigo, de duas páginas inteiras cada um, devidamente catalogados em hemeroteca; são duas preciosidades literárias, que em matéria de ‘agravos, em alto estilo’, nada existe semelhante em língua portuguesa, nem mesmo os terríveis epigramas trocados por Bocage e Caldas Barbosa na velha Arcádia Lusitana, ou as bandarilhas trocadas entre Alexandre Herculano e seus ‘indesejados’ colegas da Torre do Tombo, ou ainda, as fúrias contidas nas farpas de Eça e Ortigão contra uma comunidade inteira. Uma maravilha de batalha literária! De sua extensa bibliografia, eis aqui alguns livros e antologias de Oswaldino Marques: ‘Poemas quase dissolutos’, 1946; ‘Cantos de Walt Whitman’, 1946; ‘O poliedro e a rosa’, 1952; Cravo bem temperado, 1952; ‘Usina de sonho, 1954; ‘Videntes e sonâmbulos’, 1955; ‘Poemas famosos da língua inglesa’, 1956; ‘A seta e o alvo’, 1957; ‘Ensaios escolhidos’, 1968; ‘O Laboratório Poético de Cassiano Ricardo’, 1976; ‘A dançarina e o horizonte’, 1977, ‘Livro de sonetos’, 1986. “[...] Em seus poemas, onde a beleza formal jamais se afasta da substância, em seus ensaios críticos, onde a arguta percepção está informada do mais dignificante calor humano, em suas traduções exemplares, [William Blake, Walt Whitman, T.S. Eliot] onde a fidelidade ao espírito criador original não está contida pela inevitabilidade da redução, sendo antes recriações válidas e autônomas, o escritor maranhense oferece generosamente o melhor de si [...] “A sensualidade de nossos trópicos se torna evidente mesmo quando os temas são aparentemente intemporais e forâneos”, disse dele o amigo e editor Ênio Silveira. Escutemo-lo, em seguida, em ‘A dançarina e o horizonte’: “Em luz resplandeceu minha palavra/ e se fez sol interior, mental:/ sob seu calor agora torno à lavra/dos campos da sintaxe e do real”. Por fim, ouçamo-lo neste ‘Homo sum’, enfeixado em ‘Poemas quase dissolutos’: “Há nos meus ombros vestígios de asas,/Guardo zeloso uma rica herança de voos;/Não esqueci, de todo, os segredos da levitação,/E me vanglorio de flutuar ainda como leve paina no espaço!/Tem sua obscura razão este ingênuo amor pelas nuvens,/Esta infantil ternura pelas franzinas borboletas,/E o orgulho de atirar o rosto para as estrelas./Mas, ai! apalpo no meu cóccix também uma cauda atrofiada,/ Que em vão dissimulo e dissimulo com meu enganador manto celeste. /Besta e anjo — um meridiano me corta em zonas de luz e treva. /De um dos meus lados nasce a aurora, /O outro é a úlcera de onde jorra a noite. / Ai! Que desgraça ser o antípoda de si mesmo! / Viver se despenhando em violentas diagonais de contradições. / A mão pura e a impuras pendentes do mesmo tronco. /O olho cego e o são coexistindo na mesma face. /O lábio podre e o eterno modelando estranhas palavras híbridas.” A última vez que conversei com Oswaldino Marques, não preciso quando...Foi no gabinete em que ele dividia com Herberto Sales a direção do Instituto Nacional do Livro [INL] em Brasília. Tenho saudade de sua generosidade e de suas colocações discursivas, sempre em altíssimo nível. Ele foi, repito, um querido amigo e um escritor que honra a Literatura Brasileira!

SALGADO MARANHÃO, ESCRITOR CAXIENSE: INDO LONGE E PERTO. BEM LONGE E BEM PERTO

EDMILSON SANCHES

José Salgado Maranhão certamente está recebendo mensagens de todo o país -- e do Exterior também -por seu aniversário no domingo, 13 de novembro. Sua página no Facebook (https://www.facebook.com/jose.s.maranhao) mostra o carinho de seus leitores, amigos e conterrâneos. Tempos atrás, Salgado Maranhão esteve na segunda semana de novembro em Caxias, sua terra natal. Era convidado para o 1º Sarau Literário "Na Pele da Palavra", organizado pelo também escritor caxiense Carvalho Júnior.

Junto com o jornalista Jorge Eugênio Gonçalves, estive na rodoviária caxiense e recebi o grande poeta. Hospedou-se, por minha indicação, no tradicional Excelsior Hotel, ali ao lado da Praça Gonçalves Dias, no centro da cidade, onde também eu me hospedara. Juntos (mas o convidado era ele), palestramos no auditório do Memorial da Balaiada, no histórico Morro do Alecrim, para dezenas e dezenas de estudantes de escola pública, a convite da professora e poeta Ana Lúcia Gonçalves. Éramos ali dois caxienses, nascidos na mesma década, época que, em princípio, “conspirava” contra nós, por reunir todas as pré-condições para nos dar mal na vida: nascemos pobres, negros, no interior do Maranhão / do Nordeste. Mas o "casulo" que aparentemente nos apertava e segregava foi o mesmo que nos fez robustos, vigorosos, pelo esforço que empenhamos para sair dele e voar, ir (para) longe. E Salgado Maranhão foi longe. Bem longe. Em livro e pessoa. Todo prosa -- mas, sobretudo, todo poético. Em letras (d)e canções. Em versos e versões -- versões para outras línguas. Salgado Maranhão foi (e continua indo) pelo mundo. Só nos Estados Unidos, em 2012, a convite, esse poeta caxiense (per)correu pelo menos 20 mil quilômetros e visitou e palestrou em cinquenta e duas exigentes e superorganizadas universidades americanas. Salgado Maranhão tornou-se “escritor de uma literatura”, não apenas “escritor de uma língua”, de que nos fala o também maranhense Josué Montello em seu “Diário da Tarde”. Em Caxias, naquele novembro de há alguns anos, Salgado Maranhão foi perto. Bem perto. Juntos, ele e eu re/buscamos ruas de nossa cidade e naquelas ruas buscamos lugares e casas dantanho -- passado presente em nossas lembranças crianças... Mas as antigas casas foram (trans)mudadas, (trans)feridas pelo amor ao agora e desamor ao (e)terno. O Poeta não encontrou o que procurava e que se encontra permanente e indelevelmente em sua memória doutrora.

Caxias, confirma-se, está bem presente em Salgado Maranhão. E naquele dia, vésperas do aniversário do Poeta, a cidade-mãe teve presente o filho reconhecidamente pródigo e prodígio, fecundo e genial em nossa Poesia..

Em tempo de aniversário, filho e mãe se presenteiam. Parabéns para eles. Parabéns para nós. Parabéns, Salgado Maranhão.

"VERÔNICA SIMPLESMENTE": "UM PASSARINHO ME CONTOU. E VOCÊ? TEM PASSARINHO?"

NOVO LIVRO DO ESCRITOR MARANHENSE ROGER DAGEERRE MHARIO LINCOLN

Roger Dageerre.

VERONICA SIMPLESMENTE está entre os livros a serem lançados na 12ª edição de Lançamento Coletivo de Obras Maranhenses, na Biblioteca Pública do Estado do Maranhão, neste 25 de novembro. Ao todo, serão 55 autores a participarem desse evento.

Resenha do livro de Roger Dageerre

O novo livro de Roger Dageerre VERÔNICA SIMPLESMENTE é uma obra de resiliência. Versa sobre um triunvirato: Roberto, Verônica e Jamille. Um desses amores platônicos que acabam não dando certo e o amante segue uma vida sem se livrar desse pensamento indolor, mas furtivo e inquietante. Como diria Luís de Camões: "Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói, e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer. (...)".

Mas, no conto de Roger Dageere, tudo muda de figura e Roberto acaba por se ver numa outra situação. Não idêntica à de Verônica. De certa forma, contudo, digna de frenesi amoroso: finalmente, alguém entra na vida triste dele e a muda por completo. Artur da Távola, costumava dizer: "O amor... Ah, o amor.../ O amor quebra barreiras, une facções,/ destrói preconceitos,/ cura doenças...". Então, na lógica, vale uma pergunta: será que o novo amor entre Roberto e Jamille é maior que o amor de Verônica? É assim que o conto se desenrola. Quando Roberto se vê abandonado após um único encontro entre ele e Verônica, o leitor fica se perguntando qual seria o destino dele.

Roberto passa por todas aquelas fases de um homem apaixonado/abandonado. Foi ao bar onde sempre bebia duas cervejas aos sábados e, naquela vez, tentou se embebedar de saudade, não suportando a ausência da amada. No fundo, é como se ele "tivesse criado uma imagem sagrada de Verônica". O Sr. Darciles, o dono do estabelecimento, interveio vendo o suplício do amigo e se pois a explicar que um novo amor poderia aparecer a qualquer momento. O fato é que essa história foge aos conceitos dos roteiros de Amor. Primeiro, porque não há ódio, nem rancor, nem ciúme, nem traição, nem morte. Segundo, porque o principal personagem recebe uma segunda chance e tem uma nova oportunidade de ser feliz, constituir família e filhos. Mas, não deixa de ter o ápice. É quando, muito tempo depois, já casado e aquietado, Verônica liga para Roberto e marca um encontro a sós com ele. Jamille ouve a conversa e libera Roberto para o encontro, o que demonstra muita maturidade e apreço do personagem, casada com Roberto. Por fim, o encontro acontece e Verônica explica o porque do abandono: "voltaria para teus braços se eu merecesse você". Nesse caso, o texto foge ao tradicional cantado pelos escritores shakespearianos, que insistem em escrever sobre o poder esmagador que tem o amor, em conseguir alterar e definir as vidas dos amantes. E não para aí: Roger Dageerre também foge ao tradicional quando dá um final feliz diferenciado a esse triunvirato amoroso mostrando a sinceridade de Verônica e a capacidade de torcer para que Roberto continuasse feliz com a nova família, sem tentar destruir esse relacionamento. E pelo visto, Verônica teria como interceder negativamente. Isso acaba tornando-a um personagem muito significativo no enredo (não só pelo título), porque o leitor sabe da influência forte desse sentimento, quando "(...) o ato de amar é morar um no outro", ensinado por Mario Quintana. Assim, mesmo que Roberto vivesse feliz com Jamille, ele, com certeza, correria para os braços de Verônica, caso ela sinalizasse dessa forma. Entretanto é a mesma Verônica a responsável pela continuação da convivência conceitual com Jamille, ao final das contas. Em determinado momento durante o encontro, passadas as emoções e frios na barriga, Roberto pergunta: - Como você, Verônica, conseguiu me encontrar, tantos anos depois de nenhum contato? Verônica mesmo responde: - "Um passarinho me contou". Aí, já no finalzinho apoteótico, todo o milagre contextual do conto, traduzido em uma palavrinha só, "Um passarinho me contou" -, mesmo porque, essa expressão, especificamente no texto do conto, represente um universo imenso de entendimento, pelo que Roberto enseja: - Então, por que eu nunca lhe encontrei? Pelo que, sensacionalmente ela responde: - É porque você não tem um passarinho! Esse diálogo final é a chave do enigma para o leitor compreender todo o jogo amoroso entre Roberto e Verônica. É a velha história de Édipo e a Esfinge, retratada óleo sobre tela, pelo francês François-Xavier Fabre: - Decifra-me ou devoro-te. (Em todos os sentidos). Eu decifrei! E você?

POR QUE O MARANHÃO ABANDONA (OU ATÉ DESCONHECE) SEUS GRANDES VALORES UNIVERSAIS?

EDMILSON SANCHES

Edmilson Sanches Nota do Editor: o Padre Francisco João de Azevêdo inventou uma máquina-protótipo de escrever, através de teclas e a mostrou durante a grande Exposição Nacional no Rio de Janeiro, de 1861. Mas um americano o persuadiu a levar a invenção para os Estados Unidos afirmando que lá, poderia industrializá-la. E aí ianque Chritistofer Sholes levou a fama e a patente. Em março de 1973 Sholes apresentou como seu, um protótipo igual ao do padre. Logo depois mostrou aos armeiros Remington e a partir daí, todo mundo conhece. O padre entrou para a galeria brasileira dos inventores injustiçados. Mas, e quando as pessoas são reconhecidas como desbravadores, inovadores, dentro e fora do país, todavia quase desconhecidos em sua terra de origem, onde nasceram? É essa a história que Edmilson Sanches conta, abaixo:

POR QUE O MARANHÃO ABANDONA SEUS MAIORES VALORES? ---- Se o Brasil fosse o mundo, o Maranhão seria a França. ---- Se o Maranhão saísse do Brasil, a economia do Brasil perderia menos de 1,5% [um e meio por cento]. Mas se o Maranhão saísse do Brasil, o País perderia mais de 30% de sua História e Cultura *

Recentemente, em longa conversa em um café de grande Livraria no Rio de Janeiro, o poeta Salgado Maranhão, meu conterrâneo caxiense, contou-me que ouviu um palestrante dizer, no curso de sua fala: “ --- Se o Maranhão saísse do Brasil, a economia do Brasil perderia menos de 1,5% [um e meio por cento]. Mas se o Maranhão saísse do Brasil, o País perderia mais de 30% de sua História e Cultura”. Tal é a grandeza histórico-cultural de nosso Estado. Como costumo dizer, em termos histórico-culturais, se o Brasil fosse o mundo, o Maranhão seria a França - e, nesta França, Caxias seria Paris... Reproduzo de memória a frase e substituí o percentual da Economia, com inclusão de dados oficiais, com base no PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil e do Maranhão em 2019, quando o País totalizou R$ 7 trilhões 389 bilhões e o Maranhão, R$ 97 bilhões.

Por mais que seja difícil quantificar um percentual de participação histórico-cultural de um estado na formação e existência de um país, ainda assim é válido, ilustrativa e simbolicamente, realçar a grandeza maranhense na formação brasileira. *

Nosso Estado, o Maranhão, pelo talento e esforço de diversos de seus filhos, deu uma gigantes contribuição ao Brasil e ao mundo.

Assim, “en passant”, podemos afirmar que eram maranhenses quem criou a Bandeira do Brasil (cujo dia é daqui a pouco, em 19 de novembro) e quem deu ou fortaleceu a ideia de o Hino Nacional ter uma letra, que foi Coelho Netto, à época deputado federal, em 1909 e 1917. Ou seja, os dois maiores símbolos do Brasil têm a presença maranhense, incluindo-se também os versos de Gonçalves Dias em estrofe do Hino (“Nossos bosques têm mais vida” / “Nossa vida” no teu seio “mais amores”). Por sua vez, a cidade maranhense de Caxias é um raríssimo caso de município que está presente três vezes no Hino e Bandeira brasileiros: o criador da Bandeira do Brasil, Teixeira Mendes, é caxiense, e caxienses são também Coelho Netto e Gonçalves Dias Maranhenses também são o criador do Ministério da Agricultura (e presidente de honra da Sociedade Nacional de Agricultura); ...o primeiro dramaturgo negro do Brasil, criador do Teatro Profissional do Negro, cujo nome foi dado ao ano de 2018 pelo Governo Federal; ...o primeiro tradutor de Shakespeare para a Língua Portuguesa; ...o introdutor do cinema seriado no Brasil; ...o idealizador do Teatro Municipal do Rio de Janeiro; ...o maior governador do Amazonas; ...o primeiro poeta brasileiro a ser publicado em página do maior jornal dos Estados Unidos; ...o autor da primeira música sertaneja gravada no Brasil; ...o criador da primeira companhia imobiliária do País; ...os idealizadores do primeiro banco brasileiro, muito antes de Dom João 6º chegar ao Brasil; ...o inventor do “stent” (nanotubo que se introduz em artérias para regular fluxo sanguíneo para o coração); ...o fundador dos bairros Grajaú no Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP).

Maranhenses são o redator da Lei do Ventre Livre; ...o autor da Lei que permitiu a liberdade de crença e culto (com a separação da Igreja do Estado); ...o autor do primeiro livro científico de Odontologia no Brasil e dentista pioneiro no uso de anestesia, considerado “Glória da Odontologia Brasileira”; ...o patrono da Medicina Legal brasileira (junto com o médico e escritor baiano Afrânio Peixoto); ...o criador da Antropologia Criminal; ...o inspirador da criação da FUNAI (Fundação Nacional do Índio); ...o pioneiro nas lutas pelas leis de proteção à mulher trabalhadora, ao menor trabalhador, ao doente mental e ao índio; ...o introdutor do Indianismo na Literatura Brasileira; ...o introdutor do Parnasianismo; ...o introdutor do Naturalismo;

um dos criadores do Concretismo e do Neoconcretismo na Literatura Brasileira; ...o introdutor do Modernismo nas Artes Plásticas brasileiras; ...o precursor do romance policial no Brasil; ...o professor e dramaturgo que é considerado “A Pedra Angular do teatro Paranaense” (e que estudou com grandes nomes do Cinema e Teatro mundial, como Federico Fellini, Roberto Rossellini, Michelangelo Antonioni, Laurence Olivier, Luchino Visconti...).

São maranhenses o responsável pela elevação da capoeira no Brasil, como esporte, arte, técnica, dança, luta digna; ...o escritor três vezes indicado ao Prêmio Nobel; ...o introdutor do cinema seriado no Brasil, precursor das novelas e séries atuais; ...os autores do primeiro livro de autoria coletiva do Brasil; ...o precursor da Tradução Criativa no Brasil; ...o médico que é considerado o maior matemático da História brasileira e um dos maiores do mundo; ...o patrono da Cadeira nº 1 da Academia Brasileira de Letras; ...o pioneiro no estudo do Folclore no Brasil; ...o responsável pela reabilitação do violão como instrumento musical digno no Brasil; ...a sacerdotisa de culto afro-brasileiro e última princesa da linhagem direta fon (estudada por escritores, sociólogos e antropólogos brasileiros e estrangeiros); ...o professor considerado “Mestre dos Mestres” em São Paulo.

Também são maranhenses um campeão internacional de hipismo (inclusive recentemente); ...o pioneiro no estatuísmo (“estátuas vivas”) no Brasil; ...o pioneiro em organização de Cerimonial & Relações Públicas no País; ...um dos fundadores da União Nacional dos Estudantes; ...um aviador herói da 2ª Guerra Mundial; ...a “mãe dos pobres” de São Paulo (capital); ...os primeiros músicos brasileiros a subirem ao palco do primeiro “Rock in Rio” (janeiro de 1985); ...o primeiro ministro da Ciência e Tecnologia do país; ...o escritor mais lido do Brasil em sua época; ...o primeiro presidente do Conselho Brasileiro de Fitossanidade; ...o dramaturgo, poeta, contista e jornalista e compositor, considerado entre os primeiros letristas profissionais da música popular brasileira.

Também são maranhenses o escritor e jornalista que iniciou a “revolução” gráfica na Imprensa brasileira; ...o antropólogo, veterinário e ictiólogo que foi um dos primeiros pesquisadores mestiços de reconhecimento científico internacional, fundador da Academia Amazonense de Letras, com placa e álea com seu nome no Jardim Botânico do Rio de Janeiro; ...o prefeito exemplar de capital no Sul-Sudeste, autor literário reconhecido em diversos países; ...o autor do primeiro livro de gramática da Língua Portuguesa no Brasil; ...o fundador da primeira tipografia de São Paulo; ...o jornalista e escritor que, bem antes de Euclides da Cunha, foi o primeiro a chegar a Canudos e a escrever e publicar livro sobre a “Guerra de Canudos”, na Bahia (1896-1897); ...o responsável pela primeira contagem populacional (recenseamento) do Brasil, em 1872; ...o primeiro presidente do Banco do Brasil; ...a cantora, compositora, multiinstrumentista, professora e folclorista, considerada a “Rainha do Acordeom” e a segunda maior compositora brasileira em número de músicas gravadas, que com menos de 15 anos já se apresentava no exterior, teve composições gravadas em outros países e por grandes nomes da música brasileira, como Nara Leão, Fagner, Clara Nunes, Marlene, Dóris Monteiro, Inesita Barroso, Marinês e Sua Gente, Carlos Galhardo e Zé Ramalho; ...o músico considerado, na sua época, o melhor violinista do Brasil; ...os poetas considerados, na época de cada um, o maior poeta vivo brasileiro; ...a banda militar maranhense que é a segunda criada na história do Brasil;

...e outros maranhenses e ocorrências que foram/são destaques nacionais e internacionais na Ciência & Tecnologia, nas Artes e Cultura (Música, Literatura, Pintura etc.), Meio Ambiente, Educação, Medicina & Saúde, Administração Pública e Empresarial etc. E o que, maximamente, é tema recorrente na Imprensa brasileira sobre o Maranhão? Que somos o pior ou um dos piores em indicadores socioeconômicos. Quando eu era menino, comprava todo ano o “Almanaque Abril”, desde a primeira edição. Sofregamente, ia logo ver o capítulo sobre os Estados brasileiros para ler o texto

sobre o Maranhão. Decepção. Geralmente começava assim: “O Maranhão, estado mais pobre / mais atrasado do Brasil [...]”. Autoridades maranhenses e mesmo o mundo empresarial, se já não tivessem outros deveres, também têm a obrigação -- chamam-na de “responsabilidade social” -- de proporcionar aos maranhenses o conhecimento sistêmico e sistemático, orgânico e organizado dessas informações. Informações que tanto poderiam dar conhecimento quanto, também, ser motivo de inspiração e sadio orgulho para os mais jovens e, por que não?, para todos nós. Com base nessa exaustiva -- e ainda assim curta -- lista de grandes nomes maranhenses (que compõem o projeto “Enciclopédia Maranhense”, que elaborei), faça uma reflexão sobre o fato de nosso Estado, repito, ser conhecido “lá fora” apenas por indicadores socioeconômicos péssimos (que devem ser combatidos, revertidos), mas esquece, nosso Maranhão, de divulgar para o Brasil e para além o que de bom a História registra que foi feito por nossos Conterrâneos de antanho. O Maranhão não se assenhoreia desse verdadeiro tesouro, desse potencial de Economia Criativa / Economia da Cultura. Relega, bane, expatria ou despreza o pioneirismo, os esforços, o resultado do talento e lutas de seus próprios filhos, que, no passado e até presentemente, contribuíram verdadeiramente para formar, fixar e ampliar a Identidade Brasileira e ajudar a tornar melhor nosso País nas diversas áreas. Quer saber mais outras dezenas senão centenas de “coisas” em que o Maranhão e maranhenses são bons ou pioneiros etc.? Quer conhecer, apoiar ou associar-se ao projeto “Enciclopédia Maranhense”? Quer uma oportunidade de ser terno com sua terra e eterno com seu nome? www.edmilson-sanches.webnode.page.

POETA E ESCRITORA JOIZACAWPY COSTA ANALISA TRABALHO INÉDITO DE MHARIO LINCOLN

Joiza escreve sobre "Entrevistas com Livros", gênero inédito, registrado pelo Facetubes.com.br

Joizacawpy Muniz Costa

UMA NOVA FORMA DE RESENHAR PROPOSTA POR MHARIO LINCOLN

*JOIZACAWPY COSTA

Com uma nova forma de resenhar nos propondo uma inovação em gênero de resenha, Mhario Lincoln lança “Entrevista com livros” de forma espetacular. De um jeito diferente Mhario nos leva a viajar pelas páginas de livros de maneira diferenciada, propondo e realizando uma entrevista interagindo com livros de um jeito descontraído permitindo ao leitor embarcar num verdadeiro deleite literário de modo a proporcionar uma viajem pela obra de uma forma leve. O formato proposto e realizado por Lincoln é feito da seguinte maneira: ele lança uma pergunta ao autor e obtém a resposta com fragmentos do próprio escritor referente a obra selecionada, desse modo tem-se a resenha em forma de entrevista com livros. O primeiro “diálogo”, foi com o grande escritor José Sarney, Mhario nos fez adentrar a obra “Saudades mortas “, nos permitindo conhecer nuances do livro com riqueza de detalhes, conduzindo-nos a refletir sobre as contribuições contidas no título de forma significativa de modo a nos lançar novos olhares sobre autor e obra. MHL: Na espontaneidade de seus versos, há muita coisa que cala fundo, quando o mote revive momentos antanhos. Fale-me, pois, sobre um desses momentos: o de sua partida para o futuro. Deixando a rua de barro, de cavalos e de peixes lodosos... JS: Nasci nesta rua de cavalos; comi pó e barro, peixes de água lodosa, pescados nas madrugadas molhadas. Vieram dias que docemente me induziram a viver, e vivi. Buscando forças que me levaram a partir e nelas fui embora como quem apanhava um barco a velas para enfrentar o mar. Estou íntegro. Sou carne do meu sonho e alma do meu encanto que amou, conheceu medo, a salsa, a alegria, e a chama dessa luz que apagou no vento azedo da maresia do tempo. (Às págs. 33). Na segunda entrevista, Lincoln nos traz o grande poeta Nauro Machado com o título “Jardim de Infância”, ele viaja na obra interagindo de forma criativa e nos faz adentrar a mesma através de suas perguntas, cujas respostas são os próprios trechos poéticos de Nauro, enriquecidos com o jeito descontraído do novo jeito de resenhar. MHL: Aliás, em que momento você se apercebe homem ou simplesmente poeta?

NM: “Meu corpo está completo, o homem – não o poeta./ Mas eu quero e é necessário/ que me sofra e me solidifique em poeta,/ que destrua desde já o supérfluo e o ilusório/ e me alucine na essência de mim e das coisas,/ para depois, feliz ou sofrido, mas verdadeiro,/ trazer-me à tona do poema/ com um grito de alarma e de alarde:/ ser poeta é duro e dura/ e consome toda/ uma existência.” (Pág. 13).

De maneira inovadora Mhario Lincoln nos proporciona um jeito igualmente inovador de apreciar uma boa leitura através de entrevista com livros, despertando em nós novas possibilidades de adentrar o mundo da escrita levando-nos a refletir sobre as renovações na maneira de escrever e explorar o univrso literário. ---------------------------*Joizacawpy Muniz Costa Formada em pedagogia, pós-graduada em psicopedagogia, professora atuante na rede municipal de São Luís MA, nasceu em Santa Inês MA, residiu até os 14 anos no município de Monção MA, mudou-se para São luís aos 14 anos, onde encontrou uma afinidade muito forte com esta cidade. Obras: "Essência de uma Alma" e "Marca das Palavras".

ACADEMIA MARANHENSE DE CULTURA JURÍDICA, SOCIAL E POLÍTICA OUTORGA MEDALHA FRAN PAXECO A PROFESSORES DE DIREITO

Por Aquiles Emir

Paulo Velten, Jaqueline da Silva e Alberto Tavares Em solenidade realizada, no auditório da SVT Faculdade, no São Francisco, a Academia Maranhense de Cultura Jurídica, Social e Política – AMCJSP, fez a outorga da Medalha Fran Paxeco e do Diploma de Reconhecimento aos professores Alberto Tavares, Paulo Velten e Jaqueline Demétrio. A Medalha Fran Paxeco e o Diploma de Reconhecimento estão previstos nos dispositivos regimentais da Academia – em seus artigos 44 da Seção III, e 46 da Seção IV. A Medalha foi criada com o objetivo de homenagear professores que tenham se destacado na docência jurídica, através de atividades pertinentes às contribuições em favor do desenvolvimento da pessoa humana e do Estado Democrático de Direito. Ela é concedida em reunião solene, de preferência no dia em que se comemora a criação do curso jurídico no Maranhão. Este ano, excepcionalmente, ela está sendo outorgada no Dia da Justiça. Diploma de Reconhecimento – O Diploma destina-se a agraciar personalidades físicas ou jurídicas pelo apoio e colaboração prestada à manutenção e desenvolvimento do Direito em nosso Estado. Os agraciados receberam, assim, concomitantemente, a Medalha Fran Paxeco e o Diploma de Reconhecimento. Fran Paxeco – Manuel Francisco Pacheco (Fran Paxeco), nasceu em Setúbal, a 9 de março de 1874, e faleceu em Lisboa, a 17 de setembro de 1952. Chegou ao Maranhão, em 1900, e aqui se radicou, tendo prestado relevantes serviços no campo intelectual, em que teve papel preponderante ao lado de Antônio Lobo. Jornalista, professor, historiógrafo, geógrafo, orador e diplomata. Foi lente do Liceu Maranhense, professor honoris causa da antiga Faculdade de Direito do Maranhão (que ajudou a fundar), sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Foi cônsul de Portugal no Maranhão e no Pará.

FERNANDO BRAGA

in ‘Conversas Vadias’, antologia de textos de autor. Ilustração: Foto do poeta João Viana Guará e Capa do livro ’Poeira Dourada’.

Quem primeiro me falou do poeta João Viana Guará foi o jornalista e escritor José Erasmo Dias de saudosa memória. Dizia-me ele que Viana Guará era um grande poeta, apesar da sua pouca idade e vivência literária, já que era um homem de negócio nascido fazendeiro. Não sabia Erasmo, de cor, nenhum poema do poeta de “Poeira dourada”, mas não sei por que toda vez que ele falava de Viana Guará associava-o a Edmo Leda, este de Barra do Corda, talvez por ser Edmo também um grande poeta e pela contemporaneidade de ambos, a fazer, a est’outro, os elogios merecidos. Raimundo Guará, irmão do poeta, meu tio por afinidade, pois era casado com uma prima carnal de minha mãe; a ele devotava eu muita ternura e querer bem. Um belo dia presenteou-me o livro de Viana Guará “Poeira Dourada”, com belíssima dedicatória; este livro foi editado como homenagem de família em 1986, pelo Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Maranhão – SIOGE, cujas orelhas levam a assinatura de Marlene Guará, sobrinha do poeta. O meu querido amigo Antônio de Oliveira, comparte do poeta, sendo um pouco mais velho que este, diz na apresentação do livro, num laivo de romantismo camiliano, já que era estudioso do genial criador de ‘Amor de Perdição’, que conheceu “Viana Guará na Praça João Lisboa, em São Luís, na década de 30, “quando batia a viração macia do vento, vinda da Ponta da Areia e da Bahia de São Marcos, canalizadas pelas ruas do Egito e de Nazaré, a suavizar a canícula das claras tardes de verão e a refrescar as sedutoras noites estreladas”. Viana Guará morreu aos vinte e quatro anos de idade, na mesma faixa em que morreram os poetas da chamada terceira geração estoica de românticos, como Castro Alves, Fagundes Varela, Casemiro de Abreu e Álvares de Azevedo. Não digo que não seria o romantismo a sua bandeira de sentimentos, o seu marco poemático, caminhos que não arredaram o poeta por um instante dos meandros modernistas, escola já instalada e de muita pujança no Brasil, onde surgira em 22, a qual se atravessou pelo meio existencial do poeta, alcançando-o em plena juventude. O que mais me impressiona, no entanto, em Viana Guará, é o seu senso épico, estética que lhe penetra o espírito nas mais variadas formas em que escreveu, do soneto à prosa. Sintamo-lo neste canto dedicada à sua cidade de Grajaú: Estradas abertas nos desvãos sombrios”. Entre coivaras, tucurus e caçapavas, Acordando às manhãs Com o matraquear das tropas E o estalejar das taças, Visando, nas quebradas dos lubungos, A grinalda cinzenta de poeira,

O rastejador constante dos tropeiros - Eis minha terra!” O poeta confessou ao seu amigo Antônio de Oliveira que gostaria de formar-se em Recife, na famosa Faculdade de Direito de Pernambuco para sorver os ensinamentos deixados por Tobias Barreto e que ainda, como hoje, impregnam todo o ambiente daquela velha escola jurídica, e depois voltar formado para Grajaú por onde deveria começar sua profissão como advogado ou simples promotor, caso preferisse o Ministério Público. De volta a São Luís, talvez fizesse concurso para uma Cadeira na velha Faculdade da Rua do Sol. Gostaria também de ganhar algum dinheiro para ressarcir um pouco seus pais e seus irmãos pelo sacrifício que tinham feito e que ainda iriam fazer” A família Guará possuiu em Grajaú quatro fazendas assim caracterizadas por Raimundo Guará, no belo conto ‘Fazenda São João’, cuja descrição se faz necessária, para que, no texto aqui reproduzido compreendamos a intenção de sua colocação:” Fazenda ‘Vargem Bonita’: linda propriedade, enfeitada pela sua estrutura geofísica, de matas, vargens e carrascos e reconhecida como berço das onças pintadas; ‘ Fazenda Olhos D’água’ Era um recanto de agregados felizes e alegres que preenchiam as horas de lazer com contagiantes noitadas de amborés de mina; ‘Fazenda Deserto’: Era a fazenda mais antiga e que congregava um número muito grande de agregados, sendo, talvez por isso, um ninho de fuxicos; ‘Fazenda São João’: “Essa fazenda foi focalizada no ‘ fecho da quadra’ por ter sido pivô desse conto, contribuindo para promover a descrição verdadeira que deu motivo a essa curiosa ocorrência” [sic]. E continua Raimundo Guará a nos narrar, em seu belo conto, o brejeiro acontecimento ocorrido em um dia festivo de ‘ferra de gado’ e aqui como muita propriedade registrado: ”[...] Foi precisamente entre a casa da farinhada e o riacho que a filha do vaqueiro, de nome Piedade, foi flagrada em colóquios amorosos com o jovem Sebastião, por um dos empregados da fazenda conhecido por ‘Uruçu’, o qual, na mesma hora, comunicou com veemente indignação ao patrão o que havia presenciado. ‘Uruçu’, ainda sob o impacto da surpresa, dirigiu-se ainda a mim e disse: ‘Raimundo! É preciso acabar com essa pouca vergonha que não é de hoje que vem acontecendo por aqui, pois não é que encontrei agora mesmo a Piedade de sai alevantada e o Sebastião por riba! Eu, naquele momento, encontrava-me na fazenda São João, prestando ao meu saudoso irmão João Viana Guará, já muito doente, a minha colaboração fraterna e amiga no acompanhamento do processo da ferra do gado...” “Naquele instante, eu e o mano João encontrava-nos recostados na porteira do curral pelo lado de fora, um ao lado do outro, acompanhando com toda atenção e cuidado o segmento dos trabalhos da empolgante ‘ferra’, quando, ainda sob o impacto da surpresa provocada pela revelação do ‘Uruçu’, vira-se João sem ares de revolta e diz para mim: “Raimundo! Vargem Bonita pra onça, / Olhos d’água pra folia, / Deserto pra fuxico/ e São João pra putaria’. “O nível do impressionante e rápido improviso surpreendeu-me pela sua velocidade e essência, lançado de chofre pelo meu inesquecível e infortunado irmão, não apenas pela beleza e genialidade da rima à queimaroupa, como se diz na gíria, mas, sobretudo, pelo incrível fato de a tê-la encaixado em brilhante síntese...” [sic]. João Viana Guará nasceu em Grajaú, bela cidade do sertão maranhense, em 6 de outubro de 1916. Aproveito aqui o gancho deixado por Antônio de Oliveira, já considerado seu biógrafo, para viajar com ele nas asas daquele tempo: “Passaram-se alguns anos. Já no Rio de Janeiro, em 1940, soube casualmente de sua morte, por uma breve notícia de um jornal de São Luís. Finou-se como o genial poeta do ‘Guesa’ (Sousândrade), num 21 de abril, consagrado a Tiradentes. Simples como todo homem que carrega consigo a bagagem de muita sensibilidade e de uma cultura feita em contraponto com a honradez do seu caráter, Viana Guará se despediu da vida em sua Fazenda São João, em Grajaú, onde escreveu, por derradeiro este ‘Meu Testamento’: “Não tenho herança a vos deixar, meus irmãos, / trago os bolsos vazios, sem dinheiro. / (...), no entanto, ó meus irmãos, se desejardes / algo de humilde que não tenha alardes, / Buscai um dia os meus papéis dispersos.../ Encontrareis de certo uns velhos trapos/ E entre as traças vereis, / desses farrapos. / A poeira dourada de meus versos...”

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