GEOGRAFIA DO CRIME E ARQUITETURA DO MEDO

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Copyright © Pablo Silva Lira, 2014 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida por meio impresso ou eletrônico, sem a autorização prévia por escrito da Editora/Autor(es). GEOGRAFIA DO CRIME E ARQUITETURA DO MEDO ditor : João Baptista Uma Análise DialéticaEda Criminalidade ViolentaPinto e das Instâncias Urbanas

Capa: Luiz Guimarães

Capa e diagramação: Oficina de Letras Ltda. Impressão: GSA Gráfica e Editora Realização: Prefeitura Municipal de Vitória Lei Rubem Braga Apoio: Vale e Andesa Revisão: Pablo Silva Lira 1ª edição: setembro de 2014 C Pablo Silva Lira CIP- BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ L745g

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Lira, Pablo Silva Amanda Luiza[recurso de Souza Mattioli: –uma CRB 6 – 809/ES Geografia doBibliotecária crime e arquitetura do medo eletrônico] análise dialética da criminalidade violenta e das instâncias urbanas / Pablo Silva Lira. - 2. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital : Observatório das Metrópoles, 2017. L768g LIRA, Pablo Silva. recurso digital ; 43465 MB

Geografia do crime e arquitetura do medo: uma análise dialética da criminali

Formato: epdf dade violenta e das instâncias urbanas / Pablo Silva Lira ; ilustração, Oficina Requisitos do sistema: adobe acrobat reader Ltda.wide web Modo de Editora acesso: world Inclui bibliografia ISBN: 978-85-7785-533-9 (recurso Vitória, ES : Gráfica e eletrônico) Editora GSA, 2014. -

1. Criminologia - Brasil. 2. Crime - Aspectos sociais. 3. Violência - Brasil. 4. Crime e criminosos - Brasil. 5. Ciências sociais. 186 p.6.; Livros 21 cmeletrônicos. I. Título. 17-41981

ISBN: 978-85-8173-098-1

CDD: 364 CDU: 343.9

1. Criminalidade. 2. Criminologia – Aspectos sociais. 3. Medo. I. Título.

Observatório das Metrópoles - IPPUR/UFRJ

CDU: 343.97

Coordenação Geral: Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro Av. Pedro Calmon, 550, sala 537, 5ª andar – Ilha do Fundão Cep 21.941-901 – Rio de Janeiro, RJ Tel/Fax 55-21-3938-1950 www.observatoriodasmetropoles.net Letra Capital Editora Telefax: (21) 3553-2236/2215-3781 letracapital@letracapital.com.br


PABLO SILVA LIRA

GEOGRAFIA DO CRIME E ARQUITETURA DO MEDO Uma Análise Dialética da Criminalidade Violenta e das Instâncias Urbanas

2ª E dição


Conselho Editorial Coleção Metrópoles Dr. Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro – IPPUR/UFRJ Presidente do Conselho Dra. Ana Lúcia Rodrigues – PPGCS/UEM Dra. Andrea C. Catenazzi – UNGS/Argentina Dr. Aristides Moysés – PUC Goiás Dr. Carlos de Mattos – IEU/PUC Chile Dr. Carlos Nassi – COPPE/UFRJ Dr. Emilio Pradilla Cobos – UAM (Universidade Autonoma Metropolitana), México Dr. Eustógio Wanderley C. Dantas – PPGG/UFC Dr. Frederico Rosa Borges de Holanda – FAU/UNB Dr. Jeroen Johannes Klink – UFABC Dra. Inaiá Maria Moreira de Carvalho – PPGCS/UFBA Dr. José Borzacchiello da Silva – PPGDMA/UFC Dra. Lúcia Bógus – PPGCS/PUC Minas Dra. Luciana Teixeira Andrade – PPGCS/PUC Minas Dra. Marcia da Silva Pereira Leite – IFCS/UERJ Dr. Marcio da Costa – FE/UFRJ Dr. Manuel Villaverde Cabral – Universidade de Lisboa Dra. Maria do Livramento Miranda Clementino – NAPP/UFRN Dra. Maria Madalena Franco Garcia – FNEM (Fórum Nacional de Entidades Metropolitanas) Dra. Maura Pardini Bicudo Véras – PPGCS/PUC São Paulo Dra. Olga Firkowski – Dept. Geografia/UFPR Dr. Orlando Santos Junior – IPPUR/UFRJ Dr. Peter Spink – EAESP/Mackenzie/SP Dr. Roberto Kant de Lima– INCT-InEAC/UFF Dr. Roberto Luís M. Monte-Mór – CEDEPLAR/UFMG Dr. Ruben George Oliven – PPGAS/UFRGS Dr. Ricardo Machado Ruiz – CEDEPLAR/UFMG Dra. Raquel Rolnik – FAU/USP Dra. Rosa Moura – IPARDES/PR Dra. Rosetta Mammarella – FEE/RS Dra. Simaia do Socorro Sales da Mercês – NAEA/UFPA Dra. Suzana Pasternak – FAU/USP


Ao Professor Dr. Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro pela ampla produção de conhecimento de excelência sobre a metropolização, urbanização e temas correlatos. Aos amigos e amigas do INCT Observatório das Metrópoles, do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), da Universidade Vila Velha (UVV) e da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).


Se uma imagem vale mais do que mil palavras, um mapa vale mais do mil imagens (Professor Pablo Lira).


Sumário Prefácio.................................................................................................8 Apresentação......................................................................................10 Introdução...........................................................................................12 Direito à Cidade e Direito à Segurança Pública no Brasil: avanços e desafios na perspectiva da Segurança Cidadã.............15 Capítulo 1. Organizando as ideias....................................................23 Um fenômeno complexo e multifacetado................................26 Multiplicidades: violência e espaço urbano.............................26 Perspectivas teóricas..............................................................28 Capítulo 2. Considerações metodológicas......................................33 Capítulo 3. Problemas críticos enfrentados pelas cidades: epidemias e violência........................................................................41 Historicidade da violência........................................................42 Epidemias e insalubridade urbana: da chegada da corte portuguesa aos novos arrabaldes.............................53 Violência: uma endemia comtemporânea?.............................57 Capítulo 4. Instâncias urbanas e violências....................................63 Conceitos e teorias..................................................................63 Estruturas e processos............................................................65 Formas e funções..................................................................126 Considerações finais.......................................................................165 Referências.......................................................................................170 Posfácio............................................................................................182

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Prefácio

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este livro, Pablo Lira permite aos leitores, conhecer o resultado de reflexões despertadas em sua graduação em Geografia e amadurecidas durante seu mestrado em Arquitetura e Urbanismo, ambos realizados na Universidade Federal do Espírito Santo. O mérito deste despertar deve-se, sem dúvida, à árdua pesquisa da qual participou o autor, culminando no Atlas da Violência na Grande Vitória, Espírito Santo, sob a coordenação do Professor Cláudio Luiz Zanotelli, a quem se deve remeter a orientação do suporte teórico indispensável ao avançar dos estudos sobre a violência desenvolvidos por Pablo. A continuidade desses estudos deve-se ao interesse científico aguçado do autor e ao intuito de investigar em que medida a urbanidade, ou sua ausência, interfere na manifestação da violência. Contribuem também para este interesse, os elevados índices de violência no Espírito Santo e na região de Vitória, contexto urbano intrínseco à vivência cotidiana do autor. O livro, em sua introdução, apresenta a violência como um fenômeno multifacetado, demonstrando, a partir de referências teóricas, sua possível relação com o espaço urbano, deixando clara a abordagem desenvolvida ao longo da publicação. Tratando-se de conteúdo científico, a metodologia é exposta de modo a apontar que aspectos da violência foram considerados, de que forma foram pesquisados e que técnicas foram responsáveis pelo mapeamento e registros gráficos, com valorização da técnica de geoprocessamento. A violência e a cidade são tratadas historicamente no livro, com o intuito de debater a longevidade de ambas, mas também de apresentá-las como irradiadoras de suas potencialidades. As dificuldades de combate às epidemias e à insalubridade das cidades na passagem do século XIX para o XX são trazidas como reflexão às questões enfrentadas na contemporaneidade com relação ao combate à violência urbana. Conceitos e teorias são retomados para interpretar as estruturas e processos referentes à violência no Espírito Santo, mas especialmente em sua capital, Vitória, diante da infraestrutura urbana. A localização de ocorrência de crimes violentos é confrontada com dados demográficos envolvendo rendimentos, escolaridade e localização de equipamentos e serviços. O livro, ao reproduzir o resultado dos estudos de mestrado em Arquitetura e Urbanismo de Pablo Lira, apresenta-se como um alerta a técnicos, autoridades e estudiosos do tema, ao demonstrar que a ausência de oportunidades características do modo de vida urbano se superpõe, em Vitória, às regiões de elevado índice de violência. 8


A grata satisfação de ter orientado este trabalho, se renova neste prefácio. Eneida Maria Souza Mendonça Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo - USP; Professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e dos Mestrados de Arquitetura e Urbanismo e Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo - UFES

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Apresentação

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ste livro, de Pablo Silva Lira, insere-se num renovado esforço de conformação de um campo de pesquisa que recoloca o urbano e a violência tanto como unidades de análises quanto como recurso analítico capaz de enfrentar a multiplicidade do social e a inesgotabilidade do real, oferecendo uma possibilidade para a compreensão mais ampla de questões centrais da sociedade brasileira. Aspectos espaciais, geográficos, demográficos e socioeconômicos da violência são, assim, articulados ao urbano e disso deriva uma questão central para o livro, qual seja, a de que tais fenômenos devem ser observados para além de uma simples relação causa e efeito, considerando-os de modo multidimensional e mutifacetado. A violência não é assumida apenas como um conceito teórico das Ciências Sociais e Humanas, mas é apropriada como evidência empírica de uma série de dilemas da organização do espaço urbano e da administração de conflitos sociais; como elemento-chave para se compreender as respostas públicas frente ao crime, à desigualdade e à garantia e manutenção da paz e de direitos. E é em torno de uma agenda alternativa às profundas ineficiências e inequidades geradas pelo sistema de segurança pública e justiça do Brasil que Pablo Silva Lira vai, a partir de dados sobre a cidade de Vitória, refletir sobre os rumos e sentidos das políticas públicas da área. Ou seja, o Estado foi tomado como um ator fundamental na organização do espaço urbano e, portanto, o livro busca medir a influência das ações públicas, na ideia de dar significado aos dados e, sobretudo, na proposta de identificar os sentidos da política. Trata-se, por certo, de uma abordagem em muito influenciada pela sociologia norteamericana e pela geografia, pelas quais os estudos pioneiros da Escola de Chicago são atualizados e seus temas ganham nova centralidade. Mas o grande mérito de Pablo Silva Lira é o de assumir, explicitamente, a perspectiva relacional na análise e compreensão das questões levantadas ao longo do livro. Há, nesse movimento, uma procura constante por variáveis intervenientes na relação entre violência e espaço urbano, mas há, em especial, o reconhecimento de diferenças que marcam e estratificam profundamente a nossa sociedade. Dito tudo isso, creio que o livro tem o potencial de ser uma das obras de referência para os estudos urbanos e possui o mérito de se constituir em um balanço de quase todas as principais e atuais questões postas ao debate sobre violência e espaço urbano no Brasil. O texto faz uma ponte importante com os estudos sobre metrópoles e pobreza e os complementa com uma 10


elegante análise da violência, muitas vezes tida como um campo autônomo de estudos. Renato Sérgio de Lima Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo - USP; Pesquisador da Fundação SEADE/SP e da Fundação Getúlio Vargas - FGV/SP e Membro Representante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública - FBSP

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Introdução

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ceitei com muito prazer o convite para escrever a introdução deste livro de Pablo Silva Lira. Livro originado em sua dissertação de mestrado defendida em 2009 no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Espírito Santo. Pablo Lira iniciou as pesquisas sobre violência e criminalidade comigo no início dos anos 2000, à época ele era estudante do curso de Geografia e desde então estabelecemos mais que uma colaboração acadêmica, uma relação de amizade. Jovem ele já revelava o interesse pela pesquisa, bem como a seriedade, abertura de espírito e inteligência que são suas marcas. Pablo, mais que merecidamente, foi premiado com o melhor trabalho de Iniciação Científica da Ufes na área de Ciências Humanas dentro do quadro de nossa pesquisa sobre violência e criminalidade e segregações socioespaciais. Da mesa forma, participou do Atelier Internacional de Urbanismo realizado na região parisiense na França, com meu apoio, tendo se destacado no grupo que realizou propostas de planejamento à época relativas à uma área da região parisiense. Hoje, Pablo é um profissional plenamente realizado e continua a ser um pesquisador curioso e com interesse em diferentes setores. Em nossa colaboração acadêmica publicamos diversos artigos, e, também, conjuntamente com outros autores, um livro, o Atlas da Criminalidade no Espírito Santo publicado pela Annablume em 2011. Penso que este livro se inscreve no direto fio de inspirações das pesquisas que então eu coordenava e nas quais Pablo Lira colaborou. Mas, o livro tem uma perspectiva e uma autonomia próprias que a mim nada devem, fruto do labor e da diligência do autor, bem como de sua autonomia de pensamento, característica fundamental em quem pretende realizar pesquisas e escrever. No início dos anos 2000 lancei um programa de pesquisas que pretendia estudar as múltiplas faces da violência, do crime, dos delitos e de seus rebatimentos sociais e espaciais. Para isso com uma equipe de estudantes e com a colaboração de outros colegas da Ufes começamos a realizar levantamento de dados, organização das informações relativas à temática. Como toda pesquisa, necessitávamos de ter uma noção do conjunto dos dados, das informações e de organizá-las, mapeá-las e por fim cruzá-las com as informações socioeconômicas. Essa pesquisa se desdobrou em vários artigos e finalmente no Atlas da Criminalidade citado anteriormente. O objetivo era entender a distribuição no território da Região da Grande Vitória e do Espírito Santo dos diferentes crimes e delitos, mas inscrevendo-os na perspectiva da segregação e autosegregações espaciais. 15 12


Assim, não queria construir e não queríamos construir um retrato da violência da criminalidade que contaminasse a percepção social sobre os mesmos associando-o às determinadas populações e/ou bairros, mas, antes, explicitar as injustiças socioespaciais flagrantes que faziam e fazem com que os crimes mais violentos, em particular os homicídios, atinjam os destituídos de capital econômico, cultural e social e, em particular os jovens e negros habitantes nas periferias. Nossa abordagem é sistêmica, estrutural e, por isso mesmo, tenta explicitar inclusive os limites dos dados que utilizamos; o viés que se impõe de uma pesquisa a partir de dados (dados do SUS, dos jornais, das polícias) estruturados segundo uma prática e uma percepção institucional que não abordam a problemática em toda sua profundidade. Queríamos desnudar as relações de classes sociais, as dominações e violências simbólicas e materiais que submetem os “desfiliados” e, finalmente, em última instância, acaba culpando as vítimas do sistema socioeconômico desigual daquilo que as atinge, as atravessa e arma as mãos daqueles que são agentes de um sistema que os ultrapassa. O livro de Pablo Silva Lira trás uma perspectiva particular e original, que havíamos iniciado conjuntamente, de um estudo mais pormenorizado do município de Vitória. Num primeiro momento mapeando um conjunto de indicadores relativos aos crimes violentos contra a pessoa, crimes contra o patrimônio e um mapa de concentração dos crimes relativos a tráficos de drogas ilícitas, concentração de crimes de armas e munições em Vitória. Em seguida realiza um mapeamento da distribuição da população por faixa etária, da distribuição nos bairros das taxas de analfabetismo, do nível de instrução, da repartição das escolas particulares, renda média das famílias e distribuição de equipamentos e serviços diversos. Demonstrando uma concentração de determinados delitos e crimes em áreas mais destituídas de serviços, equipamentos, com rendas e nível educacionais inferiores à média. Mas, Pablo, também acrescenta a esse quadro uma análise original e fértil da cultura do medo provocada, entre outros, pela mídia, e pela ineficiência na prevenção e punição dos delitos por parte do sistema judiciário e de segurança. Lira demonstra o desdobramento concreto da criminalidade real e do medo produzido socialmente na conformação dos mercados imobiliários, das formas e dos conteúdos das residências gradeadas e no exponencial aumento da segurança privada. Demonstra como que há um “resgate de elementos arquiteturais medievais e/ou prisionais” nos prédios e casas da cidade de Vitória, com torres de vigília, altos muros, cercas elétricas, arames farpados, grades em todos os lugares etc. Desvela o avanço dos espaços privados sobre os espaços públicos e a conformação daquilo que Soja chamou de arquipélago carcerário à propósito de Los Angeles e das segregações socioespaciais. 1316


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