Christianne Bernardo David Zee ORGANIZADORES
Meio ambiente urbano desafios e soluções MEIO AMBIENTE URBANO: DESAFIOS E SOLUÇÕES
Prefácio: Ministro Luiz Fux
Copyright© Christianne Bernardo e David Zee (Organizadores), 2014 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem a autorização prévia por escrito dos autores, poderá ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados.
Editor João Baptista Pinto Revisão Edson Monteiro Projeto Gráfico e capa Rian Narcizo Mariano
http://variety.com/2013/film/global/rio-film-commission-moves-to-city-hall-1200697892/
Ilustrações Scheilla Goes Coutinho
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
M45 Meio ambiente urbano: desafios e soluções / organização Christianne Bernardo , David Zee. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital, 2014. 240 p. : il. ; 23 cm. Inclui bibliografia ISBN 9788577852987 1. Planejamento urbano. 2. Planejamento urbano - Aspectos ambientais. I. Bernardo, Christianne. II. Zee, David. 14-15795 CDD: 711.42 CDU: 711.4
Letra Capital Editora Telefax: (21) 2224-7071 / 2215-3781 letracapital@letracapital.com.br
Christianne Bernardo David Zee Organizadores
MEIO AMBIENTE URBANO: DESAFIOS E SOLUÇÕES
Esta publicação foi possível graças ao apoio da
Agradecimento
A
preocupação dos autores, frente às crescentes interações urbanas com o meio ambiente do entorno, promoveu a reflexão dos temas aqui abordados. Entretanto, de nada valem as ideias se não forem compartilhadas e discutidas visando a iluminar as possíveis soluções. Neste sentido, a Carvalho Hosken S/A, na pessoa de seu presidente, Dr. Carlos Carvalho, que comunga das mesmas preocupações do futuro sustentável da cidade do Rio de Janeiro, tornou possível a presente obra. Os autores reconhecem, reciprocamente, a visão de vanguarda e da responsabilidade socioambiental que o Dr. Carlos Carvalho sempre dedicou a temas e discussões relacionados à expansão urbana com qualidade de vida para o Rio de Janeiro. Registram, assim, por absoluta pertinência, o mais profundo agradecimento pelo privilégio de ter como parceiro desta obra a Carvalho Hosken Engenharia. Rio de Janeiro, 20 de outubro de 2014 Aspásia Camargo Christianne Bernardo David Zee Denise de Mattos Gaudard Eldis Camargo Santos Francisco Carrera Marcus Vinicius Bernardo Maurício Barreira Robert Segal Sandra Campos Beltrão Wanderley Rebello Filho
Prefácio do Ministro Luiz Fux
R
esíduos Sólidos, Saneamento Básico, Mudanças Climáticas, Recursos Hídricos, Gestão Ambiental Urbana, Educação Ambiental, Crimes contra a Fauna, entre outros, são temas que constam deste maravilhoso livro que trata, essencialmente, da proteção de nosso meio ambiente tão agredido e tão degradado, e cujos autores são profissionais absolutamente envolvidos de coração, corpo e alma com o tema, e todos membros da Comissão de Direito Ambiental (Presidente Christianne Bernardo) da OAB/Barra da Tijuca (Presidente Ricardo Menezes). As leis vão e vêm! Hoje temos leis de proteção à fauna e à flora, de combate à poluição de qualquer tipo e origem, de proteção aos recursos hídricos, entre muitas outras. São dezenas as nossas leis e elas são respeitadas no mundo inteiro, mas o respeito é inversamente proporcional ao que logramos realizar em termos de proteção ambiental. Nunca se desmatou tanto, nunca se dizimou tanto a nossa fauna, nunca foram concedidas tantas licenças ambientais, nunca queimamos tanto a nossa floresta amazônica. Tantas leis, e tão pouca justiça ambiental! Por isto, hoje eu tenho a certeza de que precisamos muito menos de leis, e muito mais de justiça. Justiça social e ambiental. Precisamos de muita Educação Ambiental, que é o que um trabalho como este traz para todos nós. “O homem é o que ele faz”. A esta sábia e simples lição do grande escritor e político francês André Malraux podemos, com segurança, acrescentar que o homem é também o que ele diz e o que ele escreve. Então, em primeiro lugar, convido a todos para dirigirem um olhar cuidadoso para os problemas ambientais; e em seguida, para conhecerem esta obra que nos revela os problemas e as soluções ambientais, o que a torna especial e inédita. Os advogados e a sociedade acabam de ganhar, com este livro, um companheiro na luta diária contra a degradação ambiental. 7
Em dias recentes, ouvi de um esclarecido cidadão um desabafo: ele me disse que em nosso País muitas leis são letras mortas, que as eleições são batalhas indecentes, que a liberdade é na verdade uma anarquia, que a vida para milhões de cidadãos tem sido um tormento, e que a proteção ambiental é apenas um discurso que não passa do que soam as vozes e do que redigem em papéis. Advogados, autoridades e cidadãos, vamos lutar em apoio aos autores deste Livro pela proteção efetiva do meio ambiente. A fauna, a flora, e as águas doces e salgadas de nosso planeta pedem socorro. Hoje vemos esgoto a céu aberto em quase todas as praias. As árvores por aqui estão feridas, os pássaros caem e os animais sofrem. Poucos por aqui se preocupam com o meio ambiente, indiferença que é fruto de nossa estupidez com cirrose que corrói esta nossa terra hoje “tão sem perfume, tão sem rosas, tão sem nada”. Agradeço ao meu amigo, o advogado Wanderley Rebello Filho, o convite para prefaciar este trabalho tão importante para toda a sociedade. Ele é o autor do brilhante texto que trata dos Crimes contra a Fauna. O nosso caminho na defesa do meio ambiente está, agora, facilitado com este trabalho que apresenta problemas e soluções. E que este caminho seja então, daqui pra frente, de mais respeito ao meio ambiente e a todos os seres vivos que dele dependem. E que os imaginários “pássaros verdes” que vigiam a natureza desdobrem sobre nós suas asas invisíveis, e que levem para Deus as nossas palavras explicando que este imenso monumento à derrota, que tem sido a nossa espécie humana, também é capaz de trabalhos grandiosos, e de atitudes que podem mudar para melhor este nosso lindo Planeta. O mestre Max Gehringer nos ensinou que “cada um é só um, mas que ainda assim é um. Que um só não pode fazer tudo, mas pode fazer alguma coisa; e que apenas por não poder fazer tudo, não quer dizer que vai se recusar a fazer o pouco que pode; o que cada um faz é apenas uma gota no meio de um oceano; mas sem ela, o oceano seria menor”. Então, mãos à obra, todos juntos! Ministro Luiz Fux Supremo Tribunal Federal
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Introdução
S
eguindo a esteira da globalização do planeta iniciada no século XX, o adensamento urbano se consolida nos primórdios do século XXI. O desenvolvimento acelerado das cidades teve como principal consequência a multiplicação do consumo dos recursos naturais do planeta. A viabilidade do planeta encontra-se cada vez mais ameaçada em função da fome por energia, matéria prima, espaço e água. A produção de resíduos orgânicos e inorgânicos das cidades supera em muito a capacidade natural do planeta em reciclar e prover a demanda de uma população humana que se multiplica sem limites. Em 2012, segundo a ONU, mais da metade da população do planeta já vivia em zonas urbanas. No Brasil, desde 1970 o número de pessoas que moravam nas cidades superava a rural. Segundo o último censo do IBGE (2010), mais de 84% da população brasileira já vive nas cidades. O crescimento vegetativo da população urbana somada com a migração rural para as cidades em busca de melhores condições de vida, empregos, educação e saúde provocou um adensamento urbano redundando no estrangulamento dos ciclos naturais do meio ambiente. A gradual e crescente quebra do equilíbrio dos fluxos de energia e matéria trazem efeitos colaterais nocivos nas áreas urbanas. Tais impactos são crescentes, visíveis e de difícil solução uma vez que são geradas por uma complexa cadeia de relações humanas e naturais que em escalas menores não se percebiam. As megacidades já não suportam tamanha aglomeração humana. Sua qualidade de vida que paradoxalmente a tanta tecnologia e riqueza produzida, já não consegue atender a expectativa de todos. A presente obra pretende, através de uma visão multidisciplinar, trazer experiências e conhecimentos que possam montar o mosaico complexo da realidade das cidades brasileiras. Através do reconhecimento, mesmo que parcial, dos inúmeros desafios existentes na cidade do Rio de Janeiro, procura trazer luz no cenário atual e futuro dos desafios para viabilizar as cidades costeiras do Brasil. 9
Quanto mais abrangente for o conhecimento, tanto maior será a capacidade de entender a relação causa e efeito dos fenômenos urbanos que se sucedem no dia a dia. Com esta plataforma, as soluções formuladas conseguem se apoiar sobre bases mais amplas e realistas, tornando-as simples e objetivas. O princípio das propostas inovadoras é a simplicidade e a objetividade das respostas. A visão multidisciplinar proporcionada através das experiências e conhecimentos adquiridos pela vivência de inúmeros profissionais das mais diversas áreas pode, quem sabe, inspirar o leitor na sua carreira profissional. A questão ambiental urbana transcende e interage com as diversas áreas acadêmicas (ciências humanas, da terra, exatas e biomédicas), fronteiras da natureza (geosfera, atmosfera e hidrosfera) e da cultura humana. Com o intuito de facilitar a percepção dos inúmeros fatores que regem as reações urbanas, este livro está dividido em 4 segmentos distintos cujas temáticas procuram se complementar mutuamente na compreensão de algumas realidades que se apresentam no cotidiano do Rio de Janeiro. Esta cidade protótipo apresenta os problemas de hoje e os desafios do futuro que qualquer cidade brasileira pode vivenciar. A segmentação do livro está dividida pelos seguintes temas: A.Equilíbrio Ambiental B.Serviços Ambientais C.Equipamentos Urbanos D.Gestão e Ordenamento Em função das temáticas, estes segmentos serão compostos por capítulos com assuntos pertinentes e relevantes. Naturalmente que os assuntos não se esgotam nem preenchem a totalidade dos desafios urbanos atuais. Contudo, apresentam indícios dos principais assuntos por onde a viabilidade das cidades do futuro irá passar inexoravelmente. Ter a mente aberta para reconhecer todas as realidades que se apresentam na cidade, seja ela urbana ou natural, não nos torna apenas parte da cidade, e sim, integrado com a cidade como um todo. David Man Wai Zee
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Sumário
Equilíbrio ambiental
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Resíduos sólidos e seus novos valores Christianne Bernardo
35
Água: quanto vale? Eldis Camargo Santos
49
Os direitos dos animais e os crimes contra a fauna: desafios e soluções Wanderley Rebello Filho
Serviços ambientais
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Mudanças climáticas, sustentabilidade e oportunidades para as cidades nos rumos dos mercados globais de carbono Denise de Mattos Gaudard
99
Pagamento por serviços ambientais e proteção da biodiversidade: uma abordagem jurídica Francisco Carrera
Equipamentos urbanos
114
Saneamento básico no estado do Rio de Janeiro: por uma mudança do modelo institucional com vistas à universalização
141
Saneamento: instrumento para a sustentabilidade David Zee
159
A questão da poluição sonora nas cidades à luz do direito ambiental brasileiro Robert Segal
Aspásia Camargo e Maurício Balesdent Barreira
Gestão e ordenamento
183
Meio ambiente artificial: sim, ele existe! Leonardo Ferraro
197
Tributação ambiental: a extrafiscalidade como instrumento de equilíbrio do meio ambiente Marcus Vinicius Bernardo
217
A educação como instrumento de implementação da cidadania ambiental Sandra Campos Beltrão
Equilíbrio ambiental Resíduos sólidos e seus novos valores Christianne Bernardo Água: quanto vale? Eldis Camargo Santos Os direitos dos animais e os crimes contra a fauna: desafios e soluções Wanderley Rebello Filho
Christianne bernardo é Advogada formada pela PUC/RJ, Mestre em Ciência Ambiental pela UFF, e Pós-Graduada em Auditoria e Perícia Ambiental pela UNESA. É Autora de três livros: “Guia Prático de Direito Ambiental”, em coautoria com Wanderley Rebello Filho, de 1998, na 3ª ed.; “Coletânea de Legislação Ambiental Básica Federal”, em coautoria com Carla Favoreto, de 2002, na 2ª edição, ambos pela Lumen Juris; “Unidades de Conservação”, de 2007, pela Letra Capital, sendo atualizado para a 2ª edição. Atualmente é Profª de Direito Ambiental do Curso de Pós-Graduação do IBMEC/ PETROBRAS. Foi Profª de Direito Ambiental pelo Bennett de 1999 a 2013, além de ter Coordenado três Pós-Graduações de Direito Ambiental, duas pela Escola Superior de Advocacia da OAB/ RJ, e uma pelo Bennett. Foi Profª em diversas Pós-graduações no RJ e em outros Estados. Desde janeiro 2013 é Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB Barra da Tijuca. Como Advogada atua administrativa e judicialmente na área ambiental, além de participar da elaboração de EIA’s, e como consultora. Desde 1997 é membro da Comissão de Esporte e Meio Ambiente do COB, e desde 2009 é Secretária da Comissão de Voleibol e Meio Ambiente da CBV. christianne.bernardo@gmail.com
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Resíduos sólidos e seus novos valores Christianne Bernardo
Introdução
O
s resíduos produzidos inicialmente pelos humanos eram basicamente excrementos. Depois, com o desenvolvimento das atividades agrícolas e industriais, começaram a surgir os restos da produção, assim como os próprios objetos, após o seu uso. Contudo, nessa época, os materiais utilizados eram em sua maioria de origem natural, e seu descarte não causava grandes impactos ao meio ambiente. Com o aumento da industrialização e o crescimento populacional os resíduos se multiplicaram, assim como se modificou a origem dos mesmos, causas que os tornaram muito mais danosos ao meio ambiente, afetando diretamente a qualidade de vida da população. A geração de resíduos é influenciada por diversos fatores. O consumo, maior ou menor, a renda e o padrão de vida das pessoas, assim como as características de sexo e idade dos grupos populacionais influenciam diretamente tal geração. Em épocas de recessão econômica a quantidade de resíduos coletados pode diminuir, devido ao aumento da reutilização e diminuição do consumo. Existem estudos que revelam que nos países mais desenvolvidos a geração de resíduos passíveis de reciclagem é maior que nos países mais pobres, e o desperdício é o menor possível. O mais evidente é relativo à quantidade de matéria orgânica encontrada nos resíduos sólidos. Numa comparação entre Brasil e Japão, os resultados médios seriam de 50% e 20%, respectivamente (BIDONE & POVINELLI, 1999). Não resta dúvida de que a problemática que envolve os resíduos sólidos é extremamente complexa, pois esbarra em princípios de educação básica e de educação ambiental. 15
Resíduos sólidos e seus novos valores
Além da falta de educação, há também falta de informação. Os dados oficiais que tratam do assunto se resumem, basicamente, na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) realizada de tempos em tempos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir de questionários e entrevistas com as prefeituras municipais e entidades responsáveis pela prestação de serviços (ARAÚJO & JURAS, 2011). Para melhor ilustrar, segue a planilha referente às pesquisas realizadas em 2000 e 2008 (esta foi a última realizada para este tema), no que se refere à coleta domiciliar. 2000 Número de Municípios com coleta de resíduos domiciliar
Percentual
1814
100%
2978
de 50 a 99%
489
até 50%
Fonte: IBGE (PNSB, 2000 e PNSB, 2008)
Em 2008, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, 5.540 municípios tinham coleta de resíduos domiciliar, o que corresponde a 99,57% do total de municípios. No que se refere à destinação dos resíduos sólidos coletados, a situação é mais delicada, pois os chamados “lixões” ainda predominam nos municípios. 2008 Número de Municípios
Destino dos resíduos
Percentual
2810
“Lixões”
50,75%
1254
Aterros Controlados
22,53%
1540
Aterros Sanitários
27,67%
Fonte: IBGE (PNSB, 2008)
Em 2000, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB), 71,5% dos municípios declararam que destinavam seus resíduos em vazadouros a céu aberto (“lixões”), enquanto somente 17,3% afirmavam dispor de aterro sanitário (IBGE, PNSB, 2000). A Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que “institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 16
Christianne Bernardo
1998; e dá outras providências”, equipara-se aos demais instrumentos legais de apoio à proteção do meio ambiente. A Lei 12.305/2010 sozinha não resolverá um problema tão grave e complexo como o dos resíduos sólidos. Mas, já dá um caminho de como a situação atual pode ser modificada. Um dos instrumentos trazidos pela lei é o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir), que pode suprir a falta ou pouca informação relacionada ao tema, levando ao conhecimento de todos, de forma mais sistemática, a condição atual da gestão dos resíduos sólidos em nosso País. O mais importante aspecto da Lei de Resíduos Sólidos reside na adoção de medidas capazes de mudar os padrões de produção e de consumo, o que, por si só, requer o envolvimento de toda a sociedade, ou seja, do Poder Público, do setor empresarial e dos consumidores. Destaca-se aqui a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto e a logística reversa, temas que serão tratados mais adiante. Antes, é importante que se classifiquem os resíduos sólidos, divididos inicialmente, quanto à sua origem e quanto à periculosidade.
Classificação dos resíduos sólidos De acordo com a Lei nº 12.305/2010, quanto à periculosidade, os resíduos se dividem em: a) resíduos perigosos, que são aqueles que, em razão de suas características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental; e b) resíduos não perigosos, que são aqueles não enquadrados acima (art. 13, inciso II). Quanto à origem, os resíduos são: a) domiciliares, aqueles originários de atividades domésticas em residências urbanas; b) de limpeza urbana, os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana; c) de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, os gerados nessas atividades; d) dos serviços públicos de saneamento básico, os gerados nessas atividades; e) industriais, os gerados nos processos produtivos e instalações industriais; f) de serviços de saúde, os gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente e do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária; g) da construção civil, os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, 17
Resíduos sólidos e seus novos valores
incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis; h) agrossilvopastoris, os gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades; i) de serviços de transportes, os originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira; e j) de mineração, os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios (Art. 13, inciso I). Observa-se da classificação acima que estão excluídos da abrangência desta lei os resíduos radioativos, já que os mesmos estão contemplados na Lei nº 10.308, de 2001.
Definições A Lei nº 12.305/2010 traz em seu texto uma série de definições, e dentre elas algumas foram introduzidas pela primeira vez num texto legal. Dentre os conceitos que merecem destaque estão os acordos setoriais, que são atos de “natureza contratual firmados entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto” (Art. 3º, I). Por se tratar de um pacto entre o poder público e o setor produtivo, terá aplicação imediata e efeito de uma norma entre as partes, podendo até englobar a aplicação da logística reversa. O conceito do ciclo de vida do produto envolve todas as etapas do desenvolvimento do produto, desde a obtenção da matéria prima à disposição final do mesmo. Este conceito tem aplicação direta sobre a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto, gerando conseqüências para todos os envolvidos nas etapas em que o produto é gerado, utilizado e descartado. A Lei 12.305/2010 traz uma diferenciação entre os conceitos de “destinação final ambientalmente adequada” e de “disposição final ambientalmente adequada”. No primeiro caso, os resíduos podem ter outra destinação que não a de ser disposto num aterro sanitário, tais como a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações, ou até mesmo a disposição final. No segundo caso, os resíduos são dispostos em aterros, não sendo, desta forma, transformados em outros produtos. 18
Christianne Bernardo
Quando a lei traz o conceito de “geradores de resíduos sólidos”, pode-se observar que qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, gera resíduos. É neste conceito que está incluído o consumo. Não há dúvida de que quanto mais se consumir, mais resíduos serão produzidos. A questão, contudo, vai além da quantidade, envolvendo também a qualidade, considerando o que está por trás daquele produto. A situação do consumo é tão preocupante que até mesmo o Ministério do Meio Ambiente, através de sua página na rede mundial de computadores, no setor de responsabilidade sócio-ambiental, define o Consumidor Consciente como sendo “aquele que leva em conta, ao escolher os produtos que compra, o meio ambiente, a saúde humana e animal, as relações justas de trabalho, além de questões como preço e marca”. A Lei nº 12.305/2010 traz ainda a diferenciação entre “gerenciamento dos resíduos sólidos” e “gestão integrada de resíduos sólidos”. No caso do gerenciamento estão incluídas as etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. Neste caso, pode tratar-se de apenas um tipo de resíduo. No que tange à gestão integrada de resíduos, estão inseridos o planejamento e a coordenação de todas as etapas insertas no gerenciamento e, também, a inter-relação das dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social envolvidas. Neste caso, trabalha-se com todos os tipos de resíduos sólidos ao mesmo tempo (ARAÚJO & JURAS, 2011). Por último, cumpre destacar a Logística Reversa, que é um dos principais conceitos introduzidos pela lei, e que tem como base a responsabilidade pós-consumo do setor produtivo. De acordo com a lei, resumidamente, o produto deve ser coletado e restituído ao setor empresarial, para reaproveitamento em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou ainda outra destinação final ambientalmente adequada. De acordo com o quadro a seguir, é possível dimensionar a matéria prima como sendo secundária, voltando ao ciclo de vida do produto. Com isso objetiva-se aumentar o uso da matéria prima secundária, reduzindo-se o emprego dos recursos naturais.
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Resíduos sólidos e seus novos valores
Fonte: alefilizzola.wordpress.com
Em 17 de fevereiro de 2011, o Governo Federal instalou o Comitê Orientador para Implementação de Sistemas de Logística Reversa. O Comitê é formado pelos Ministérios do Meio Ambiente, da Saúde, da Fazenda, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e tem por finalidade definir as regras para devolução dos resíduos (aquilo que tem valor econômico e pode ser reciclado ou reutilizado) à indústria, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos. (http://www.mma.gov. br/cidades-sustentaveis/residuos-solidos/logistica-reversa) O Comitê criou um Grupo Técnico de Assessoramento (GTA) para lhe assessorar na instrução das matérias a ele submetidas. O GTA, por sua vez, criou cinco Grupos Técnicos Temáticos que discutem a Logística Reversa para cinco cadeias. As cinco cadeias, identificadas inicialmente como prioritárias, são: descarte de medicamentos; embalagens em geral; embalagens de óleos lubrificantes e seus resíduos; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista, e eletroeletrônicos. A finalidade destes grupos é elaborar propostas de modelagem da Logística Reversa e subsídios para o edital de chamamento para o Acordo Setorial.
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Christianne Bernardo
Princípio da ecoeficiência A Lei nº 12.305/2010 apresenta onze princípios e 15 objetivos, mas destaca-se aqui apenas o princípio da ecoeficiência, previsto no inciso V do artigo 6º da lei. A ecoeficiência é o princípio mediante o qual se compatibiliza o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e reduções do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a níveis, no mínimo, equivalentes à capacidade de sustentação estimada do planeta. O conceito de Ecoeficiência, definido pelo World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), está relacionado ao fornecimento de bens ou serviços que satisfazem às necessidades humanas, trazendo melhor qualidade de vida, reduzindo os impactos ambientais e o uso de recursos naturais, considerando o ciclo de vida dos produtos, sua produção e a capacidade do planeta de suportar tal demanda (WBCSD, 2000) (SISINNO et alii, 2011). Pelo conceito exposto, a empresa ecoeficiente é aquela que utiliza menos recursos naturais, reduz o consumo de energia e minimiza os impactos ambientais sem perder o foco no negócio, buscando o crescimento e a rentabilidade permanentes (SISINNO et alii, 2011). Este princípio, que se pode enquadrar como “ideal”, acaba por englobar vários outros princípios previstos na Lei nº 12.305/2010, motivo pelo qual foi aqui destacado.
Instrumentos A Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos traz em seu artigo 8º os dezenove instrumentos que têm como finalidade viabilizar os objetivos e os princípios elencados no texto legal. Dentre os instrumentos estão os planos de resíduos sólidos, direcionados à gestão integrada e ao gerenciamento dos resíduos sólidos, a educação ambiental e o incentivo à adoção de consórcios de cooperação entre os entes federados, objetivando a elevação das escalas de aproveitamento e a redução dos custos envolvidos. Para muitos municípios, a única forma de viabilizar a gestão e o gerenciamento de seus resíduos é através de consórcios, pois o custo não poderia ser suportado somente pela gestão municipal.
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Resíduos sólidos e seus novos valores
Em maio de 2013 foi criado um Consórcio Público de Gestão de Resíduos Sólidos reunindo os municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Belford Roxo, São João de Meriti, Mesquita e Nilópolis. Ao organismo, de caráter autárquico municipal competirá a gestão dos resíduos sólidos, inicialmente com ênfase em restos da construção civil e volumosos. Entre as atribuições do consórcio, que terá recursos de R$ 28 milhões do Fundo de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (Fecam), está a operação das 113 instalações previstas pelo Programa Entulho Limpo, da SEA/Inea, em parceria com os seis municípios. Serão criadas ainda seis Áreas de Triagem e Transbordo para suporte às ações corretivas e obras públicas e mais uma rede de 107 ecopontos para entrega voluntária de materiais de coleta seletiva e resíduos de madeira e podas e concreto e alvenaria (http://www.rj.gov.br/web/sea).
Planos de resíduos sólidos Como mencionado acima, os Planos de Resíduos Sólidos são instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Mas a lei os subdivide em seis planos: 1) Plano Nacional de Resíduos Sólidos; 2) Planos Estaduais de Resíduos Sólidos; 3) Planos Microrregionais de Resíduos Sólidos e os Planos de Resíduos Sólidos de Regiões Metropolitanas ou Aglomerações Urbanas; 4) Planos Intermunicipais de Resíduos Sólidos; 5) Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos; e 6) Planos de Gerenciamento de Resíduos Sólidos. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos tem como órgão coordenador o Ministério do Meio Ambiente, com vigência por prazo indeterminado e horizonte de 20 (vinte) anos, com atualizações a cada 4 (quatro) anos. O conteúdo mínimo do Plano Nacional está determinado no artigo 15 da Lei nº 12.305/2010, contemplando: “I - diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos; II - proposição de cenários, incluindo tendências internacionais e macroeconômicas; III - metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada; IV - metas para o aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades de disposição final de resíduos sólidos; V - metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; VI - programas, projetos e ações para o 22