Miolo vertebrados e plantas fosseis1 21

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Fósseis de Vertebrados e Plantas do Período dos Dinossauros da Região do Triângulo Mineiro



Carlos Roberto A. Candeiro & Leonardo S. Avilla Organizadores

Fósseis de Vertebrados e Plantas do Período dos Dinossauros da Região do Triângulo Mineiro



Fósseis de Vertebrados e Plantas do Período dos Dinossauros da Região do Triângulo Mineiro Organizadores Carlos Roberto A. Candeiro (Campus Pontal/UFU) Leonardo S. Ávilla (Unirio)

Colaboradores Annie Schmaltz Hsiou Caio César Rangel Camila Tavares Pereira Daniel Perea Diego Sullivan de Jesus Alves Edivane Cardoso Emerson Ferreira de Oliveira Emerson Jhammes Francisco Alves Etiene Fabbrin Pires Federico A. Gianechini Felipe Chinaglia Montefeltro Fellipe Muniz Fernanda Luisa Ramalho Filipi Silva Limonta Janaina Zito Losada Lara Cristina Alves de Souza Lílian Paglarelli Bergqvist Luiz Antônio de Oliveira Luiz Henrique Almeida Castilho Matías Soto Max Cardoso Langer Mirley Cristiane Mendes Alves Pablo A. Gallina Paulo Marques Machado Brito Pedro Seyferth R. Romano Roberto Barboza Castanho Rodrigo Miloni Santucci Sebastián Apesteguía Yuri Modesto Alves


Copyright © Carlos Roberto A. Candeiro & Leonardo S. (Orgs.), 2015 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei nº 9.610, de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados, sem a autorização prévia e expressa do autor.

Editor João Baptista Pinto Capa Letícia Parreira Oliveira Ilustração: Andrea Cau/Bolonha-Itália “Um abelisaurideo do Neocretáceo do Triângulo Mineiro atacando Maxakalisaurus topai”

Projeto Gráfico e Editoração Luiz Guimarães Revisão Adelino Adilson de Carvalho

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

F855 Fósseis de vertebrados e plantas do período dos dinossauros da Região do Triângulo Mineiro / organização Carlos Roberto A. Candeiro , Leonardo S. Avilla. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital, 2015. 246 p. : il. ; 15,5x23 cm. Inclui bibliografia ISBN 978-85-7785-258-1 1. Exposição Dinossauros e Fósseis do Triangulo Mineiro. 2. Dinossauro - Triângulo Mineiro (MG : Mesorregião) - Exposições. 3. Fósseis - Triângulo Mineiro (MG : Mesorregião) - Exposições. 4. Paleontologia - Triângulo Mineiro (MG : Mesorregião) - Exposições. 5. Minas Gerais - Antiguidades - Exposições. I. Candeiro, Carlos Roberto A. II. Avilla, Leonardo S. 15-19539 27/01/2015

CDD: 567.910981512 CDU: 568.1(815.12) 27/01/2015

Letra Capital Editora Telefax: (21) 3553-2236/2215-3781 letracapital@letracapital.com.br


Conselho Editorial Dr. Adriano de la Fuente Museo de Historia Natural de San Rafael Dr. Alberto Cione Universidad Nacional de la Plata

Dr. Andréa Cau Universita de Bologna

Dr. Ariovaldo Antônio Giaretta Universidade Federal de Uberlândia

Dr. Átila Agusto Stock Universidade Federal de Santa Maria

Dr. Fernando Mayer Pelicice Universidade Federal do Tocantins

Dr. Fresia Soledad Ricardi-Branco Universidade Estadual de Campinas

Dr. Leonardo Salgado Universidad Nacional de Comahue

Dr. Miguel Telles Antunes Academia de Ciências de Lisboa

Dra. Adriana Albino Universidad de Mar del Plata

Dra. Roseane Sarges Ribeiro Universidade Federal de Goiás

Dra. Taissa Rodrigues Marques da Silva Universidade Federal do Espírito Santo



Dedicamos este trabalho de organização deste livro aos nossos pais Adelina A. Candeiro, Jose Luiz Dias Candeiro (R. Candeiro) e Elizabeth S. Avilla e Sergio Avilla (L. Avilla), quem tudo devemos.



Agradecimentos

E

ste livro é resultado de pesquisas paleontológicas e geológicas desenvolvidas na importante região do

Triângulo Mineiro desde o início do Século. Agradecemos, inicialmente, a nossos parceiros pesquisadores sobre os temas de suas especialidades, pela oportunidade de trabalharmos e aprendermos juntos e por suas valiosas contribuições nesta fascinante área das ciências. Além de dominarem conhecimentos que vem desenvolvendo, inúmeras contribuições registradas neste livro demonstram o domínio que os diferentes autores detêm, sobre os seus temas abordados de forma integradora e inovativa de suas áreas de investigações aqui enfocados. A Fundação de Amaparo a Pesquisa de Minas Gerais, que tem sido uma parceira nas concessões de Bolsas de Incicião Científica e outros apoios institucionais ao longo da última década as pesquisas paleontológicas e geológicas no Triângulo Mineiro e também no financimanento desta importante obra aqui organizada. Dirigimos agradecimentos a Diretoria de Pesquisa em nome do Prof. Dr. José Magno Queiroz Luz e ao Prof. Dr. Alcimar Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Gradução da Universidade Federal de Uberlândia que os seus apoios às atividades de pesquisas relacionadas a paleontologia no Cretáceo do Triângulo Mineiro. Ao


Prof. Dr. Amindo Quilicci Neto Diretor da Faculdade de Ciências Integradas do Pontal do Campus Pontal/Ituiutaba/UFU pelo seu apoio constante e animador com as inovações e investigações da nossa paleontologia no Pontal do Triângulo Mineiro. Este agradecimento se estende, também, a todos aos revisores dos presentes capítulos, pesquisadores e entusiastas que de diferentes formas, têm apoiado a paleontologia de nosso estado.


Sumário Prefácio.......................................................................................... 15 Capitulo I....................................................................................... 19

A paleontologia nos discursos da história: as notícias sobre fósseis no sertão das Minas Gerais......................................................................... 19 Janaina Zito Losada Capitulo II...................................................................................... 38 Geologia do Cretáceo Superior...................................... 38 Luiz Antônio de Oliveira Capitulo III.................................................................................... 56 Plantas..................................................................................... 56 Edivane Cardoso, Etiene Fabbrin Pires Capitulo IV.................................................................................... 73 Peixes....................................................................................... 73 Yuri Modesto Alves Lílian Paglarelli Bergqvist Paulo Marques Machado Brito Capitulo V...................................................................................... 95 Anuros..................................................................................... 95 Fellipe Pereira Muniz Carlos Roberto A. Candeiro Capitulo VI.................................................................................. 102 Lepidosauria e Testudines............................................. 102 Pedro Seyferth R. Romano Annie Schmaltz Hsiou


Capitulo VII................................................................................. 120 Crocodyliformes................................................................. 120 Felipe Chinaglia Montefeltro Max Cardoso Langer Capitulo IX.................................................................................. 142 Saurópodes.......................................................................... 142 Rodrigo Miloni Santucci Capítulo X.................................................................................... 160 Terópodes e Aves............................................................... 160 Carlos Roberto A. Candeiro Capítulo XI.................................................................................. 170

Fósseis do Cretáceo na Região do Triângulo Mineiro: Lista Taxonômica............................................ 170 Camila Tavares Pereira, Caio César Rangel, Diego Sullivan de Jesus Alves, Emerson Ferreira de Oliveira, Filipi Silva Limonta, Fernanda Luisa Ramalho, Lara Cristina Alves de Souza, Mirley Cristiane Mendes Alves, Luiz Henrique Almeida Castilho, Emerson Jhammes Francisco Alves Capítulo XII................................................................................. 176

Distribuição dos Fósseis de Plantas e Vertebrados do Triângulo Mineiro............................. 176 Roberto Barboza Castanho Diego Sullivan de Jesus Alves Capitulo XIII............................................................................... 185

Dinosaurios cretácicos del Triángulo Minero (Grupo Baurú, Brasil), el Grupo Paysandú (Uruguay Occidental) y la Cuenca Neuquina (Grupo Neuquén, Argentina)........................................ 185 Sebastián Apesteguía, Pablo A. Gallina, Federico A. Gianechini, Matías Soto, Daniel Perea

Equipe do Grupo de Pesquisas..................................... 242


Prefácio

A

América do Sul é um dos continentes mais importantes no que se refere a descobrimentos de dinossauros. Embora estes registros sejam numericamente inferior aos reportados para América do Norte e Ásia, o que está documentado em nosso continente é de suma importância para compreender os aspectos destacados da evolução dos dinossauros, tais como suas origens no Período no Triássico, a aquisição de tamanhos gigantescos, os efeitos da fragmentação geográfica do Gondwana sobre as comunidades dinossaurianas, e a transição dinossauro-ave. Mais ainda, as rochas mesozoicas da América do Sul deram exemplos muito interessantes da história evolutiva de clados dinossaurianos não registrados em outras partes do mundo. O trabalho realizado em afloramentos mesozoicos sul americanos permitiu ampliar a lista de taxa em mais de 50 espécies de dinossauros, diagnosticados baseando-se em características osteológicas, o que revela que uma complexa história evolutiva ocorreu em nossas terras. O registro fóssil sul americano compreende os períodos Triássico, Jurássico e Cretáceo, que ilustram acerca de destacados capítulos evolutivos desde suas origens e diversificação até à extinção do grupo. Agora sabemos que o território sul americano esteve povoado por dinossauros de diversas afiliações, em companhia de uma ampla diversidade de outros vertebrados, particularmente arcossaurios basais, crocodilomorfos, e sinápsidos (incluindo mamíferos), que documentam adaptações e tendências evolutivas muito diferentes à de seus parentes laurásicos. Enquanto a maior parte do que se conhece desta diversidade de dinossauros e outros tetrápodes são provenientes fundamentalmente da Patagônia argentina, importantes achados estão sendo realizados, nos últimos anos, no Brasil (consistentes em material ósseo, dentes, pegadas e ovos), o que permitiu enriquecer 15


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nosso panorama acerca da radiação adaptativa desta variedade de criaturas gondwânicas. São várias as bacias cretáceas do Brasil onde são encontrados fósseis de dinossauros, tais como Araripe, São Luís, Sousa, Rio do Peixe, mas, sem sombra de dúvidas, é a Bacia Bauru a que possui a maior riqueza em restos fósseis de répteis em geral e dinossauros em particular. As rochas portadoras de fósseis de tetrápodes do Grupo Bauru foram acumuladas durante os últimos 30 milhões de anos do Período Cretáceo, e se estendem amplamente por vários estados do centrosul brasileiro. O “Triângulo Mineiro”, no estado de Minas Gerais, é uma região famosa, pois ali se concentra a maior quantidade de descobertas de restos de dinossauros, crocodilomorfos e tartarugas. As primeiras descrições se remontam à década de 1930, tendo sido estudados por renomados paleontólogos como Frederich von Huene e mais tarde pelo pesquisador brasileiro Lewelling Ivor Price. No entanto, os estudos paleontológicos mais abrangentes e sistemáticos foram realizados nos últimos 15 anos, resultando em um incremento substancial de descobrimentos de fósseis de invertebrados e vertebrados. Isto permite uma melhor compreensão do significado paleobiológico dos fósseis do Grupo Bauru no contexto do que se conhece para o resto do continente sul americano, em especial da Patagônia. Com o propósito de ressaltar a importância científica que possui o “Triângulo Mineiro”, Carlos Roberto A. Candeiro e Leonardo S. Avilla reuniram no presente livro uma série de contribuições que sintetizam o que se conhece até agora acerca da geologia e conteúdos paleontológicos desta famosa região do Brasil. O livro é composto de treze capítulos escritos por diferentes especialistas do Brasil, Uruguai e Argentina. O Capítulo I, a cargo de Janaina Zito Losada, analisa o desenvolvimento histórico das investigações científicas no Triângulo Mineiro. O Capítulo II, escrito por Luiz Antônio de Oliveira, analisa a Bacia Bauru a partir de um ponto de vista geológico, descrevendo, entre outras unidades, as formações Adamantina e Marilia, que são as mais abundantes em restos paleontológicos. No Capítulo III, Edivane 16


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Cardoso e Etiene Fabbrin Pires resumem o que se conhece acerca do conteúdo paleobotânico da Formação Botucatu e Formação Adamantina, restringindo-se à troncos silicificados e restos de algas. Nos capítulos seguintes revisam o registro de vertebrados fósseis da Bacia Bauru, começando pelo panorama acerca dos peixes de água doce (Capítulo IV), a cargo de Yuri Modesto Alves, Lilian Pagliarelli Bergqvist e Paulo Marques Machado Brito, onde destacam a relevância desta evidência para o entendimento da prematura evolução de grupos de peixes neotropicais atuais. No Capítulo V, Felipe Muniz e Carlos Roberto A. Candeiro efetuam uma atualização do conhecimento sobre os anfíbios coletados nas formações Adamantina e Marilia, os quais aportam dados sumamente valiosos para a compreensão da história paleobiogeográfica Cretácea deste espécime. O Capítulo VI, a cargo de Pedro Seyferth Romano e Schmaltz Hsiou, está dedicado ao estudo dos lepidosaurios (lagartos e serpentes), ainda pouco conhecidos, e dos testudinos, ao contrário, abundantemente documentados no Triângulo Mineiro. No Capítulo VII, Felipe Chinaglia Montefeltro e Max Cardoso Langer efetuam uma revisão do grupo de vertebrados com melhor representação no registro fóssil da Bacia Bauru: Os crocodiliformes. Estes répteis são conhecidos por numerosos crânios e esqueletos, muitos deles completos e articulados, os quais constituem, de longe, a fonte mais informativa da evolução dos crocodiliformes do Cretáceo sul americano e por extensão de Gondwana. O Capítulo IX, escrito por Rodrigo Miloni Santucci, analisa o que se conhece sobre os titanossauros, que pertence ao grupo de dinossauros mais frequentemente encontrado no Triângulo Mineiro, e dos quais se dispões não somente de material ósseo como também de ovos. O Capítulo X, desenvolvido por Carlos Roberto A. Candeiro revisa as informações disponíveis sobre a diversidade dos dinossauros terópodes (aves incluídas), destacando formas de relações com o Cretáceo da Argentina. O Capítulo XI (escrito por Camila Tavares Pereira e coautores) e o Capítulo XII (por Roberto Barboza Castanho e Diego Sullivan de Jesus Alves) apresentam, respectivamente, listas taxonômicas que resumem o conteúdo 17


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fossilífero das formações Adamantina, Uberaba e Marília, assim como uma síntese das localidades do Triângulo Mineiro onde foram documentados materiais fósseis. Por último, o Capítulo XIII (escrito por Sebastián Apesteguía e colaboradores) apresenta uma análise integradora dos dinossauros cretáceos descobertos no Grupo Bauru, no Uruguai e na Bacia Neuquina do NW, da Patagônia. Este livro coloca à disposição de estudantes e especialistas uma visão resumida e atualizada do que conhecemos do Triângulo Mineiro, mas fundamentalmente deixa claro que esta imensa região do Brasil possui uma riqueza fossilífera que ainda resta por ser conhecida. Uma riqueza oculta que permitirá reconstruir aspectos inquestionáveis acerca da evolução dos vertebrados. O desafio é, pois, descobri-la. Dr. Fernando E. Novas Museo Argentino de Ciencias Naturales/Buenos Aires/ARG

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Capitulo I

A paleontologia nos discursos da história: as notícias sobre fósseis no sertão das Minas Gerais Janaina Zito Losada

Era um novo éden o território da Farinha Podre... (Antonio Borges Sampaio, 1906)

Introdução Coisas do sertão “Sertão da farinha podre” era o nome dado à região entre os rios Paranaíba e Grande, atual Triângulo Mineiro, cuja mais importante característica era o regime das águas e um calor muito mais causticante que no litoral. Em 1909, Antonio Borges Sampaio, ao fazer uma digressão histórica sobre a região, fala a respeito da pertença da região à província de Goyaz e das histórias daquelas primeiras entradas e bandeiras pelos sertões. Os caminhos que saíam de São Paulo atravessavam o rio das Velhas e a Serra da Canastra e, nas paisagens do sertão/cerrado, chegavam até o Ribeirão da Prata. Liberal e comerciante - “homem industrioso”, como se diria na época, político, intelectual, escritor, cientista e advogado, Sampaio foi uma personalidade de destaque que descreveu a região com um olhar voltado às ideias de progresso e civilização herdadas do século XIX. Consagrado ao desenvolvimento de Uberaba, antevia para a região um futuro brilhante e elogiava o povo que, em seus termos, era laborioso, patriótico, hospitaleiro e beneficente. “Em todo caso, o Triângulo Mineiro vê a Farinha Podre transformada por continuado progresso. Não é mais Sertão.”1 SAMPAIO, Antonio Borges. O Sertão da Farinha Podre. Revista do Arquivo Publico Mineiro, Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas, 1909. p.274. 1

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O Sertão é uma ideia ampla, uma representação que associa vegetação e regime das águas ao desenvolvimento ou à decadência, por isso quase sempre foi associado ao atraso e à rusticidade, como já apontou Ricardo Ferreira Ribeiro, que coloca o sertão como um desafio perene, vazio, periférico e estranho, sinônimo de população esparsa e rarefeita; mas também território desconhecido e de fronteira móvel. A partir de Janaina Amado, o termo sertão é marcado por referências como: desertão, sertanum, desertanum, desertum2. Quando chega o progresso já não é mais Sertão, já não é mais Goiás, é Triângulo. Embora de maneira um pouco tímida, a historiografia tem se voltado ao tema, como comprova o exaustivo trabalho de Ribeiro com os instrumentais da História ambiental, em que ele analisa o bioma do Cerrado desde a sua formação geológica, atravessando a história da presença humana desde a tradição Itaparica, os caçadores e coletores, a tradição Una, a formação das culturas indígenas modernas, a ocupação bandeirante, a escravidão negra e os motins, o espaço da liberdade quilombola, até a chegada do progresso e da ciência no sertão. Ao longo de sua narrativa, ele mapeia os cientistas que tomaram essas terras como seu objeto de observação: entre eles, Whilhelm Ludwig Von Eschwege, que esteve na região entre os anos de 1811 e 1821; Auguste Prouvençal de Saint Hilaire, entre 1816 e 1822; e Alcides Dessalines D´Orbigny3 que, embora sem visitar este Sertão, é o único paleontólogo objetivamente citado, pois caminhou por terras de outros sertões mineiros desconhecidos: o Jequitinhonha, o norte e o noroeste de Minas. Observa-se que aqui há uma dimensão de sertão que o associa aos interiores físicos do Brasil e às tradições rústicas de suas populações. Sobre as possibilidades etimológicas, o autor afirma que o termo sertão, a partir de Janaina Amado, significaria: a. uma corruptela de “desertão”; b. serere, do latim, trançado, entrelaçado; c. desertum, desertor; d. desertamun, o lugar onde vai o desertor.” Apud: RIBEIRO, Ricardo Ferreira. Florestas Anãs do Sertão: o cerrado na História da Minas Gerais. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. P. 55. 2

Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro a partir de 1900, autor do Carvão Nacional no Jornal do Comercio, foi membro da Comissão Geológica do Império do Brasil, diretor da seção de Geologia do Museu Nacional, participou da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo. Ver: DICIONÁRIO bio-bibliográfico de Historiadores, geógrafos e antropólogos brasileiros. Rio de Janeiro: Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 1993. Vol 4. P. 58/59 3

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Sertão e Cerrado aqui não são tomados como sinônimos, mas antes são região, bioma4 e universo cultural; lócus atravessado por marcas geográficas e geológicas, historicizado nos indivíduos e resgatado a partir de suas sensações registradas. Por ora, pretendemos perceber como os discursos sobre o sertão e seus fósseis circularam nas instituições de história ao final do século XIX e início do século XX. Período, este, de profunda transição e, ao mesmo tempo, de continuidade silenciosamente assustadora em que a virada republicana pouco significou nos meios científicos, uma vez que as instituições imperiais continuaram a manter um círculo de intelectuais que pensavam, agiam e, sobretudo, escreviam como se ainda fosse Império. As paisagens eram atravessadas pelo espírito científico em busca de minérios e terras férteis, mas também em busca de fósseis, orquídeas e beija-flores. Ciência, industriosidade e comércio não eram universos tão distantes ou separados, como nos mostra Margareth Lopes (1999), quando, ao comparar a história da paleontologia entre o Brasil e a Argentina, conta a história de Florentino Ameghinno, um cientista diletante, autor de trabalhos significativos para a paleontologia de lá. Este cientista nunca teve cargos em instituições de pesquisa ou ensino, tampouco recebeu apoio financeiro para os seus importantes trabalhos; mas, ainda assim, colaborou intensamente com as instituições científicas. Os primeiros fósseis brasileiros foram encontrados em meados do século XIX por cientistas europeus que ainda não eram paleontólogos diplomados, pois a maioria possuía formação eclética e atuação profissional diversa: naturalistas, bacharéis, médicos, engenheiros e práticos ao mesmo tempo, observadores da natureza que os circundava e, na lógica do gabinete de curiosidades, exerciam a coleta e a catalogação de animais, vegetais e minerais contemporâneos ou não. Outros também eram funcionários imperiais associados a sociedades de ciências, de história, de geografia e mineralogia para onde remetiam seus estudos, frutos de sua formação intelectual na academia europeia e de seu pertencimenJosé Augusto Pádua propõe uma ferramenta conceitual para a educação ambiental e também para a história através do recorte territorial dos seis biomas brasileiros, atentando aos vínculos e as identidades que são forjadas nos específicos ecossistemas. Ver. PADUA, José Augusto. (org.) Desenvolvimento, Justiça e Meio Ambiente. Belo Horizonte: UFMG, 2009. 4

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