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3.1.1. Profissionalização da indústria

A industria do futebol está cada vez mais profissional e a exigir mais profissionalismo a todos os que nela trabalham.

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Valorização do futebol enquanto produto de entretenimento

Cada vez mais, a indústria do futebol tem-se valorizado enquanto produto de entretenimento e não só como produto desportivo.

Esta mudança de paradigma tem vindo a ser impulsionada pela crescente procura por parte das Sociedades Desportivas em iniciativas de criação de valor que levem a um aumento da receita e melhoria da qualidade desportiva, assim como pelo interesse por parte dos adeptos para consumirem experiências diferenciadoras e exclusivas.

Assim, torna-se fulcral o desenvolvimento de experiências e conteúdo adicional no futebol para atrair e reter mais consumidores e fazer face a uma concorrência na indústria do entretenimento cada vez mais global e diversa.

Data analytics no desporto

Com o acentuar da competitividade, os stakeholders da indústria do futebol têm procurado cada vez mais alcançar vantagens competitivas e a utilização de data analytics e de inteligência artificial tem-se revelado soluções muito utilizadas.

A implementação de ferramentas de data analytics é feita particularmente nas áreas de recrutamento, análise de performance e comercial e tem um elevado poder de criação de valor, sobretudo quando associado a inteligência artificial. A inteligência artificial permite, através dos dados recolhidos, o desenvolvimento de modelos de previsão de jogos e de performance de atletas mas também melhorar a experiência do adepto, por exemplo através da personalização de conteúdos.

Assim, nos últimos anos, tem-se assistido, cada vez mais à criação e reforço de equipas de data analytics e inteligência artificial nas Sociedades Desportivas, como é o caso do Manchester City, do FC Midtjylland e do Brentford F.C. Do mesmo modo, para melhorar e tornar mais eficiente o processo de análise de dados, tem-se assistido ao investimento em tecnologias de recolha e processamento de informação sobre os atletas (e.g. wearables, optical tracking, inteligência artificial), como tem feito o Liverpool F.C. e o Arsenal F.C.

No que toca a personalização de conteúdos, é visível já a disponibilização de estatísticas em tempo real, como fez o Bayern Munich com a introdução de ecrãs no estádio com informação adicional e de suporte aos jogos, aumentando o engagement com os adeptos e melhorando a experiência.

Esta abordagem de valorização do futebol enquanto produto de entretenimento auxilia no alcance de novos públicos e diversificação de receitas. Adicionalmente, contribui para a diversificação do risco e aumento da exposição global.

Atualmente, há já diversas Sociedades Desportivas a capitalizar esta tendência através do desenvolvimento de marcas de lifestyle e entretenimento, assim como através do investimento em marketing e digital.

Valor do mercado mundial de sports analytics (mil milhões de dólares, 2021-30)

22,0 representa

Aumento do investimento

A nível nacional e internacional, tem existido não só um aumento no número de investimentos em Sociedades Desportivas, mas também nos montantes investidos, com especial incidência para o investimento de origem norteamericana.

Nas principais ligas europeias, um elevado número de Sociedades Desportivas são já controladas por investidores estrangeiros, sendo este valor de 39% (sete Sociedades Desportivas) na Liga Portugal bwin.

Este aumento poderá acelerar a profissionalização do futebol, ao trazer mais capital e boas práticas, contudo, é crucial que os órgãos competentes realizem um controlo deste investimento, garantindo um alinhamento na criação de valor a longo prazo entre Sociedades Desportivas e investidores, promovendo investimentos sustentáveis no longo prazo.

Novos modelos de negócio

A maior profissionalização da indústria do futebol, muito impactada pelo aumento do investimento estrangeiro, tem levado ao surgimento de novos modelos de negócio, como é o caso do Multi-Club Ownership (MCO).

Este modelo assenta na aquisição de diferentes Sociedades Desportivas por parte de um clube/empresa e a sua proposta de valor reside na criação de sinergias, economias de escala e alocação ótima de recursos.

Este modelo tem evidenciado elevado crescimento, muito baseado no surgimento de grandes grupos (e.g., City Football Group, Red Bull).

Em Portugal tem existido cada vez maior presença destes grupos, como são os exemplos do Casa Pia, SDUQ ou o Estoril Praia, Futebol SAD.

Em 2022, a nível global, existiam 195 Sociedades Desportivas controladas por grupos de MCO, número que tem aumentado em 2023.

Novo modelo de fair-play financeiro

A pandemia representou o catalisador perfeito para uma reforma das regras financeiras impostas às Sociedades Desportivas por parte da UEFA. Apelidadas de Financial Sustainability Regulations, as novas regras entrarão em vigor de forma faseada entre 2022/23 e 2025/26 e baseiam-se em três pilares: estabilidade, solvência e controlo.

O sistema anterior baseava-se em dois parâmetros fundamentais: ausência de dívidas e a regra do break-even Ambos foram reforçados, respetivamente, pelo pilar da solvência, que garantirá maior proteção aos credores das Sociedades Desportivas, através de um controlo trimestral das contas, em vez de semestral e com agravantes para pagamentos com atrasos superiores a 90 dias, e pelo pilar de estabilidade, que manterá a imposição do break-even mas com alterações que pretendem incentivar o investimento através de capital próprio.

O terceiro pilar representa a maior inovação, e limita até 70% o rácio entre os custos totais associados ao plantel e as receitas das Sociedades Desportivas.

Estas regras far-se-ão sentir na operação das Sociedades Desportivas por elas abrangidas que impactarão toda a indústria.

Patrocinadores de novas indústrias

A maior globalização e popularidade do futebol tem vindo a transformar as Sociedades Desportivas e ligas em palcos mediáticos capazes de oferecer enorme visibilidade às marcas patrocinadoras.

Desta forma, tem-se gerado um aumento do interesse das marcas pela indústria, levando a um aumento da procura por espaços publicitários, e consequentemente ao aumento do seu valor. Este aumento, que se tem acentuado nos últimos anos, limita as empresas e setores com capacidade financeira de acesso a este “palco”. Assim, novas indústrias têm ganho relevo enquanto patrocinadoras dos diferentes stakeholders do futebol europeu e nacional, em particular a indústria de apostas desportivas, criptomoedas, NFTs e blockchain.

É expectável que o número de patrocínios por parte de empresas destas indústrias continue a aumentar, dada a fase inicial de maturidade em que se encontram, e que se continuem a estabelecer como uma importante fonte de receita no futuro da indústria.

Pilares do Financial Sustainability Regulations

3.1.2.

Novos formatos competitivos

A transformação, globalização e industrialização do futebol tem culminado num repensar dos formatos competitivos, direcionando o futebol para um panorama transnacional, com as competições internacionais a ganharem particular destaque face às nacionais.

Esta tendência é evidenciada pela alterações das competições europeias - UEFA Champions League, UEFA Europa League e UEFA Conference League – e internacionais - FIFA Club World Cup - que terão novos formatos competitivos a partir de 2024/25, com um maior número de equipas, jogos, e possivelmente com um maior número de receitas.

Esta transformação tem impacto nos stakeholders nacionais, seja diretamente pela disrupção nos calendários competitivos, ou pelos desequilíbrios financeiros causados, aumentando o fosso entre as Sociedades Desportivas que participam ou não nas competições.

Crescente importância do futebol feminino

O futebol feminino tem demonstrado um elevado crescimento tanto a nível internacional como nacional, promovido pelo aumento do número de atletas, de assistências, de prémios de competições (e.g., o aumento de 900% do prize money do mundial feminino entre 2007-23) e de investimento efetuado por órgãos governadores do futebol na modalidade.

Em Portugal, o número de praticantes entre 2015 e 2020 quase duplicou, passando de 5.766 praticantes em 2015 para 11.200 praticantes federadas em 2020. Este desenvolvimento apresenta-se como uma oportunidade para Sociedades Desportivas e ligas diversificarem as suas receitas e expandirem a base de adeptos.

Crescente importância dos eSports

As novas tecnologias têm oferecido novas dimensões ao ecossistema do futebol, com os eSports a assumirem uma posição de destaque. Este mercado tem registado um crescimento relevante em número de espetadores a nível mundial, crescimento esse que foi acelerado pela pandemia da COVID-19.

O crescimento no número de espetadores foi também acompanhado pelo crescimento das receitas, principalmente devido à crescente valorização dos contratos publicitários. Estes fatores têm atraído cada vez mais stakeholders da indústria do futebol, como ligas e Sociedades Desportivas.

A indústria dos eSports, para além deste crescimento no número de espetadores e das receitas associadas afigura-se também como um veículo do aumento do engagement com audiências mais jovens.

Assim, torna-se pertinente definir uma estratégia, capaz de otimizar os eSports enquanto fonte de receitas para as Sociedades Desportivas e porta de entrada de público jovem para a indústria do futebol tradicional.

Audiência

De

Receitas

Publisher Fees

Streaming Merchandise e bilhetes

Adepto mais digital e com spans de atenção mais curtos

Com o avanço tecnológico, os adeptos de futebol agora possuem uma ampla oferta de soluções de entretenimento, o que tem resultado em alterações na forma como o conteúdo desportivo é consumido. Cada vez mais os adeptos utilizam smartphones e apps móveis para consumir informação sobre o clube e jogadores favoritos, bem como para assistir a jogos ao vivo.

No entanto, essa diversificação de opções de entretenimento pode ter um efeito negativo na capacidade de concentração plena dos adeptos, levando a spans de atenção mais curtos. De facto, com múltiplas fontes de informação e entretenimento a competirem pela atenção dos adeptos, pode ser difícil para estes se envolverem profundamente numa só atividade.

Assim, poderá haver implicações na forma como os adeptos assistem a partidas de futebol, especialmente quando estão a utilizar dispositivos móveis para acompanhar os jogos. Em vez de assistir ao jogo completo, muitos adeptos preferem consumir clips curtos e destaques, o que pode diminuir a experiência completa de assistir a um jogo de futebol.

Consumo de novas fontes de informação

O perfil do adepto encontra-se a sofrer grandes alterações, estando as fontes de informação onde este consome conteúdo futebolístico a apresentar novas dinâmicas, especialmente com a entrada de novos players.

Os meios de informação não tradicionais, tal como as redes sociais com conteúdo num formato vertical de curta duração e as plataformas de streaming (e.g., TikTok, Twitch) têm ganho terreno face aos meios de comunicação tradicionais, o que coloca pressão em Sociedades Desportivas, ligas e demais stakeholders da indústria, para privilegiarem a produção de conteúdo compatível com estas novas fontes de informação.

Estas novas dinâmicas de mercado apresentam novas oportunidades de interação personalizada com os adeptos, especialmente de faixas etárias mais jovens, pelo que não devem ser ignoradas pelos vários stakeholders

Jogadores com maior poder de influência

A crescente utilização de redes sociais concedeu aos principais atletas profissionais não só uma grande exposição, mas também uma enorme capacidade de influência sobre a sociedade, em particular sobre os adeptos.

De acordo com os adeptos, os atletas são o meio com a maior capacidade de criação de conexão entre marcas e eles próprios. Os jogadores superam os treinadores, comunidades de adeptos, ligas e até mesmo clubes.

Assim, recorrer a atletas com elevada exposição em diferentes redes sociais e elevado impacto mediático é uma oportunidade para os diferentes stakeholders da indústria do futebol aumentarem o engagement com os adeptos e explorarem a possibilidade de criação de fontes de receita adicionais.

Novo paradigma de broadcasting

O mercado dos direitos audiovisuais de conteúdo desportivo tem sofrido diversas alterações, quer no lado da procura, quer da oferta.

Existiu, no período pré-pandemia, um aumento generalizado dos valores dos direitos audiovisuais, devido a condições concorrenciais favoráveis. Contudo, após a pandemia, verificou-se uma ligeira diminuição na renegociação destes valores nas Top5 ligas europeias.

O mercado tem, no entanto, sido perturbado pela entrada de novos players (e.g., OTTs, big techs), o que tem originado uma certa fragmentação do que poderá vir a contribuir para o aumento do valor dos contratos.

Do lado da procura, tem aumentado o interesse por conteúdo non-live (e.g., behind-the-scenes, documentários), especialmente por conteúdo exclusivo e distintivo.

Para as ligas, e principalmente para a Liga Portugal, dado o cenário de pré-centralização, este novo panorama do mercado de broadcasting poderá apresentar riscos, mas também oportunidades que devem ser estudadas e aproveitadas.

Adeptos que acreditam que estas entidades são bons conectores com marcas (%, 2022)

Variação dos valores dos direitos audiovisuais renegociados após 2019/20 para as Top5 ligas de acordo com UEFA

-2,2%

Em 2022, a Apple TV adquiriu os direitos de transmissão da MLS para os próximos 10 anos por US$2,5 mil milhões

A DAZN, adquiriu os direitos de transmissão de jogos da La Liga por cinco épocas – de 2022 até 2027

Crescimento do mercado de apostas desportivas

O mercado português e europeu de apostas desportivas tem experienciado um elevado crescimento, muito impactado pela pandemia da COVID-19, e é expectável que continue a crescer no curto/médio prazo, com especial ênfase para o mercado de apostas online.

O futebol tem um grande peso neste mercado, sendo que na época 2021/22, segundo o SRIJ (Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos), o futebol contribuiu cerca de 70% do volume total de apostas desportivas online em Portugal, com a Liga Portugal bwin a representar cerca de 8% do total apostado na modalidade de futebol. Assim, é fácil concluir que o mercado de apostas desportivas encontra-se cada vez mais enraizado na indústria do futebol. Esta ligação apresenta não só uma oportunidade de criação de receita para os seus vários stakeholders, como também uma oportunidade de aproximação ao adepto, pelo entusiasmo e ligação que uma aposta pode criar ao adepto.

O crescimento da Web3

A Web3 tem vindo a ter um impacto cada vez maior no mundo do futebol, com a adesão de cada vez mais stakeholders Embora, atualmente, a maioria das receitas geradas ainda estejam limitadas aos contratos publicitários, há um enorme potencial para a utilização de ferramentas e tecnologias associadas à Web3 para criar novas fontes de receita através da monetização de ativos virtuais, como NFTs e tokens, bem como através da exploração de novas formas de envolvimento dos fãs.

Várias equipas e ligas internacionais já estão a explorar as funcionalidades da Web3, principalmente através de NFTs e da transmissão de jogos no metaverso. Os NFTs, que são ativos digitais únicos e não fungíveis criados na blockchain, têm sido particularmente populares na indústria do futebol, permitindo a criação de ativos virtuais autênticos que representam momentos históricos, imagens e vídeos relacionados com o desporto. Da mesma forma, os tokens, que podem representar uma participação numa equipa ou liga, representam uma potencial forma de investimento e financiamento.

O metaverso também oferece oportunidades inovadoras para as Sociedades Desportivas e fãs de futebol. Com esta tecnologia, é possível criar simulações do mundo real em que os fãs podem interagir e participar em eventos desportivos de forma imersiva. Os jogos no metaverso estão a ser cada vez mais utilizados em eventos desportivos, permitindo aos fãs interagir com outros fãs, jogadores e Sociedades Desportivas de uma forma completamente nova.

Fontes: SRIJ; Análise EY

Volume de apostas desportivas à cota e licenças atribuídas em Portugal

Exemplos de Web3 na indústria do futebol

Em 2022, foi transmitido um jogo do AC Milan contra a Fiorentina no metaverso

O Paris SG, Juventus FC e o Atlético de Madrid criaram coleções de NFTs

O Manchester City estabeleceu uma parceria com a Sony para construírem o Etihad Stadium no metaverso

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