ANOTAÇÕES DISPERSAS SOBRE AS MUTAÇÕES DA MATÉRIA 12,5 As Coisas Quando Não São Mais Elas mostra obras envolvidas pela atmosfera transitória e impermanente das temporalidades. Tempo que passa e tudo altera. Trata-se de “observar a vida nas coisas mortas e a morte nas coisas vivas”. Passagem entre estados de existência que mudam incessantemente com a ação do tempo. Marcas do tempo também na matéria. 0,5 Um som ecoa permanente na sala de exposições. PRESENÇA. Tempo.
FICHA TÉCNICA } REALIZAÇÃO: MEMORIAL MINAS GERAIS VALE / GESTOR: WAGNER TAMEIRÃO } MONTAGEM: GESTALT } PRODUÇÃO DE MONTAGEM: GUILHERME MACHADO E MÁRCIA RENÓ } DESIGN GRÁFICO: AD10 COMUNICAÇÃO } SELEÇÃO DAS EXPOSIÇÕES: EDUARDO DE JESUS, WAGNER TAMEIRÃO, MARIA ANGÉLICA MELENDI, ANA LUIZA NEVES E NANCY MORA } COORDENAÇÃO GERAL E TEXTOS: EDUARDO DE JESUS
12,3 - Fragmentos de troca de e-mails: (...) estou construindo coisas quebradas, pedaços do pós-apocalipse associados à passagem do tempo e da lama do morro que desce no meu terreiro toda vez que chove. (...) em ambas estou falando de caos e cosmos, lixo, existência, unidade e fragmento, conexões se diluindo em imagens abstratas, tempo, imantação, as referências para a realização são as mesmas, em termos de imagem. Só que em uma delas uso um projetor, na outra uso meditação, sonhos lúcidos e outros métodos de in e con-dução. Anexo 01 – Enquanto isso, ecoa a voz de Michelle Gurevich Behind closed doors No words can touch that which is shared
Além de dar destaque para as manifestações da cultura ligadas à memória e à tradição, o Memorial Minas Gerais Vale ainda ativa as potências do contemporâneo como forma de dar sustentação e circulação ao legado do passado. Esse gesto aproxima e coloca as dimensões do tempo em um jogo, no qual passado e presente se entrecruzam nas dinâmicas das muitas manifestações da arte e da cultura. O Programa de Exposições 2017, selecionadas pelo Edital para Jovens Artistas Mineiros, é um desses gestos que aciona a produção artística contemporânea, dando visibilidade a artistas emergentes. www.memorialvale.com.br
1.0 – Introdução Não se trata apenas do tempo cronológico, mas das forças do tempo histórico e, ao mesmo tempo, das tensões e urgências do presente com todas as pressões dos contextos que experimentamos agora extremamente globalizados e midiatizados. As imagens marcam de distintas formas a memória coletiva e individual do tempo que vivemos. A apropriação de vestígios das imagens em circulação marca essas obras de Carolina Botura.
Anexo a - O projetor de baixa resolução A imagem vinda do circuito midiático torna-se referência direta para a pintura. A operação que parecia simples é subvertida nos processos de produção pela baixa qualidade da imagem projetada e pelo modo de compor as formas na tela. Massas cromáticas que parecem não conseguir ocupar o espaço, deformando-se em arranjos atraentes e dispersos, fragmentados.
Iniciativa:
QUANDO MAIS ELAS
Patrocínio:
0,4 – Dúvida perspicaz E essa madeira curva cheia de pequenas peças de mármore? Tão pesada e parece flutuar. Quais os tempos dela?
Sumário Existe muito movimento, instabilidade e potência.
COISAS NÃO SÃO
87,3 – Parte final Quando olhamos para as obras que compõem a exposição, é possível perceber como os vestígios, as marcas do tempo e um certo traço da catástrofe marcam as estratégias e os procedimentos artísticos. As esculturas manejam de forma singular materiais tradicionais, mas sempre de modo arriscado, tentando deixar os sinais de uma outra possível transformação. Entre fragilidade e resistência, há uma transitoriedade que Botura parece também perseguir nas pinturas ao reproduzir de forma pouco precisa as imagens, colocando-as em outros jogos formais, como se tentasse nelas manter seus fluxos contínuos de circulação midiática. Os desenhos tornam-se massas cromáticas, heterogêneas, fechadas, mas ao mesmo tempo leves e quase delicadas. Tudo cheio de instabilidade.
2,46 – O que dizer da especificidade dos suportes Pintura, desenho, escultura, instalação, performance. Mais uma vez, tudo impermanente e híbrido. Passagem e contaminação. Referências e estratégias que vão de um a outro e não param de mudar. “Não seria a instabilidade a condição da permanência?”.
AS
O Ministério da Cultura e a Vale apresentam Parceria:
Realização:
MINISTÉRIO DA CULTURA
CICLO DE EXPOSIÇÕES MEMORIAL MINAS GERAIS VALE 2017
CAROLINA BOTURA
03 DE FEVEREIRO A 25 DE MARÇO / 2018
ENTREVISTA – CAROLINA BOTURA
tempo da ordem do movimento, estamos literalmente no espaço, são forças específicas para realizar cada trabalho.
Seu trabalho tem se desenvolvido em distintos suportes, como pintura, desenho, performance e escultura. Como você elabora esses desdobramentos e escolhas?
Tenho obsessão por vidros e espelhos também, talvez por serem tão sensíveis à quebra e trazerem a cosmologia da água, a qualidade existencial do ver de fora e através.
Sinto que há uma conexão íntima entre os processos e, cada vez mais, atuo sobre esses espaços que separariam as linguagens como prolongamentos. Procuro mantê-los abertos e essa permissividade resulta num englobamento natural de uns aos outros. Há uma performance invisível que envolve a produção em qualquer suporte, no que diz respeito ao estado vibracional e altos níveis de consciência e suspensão envolvidos no ato criativo.
A atração por esses elementos passa por uma memória afetiva. Esses encontros são muito mágicos! Sinto um tipo de impacto com as pias de mármore branco da casa dos meus pais, a lápide de granito do meu avô, o vidro que continha um líquido misterioso no quarto da minha avó, os espelhos do ballet e do meu quarto.
Creio que as escolhas e os desdobramentos estejam pautados sobretudo pelo movimento. Gosto de observar a vida nas coisas mortas, a morte nas coisas vivas e mover com as transformações que proponho aos materiais e aos acontecimentos. Isso garante devir aos trabalhos e assenta sua importância não sobre o objeto, mas sobre esse trabalhar em si. Como se eles estivessem em estado permanente de tornar-se, sem que para isso tenha que se suprimir sua qualidade presente, seu estado de fragmento e compreensão como unidade. A escultura existe, portanto, sem que a performance precise ser citada, as correlações permanecem evidenciadas nos resultados como uma gravura sensível que adiciona camadas, mantendo seu senso de independência. Os objetos de silêncio seriam como pontes para captação de uma brecha de tempo sempre atualizada e ativada pela presença e interação das pessoas, que também modificam a história das obras. Você caminha sobre as pedras e as pedras também te encaminham. Talvez possa dizer que a performance funciona para mim como um fio condutor de energia. Não existe arte sem ação ou presença. A arte não está na arte. Há uma dimensão escultórico-performática que perpassa a escolha pelos grandes formatos em desenhos e pinturas também, porque neles as relações se tornam mais corporais: abaixa, levanta, estica, senta, afasta, aproxima, dança. Como foi o processo de criação das obras que compõem a exposição? Qual foi o ponto de partida? Quando produzi a série de pinturas As Coisas Quando Não São Mais Elas, estava olhando para as imagens que circulavam no mundo naquele fim de ano de 2015, guerra da Síria, ataques terroristas, Bataclan, imigrações, Miss Universo, o piloto suicida da Germanwings, o lixo, divisões celulares, galáxias, cosmo, caos, Big Bang. Aproximando formalmente situações de desastre com a criação do universo e a formação da vida. Utilizei um projetor de baixíssima qualidade e pintava no escuro a partir dessas imagens, que através de escolhas, exclusões e mutações começavam a despregar delas mesmas, configurando-se em imagens abstratas. Imagens de imagens gerando novas paisagens, em que os contornos reais não passariam de vincos e dobras. Portal é a escultura que compõe a instalação junto às pinturas citadas e foi produzida ao longo de dois anos, incluindo processos performáticos de energia canalizada e outras ações que envolvem a per1formatividade cotidiana do atelier - ação e manipulação do tempo e do peso sobre a peça.
PERFORMANCES
Fotos: Luiz Carlos Oliveira
03/02, às 12h – Concerto de abertura – Uróbøro. 03/03, às 11h – Limpeza – artista convidado: Thiago Miotto Tereda. 25/03, de 10h às 16h – Performance de encerramento.
Durante o período de 2016-17, estava construindo coisas quebradas. Morava em um atelier muito pequeno, o que me obrigava a deixar as peças do lado de fora, para ter espaço para produzir. Elas ficavam em uma área em que escorria a lama do morro acima, quando chovia. Posteriormente, foram sendo englobadas ao pé do desenho/pintura (queimada) “∆” instalada na sala 1. Ela foi produzida ao longo de um ano através de práticas de meditação, sonhos lúcidos, música, dança e milhares de camadas de incenso, com o qual acabei por incendiar o quarto. Algumas das esculturas foram criadas durante um happening que envolvia o fogo como elemento transformador. Cada peça que compõe a instalação tem uma história única, que perpassa rituais [solitários e compartilhados] e outros fluxos naturais de sua existência. 1 per 1. com a ideia de “através”: perfurar 2. com a ideia de “completamente”: perfeito 3. com a ideia de “destruição”: perverter 4. (Química) com a ideia de “proporção máxima de um elemento num composto”: peróxido O mármore, assim como o gesso, em diversos usos, estão presentes em suas obras. Como você se aproximou desses materiais e como os insere em sua pesquisa estética? Trabalho com o descarte do mármore e do granito e pego esse material nas caçambas das marmorarias. É uma escolha que tem a ver com a sua disponibilidade, a sobra gerada pela exploração capital. A pedra que não volta a ser montanha e que, de alguma forma, ainda é. Acontece de ser um dos materiais mais clássicos da escultura e isso traz ambiguidades muito interessantes para o trabalho. Acho que há também uma atração natural dos escultores pela pedra, uma coisa ancestral, rupestre. E apesar de ser uma estrutura mais fixa, eu já a encontro depois de ter sido explodida e cortada, então, passo a relacionar suas partes. E, nesse sentido, se inserem na minha pesquisa estética sobre o fragmento. A escultura tem um
A escolha do gesso tem a ver com a maleabilidade e seu poder de solidificar uma ação. Costumo moldá-lo a partir de alguma estrutura que também se permite transformar durante a manipulação. O resultado está diretamente ligado à consciência ou não do meu movimento em relação ao tempo de solidificação. O gesso tem uma característica permeável, posso submetê-lo à absorção de acontecimentos e, por ser muito sensível, cada peça acaba adquirindo uma textura única. Bater gesso é igual bater bolo, nenhuma pessoa faz igual à outra. Costumo lidar com ele de uma forma intuitiva, em diálogo com a água. Ele também é um material clássico da escultura, mas muito mais associado à natureza da fôrma, do suporte que vai gerar a peça. Eu gosto da ideia da fôrma como sendo a coisa mesmo, o conteúdo que dá forma à fôrma, pele elástica invertendo a ordem do uso e totalizando o acontecimento. A música tem uma importante centralidade na sua trajetória artística. Como você relaciona os domínios da arte e da música em suas obras visuais e performances? Não diria centralidade, mas certamente estamos sempre em cruzamento. Minha pesquisa com o som passa por um tipo de selvageria, bruta e rudimentar, além da dimensão atmosférica e espiritual. Gosto de criar situações e esculturas que possam ser dançadas e produzam ruído. Se posso dizer que pesquiso em música, devo isso ao ancestral da caverna, aos dadaístas e ao noise que entrei em contato há alguns anos e foi onde encontrei um campo possível para a maneira com que gosto de fazer e combinar sons. Vim parar nas artes plásticas por ser esse território super-híbrido, em que se pode experimentar com tudo, fome e geografia. A performance é um tipo de arte total em que você é atravessado por todos os sentidos, sempre há música e xs performers estão ligados nisso. Alguns escolhem trabalhar mais essa camada, provocando, direcionando e ampliando a experiência sônica que deriva da ação. Eu gosto de elaborar com o som, ou a partir dele, e muitas das vezes ele é um elemento natural da ideia. Vejo minha pesquisa sonora numa vibração crua e sem requintes. Há um elemento lúdico e envolvente acerca da música que também me interessa. O ritual sempre convidou a musicalidade, seu poder de cura e sua penetração são muito fortes. É irresistível o que ela pode fazer enquanto atmosfera, sendo um elemento de conexão poderoso dentro de uma peça, independentemente da linguagem. } Carolina Botura (Botucatu, São Paulo, 1982) Graduada em Escultura e Pintura pela Escola Guignard (UEMG, 2010-2015) e com passagens pelo curso de Letras, Literatura e Alemão (UFMG e UFOP, 2008-2010), Carolina Botura é uma das idealizadoras da Vespa – Via de Experimento em Performance e Ação e da Ex tre ma - Residência Artística e Festival de Punk Metal Noise e Música Experimental, sendo ainda integrante dos projetos sonoplásticos B∆siLåbUsi e O∆H. Entre as suas coletivas em 2017, destacam-se: Fime - Festival Internacional de Música Experimental de São Paulo, Corpo-Presente Residência Desenha (Galeria de Arte do Sesiminas, Belo Horizonte), Vespa: Perfura - Perfura: Atelier de Performance (Sesc Palladium, Belo Horizonte), Videoformes Brazil (França), Mostra de Vídeo TimeLIne - Sesc Palladium, Belo Horizonte e Vespa Lo.cura LO_cuRa (Galeria de Arte do Sesiminas, Belo Horizonte). Em 2017, realizou as individuais Casa Para Um Animal na Galeria do BDMG Cultural (Belo Horizonte) e “∆” no Espaço L∆V∆ (Belo Horizonte). Em 2016, esteve em outras coletivas na Ex tre ma - Residência Artística e Festival de Punk Metal Noise e Música Experimental (Minas Gerais), II Prêmio Camelo de Arte Contemporânea (Belo Horizonte), O∆H - Flecha - Teatro de Bolso do Sesiminas (Belo Horizonte), III Festival de Videoarte MoveMundo (Minas Gerais), Residente da MIP - Manifesto Internacional de Performance (Belo Horizonte), Vocación de Fracasso (Quito, Equador) e Salão Nacional de Artes da Colômbia. Não Alimente as Esperanças - Intervenção Urbana - Mídias Táticas (Belo Horizonte), Ruído Gesto - Festival de Performance e Vídeo-Performance (Porto Alegre), Residência e Festival Mulheres Cisperformers - Perpendicular Faz Curadoria (Belo Horizonte), Cine de Rua Feminista - Virada Cultural (Belo Horizonte), II Mostra Feminista de Arte e Resistência (Belo Horizonte), Festival Instantâneo de Performance Urgente- Quarta Função (São Paulo), II Festival Internacional de Performance/Ação/Sonora/Vídeo - Vespa FX2, Saldo Positivo - Mega Saldão Casa Camelo (Belo Horizonte). Em 2015, destaca-se na Residência Artística Línea Imaginária - La Multinacional (Quito, Equador), que a levou ao Hélice - Festival Internacional de Performance de Quito. Já em 2014, esteve na Residência em Ação e Performance - Co-Habitar al Cuerpo (Valparaíso, Chile).