27 DE MAIO A 16 DE JULHO / 2017
NÃO ME ESPERE PARA O JANTAR
As pinturas que Adriel Visoto nos apresenta em “Não me espere para o jantar” abrem o Ciclo de Exposições 2017 do Edital para artistas mineiros do Memorial Minas Gerais Vale, e nos convidam a um deslocamento pelas sutilezas e repetições típicas dos espaços domésticos.
CICLO DE EXPOSIÇÕES MEMORIAL MINAS GERAIS VALE 2017
O quarto, o banheiro, o espelho e a sala, com todos os objetos expostos em uma completa desordem, parecem se misturar aos sujeitos que, com gestos ordinários, habitam aqueles espaços.
O Ministério da Cultura e a Vale apresentam Óleo sobre tela - 15 x 12cm - 2016
Talvez esses pequenos fragmentos cotidianos materializados na pintura parecem colocar em tensão as formas mais tradicionais de representação, como a pose para o retrato ou mesmo toda a história do autorretrato. Ao trazer o privado e o íntimo a público, de forma muito silenciosa e nem um pouco espetacular, Visoto promove um confronto entre o tom ordinário de suas representações, em meio a outras tantas imagens banais, e o ruidoso movimento das imagens que colocamos para circular agora, prontas para a mais extrema visibilidade.
Óleo sobre tela - 16 x 22cm - 2016
No entanto, as imagens de Visoto se distinguem de outras imagens banais porque ativam outras estratégias de representação, um rearranjo dos espelhos entre o eu e o outro, tensionando as formas de representação. Outros jogos de sentido entre o retrato, o autorretrato e a autoficção da imagem de si. Na era do selfie, da autorrepresentação acionada pelas demandas de visibilidade da rede, as pinturas de Adriel Visoto colaboram para acionar as ambiguidades e complexidades típicas do sistema contemporâneo das imagens também no domínio da pintura.
Além de dar destaque para as manifestações da cultura ligadas à memória e à tradição, o Memorial Minas Gerais Vale ainda ativa as potências do contemporâneo como forma de dar sustentação e circulação ao legado do passado. Esse gesto aproxima e coloca as dimensões do tempo em um jogo, no qual passado e presente se entrecruzam nas dinâmicas das muitas manifestações da arte e da cultura. O Programa de Exposições 2017, selecionadas pelo Edital para Jovens Artistas Mineiros, é um desses gestos que aciona a produção artística contemporânea, dando visibilidade a artistas emergentes. Nessa temporada, quatro exposições revelam o vigor da produção artística emergente. A ideia central é dar espaço para a diversidade de discursos, práticas e estratégias da arte contemporânea produzida em Minas Gerais, garantindo aos jovens artistas boas condições de exposição e de visibilidade. www.memorialvale.com.br Iniciativa:
Patrocínio:
FICHA TÉCNICA } REALIZAÇÃO: MEMORIAL MINAS GERAIS VALE / GESTOR: WAGNER TAMEIRÃO } MONTAGEM: GUILHERME MACHADO } DESIGN GRÁFICO: AD10 COMUNICAÇÃO } SELEÇÃO DAS EXPOSIÇÕES: EDUARDO DE JESUS, WAGNER TAMEIRÃO, MARIA ANGÉLICA MELENDI, ANA LUIZA NEVES E NANCY MORA } COORDENAÇÃO GERAL E TEXTOS: EDUARDO DE JESUS
Óleo sobre tela - 22 x 14cm - 2016
O jogo proposto por Visoto entre o voyeur e o exibicionista nos envolve pelo modo como mostra, em um outro lugar, os espaços semelhantes aos que habitamos e os mesmos gestos que repetimos exaustivamente, como tomar banho ou trocar de roupa. Tudo parece doméstico e comum mas, ao mesmo tempo, há algo estranho.
Óleo sobre tela - 15 x 18cm - 2016
Quando nos detemos diante das séries de quadros, quando estamos mais próximos, as imagens revelam composições formais que se repetem, muitas vezes com o mesmo fundo, performances comuns, distantes do recorrente gesto espetacular que caracteriza as representações do sujeito que vemos circular hoje em dia. Os quadros acionam um inventário de nossas relações com os espaços domésticos, com as intensidades ordinárias do cotidiano e com um certo modo de articular a experiência estética que a vida cotidiana pode guardar no cerne de suas exaustivas repetições.
ADRIEL VISOTO
NÃO ME ESPERE PARA O SELFIE!
Parceria:
Realização:
MINISTÉRIO DA CULTURA
ENTREVISTA – ADRIEL VISOTO
4. Como o tempo habita suas obras?
1. Qual é o ponto de partida para o entrelaçamento entre o gesto mais autobiográfico, a vida cotidiana
Acredito que o tempo figure através de uma relação entre o instante que é representado e a
e um certo estranhamento que vemos em seus trabalhos?
memória de onde derivam, pois ainda que se tratem de imagens produzidas a partir de uma cena, elas resgatam e materializam situações que habitam esse lugar ambíguo e incerto da
Sempre houve uma necessidade de produzir coisas a partir de experiências pessoais e cotidianas.
memória.
Antes de começar a pintar, eu escrevia diários, poesias e cartas, fotografava situações banais, fazia vídeos em VHS, desenhava... O interesse por esse aspecto pessoal e autobiográfico ligado à vida
Mas o tempo também se faz presente nos processos de criação e produção dos trabalhos, de
cotidiana já existia, já era latente antes mesmo de pensá-lo enquanto objeto de arte. Acontece que
uma forma técnica. Por partir de imagens fotográficas para a produção pictórica, o processo em
eles foram migrando para um outro território, passaram a ser construídos por meio de um pensamento
si já envolve dois tempos distintos: o da fotografia, que é mais imediato, e o da pintura, que é
estético, concebidos não apenas como conteúdo, mas construídos com elementos formais, pictóricos.
mais extenso e processual. Um tempo de superfície em contraposição a um tempo de camadas,
Talvez seja nesse ponto que residam o seu estranhamento, o cuidado e a importância dedicados ao
que se contaminam, se sobrepõem e passam a habitar um mesmo espaço.
registro daquilo que se configura como íntimo e trivial, o que acaba promovendo um deslocamento desses para um outro lugar, que pode ser simultaneamente familiar e estranho. 2. Como você constrói as narrativas que organizam as séries? De onde elas partem? Como eu disse anteriormente, elas sempre têm como ponto de partida situações pessoais, rituais
}
Adriel Visoto
cotidianos, espaços que me são familiares, e objetos que, por alguma razão, acionam uma carga afetiva. No processo de construção dos trabalhos, há uma reorganização dessas memórias, espaços e
Adriel Visoto (Brazópolis, 1987) é bacharel em Artes Plásticas pela Escola Guignard (2012) e
objetos. Eles são reencenados, surgem como componentes de uma espécie de mise en scène.
Mestre em Artes Visuais pela UNICAMP (2015). Entre suas exposições individuais, destacam-se: “Imersões” (Galeria Nello Nuno, FAOP, Ouro Preto, Minas Gerais, 2012) e
A fotografia é produzida como uma imagem de referência para a construção da pintura, um esqueleto,
“Reality show me” (Galeria do Instituto de Artes da UNICAMP, Campinas, São Paulo, 2016).
que acaba sendo abandonado em algum momento do processo e o trabalho passa a caminhar a partir de seus elementos pictóricos. A cor se desprende da imagem fotográfica e se torna mais autônoma.
Participou das exposições coletivas “Quase pornô” (Galeria Mama Cadela, Belo Horizonte, MG), 44º Salão de Arte Contemporânea Luiz Sacilotto (Casa do Olhar, Santo André, SP), Programa
As narrativas vão se construindo dessa forma, por isso elas nunca são lineares de fato. Elas tentam
de Exposições do Museu de Arte de Ribeirão Preto (SP), Immersioni tra fotografia e poesia -
agrupar as situações a seus elementos visuais, se esforçam numa tentativa falha de colar todos esses
Refugi di via Babiana (Coleferro, Itália), “Não confie em ninguém com mais de 40” (Viaduto das
fragmentos, seguindo dispersas, com seus lapsos e vazios, algo que me interessa profundamente
Artes, Belo Horizonte, MG), 12º Salão de Arte Contemporânea de Guarulhos (Centro Cultural
enquanto elemento poético.
Adamastor, Guarulhos, SP), 32º Salão de Artes Plásticas de Rio Claro (Centro Cultural Roberto Palmari, Rio Claro, SP), Art Aspen (Gallery of the Aspen Institute, Aspen, EUA), 13ª Mostra dos
3. Por que as obras em pequenos formatos?
Premiados (Galeria da Escola Guignard, Belo Horizonte, MG), entre outras. Integrou o Projeto
Óleo sobre tela - Tríptico 15 x 36cm (15 x 12cm cada) - 2016
Tenda de Livros (com mostras na Oficina Cultural Oswald de Andrade, em São Paulo, no Existem várias razões para manter meu trabalho em suportes de tamanho reduzido. Irei me ater à primeira
Espaço Aeromoto, na Cidade do México, e no Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia,
e talvez mais importante, que é por uma razão conceitual. Penso que o pequeno formato permite
em Belém).
a configuração de um outro tipo de relação com o espaço expositivo e com o observador. É preciso que o sujeito vá até o trabalho, antes que esse chegue até ele. Cria-se um movimento mais silencioso,
Obteve Bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), em
que requer uma aproximação. Faz-se necessário olhar a pintura de perto para acessar sua imagem e
2014, e os prêmios de menção honrosa no 12º Salão de Arte Contemporânea de Guarulhos
sua materialidade. Dessa forma, se estabelece entre o sujeito e a obra uma relação potencialmente
(Guarulhos, SP) e no 1º Salão de Artes Plásticas Solar dos Andradas (São Paulo, SP).
mais intimista, em alguns momentos própria de um confidente, ou em outros, de um voyeur. Além disso, a pintura realizada nesses pequenos suportes evoca a escala e o tempo de produção de alguns objetos ligados a um registro também íntimo da memória, como é o caso dos diários e das fotografias vernaculares, por exemplo.