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capítulo 1.

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introdução.

introdução.

O processo de colonização do Litoral Paulista

1.1 História

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Ao longo dos anos, o Litoral Norte Paulista foi povoado por diversas populações, sendo a mais marcante e a de maior interesse para este estudo a população caiçara. Ele engloba os municípios de Bertioga, São Sebastião, Caraguatatuba e Ilhabela.

A população litorânea possui uma vida completamente voltada ao trabalho de pesca e agricultura, no meio das mais belas paisagens litorâneas do país. Sua existência é marcada por um contato intenso com a Mata Atlântica e com o mar, cheio de alegrias e mistérios. Recebem esse apelido “caiçara”, que em tupi se refere aos cercos de madeira que os indígenas constroem na água para aprisionar os peixes. Mas a cultura caiçara apesar de, hoje, ser muito característica, é marcada pela miscigenação de diversos povos que ocuparam o território litorâneo. A história de ocupação do litoral paulista perde-se no tempo e os registros existentes vem desde a pré-história do Brasil, há mais de 2.000 anos – conforme mostram os sítios arqueológicos – que trazem registros dos mais antigos habitantes do litoral paulista, o povo Sambaqui, que estavam espalhados por toda a costa litorânea, desde o Espírito Sando até o Rio Grande do Sul. Os Sambaquis são sítios arqueológicos formados pelo acúmulo de conchas de moluscos, ossos de animais, fogueiras e artefatos de pedra, podendo ter metros de altura ou serem pequenos morros. Eles foram muito explorados ao longo dos anos e poucos são preservados até hoje. O povo costumava fazer uso das pequenas ilhas (como Ilhabela) para enterrarem seus mortos, por serem locais escondidos e isolados. Viviam basicamente da pesca e da coleta de recursos marinhos e provavelmente não praticavam a agricultura.

Com a chegada dos povos horticultores e ceramistas no local, pouco a pouco eles foram dominando as regiões costeiras, antes completamente ocupadas pelos sambiqueiros. Esses grupos agricultores eram os tupi-guaranis, que praticavam a agricultura de corte e queima e plantavam feijão, milho, abóbora e mandioca. Dominaram o litoral paulista durante o período pré-colonial.

Diversos povos indígenas passaram a povoar o litoral. A presença dos índios perdurou até a chegada dos colonizadores.

Antes da chegada dos portugueses, o município de São Sebastião era chamado de Maembipe ou Meyembipe. Ele era ocupado por índios tupinambás chamados de “homens pescador-coletores do litoral”, pois eles não dominavam a agricultura e nem a produção de cerâmica, então viviam do que encontravam na natureza, principalmente dos animais marinhos. Além dos índios tupiniquins.

uma nação, mas sim grupos dispersos, os portugueses conseguiam encontrar aliados entre os próprios indígenas, e os que resistiam se deslocavam para a Mata Atlântica da Serra do Mar.

Os habitantes do litoral passaram por muitos momentos de sobressalto, pelo contínuo aparecimento de navios misteriosos de outras populações.

Entre as décadas de 1530 e 1540, foi estabelecido no Brasil a produção de cana-de-açúcar, dando início a um novo ciclo econômico no país.

Os Padres Carmelistas receberam doações de enormes glebas de terras que se tornam um produtivo engenho na praia de Guaecá, por volta de 1632. Em Boiçucanga, foi erguida uma capela, possibilitando a criação de um povoado ao seu redor. A presença dos religiosos marcou muito a colonização de São Sebastião.

Fonte: https://naturam.com.br/indios-em-ubatuba/

Na época das grandes navegações, foi organizada uma segunda frota saída de Portugal no dia 10 de Maio de 1501, composta por três caravelas e coordenada por Américo Vespúcio. Eles prosseguiram para o Sul e percorreram toda a costa. No dia 20 de janeiro de 1502, a expedição chegou em Maembipe. Vespúcio dizia que, se existisse paraíso na terra, ele certamente estaria naquela região. Ele nomeou todo o nosso continente, incluindo a ilha de Maembipe, que foi então batizada com o nome do santo do dia, São Sebastião. Entretanto, ele não descreveu a ilha.

Em 1532, iniciou-se a povoação de uma nova expedição na Ilha de São Sebastião e, somente em 1608, os primeiros colonos portugueses se estabeleceram nas margens do Canal de São Sebastião e ela começou a ser povoada.

Nesse meio tempo, ocorriam disputas territoriais entre os tamoios (que habitavam Ubatuba), os tupiniquins, aliados aos portugueses e os tupinambás, aliados aos franceses. Essas lutas resultavam no aprisionamento de viajantes alemães, franceses e holandeses, muitos dos quais foram aprisionados e devorados pelos inimigos. Alguns, como o alemão Hans Stader, escaparam e contaram as histórias das viagens pelo litoral. Como os índios não representavam

Fonte: https://www.cidadeecultura.com/historia-de-ubatuba/

O arquipélago também foi muito usado como refúgio por corsários e piratas, o que motivou a construção de um sistema para defesa de Ilhabela e São Sebastião.

Com a expulsão dos franceses, o povoamento europeu do litoral se intensificou, com a concessão de sesmarias, ou seja, a doação de grandes extensões de terras que deveriam ser cultivadas.

A partir de 1850, o cultivo de cana-de-açúcar entrou em declínio no sudeste brasileiro e começou no Brasil o ciclo da mineração, deslocando uma massa da população para Minas Gerais, Bahia, Goiás e Mato Grosso. Surgiram então, as culturas de fumo, banana, cana e os engenhos de açúcar, além da mandioca (ainda muito cultivada pelas comunidades caiçaras). No fim do século XVII a ilha era próspera, com engenhos e comércio. Em um primeiro momento, a força de trabalho utilizada era a indígena, mas, a partir do século XVII, surgiram uma série de conflitos por conta de sua escravização.

A convivência entre os portugueses e os índios nem sempre era boa, o que fez necessária a criação de vários acordos e alianças. Entretanto, eram comuns casamentos entre esses povos, entrelaçando a cultura e muitos dos costumes, que aparecem até os dias de hoje.

A região se encontrava no meio de uma rota muito privilegiada, entre Santos e o Rio de Janeiro, então os viajantes encontravam abrigo ali.

Isso fez com que os engenhos se multiplicassem, mesmo que ainda fossem modestos em relação às áreas do nordeste brasileiro, por conta dos terrenos acidentados que limitavam as áreas de plantio.

Desde o início da colonização, o litoral brasileiro foi submetido à muitos anos de exploração de seus recursos que, somado com o sistema de concessão de sesmarias, resultaram em uma combinação altamente destrutiva para a Mata Atlântica.

Na segunda metade do século XVIII, a população começou a crescer no litoral norte, principalmente na Ilhabela, onde começou a se formar um pequeno povoado.

Foram construídas muitas casas de veraneio para famílias das classes média e alta do planalto paulista, que fez com que Ilhabela e outras cidades da região começassem a receber um grande fluxo de migrantes oriundos de diversos estados brasileiros.

Desde a década de 1990, essas cidades têm enfrentado grande crescimento demográfico, o que tem provocado o crescimento urbano desordenado.

1.2 Populações litorâneas

Caiçara¹ é um termo genérico utilizado para determinar as populações que nasceram no litoral brasileiro e vivem da cultura de subsistência. Por isso, eles são a melhor representação de convivência harmoniosa entre o homem com o meio ambiente, representando a junção da cultura indígena com a colona brasileira.

Passando pelo litoral brasileiro, além das lindas paisagens, encontramos diferentes grupos de pessoas. Cada um deles se adequa ao seu ambiente de uma maneira, sofrem influências de diferentes grupos e se relacionam com a terra e o resto do mundo da sua forma. A maioria delas têm como uma das principais tradições a pesca artesanal, que movimenta a economia, a gastronomia, e está enraizada na vida das comunidades.

Nesse momento, devemos destacar a diferença entre as comunidades tradicionais e as comunidades que foram mais afetadas pelo mundo globalizado, frutos das cidades grandes, como Salvador, Rio de Janeiro e Santos. Mesmo carregando resquícios da cultura caiçara, seu estilo de vida se tornou completamente diferente. A urbanização dos grandes centros do litoral muitas vezes acaba destruindo essas comunidades, além do turismo em massa quando é feito de maneira predatória. Portanto, vale enfatizar que, ao longo desse estudo, as populações litorâneas a serem estudadas serão as populações tradicionais do litoral, que vivem afastadas das grandes cidades.

¹ O termo “caiçara” é uma denominação local para as comunidades e indivíduos que vivem ao longo do litoral dos estados de São Paulo, Paraná e Rio de Janeiro. Denominam-se caiçaras os habitantes tradicionais do litoral das regiões Sudeste e Sul do Brasil, comunidades formadas a partir da miscigenação entre índios, brandos e negros e que têm sua cultura baseada na pesca artesanal, a agricultura, o artesanato e, mais recentemente, o ecoturismo Salvador, Rio de Janeiro eSantos. Mesmo carregando resquícios da cultura caiçara, seu estilo de vida se tornou completamente diferente. A urbanização dos grandes centros do litoral muitas vezes acaba destruindo essas comunidades, além do turismo em massa quando é feito de maneira predatória. Portanto, vale enfatizar que, ao longo desse estudo, as populações litorâneas a serem estudadas serão as populações tradicionais do litoral, que vivem afastadas das grandes cidades.

No litoral paulista, encontramos populações caiçaras em Ubatuba, Ilhabela, Juquehy, Bertioga, entre outras. Como já foi visto anteriormente, o protagonista da ocupação dessa região foi o indígena que escapou dos massacres dos primeiros séculos de colonização e que não fugiu para o interior, continuando nas praias e pescando com suas canoas. Miscigenaram-se com os brancos e com os escravos negros fugidos.

A área, que não atraía os colonizadores, foi ocupada por um padrão dominante das propriedades camponesas, com pequenas aldeias. Eram roças pequenas abertas na mata, produtoras de alimentos básicos para a família, e com algum excedente para o mercado local, combinadas com algumas poucas fazendas voltadas principalmente para produtos de exportação, e também para o cultivo de alimentos destinados ao seu uso doméstico.

A paisagem do litoral foi muito afetada com a chegada dos turistas, que encheram com suas lanchas e iates os portos e píeres que, antes, abrigavam apenas as canoas, botes e baleeiras dos nativos. Porém, ainda é o caiçara que maneja esses barcos maiores, como empregado do turista, já que possui conhecimento das características do mar, de suas costas, ilhas e profundidades, conhecimento este adquirido por seus antepassados enfrentando as ondas e tempestades de ventos com suas pequenas canoas movidas a remo. Dessa maneira aprendem muito sobre o mar, sobre os ventos e sobre os peixes, e o aprendizado é passado de geração em geração, alimentando uma grande sabedoria comunitária. Eles desenvolveram também técnicas essenciais para construir e reparar barcos, canoas de voga escavadas num só tronco.

A vida em comunidade é algo muito marcante entre os caiçaras. Não apenas as atividades de pesca, mas também as construções de suas casas, confecção de suas canoas, etc, são feitas em conjunto, sempre um ajudando o outro no trabalho em grupo e os saberes sendo passados para cada um.

Essas populações mantêm presente no seu dia-a-dia a cultura das festas religiosas (como a Congada, de Ilhabela), que reverenciam seus principais santos durante muitos dias. Elas são compostas por músicas, danças, rituais e rezas, unindo a comunidade e fazendo história.

Além das comunidades tipicamente caiçaras, em Ubatuba podemos encontrar uma comunidade quilombola, que luta pela liberdade da alma e pelo direito de herança à terra registrada e pela legalização do que vem a ser o primeiro remanescente de quilombo do litoral norte. Também vivem da pesca e do artesanato, feito pelas mulheres com palha de banana, conchas e anel de latinha e vendidas na cidade.

1.3 Cultura caiçara

Os nativos de Ilhabela também são denominados caiçaras. Eles possuem grande diversidade cultura e étnica e estão espalhados por todo o arquipélago, em vários núcleos, sendo alguns deles isolados, como a Praia do Bonete.

Suas tradições são muito bem conservadas com suas festas folclóricas, artesanato, fabricação de canoas e estilo de vida. Sobrevivem de recursos naturais, tais como a pesca e a agricultura.

A história da região é marcada pela cultura pesqueira, bem como seus ritos culturais, festas folclóricas, lendas e mistérios.

“Filhos do mar, donos da terra. De uma mistura de índios guaranis com portugueses e outros invasores descende um povo de fortes raízes, os caiçaras (...)” (MARANHÃO, 2014)

A população caiçara de Ilhabela é formada por descendentes de indígenas, europeus (portugueses, ingleses, holandeses e franceses) e africana. Muitos sítios arqueológicos evidenciam a presença de populações indígenas antes da colonização europeia. Eles indicam que a Ilha de São Sebastião foi habitada por indígenas do tronco linguístico macro-jê. É o único lugar do litoral sudeste brasileiro onde encontraram cerâmicas elaboradas por grupos indígenas não tupi-guaranis, apesar de eles também estarem presentes na ilha. Os concheiros presentes em Ilhabela indicam aos pesquisadores que o local pode ter sido povoado por grupos diferentes do restante da costa brasileira.

Eles tinham sua rotina pautada pelo uso de canoas de voga, que eram construídas com um único tronco e estavam presentes em todas as antigas descrições, e pela pesca, que, embora predominante, disputava seu espaço com a caça e o cultivo da mandioca, milho e feijão.

Historiadores dizem que os homens pescadores coletores do litoral realizavam sepultamentos ritualísticos de seres humanos e fabricavam artefatos com uso de pedras lascadas e polidas, confeccionavam adornos a partir de dentes, conchas e ossos de animais marinhos e terrestres. Preparavam seus alimentos armando grelhas de madeira (monquéns) e tanto na caça, quanto na pesca, utilizavam o arco e flecha. Os caiçaras destacam como influência indígena a casa de farinha, fazer peneiras, tipitis, as canoas e as técnicas de plantio.

Dos colonizadores portugueses, piratas ingleses, holandeses e franceses, veio a influência europeia. Ela deve ter começado na primeira década do século XVII, com os portugueses se estabelecendo na ilha.

Os portugueses foram os que mais contribuíram racial e culturalmente com a população caiçara. Principalmente na Praia do Bonete, que possui uma população que foi segregara por longo tempo e tem um tipo de branco meriodianal europeu.

Por conta do comercio negreiro, o litoral foi transformado em local de desembarque de escravos contrabandeados. Os navios chegavam na Baía dos Castelhanos e os escravos atravessavam a pé a ilha até serem introduzidos ao continente. A mão de obra escrava fez com que a Ilhabela atingisse seu ápice econômico, e os negros representaram a força do trabalho, produzindo grande quantidade de café, açúcar e pinga. Foram a base da época do apogeu econômico e, depois isso, não apareceram mais na cultura caiçara.

A maior marca da cultura negra deixada na Ilhabela foi a congada de São Benedito. Dessa dança encontra-se um elemento que se afirma para a contribuição afro-brasileira ao universo caiçara, em homenagem ao santo negro reconhecido pela caridade que prestou aos escravos.

No século XX, apareceram imigrantes japoneses na ilha, trazendo inovações no sistema de pesca dos caiçaras com redes de cerco e barcos a motor. Isso fez com que a área se tornasse um dos maiores centros de pesca do litoral norte de São Paulo.

Hoje, as populações caiçaras possuem técnicas de produção de artesanato rudimentares, mas que são muito eficientes para atender as demandas cotidianas da comunidade. Tecnologias de confecção e técnicas de emprego dos itens produzidos foram e ainda são passados de pai para Imagens cotidiânas da filho, por meio do uso de matérias-primas naturais disponíveis no entorno de suas moradias e nas áreas acessíveis às comunidades. São representativos do modo de vida caiçara, mesmo estando cada vez mais pressionados pelo avanço do turismo, que se tornou uma importante fonte de renda para muitas famílias.

A Praia do Bonete é uma das praias onde a população caiçara se mantém mais enraizada. Em frente a ela, ficam os barcos e canoas produzidos por eles, mostrando a importância que a pesca tem para os moradores. Trabalham com a pesca com fins comerciais e para consumo próprio. A agricultura de subsistência continua sendo praticada por uma minoria, já que, hoje, na maioria das vezes, é uma atividade clandestina, por conta dos regulamentos e proibições do Parque Estadual da Ilhabela.

Assim como outras comunidades caiçaras do litoral norte de São Paulo, a Praia do Bonete faz parte de um programa oficial do Centro de Experimentação em Desenvolvimento Sustentável (Ceds), que procura construir diretrizes de um programa de turismo sustentável para o litoral.

Sua cultura é recheada de muitas comemorações religiosas, nas quais festejam por dias cantando e dançando. São evangélicos e a maioria das comemorações são voltadas aos santos padroeiros das cidades.

Os habitantes tradicionais de Ilhabela carregam lendas e mitos constituintes de sua cultura. Eles acumulam crenças que incluem desde a mitologia dos tesouros de piratas, até fantasmas e lobisomens. Essas histórias percorrem suas raízes e eles dizem saber mesmo quem era o lobisomem, quem foi raptado por sereias e quem encontrou extraterrestres.

As histórias mais antigas falam sobre piratas que, no século XVII, se aventuravam pelas águas do litoral norte e se escondiam nas ilhas. Eram tantos os ataques que eles acabaram motivando a construção de um sistema de defesa para Ilhabela e São Sebastião.

1.4 Arquitetura vernacular

A cultura tradicional caiçara continua sendo manifestada nos costumes, na culinária e na arquitetura das populações do litoral norte paulista, por conta das condicionantes econômicas e geográficas, que fazem com que alguns elementos da cultura ainda se façam necessários. Em algumas vilas caiçaras ainda permanecem habitações características.

Tendo em vista o isolamento geográfico e econômico imposto ao litoral a partir do momento que as outras cidades do país começaram a crescer e tornar-se mais importantes, a população litorânea foi obrigada a moldar suas habitações de acordo com o que tinham na terra e com a dinâmica de tempo e espaço oferecida pela geografia. Eles aprenderam a conhecer seu espaço e obter dele os elementos convenientes ao seu bem-estar. Eles criaram seus próprios parâmetros de avaliação do mundo. Usam como referência de espaço a própria natureza, como os rios, pontes, pedreiras, vegetais.

“(...) feitas de ‘paus’ do mato próximo e da terra do chão...servem de abrigo para toda a família. É do chão que continua... mas justamente por isso, por ser coisa legítima da terra, tem para trás nós arquitetos, uma significação respeitável e digna.” (COSTA, LUCIO)

A arquitetura vernacular² caiçara promove uma relação mais neutra com o meio ambiente. Sendo assim, o estudo da cultura caiçara é de grande importância quando pensamos em promover um desenvolvimento sustentável na arquitetura brasileira.

“Nas comunidades tradicionais, o saber local está profundamente relacionado com as particularidades do ambiente no qual habitam e resulta numa utilização equilibrada dos recursos naturais do lugar. Na arquitetura vernacular, as técnicas e os programas evoluíram juntos. O saber fazer aperfeiçoou-se a partir do domínio dos recursos do ambiente e atendendo às solicitações da sociedade que, das casas, sempre esperou mais do que somente abrigo do clima ou dos inimigos”

(LEMOS, 1999)

A arquitetura vernacular das comunidades caiçaras de Ilhabela é uma manifestação da relação de conhecimento e dependência dos ciclos da natureza que caracterizam esses povos. A ocupação do espaço por essa população é moldada pelo relevo, pelos materiais da terra e por seus costumes.

Na sua concepção projetual, todas as decisões se baseiam na relação com o meio ambiente, assim como a organização espacial, as soluções encontradas, a aplicação dos materiais, etc. Os materiais utilizados na construção das habitações são aqueles que o pescador encontra na área onde as moradias serão construídas, é um reflexo do produto sendo resultado do meio.

O espaço era dividido entre ranchos de pesca, as casas aglomeradas nas vilas e o sertão, onde se cultivava a roça.

A própria sociedade litorânea desenhava urbanisticamente traçados não retilíneos que eram moldados pelas próprias relações sociais, como casamentos, onde as habitações ficavam perto das casas dos mais velhos.

A vida em comunidade fazia com que as tarefas do dia-a-dia fossem feitas em conjunto, o que trouxe a existência de um quintal comum, chamado de terreiro, onde as galinhas e porcos transitavam livremente. Neste mesmo espaço, as tarefas domésticas eram realizadas e, também, a confecção de artesanatos úteis para a vida cotidiana.

Dentre os métodos construtivos e materiais presentes na arquitetura da habitação caiçara, estão a taipa e o uso de palha, da madeira e do barro. A técnica da taipa consiste em erguer uma parede socando o barro no interior de um trançado e madeira. O barro utilizado normalmente é o vermelho, em sua forma bruta, que se encontra na natureza misturado com água. A taipa tem um bom isolamento térmico e durabilidade. É muito utilizada pela cultura caiçara por conta da fácil locomoção da construção, já que a paisagem litorânea se modifica constantemente através do movimento das dunas. Já a palha é utilizada como elemento de vedação em sua forma natural ou trançada em formatos de esteiras. A madeira roliça é usada diretamente nas construções da forma que for encontrada na natureza. e mais finos, ripas ou varas e, assim que estivesse feita, o barro era jogado e apertado sobre ela. Consiste=se em um trabalho apenas manual.

² O termo “vernacular” deriva do latim vernaculus, que significa doméstico, nativo, indígena. Surgiu a partir da palavra “verna” , que significa “escravo nativo” ou “escravo caseiro”. Em arquitetura, refere-se a um tipo de arquitetura indígena própria de uma época ou local específicos (não importada ou transcrita de qualquer outro local). É mais frequentemente aplicada a edifícios residenciais.

As habitações caiçaras do litoral de São Paulo, encontraram referência na arquitetura caipira paulista, cuja origem remonta à miscigenação entre índios e brancos colonizadores. Eram construídas tradicionalmente com paredes de pau a pique barreadas, telhados baixos de palha, piso de terra batida e estrutura de madeira. Durante o período de colonização portuguesa, entrando em contato com as construções de casas de engenho e igrejas utilizando alvenaria de pedra e cal e telhas de barro produzidas pelos escravos, os caiçaras aprenderam o ofício e passaram a adotar esses elementos em sua moradia, produzindo variadas casas com coberturas de telhas cerâmicas e beirais largos, utilizados em conjunto com fundações de pedras e assoalho de madeira.

Sobre o programa da habitação, muitas das moradias localizadas nas comunidades tradicionais da Ilhabela apresentam um único cômodo, onde tudo se integra. Algumas casas possuem dois cômodos, um de repouso e outro de serviço, no qual cozinham, reúnem-se para as refeições e fazem os artesanatos. O hábito da privacidade veio da influência europeia, separando as áreas de serviço, intimas e sociais. Algumas casas de famílias com melhores condições financeiras separam os dormitórios dos casais e dos filhos. Ao passar dos anos vão sendo acrescentados cômodos.

Eram casas térreas, de pouca frente e pouco fundo, e duas águas. As fachadas eram feitas de alvenaria de pedra e, mais comumente, suportes de madeira com tijolos inclinados para a vedação, e as demais paredes de taipa de mão.

As paredes eram formadas de estacas fincadas perpendicularmente na terra, entrelaçadas de ramos de árvores e rebocadas de barro por dentro e por fora. Era feita uma trama de roliços mais grossos

A trama se apresenta como elemento portante, portanto, não é possível abrir vãos após a construção. Janelas e portas devem ser previstas antes da casa ser construída e fazer parte da construção do tramado.

O trabalho de construção das casas era, também, feito em comunidade. Amassavam o barro e barreavam a casa enquanto cantavam cânticos que balizavam os movimentos. Eles acompanhavam o ritmo e facilitavam o processo, sincronizando o trabalho.

A captação do barro e o corte da madeira eram baseados em conhecimentos empíricos, ligados às fases da lua. Para construir com qualidade, deve-se conhecer muito a terra e a argila que estão sendo usadas. Em época de baixa influência lunar, as madeiras possuem menor qualidade de seiva, o que diminui a atuação de insetos xilófagos, por isso os paus eram extraídos em noites frias de lua crescente, para que fossem mais conservadas.

Após a expansão imobiliária, a taipa de mão caiu em desuso, mas volta à tona com o surgimento de novos paradigmas ligados à sustentabilidade e o fortalecimento da cultura regional.

A construção vernacular caiçara não só se apresenta como vetor de fortalecimento de aspectos culturais, mas também como possibilidade de geração de renda. Além de ser uma opção compatível com o cenário ambiental da região.

Quando falamos de arquitetura, falamos da construção de ambientes feitos única e exclusivamente para receber atividades humanas e, de preferência, proporcionar um melhor desempenho destas. Para isso, é necessário ter uma boa definição visual, que constitui 85% da percepção humana.

O processo de visão envolve dois aspectos: as propriedades físicas, ou seja, os estímulos físicos da luz sobre o olho, e as propriedades perceptivas, a sensação que esse estímulo provoca no indivíduo.

Protágoras, o antigo filósofo grego, afirmou no ano de 45º a.C.: “o homem não é mais que um conjunto de sensações”.

A sensação é um fenômeno psíquico elementar resultante da ação de estímulos externos sobre os órgãos dos sentidos e é o que nos faz relacionar o nosso próprio organismo com o mundo exterior.

Ela pode ser classificada em três grupos: sensação externa – a resposta de cada órgão dos sentidos aos estímulos que atuam sobre ele –, sensação interna – a resposta dos nossos órgãos que cuidam da coordenação motora, do equilíbrio e das funções orgânicas a partir dos estímulos externos captados – e sensação especial – se manifesta sob a forma de sensibilidade para sede, fome, fadiga, etc.

A percepção é a função psíquica que permite que o organismo receba e elabore informações provenientes de seu entorno através dos sentidos. Ela é uma atividade cerebral que classifica e compara informações da memória diante de determinado objeto para poder compreendê-lo conscientemente. Ela não é o resultado de um único estimulo isolado, mas sim, é afetada por vários fatores: os estímulos sensoriais – as características fisiológicas do indivíduo, como sua visão, sua audição, determinam como ele vai perceber o ambiente –, a localização do objeto no tempo e no espaço – objetos distantes no tempo não são percebidos, só são lembrados tal como objetos distantes no espaço, já que é necessário que os órgãos receptores operem sobre ele – e a influência das experiências prévias, como cultura, educação, necessidades, emoções e personalidade.

Alguns fatores podem afetar a percepção do indivíduo.

O primeiro é quando há uma distorção na percepção sensorial do indivíduo, ou seja, ele percebe erroneamente a realidade de acordo com as suas limitações do sentido visual. Diante da contradição da associação das impressões, são produzidas ilusões óticas. Usando o exemplo do Partenon, edifício da Grécia Antiga, ele foi construído de maneira totalmente distorcida para que fosse possível admirá-lo do ponto de vista da estatura do homem, mantendo a ideia de suas linhas retas e sóbrias que proporcionam uma sensação de grandeza e simplicidade. Vale reforçar que a ilusão ótica não é a a ilusão real dos sentidos. O registro ótico, a impressão do sentido da visão, é inteiramente correto. Mas a estimulação do canal causa um desequilíbrio fisiológico que altera a percepção.

O segundo é a percepção associada, quando estímulos que correspondem a um determinado sentido também influenciam nas respostas de outros campos sensoriais, por exemplo, quando relacionamos uma cor à uma sensação ou a uma temperatura.

O terceiro fator é o efeito de sinestesia.

“A sinestesia é a alteração, geralmente subjetiva, da percepção de um estímulo provocada pela excitação em outra parte do corpo” (GONZALEZ, 2000).

Cores quentes criam a sensação subjetiva de uma maior temperatura no ambiente, assim como cores azuis produzem sensação se frio.

O último fator que pode afetar completamente a percepção do indivíduo são os diferentes tipos de personalidade. Os mais importantes com relação ao desenho ambiental são: introversão/ extroversão – manifesta a inclinação da pessoa em se opor à relação com o entorno ou a seu favor –, atividade/ passividade – tendência individual para realizar ou não determinada ação sobre o entorno –, claustrofobia/agorafobia – quando o indivíduo recusa espaços muito pequenos ou muito grandes –, individualismo/gregarismo – inclinação do individuo a fazer coisas sozinho ou acompanhado -, apoliniano/dionisíaco – tendência a interpretar a realidade por um grande processo de análise, sem a abstração de uma parte do todo , neofilia/neofobia – preferir ou resistir a tudo o que é novo.

A nossa percepção inconsciente assimila todas as informações que recebemos a todo tempo e passa-as por um filtro, que é a memória inconsciente, onde estão armazenados os dados das experiências passadas, deixando para a percepção consciente apenas as informações julgadas mais importantes. O nosso cérebro capta as informações, classifica-as, interpreta-as e seleciona-as. Enquanto as informações irrelevantes são armazenadas na memória, as informações relevantes são incorporadas à consciência imediatamente e são usadas para satisfazer as necessidades que iniciaram tal investigação. Todos os elementos que se encontram no campo visual são avaliados como um só elemento, não apenas o objeto em questão.

Objetos de extrema dificuldade de classificação geram, além de uma atenção visual, uma sensação de desconforto e distração.

Outros fatores fundamentais para o processo de percepção são: a expectativa, que está associada à sequência de eventos e o que esperamos que encontrar em seguida, e o afetivo, que indica como cada estímulo afeta nossas emoções, como nos sentimos em cada situação e cada espaço. Ela influencia na atenção que dedicamos a um elemento do campo visual. Se ele nos agrada, mantemos nossa atenção para analisa-lo mas, quando ele é desinteressante, passa despercebido.

“A qualidade afetiva da percepção determina a importância que vamos dar ao objeto, o qual, por sua vez, influenciará no impacto que terá ao recalibrar nossas experiências”. (LAM, 1992)

2.1.2 Lei da Gestalt

A Teoria da Gestalt diz que não se pode conhecer o todo através das partes, mas, sim, as partes através do todo, que só através da percepção da totalidade é que o cérebro pode perceber, decodificar e assimilar uma imagem ou um conceito. Ela afirma que o cérebro segue certas leis que facilitam a compreensão das imagens e das ideias quando está no processo da percepção, ou seja, os elementos tendem a ser percebidos de sua forma mais simples.

Pregnância é a capacidade de perceber e reconhecer formas, e quanto mais simples, mais fácil de ser assimilada. A forma é uma das características essenciais dos objetos, refere-se aos limites das massas, aos corpos tridimensionais limitados por superfícies bidimensionais.

O grau de simplicidade afeta a percepção da configuração de uma determinada figura e a rapidez e facilidade com que ela é percebida. Portanto, a simplicidade tende a ser uma composição mais satisfatória.

Entretanto, ambientes mais complexos e com mais informações geram mais estímulos e mantêm a atenção, então são fatores que são considerados como valores estéticos em uma composição.

Na arquitetura, o conceito de forma é utilizado para induzir a madeira de dispor e coordenar os elementos e as partes de uma composição para que seja produzida uma imagem coerente.

A percepção e a compreensão de uma composição dependem da maneira como a interação visual entre os elementos positivos e negativos são interpretadas dentro do campo visual.

2.2 Relações proxêmicas

Quando falamos do espaço arquitetônico, não podemos pensar apenas na relação do indivíduo com este, mas, sim, entender a relação que o indivíduo estabelece com o espaço em questão e com seus semelhantes que o habitam em conjunto.

Para isso, também deve ser compreendida a relação indivíduo-indivíduo.

Assim como outros grupos de animais, os seres humanos ocupam seu território, defendendo seu espaço físico e seu espaço pessoal. Pode-se observar, que todas as espécies estabelecem entre si determinadas distâncias constantes.

O homem mantém distâncias uniformes nas relações com seus semelhantes, e tais distâncias são resultado de modificações sensoriais.

A percepção humana do espaço e da distância não é estática, ela é dinâmica, pois está ligada à ação que será realizada nesse dado espaço. Além disso, está relacionada à diversos fatores, como comentado anteriormente.

A compreensão das distâncias se dá inconscientemente e, a partir de um conjunto de informações sensoriais, podemos determinar os pontos de estruturação do sistema de entendimento de cada uma delas.

Elas estão divididas em quatro tipos: distância intima, distância pessoal, distância social e distância pública, cada uma com seu modo próximo e modo afastado.

A distância íntima é quando a presença do outro se impõe invadindo seu espaço. Pode-se perceber a visão, o cheiro e o calor do corpo do outro. Em seu modo próximo, ela está relacionada ao ato sexual e de luta, de reconforto e proteção, com contato físico, a voz desempenhando menor papel no processo de comunicação, que acontece de outras formas. Em seu modo afastado, ainda com toque mas com um distanciamento de 15 a 20 centímetros entre os corpos, uma visão levemente distorcida do outro e a voz sendo utilizada de modo abafado. Sua prática em público não é aceita e, quando ocorre, é incômoda, principalmente entre desconhecidos que estão sujeitos a isso diante de lotação de transportes públicos ou grandes filas de espera.

A distância pessoal é uma distância fixa que separa membros das espécies sem contato. Os indivíduos estão próximos, mas criam uma camada protetora que os isola do outro. Seu modo próximo se dá na distância de 45 a 74 centímetros. Já não existe distorção visual do outro. Em seu modo longínquo, na distância de 75 a 125 centímetros, o contato se torna mais difícil, é o limite do alcance físico de um com o outro. Normalmente, à esta distância, são discutidos assuntos pessoais, as formas físicas são nítidas e ainda são reparados os cheiros.

A distância social marca o poder do limite do outro. Em seu modo próximo, a altura da voz é normal e é designada a reuniões informais. Consiste na distância de 1,20 a 2,10 metros. Em seu modo longínquo, de 2,10 a 3,60 metros, se dão as relações profissionais ou sociais, assumindo um caráter mais formal e diminuindo os detalhes de percepção do outro. Este tipo de comportamento é condicionado pela cultura.

Por fim, a distância pública é situada fora do círculo imediato de referência do indivíduo. Em seu modo próximo, de 3,60 a 7,50 metros, a voz é mais alta e o corpo começa a perder volume. Em seu modo afastado, de 7,50 metros ou mais, a voz é altamente elevada, o essencial da comunicação não é mais verbal, mas feito por meio de gestos.

Conclui-se que o comportamento de territorialidade pertence à natureza dos animais e, consequentemente, à natureza do ser humano. A distância entre cada indivíduo influencia na sua percepção do todo e, portanto, do espaço. Ele usa dos seus sentidos para diferenciar as distâncias e os espaços. A distância escolhida depende das relações interpessoais, dos sentimentos e das atividades de cada indivíduo envolvido na situação e varia de acordo com o local, com a época e com a cultura, pois cada sociedade estabelece padrões e atividades que são aceitos ou não e isso influencia tanto na condição física apresentada, quanto na percepção do indivíduo sobre ela.

2.3 O morar coletivo

O morar coletivo se refere a entender como o indivíduo se relaciona com o espaço em que ele está e, ao mesmo tempo, entender como ele se relaciona com o próximo, já que a maneira como ele se sente em determinado lugar interfere diretamente em suas reações diante dos acontecimentos e, consequentemente, interfere nas relações com o outro.

Como descrito anteriormente, muitos fatores influenciam na percepção do homem sobre o ambiente em que ele está. Sua cultura, sua personalidade, suas memórias, suas características físicas, tudo isso interfere na percepção do indivíduo sobre o todo, portanto, não se pode pensar em um espaço privativo de maneira generalizada, já que cada um irá compreendê-lo de maneira diferente por conta de toda a sua bagagem.

Também foi tratado da distância física entre pessoas, o que ela significa socialmente e como ela é aceita e interpretada. Mais uma vez, concluiu-se que a aceitação de determinadas distâncias varia muito de acordo com a pessoa a quem está se referindo. Mas, de qualquer maneira, a distância é um importante fator na interpretação do espaço, mesmo que ela varie de cultura para cultura.

Elas são divididas em quatro tipos: a distância íntima, distância pessoal, distância social e distância pública. Quando elas são invertidas, ou seja, quando ocorre um caso de distância íntima em um espaço onde a distância pública é aceita, isso gera um incômodo para o usuário. Por exemplo, quando a pessoa está em um ônibus lotado e uma outra pessoa, desconhecida, senta em seu colo sem querer, ambas as pessoas ficam desconfortáveis. Porém, a classificação das distâncias varia de cultura para cultura. Em países como a Índia, por exemplo, é comum que homens heterossexuais que não possuem nenhuma relação amorosa andem de mãos dadas pela rua, ao mesmo tempo em que mulheres não podem chegar perto de homens, enquanto, no Brasil, tudo isso é visto de outra maneira. Em filas de espera na Índia, pessoas se encostam para diminuir o espaço entre elas sem nenhum problema, enquanto no Brasil isso gera grande desconforto e incômodo. Ou seja, a maneira com que as pessoas lidam com o espaço compartilhado também varia muito de acordo com a sua cultura, personalidade e memórias.

As atividades humanas são classificadas pela sociedade e por pessoas que vivem de maneira organizada. A arquitetura e os espaços devem, também, ser organizados de acordo com essas atividades e de acordo com os elementos que estas necessitam. Para isso, é necessário ter profundo entendimento de como se dão essas ações e como são classificadas as distâncias aceitas por cada uma delas. Os espaços sociais, por exemplo, são mais espaçosos. Não só para que eles consigam comportar uma quantidade maior de pessoas, mas para que a distância social seja respeitada. Da mesma maneira que espaços íntimos são menores. Espaços públicos, são muito maiores e, quando não são, os indivíduos se sentem extremamente incomodados.

Vale ressaltar que, como todas as atividades estão em constante mudança, as necessidades sobre o espaço também estão, por isso, elas devem sempre ser analisadas.

Em espaços públicos, o entendimento da interferência da arquitetura nas relações interpessoais é um pouco mais simples pois, além de passarem pelo local rapidamente, todos os indivíduos, na maioria das vezes, carregam a mesma bagagem cultural e, se alguém não carrega, facilmente compreende a cultura alheia e se adequa. Diferentemente dos espaços privados, que devem ser pensados de maneira mais personalizada. Caso contrário, ele não se adequará ao usuário que, por sua vez, não se identificará com o local, fazendo com que a arquitetura não atue de maneira benéfica em sua vida, mas sim o oposto, como pode-se encontrar na maioria das residências construídas em massa atualmente. Por exemplo, condomínios de casas de baixo padrão são conjuntos de casas idênticas para as mais diversas famílias, que não se adequam ao modo de vida e nem à necessidade de cada um, pois não é conhecido o indivíduo que ali habitará antes de ela ser projetada. Ou seja, para que a arquitetura que envolve o morar coletivo seja de qualidade, beneficiando o usuário, as atividades internas e a relação entre os indivíduos deve ser muito bem aprofundada e entendida. O morar não deve seguir um padrão, um molde previsto. Ele deve ser adequado - além das características de quem irá habitar – com as atividades que lá serão conduzidas e, consequentemente, com as distâncias aceitas pela sociedade em questão, tornando-o um espaço confortável e fácil de ser compreendido pelas próprias pessoas. Dessa maneira, a relação de cada um com o espaço será mais qualitativa, o que fará com que a relação indivíduo-indivíduo também seja.

capítulo 3.

Estudo de casos e referências arquitetônicas

3.1 Internacional: Quinta Monroy

Ficha Técnica:

Local: Iquiqu, Chile

Ano: 2003

Arquitetura: Alejandro Aravena, ELEMENTAL

Área total: 5000m2

Área construída: 3500m2

Orçamento: US$204/m2

Tempo de execução: 9 meses

Análise Funcional:

O Quinta Monroy foi um projeto desenvolvido pelo escritório de Alejandro Aravena a pedido do governo chileno com a intenção de radicar 100 famílias que estiveram ocupando ilegalmente um terreno de 0,5 hectares no centro de Iquique por mais de 30 anos.

Por conta do baixo orçamento disponibilizado pelo Ministério de Habitação, foram construídos blocos de apenas 30m2 que permitiam que os proprietários transformassem dinamicamente essa solução habitacional em uma casa, de acordo com suas próprias necessidades. Eles passaram a ver o problema da habitação como investimento social, garantindo que a habitação subsidiada, que recebe as famílias, valorize-se cada dia mais, sendo a ajuda mais importante que a família irá receber.

Além de pensar no espaço público (ruas e calçadas) e o espaço privados (as próprias moradias), pensaram em um espaço coletivo, que era uma propriedade comum de acesso restrito, dando lugar à sociabilização.

Como 50% dos m2 dos conjuntos seriam auto-construídos, o edifício deveria ser permeável o suficiente para que o crescimento acontecesse dentro da sua própria estrutura, evitando a deteriorização do espaço público e permitindo uma ampliação fácil ao mesmo tempo.

O projeto conseguiu identificar um conjunto de diferentes desenhos arquitetônicos que permitem que a habitação se valorize com o tempo novas divisórias, ou até mesmo de ser removido.

Foi entregue pelo escritório de arquitetura a metade mais difícil de se construir das casas, englobadas todas em um mesmo bloco com dois pavimentos: banheiros, cozinha, escadas e paredes divisórias, permitindo que cada morador possa ampliá-la mais tarde de acordo com suas necessidades.

As casas são compostas por três pavimentos. No primeiro pavimento de cada residência, encontra-se um banheiro, uma cozinha e uma sala pequena. O segundo pavimento (pavimento inferior do duplex) possui as instalações necessárias para a cozinha e um grande espaço livre. Já o terceiro pavimento é inteiramente livre, com a possibilidade de construir mais um banheiro e acrescentar novas divisórias, ou até mesmo de ser removido.

Análise Técnica:

Os materiais das casas consistem em concreto e madeira, sendo a estrutura principal feita com pilares e vigas de concreto armado, os fechamentos “fixos” com blocos de concreto e as extensões das casas feitas com chapas pré-moldadas de madeira. A cobertura das casas é feita com chapas metálicas planas e onduladas, que se apoiam nos pilares de concreto. Existe um sistema estrutural complexo que faz com que a coberturas sejam funcionais e não prejudiquem o conforto térmico do ambiente.

Análise Estética:

A estética das casas entregues é simples e modesta. Como a intenção do projeto era de entregar para a família o básico, elas não possuem nenhum revestimento ou pintura, apenas a estrutura aparente, possibilitando que os moradores as modifiquem da maneira que preferirem. O resultado segue o partido arquitetônico esperado pela equipe responsável pelo projeto, eles entregam o básico para que as famílias possam contribuir com a sua própria identidade.

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