PROJETO PARA ACOLHIDA DA
CAPELA DA SERRA
COMO EXPRESSÃO MINISTERIAL EM UMA IGREJA DE DONS E MINISTÉRIOS
A SER ENCAMINHADO PELO BISPO ADRIEL DE SOUZA MAIA NO CONTEXTO DA 3ª REGIÃO ECLESIÁSTICA DA IGREJA METODISTA
Páscoa/Pentecostes, 2010
2 PROJETO PARA ACOLHIDA DA CAPELA DA SERRA COMO EXPRESSÃO MINISTERIAL EM UMA IGREJA DE DONS E MINISTÉRIOS, A SER ENCAMINHADO PELO BISPO ADRIEL DE SOUZA MAIA NO CONTEXTO DA 3ª REGIÃO ECLESIÁSTICA INTRODUÇÃO
A
presente proposta resulta da reflexão dos participantes da CAPELA DA SERRA após quatro anos de vivência e maturação das expressões e cultivo de espiritualidade em torno do rico solo wesleyano. Desde o início nos propusemos a nos constituir em “um espaço de compromisso com o reino de Deus e sua justiça; de oração e de vivência da unidade cristã; e de celebração de uma espiritualidade sacramental historicamente enraizada e culturalmente encarnada”.
A PROPOSTA Propomos que a CAPELA DA SERRA seja acolhida pelo Bispo Adriel de Souza Maia, Bispo da 3ª RE, como ministério de capelania, no contexto da 3ª. Região Eclesiástica, tendo como parâmetros as justificativas e os contornos administrativos e funcionais abaixo mencionados. Recordamos que, no quadro wesleyano, registra‐se a criação, por John Wesley, da “Wesley’s Chapel”, reunindo em uma experiência litúrgica membros da Igreja Anglicana. Lembramos que experiência próxima da nossa, que dela se diferencia por tratar‐se, aquela, de ministério em nível macro nacional, é a da “Ordem de São Lucas”, na Igreja Metodista Unida dos EUA, caracterizada como ministério litúrgico. 1.
O CAMINHO PERCORRIDO EM QUATRO ANOS COMO REFERÊNCIA FUNDAMENTAL
A presente proposta emergiu de nossa percepção do que estamos vivenciando nestes quatro anos. A CAPELA DA SERRA completa, no Pentecostes de 2010, quatro anos de existência. Ela nasceu da convivência de alguns irmãos e irmãs que moram nas imediações da Serra do Japi, em Jundiaí, SP. Pela rede de relações de amizade, outros irmãos e irmãs se somaram ao longo desse tempo. Hoje, congregam conosco mais de 50 pessoas, incluindo crianças e adolescentes que se sentem parte integrante dos encontros regulares; algumas de Jundiaí, outras da grande São Paulo, incluindo principalmente a Capital e São Bernardo do Campo, outras do interior — Campinas, Piracicaba, Sorocaba, Limeira, São Pedro, Lins —, e mesmo de outros Estados, caso da regente do Coro da CAPELA DA SERRA que, sempre que possível, vem de Castro, Paraná. Quando o projeto nasceu, recebeu o nome carinhoso de CAPELA DA SERRA, pela razão que segue: Atribui‐se o termo “capela” a São Martinho de Tours, que viveu na época do imperador Constâncio, no século IV d.C. Conta‐se que, quando era soldado romano, desejava tornar‐se cristão, mas relutava a tomar essa decisão por influência do pai, também militar, e por força de sua profissão. Certa noite, quando cavalgava pela neve, viu um mendigo. Movido por compaixão, rasgou sua capa em duas partes e deu uma metade para o homem que padecia de frio. Mais tarde, durante aquela noite, enquanto dormia, teve um sonho no qual via Jesus Cristo envolto com a metade de sua capa. Quando narrou seu sonho, o termo que empregou para designar a metade da capa (ou capa pequena) foi “capela”. Essa experiência determinaria o modo de vida monástica que Martinho adotaria dali em diante. A partir de então, uma pequena construção destinada a acolher o Cristo no acolhimento dos irmãos, passou a designar‐se “capela!”. Estamos chamando o espaço no qual nos reunimos de “CAPELA DA SERRA” porque o nosso sonho é que este seja um lugar onde Cristo seja acolhido no acolhimento que fizermos uns dos outros e, já que
3 estamos ecologicamente situados ao pé da Serra do Japi, pareceu‐nos apropriado designar este lugar de “CAPELA DA SERRA”. Além disso, há aqui um encontro maravilhoso de natura com a cultura. As serras são edificações geológicas que naturalmente vão ao encontro do céu, enquanto as capelas são edificações humanas nas quais, sobrenaturalmente, Deus vem ao nosso encontro. Ao longo destes quatro anos, nossa comunidade já deu provas de que está se solidificando sadiamente: temos um significativo grupo que é pontual, assíduo e comprometido; todos são muito talentosos e dispostos a empregar seus dons para servir a Deus na comunidade; temos um espaço agradável para realizar as atividades; por nosso modo de operação temos pouquíssimas despesas, cobertas pelo voluntariado e algumas contribuições. Estas são, entre outras, nossas dádivas mais visíveis. 2.
JUSTITICATIVA 2.1. A RESPOSTA DE MUITOS METODISTAS À EXPERIÊNCIA Como afirmado acima, uma iniciativa singela que teve resposta de um pequeno grupo da região de Jundiaí chamou a atenção de muitos e os atraiu para os encontros regulares. A decisão inicial da eleição de um horário de encontro que não competisse com as atividades regulares da Igreja Metodista de Jundiaí ensejou a oportunidade para deslocamentos de grupos e famílias residentes em municípios relativamente distantes. A assiduidade deste grupo de cerca de 50 pessoas indica estar a Capela respondendo a uma carência, por parte de significativo grupo cristão, de maioria metodista, de vivências e expressões litúrgicas específicas. 2.2. O LEGÍTIMO DIREITO AO PASTOREIO, NO INTERIOR DA IGREJA NACIONAL Efetivamente a CAPELA DA SERRA vem acolhendo um grupo de cristãos que podem ser caracterizados como “deslocados”, em muitos sentidos, em relação às vivências atuais em muitas de nossas congregações. Em diferentes ocasiões temos acolhido testemunhos dolorosos de pessoas cujas vivências da fé e cultivo da espiritualidade, aparentemente sem espaço de expressão em suas comunidades originais, as impedem de simplesmente abandonar a comunidade eclesial. Muitos pastores aposentados se integraram à Capela, com a família, seus filhos e netos. Outros pastores, ainda na ativa, exercem suas atividades em órgãos e ministérios específicos, não diretamente vinculados ao ministério pastoral, ainda que com responsabilidades em uma igreja local. Em um encontro oficial de representantes da CAPELA DA SERRA com o Bispo Adriel de Souza Maia, há mais de um ano, para avaliar com ele nossa proposta e obter dele aconselhamento episcopal, esta necessidade material de um pastoreio foi fortemente manifestada. Na ocasião nos sentíamos constrangidos com nossa situação de informalidade, pela experiência efetiva de estarmos desvinculados do Corpo Eclesial Institucional. Bispo Adriel afirmou nosso direito ao pastoreio, em termos metodistas. 2.3. A PROPOSTA ORIGINAL E BÁSICA PARA A ORIGEM DA CAPELA DA SERRA Desde seu início nos propusemos que a CAPELA DA SERRA fosse “um espaço de compromisso com o reino de Deus e sua justiça; de oração e de vivência da unidade cristã; e de celebração de uma espiritualidade sacramental historicamente enraizada e culturalmente encarnada”. Esta afirmação se constituiu no mote orientador de nossas ações. No mesmo encontro, acima mencionado, com o Bispo Adriel, em contato com nossa proposta ele aquiesceu que nossa busca por alternativas para a expressão de nossa espiritualidade é legítima, pois todo e qualquer metodista deve ter assegurada a oportunidade de cultivar seu modo de viver a fé em um contexto legitimamente wesleyano; isto é consequência de uma Igreja que se afirma como Igreja plural.
4 2.4. A NATUREZA LITÚRGICA DA CAPELA DA SERRA É reconhecida a prática litúrgica, celebrativa, como componente essencial das primeiras comunidades cristãs, tais como as conhecemos no Novo Testamento. Celebrava‐se a vitória da vida sobre a morte em uma refeição com o Ressuscitado, denominada precisamente de “eucaristia”. Embora o encontro litúrgico não esgote em si a riqueza da experiência eclesial, este é o momento da epifania da Igreja Corpo de Cristo, ocasião na qual a Igreja se manifesta em sua plenitude em torno do Cristo presente, seus membros confessam sua fé e se afirmam como cidadãos e cidadãs do reino, acolhem o Cristo no acolhimento dos irmãos e irmãs, expressando toda essa riqueza em cânticos, orações, acolhida da Palavra, renovando, ao mesmo tempo, o compromisso público daquela cidadania. A CAPELA DA SERRA se propõe a expressar com a máxima plenitude possível esse ministério litúrgico e toda a sua mística. Nesse contexto procuramos mergulhar na rica experiência histórica da Igreja cristã, colhendo as mais belas expressões nas primeiras línguas por meio das quais elas vieram à luz, seja o grego ou o latim, os mais belos hinos que traduzem, ao longo do tempo, buscas profundas e celebrações comunitárias, como as dos irmãos John e Charles Wesley, entre os diferentes pais da Igreja. Esta abertura litúrgica permite a acolhida do novo canto litúrgico que vem marcando a Igreja protestante latino‐americana nos últimos 50 anos. Se cultivamos expressivas construções litúrgicas do passado da Igreja, integramos essa experiência à acolhida da riquíssima prática contemporânea, ausente do culto regular atual de nossas comunidades. Nesta concentração litúrgica decidimos acolher as crianças como legítimas participantes da comunidade. Esta rica experiência, na qual a estética é acolhida como necessária beleza da santidade de Deus, expressa, igualmente, a mística da catequese cristã, conduzindo‐nos ao aprendizado permanente dos elementos fundamentais da fé. Esta tem sido a vocação visível da CAPELA DA SERRA e certamente a razão da forte atração que vem exercendo. A proposta da CAPELA DA SERRA, neste contexto litúrgico, se apóia em quatro pilares fundamentais: a oração, elemento constante de nosso culto e aprendizado cristão; o trabalho, que se expressa em nosso compromisso público de amor ao próximo, simbolizado em nossas ofertas regulares em espécie para as diferentes causas que chamam nossa atenção*; o estudo, manifestado nas pesquisas de nossas práticas litúrgicas e no permanente convite a integrá‐lo em nossa prática regular, não apenas de questões e temas teológicos, mas de todas as dimensões humanas e suas elaborações literárias e científicas; e o silêncio‐contemplação, que nos recorda o indispensável descanso do Deus criador e a necessidade e legitimidade de nossos momentos introspectivos. (Se colocados nessa ordem: Trabalho‐Estudo‐Oração‐Silêncio, os quatro pilares formam o acróstico “TEOS”, que soa semelhante a Theós, o termo grego para “Deus”.) Em suma, a espiritualidade da CAPELA DA SERRA não é outra, senão aquela sintetizada nas Escrituras “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as
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O Teólogo Hans Küng parecia estar descrevendo o movimento metodista liderado pelos irmãos Wesley quando sintetizou o programa diaconal da Igreja nos seguintes termos: desenvolvimento do ser humano todo e de todos os seres humanos; proteção dos direitos humanos e da liberdade religiosa; luta contra injustiças econômicas, sociais e raciais; restabelecimento e defesa da paz; luta contra analfabetismo, fome, alcoolismo, prostituição e tóxicos; assistência médica, serviço de saúde e outros serviços sociais; auxílio a pessoas necessitadas e vítimas de catástrofes naturais… (cf. KÜNG, Hans. Ser cristão. Rio de Janeiro: Imago, 1976. p.18).
5 tuas forças e de todo o teu entendimento; e: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (cf. Lc 10.27). Amar a Deus e amar ao próximo são como as duas faces de uma mesma moeda. Os beneditinos dizem a mesma coisa com as seguintes palavras: Ora et Labora (“Ora e trabalha!”). John e Charles Wesley também tinham o seu jeito próprio de expressar o mesmo compromisso da comunidade cristã: por meio de “Atos de Piedade” e de “Obras de Misericórdia. A CAPELA DA SERRA pretende ater‐se rigorosamente a esse princípio básico da espiritualidade cristã. 2.5. O CONCEITO DE CAPELA EM UMA IGREJA DE DONS E MINISTÉRIOS Nossa Igreja desenvolve há muito tempo a prática de capelanias, em hospitais, escolas, prisões. As principais características dessas práticas são a dispensa do vínculo eclesial formal, na medida que se presta um serviço não necessariamente relacionado à necessidade do registro de novos membros em nossos róis eclesiásticos, mas concentrado no amor ao próximo como tal, (o antigo lema metodista do “fazer o bem pelo amor do bem”), e a dispensa da necessidade de um vínculo com um espaço sagrado definido. Se no presente essas práticas eclesiais são operadas como “ministérios”, elas não se materializam necessariamente como expressão de uma igreja local. Há que se considerar, à guisa de exemplo, outras experiências análogas que podem parametrizar o “ministério da capelania”, como o projeto conhecido como “Cenáculo de Oração”. 2.6. CARACTERÍSTICAS SINGULARES DESTA CAPELANIA, NÃO PRESENTES EM OUTRAS ORGANIZAÇÕES DA IGREJA a) A participação em uma capela como a CAPELA DA SERRA não requer a quebra do vínculo eclesial de seus participantes, em especial dos metodistas, com a igreja local de origem. Vinculados à igreja de origem, os participantes exercitam um ministério específico. b) À semelhança das práticas de capelania acima mencionadas, uma CAPELA pode acolher em plenitude cristãos não metodistas que necessitem aprofundar sua espiritualidade de modo regular e intenso. Em nossa experiência, tem sido fundamental que todas as pessoas não vinculadas à Igreja Metodista que frequentam e participam de nossas práticas litúrgicas experimentem a liberdade resultante da dispensa do vínculo de uma membresia formal. Esta liberdade, essencial para cristãos que valorizam o vínculo eclesial com suas denominações de origem, coloca seu relacionamento regular com a Capela no mesmo nível do dos metodistas, situando a todos os participantes nos mesmos patamares de vivência eclesial. A idêntica acolhida a todas e todos os cristãos de diferentes origens, estabelece um solo efetivo e natural para a experiência da unidade. c) Neste mesmo espaço de liberdade, a Capela tem acolhido “cristãos em geral e metodistas em particular que experimentam o exílio”, por se verem efetivamente deslocados de suas comunidades eclesiais de origem, quaisquer que sejam as razões. Infelizmente este dado é mais comum do que o desejável e ilumina o importante papel missionário específico deste ministério. d) A característica mais visível e fundamental da CAPELA DA SERRA, já mencionada acima, mas repetida aqui, dada a sua natureza distintiva, por contrastar esta prática com aquela efetivamente em uso nos diferentes espaços eclesiais da atualidade, é o diferencial litúrgico. À guisa de mais uma ilustração deste importante tema para nós, é a síntese possível, no rico campo da liturgia, entre o
6 resgate do canto wesleyano e a apropriação de expressões litúrgicas significativas de outras denominações, em um verdadeiro solo ecumênico. e) Como nos constituímos em uma comunidade que congrega pessoas residentes em um amplo raio de distância, pode‐se “levar” o local de encontro litúrgico pelos espaços de vida de seus frequentadores. O espaço físico de adoração pode circular pelas cidades de seus participantes. Todas essas características únicas, não encontradas em uma igreja local, pelo menos em sua plenitude, justificam a institucionalização de um ministério de capelania, em geral, e o da CAPELA DA SERRA em particular. 3.
CONTORNOS OPERACIONAIS E ADMINISTATIVOS DA PROPOSTA A seguir os elementos materiais da proposta de um ministério de capelania: 3.1. A Capela não se institui como um corpo eclesial formal. Seus participantes não estabelecem vínculos eclesiais formais, mantendo estes vínculos com suas igrejas locais de origem. 3.2. Não se mantêm livros de registros eclesiais próprios. Na eventualidade de algum ato eclesial que requeira registro, como batizado, profissão de fé, casamento, este se fará na igreja local na qual o vínculo da pessoa ou grupo familiar é mantido, ou na ausência deste, em uma igreja local previamente definida, mediante acordo de estabelecimento do vínculo. 3.3. A CAPELA DA SERRA, dada sua natureza ministerial própria, decidiu não alugar, construir ou comprar edifício para a prática religiosa. Desde nossa origem nos congregamos na Escola Municipal Eduardo Paes, em Jundiaí, que cedeu espaço para nossas reuniões, conforme sua política de relacionamento social. Na eventualidade da interrupção desta cessão, procurar‐se‐á novo espaço, em moldes análogos ao atual. 3.4. Como exercício de um ministério, no contexto da Igreja de Dons e Ministérios, a condução pastoral do grupo se fará de modo voluntário, sem previsão de proventos, por um clérigo metodista, subordinado ao Bispo da Região, processo que ensejará o indispensável pastoreio em termos e no contexto metodista. 3.5. Despesas inevitáveis para o pleno funcionamento do ministério de capelania da CAPELA DA SERRA são assumidas por seus participantes.
CONCLUSÃO Como exercício ministerial no interior da Igreja Metodista, temos claro que o ministério de capelania da CAPELA DA SERRA se constitui em um serviço livremente disponível a cristãos interessados, congregando a todas e todos que sejam atraídos e se sintam sintonizados com nossas propostas, no contexto de uma região eclesiástica, subordinada pastoralmente ao Bispo, como um pólo de compromisso com o reino de Deus e sua justiça, oração e vivência da unidade cristã e de celebração de uma espiritualidade sacramental historicamente enraizada e culturalmente encarnada, constituindo‐nos em alternativa, em uma Igreja de Dons e Ministérios, para expressar o melhor de nossa tradição wesleyana. Rev. Luiz Carlos Ramos
Páscoa/Pentecostes de 2010
Rev. Pedro Nolasco Toso
Rev. Luciano José de Lima