Grifo 07

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Renato Canini por Edgar Vasques p. 16 Um poeta entre nós, José Weis p. 24

Nº 7

ABR

Confira e ria muito, o Entrevero repensado p.25

2021

O SORRISO DA MORTE

J C OA R R N T A U L N I D S O T S A S

Necropolítica produz genocídio no Brasil

D A G R A F A R


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editorial

Necropolítica e bolsonarismo

O

palavrão para todos os humanos é o escape quando falta uma boa argumentação, ou quando a raiva comanda as ações. Hoje tá mais liberado, mas houve época em que era tão proibitivo que quando humoristas os utilizavam em teatros (nunca na TV), a plateia ria surpresa. Para jornalistas, palavrão tem também outro sentido. É a palavra a ser evitada por não pertencer ao vocabulário corriqueiro. Diga concordância, em vez de beneplácito, por exemplo. Política da morte, em vez de necropolítica (pág 3 a 10). Coisa muito ligada ao terraplanismo mental (11 e 12). No bolsonarismo, o palavrão corre solto, parece que a falta de argumentos é permanente. Nunca é um fechamento de boa piada. Sempre está acompanhado de alguma ação deletéria, quando não mortal: negar a necessidade de vacina, congelar salário de servidores públicos, desmantelar o Estado através de privatizações baratas, devastar o meio ambiente, liberar armas. Enfim, esse governo merece ser definido com um violento palavrão jornalístico: Necropolitiqueiro.

grafar.hq@gmail.com

EX PE DI EN TE

O Jornal Grifo é publicação de cartunistas da Grafar (Grafistas Associados do RS) Editor: Marco Antonio Schuster Editores adjuntos: Celso Augusto Schröder e Paulo de Tarso Riccordi Capa: Lucas Levitan Diagramação: Hals, Bruno Cruz e Caco Bisol. Colaboradores: Bier, Bira Dantas, Bruno Cruz, Caco Bisol, Carlos Roberto Winckler, Carol Cospe Fogo, Celso Vicenzi, Céllus, Cláudia Carezzato, Cyntia Campos, Dálcio, Demétrio Xavier, Duke, Edgar Vasques, Erasmo, Eugênio Neves, Iara Maurente, Janete Chargista, Juska, Kayser, Lancast Mota, Lu Vieira, Lucas Levitan, Michel Moro Gomez, Moa, Moisés Mendes, Mouzar Benedito, Pantera, Paulo de Tarso Riccordi, Rekern, Rodrigo Schuster, Santiago, Schröder, Thiago Lucas, Tiago Germano e Uberti.

Mas a gente aqui prefere utilizar humor nas palavras, como em Fez-se News (13), ou em traços, como em Só Cartum (14 e 15). Sem jamais perder a coragem, como várias nações hermanas em Mundo (19 e 20) ou a irreverência, como Bier em Diabo Rosa (21) e Canini, nosso homenageado do Lanterna Mágica (16, 17 e 18). Aliás,

O Grifo de Eugênio Neves

nem a imprensa fica livre em seus bolsonarismos: Quer que desenhe? (22). E pra mostrar que nem tudo é só necropolítica Texto & Traço (23), Poesia (24), Entrevero (25, 26 e 27)e Artes drásticas (28, 29 e 30) estão aí esbanjando bom humor, esperança (e talvez até algum tipo de palavrão, mas sutil).


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Tá passando boi, bala e vírus

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icardo Salles não gostou do tuitaço contra ele no Dia de Tiradentes. Xingou Anitta, Caetano Velloso e até Leonardo di Caprio. O ministro do meio ambiente que é contra a natureza está numa fase exuberante (huahuahua): em dezembro, mudou a meta climática,na prática facilitando a devastação de biomas, depois, defendeu desmatamento ilegal e conseguiu a demissão do delegado da Polícia Federal que fez a maior apreensão de extração ilegal de madeira do país. Tuitaço é pouco. Precisa mais, assim como precisou pressão do STF para o Congresso ter coragem de montar uma CPI sobre a negligência do governo federal com a pandemia da Covid-19. Morreram 62.918 pessoas em março, e abril ameaça repetir. O Brasil se aproxima de 400 mil mortes. Mas o terraplanismo mental que cerca a ilumina o governo acha que lockdown e ações contra aglomerações prejudicam a economia e que não passam de desculpas para facilitar o comunismo (huahuahuahua). Diz que vender empresas públicas por muito menos do que o país investiu na sua construção é medida sábia. Empulha que liberar armas, incluindo semiautomáticas, à população (até seis por pessoa), é política de segurança pública. Justiça se faça ao tuiteiro ministro do ambiente. Há um ano, em 22 de abril de 2020, na histórica reunião mi-

do

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nisterial, disse que tinha que aproveitar o momento para “passar a boiada”. CPI é pouco. Impeachment é o mínimo.

acebook

os mais de cinco mil municípios brasileiros, 1.257 possuem menos de cinco mil habitantes. Com 4.000 mortos por dia, um número que ain-

da pode aumentar, podemos imaginar que um município está sumindo do mapa a cada dia... Fazendo um cálculo rápido com os 355 mil mortos até hoje, 71 municípios com 5 mil

habitantes teriam desaparecido... Mas como o governo Genocida tirou a verba do IBGE, este ano também não teremos o Censo que deveria ter sido realizado no ano passado... Mais um ano a nossa realidade ficará às escuras... (Marco Estivalete no dia 13 de abril de 2021)


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O avanço da miséria e da fome

Paulo Muzell é economista

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m um ano de pandemia os ricos ficaram mais ricos e os pobres ainda mais pobres. Segundo dados recentemente veiculados pela Forbes, no último ano o número de bilionários brasileiros (com mais de 1 bilhão de dólares) pulou de 45 para 65. Eles têm, somados, um patrimônio de R$ 1 trilhão e 300 bilhões, montante que corresponde a quase oito vezes o PIB do Rio Grande do Sul. Além da tragédia de registrarmos 4 mil mortes diárias por Covid, genocídio que decorreu da irresponsabilidade de Bolsonaro. As condições de vida da grande maioria da população, que já eram ruins, pioraram. O número de desempregados aumentou. São hoje mais de 14 milhões de pessoas. Outras 39 milhões trabalham na informalidade. Dados da FAO revelam que mais de metade da população brasileira (55%) vive uma situação de insegurança alimentar leve, moderada ou grave. Deste total, 30%, ou seja, mais de 63 milhões de

brasileiros em 17 milhões de famílias estão em situação de aguda insegurança alimentar. Em português claro, passam fome. Um governo minimamente responsável teria que assumir a tarefa de zerar a fome, fornecendo, pelo menos, uma cesta básica mensal por família. Este programa teria um custo mensal de cerca de R$ 7,6 bilhões mês, algo na faixa dos R$ 90 bilhões/ano. Ao invés desta efetiva resposta, Bolsonaro implementou um auxílio emergencial de somente R$ 250 por família (meia cesta básica, durante apenas quatro meses), um paliativo que não resolve nada. Quando veio a solicitação de manter os R$ 600 por família, a resposta foi que “não há dinheiro”. Mentira, há sim. Todos os anos o governo paga mais de R$ 1 trilhão de juros da dívida pública e pode arrecadar muito mais, taxando os bilhões e bilhões de dividendos distribuídos pelas empresas, hoje isentos, pode aumentar o ITBI causa mortis (transmissão de grandes heranças), taxar mais as operações financeiras, tornar mais justa e progressiva a tabela do imposto de renda na fonte, reduzir os subsídios e os incentivos fiscais.

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necropolítica

SUSpende a reforma

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Bruno Cruz é jornalista

e fosse piada, a Reforma Administrativa seria de mau gosto. E como toda piada sem graça, a Proposta de Emenda à Constituição nº 32 não poderia ter sido feita em hora pior. Não que exista algum momento oportuno para uma escrotice dessas, não tem hora certa para piada ruim. Mas aprovar a destruição do Sistema Único de Saúde (SUS) e de vários outros setores do Estado durante a pandemia vai para além do oportunismo político, isso é canalhice, lesa pátria e corrupção. Sim, corrupção, esse é o verdadeiro princípio que querem introduzir na Constituição Brasileira. O artigo 37, que fala sobre “Organização do Estado”, é o mais alvejado pela Reforma Administrativa de Paulo Guedes e Jair Bolsonaro porque trata dos serviços públicos oferecidos gratuitamente à população. Nele está escrito que a administração pública em todas as esferas “obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade”. Mas do jeito que a coisa vai, a partir da Reforma, deve ser acrescentado o princípio da reciprocidade, também conhecido como “toma lá, dá cá” ou, como prefere a milícia, o princípio da “rachadinha”. Acho até que para ser justiceiro, mas não justo, essa reforma não deveria ser chamada administrativa, deveria ser chamada de Reforma Queiroz.

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Rir para resistir e revidar


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terraplanismo mental

Dar porrada num bosta desses

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senador Jorge Kajuru (Goiás) ainda quando era do Cidadania, tentou acertar com Bolsonaro uma estratégia para defender o presidente na CPI da Covid. No diálogo terraplanista, combinaram de incluir governadores e prefeitos e até “peticionar o Supremo” porque senão a CPI faria “um relatório sacana” contra o governo. O presidente até cogitou de agredir o senador Randolfe Rodrigues (PSOL). Sabe-se lá com que intenção, Kajuru divulgou o áudio, Bolsonaro reclamou. O mais irônico é que ficou uma forte suspeita, que também foi noticiada, de que Bolsonaro sabia que haveria divulgação da conversa. “Só isso explica a falta de palavrões” argumentaram os desconfiados.

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O último general Moisés Mendes é editor do The Caverá Times

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olsonaro telefonava para Pedro Bial, para acertar uma entrevista sem detector, quando Augusto Heleno entrou no gabinete e foi logo anunciando: – Estou caindo da boca. – Que história é essa, meu? Heleno sentou-se e começou a se lamentar. – Você mandou 15 generais embora. Dispensou meus amigos comandantes. Botou na rua até o ministro da Defesa. Não dá mais. Bolsonaro levantou-se nervoso e começou a dizer que não é bem assim, para com isso daí, vamos conversar, você é o esteio desse governo. Augusto Heleno o interrompeu. – Eu sou o último general ao teu lado. – Os outros saíram porque quiseram. Este era um governo de vocês – disse Bolsonaro. Heleno não gostou da rispidez da resposta e também se levantou. – Nós fomos apenas teus empregados. – Não, senhor. Vocês são do esquema. Heleno ergueu a voz: – Do esquema são os milicianos. Bolsonaro argumentou que o projeto era de um governo militar, sustentado e orientado pelos militares. Heleno contestava e dizia que, se fosse assim, Bolsonaro não teria mandado um batalhão de generais embora. Heleno chegou mais perto de Bolsonaro e tentou se impor. – Você manchou a imagem das Forças Armadas. – Eu? – exclamou Bolsonaro em tom de deboche. – Olha o que você fez. Você forçou o Exército a produzir cloro-

quina. Transformou o Pazuello em vendedor de cloroquina. – Você vem dizer isso agora? Vocês são cúmplices de tudo – gritou Bolsonaro. Heleno dirigiu-se até a porta e Bolsonaro o chamou de volta. – Você não pode me abandonar. O Exército é meu. E precisamos aplicar o golpe. – Conheço essa conversa mole – disse o general, abrindo a porta. – Você vai se arrepender – gritou Bolsonaro. Heleno bateu a porta, que logo foi aberta de novo. Era Eduardo. – Pedro Bial quer entrevistá-lo amanhã sobre a organização do gol-

pe. A Globo está buscando patrocinadores. Bolsonaro sentou-se, passou a mão na cabeça e contou a Dudu que Heleno estava indo embora. Iria ficar sem generais para o golpe. Quando o filho pensou em abrir a boca para falar de uma ideia, Bolsonaro abriu a boca junto e os dois gritaram as mesmas palavras ao mesmo tempo. – Eureka!!!! Pazuello!!!! O filho saiu porta afora, Bolsonaro retornou ao celular e disparou um Whats: “Bial meu querido... estarei aí amanhã, com o Pazuello.... mas sem detector, talkei???? kkkkkkk!!!!....”


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Humor pela arte

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m hacker invadiu a redação virtual do Jornal Grifo e vazou um debate comprometedor ocorrido duante a edição deste último número: Não Identificado 1- Esse cartum não tá na pauta. NI 2- Mas é muito bom. NI 3- Ah, é. Não é só esse, têm outros. Engraçados! NI 4- Pois é, não tão na pauta, mas temos que usar. NI 5- Vamos criar uma editoria só para esse tipo de cartum. O cartum pelo cartum, só por ser engraçado. NI 6- Siiim!!! Mas não pode ser de direita. NI 7- Como vamos chamar? NI 8 - Só cartum. Pronto ...


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... NI retardatário: Tenho um cartum de um vírus com rabo de jacaré, dentes grandes, mas cariados…

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lanterna mágica

Canini, Re Nato

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Edgar Vasques

enato Canini foi (é) um imã. Sua verve sutil e humanista e seu desenho insuperável magnetizaram o olhar e a imaginação de gerações de leitores de todas as idades. Desde o começo, com 21 anos, ao criar personagens inesquecíveis na revista infantil Cacique, (editada pela Secretaria de Educação do RS), como as formigas Corta Corta e Ligeirinho, os indiozinhos Cacique e Tibica e o gauchinho Poncho Verde. Depois, migrado pra São Paulo, iluminou a referencial revista infantil Recreio e a revista Crás (ambas da Ed. Abril), onde criou a paródia faroeste de Kaktus Kid. Mas foi em Zé Carioca que Canini fez definitivamente a diferença: o papagaio, que no original, desde os anos trinta, tinha um ar holywoodiano e postiço, afinal se naturalizou brasileiro. No texto (primeiro com Ivan Saidenberg, depois solo) e no traço de Canini finalmente figuram favelas, trajes tropicais, mestiços e personagens novos (e nacionais). E restou inútil a velha sacanagem disneyana de não creditar as colaborações: o desenho de Canini é tão característico que por si só vale como assinatura... Esse desenho, impactante pela precisão e economia radicais, é perfeito para ilustrar seu humor, curiosa contradição entre a rigidez moral do “italiano” protestante e a malícia do moleque gozador. Mas, felizmente, toda vez que o moralismo e a piada se bicaram, in dubio pro riso, o humor venceu. O trabalho gráfico de Canini constitui uma das linhas mestras do desenho de humor brasileiro contemporâneo, ao lado de Nassara, Carlos Estevão, Ziraldo e Millôr, e essa estruturação simples e radical da linha há de seguir imantando os olhos, a cabeça e as mãos de desenhistas pelo tempo afora. É o Canini re nato.


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Biografia

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homenageado desta edição, Renato Canini, é gaúcho de Paraí (23 de fevereiro de 1936) e começou a desenhar profissionalmente no final dos anos 1950, ao ser contratado pela Secretaria de Educação e Cultura do Rio Grande do Sul, ao mesmo tempo em que produzia tiras e charges para imprensa gaúcha. Morou um tempo em São Paulo, mas por saudade, retornou a Porto Alegre e da capital gaúcha eviava por malote da Editora Abril os desenhos da personagem que lhe deram fama nacional, o Zé Carioca (isso durante cinco anos, no início da década de 70). Entre as suas criações estão Kaktus Kid, um caubói, o psiquiatra dr. Fraud, o indiozinho Tibica,e algumas variações regionais do Zé Carioca. Uma das últimas personagens foi Ozelefante, produzido especialmente para o blog Tinta China, da Grafar. Faleceu em Pelotas, aos 77 anos (30 de outubro de 2013).


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América do Sul em transe

No Peru, em contexto de intenCarlos Roberto Winckler sidenciais, com Luis Arce, no primeiro turno. Manteve maioria na Assem- sa crise institucional e fragmentação é sociólogo

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s eleições recém realizadas ou ainda em curso no Peru, Bolívia e Equador, em meio à catástrofe da pandemia, sintetizam em sua dramaticidade os impasses do continente. Retomada do progressismo na Bolívia, retorno do neoliberalismo no Equador, radicalização esquerdista no Peru ou retorno do fujimorismo como mal menor. Os três países têm em comum alta proporção de povos originários na população, fragmentação territorial, desigualdade social, a sempre presente antinomia entre burguesia e Nação, uma economia agroexportadora e extrativista com maior ou menor proporção de danos ambientais acumulados, tema recorrente nos debates públicos e que permeia a crítica de cosmovisões dos povos originários. Na Bolívia, o MAS (Movimiento al Socialismo) venceu as eleições pre-

bleia Legislativa Plurinacional, apesar de derrotas para dissidências indígenas em algumas regiões. A direita teve resultados modestos, regionalmente localizados, depois da tragicomédia do golpe de 2019, de curta duração. No Equador, o candidato presidencial da direita neoliberal, Guillermo Lasso, com pequena base partidária, venceu Andrés Araus, da União pela Esperança, representante da Revolução Cidadã capitaneada por Rafael Correa, próximo a Lula. O resultado, em boa parte, foi definido pela campanha pelo voto nulo do terceiro colocado Yaku Perez, liderança indigenista, apoiado pelo Movimento de Unidade Plurinacional, que expressou a insatisfação por equívocos acumulados pelos governos de Correa e do trânsfuga Lenin Moreno, vice que rompeu com Correa. Apesar da derrota, a União pela Esperança conquistou a maioria relativa dos assentos no Congresso, secundada pelo Movimento de Unidade Plurinacional.

política, disputará o segundo turno o professor e sindicalista Pedro Castillo -do partido Peru Livre, que se autodenomina marxista-leninista e marieteguista, com votação expressiva nas regiões mais pobres do norte e sul peruanos- contra Keiko Fujimori, da Força Popular, que defende a herança neoliberal autocrática de seu pai. Peru Livre e Força Popular são os dois partidos com maior representação em um Congresso com alto grau de dispersão política. O candidato do Peru Livre defende um maior protagonismo para o Estado, uma nova Constituição, economia popular com mercados, aumento expressivo de impostos de empresas estratégicas, aumento de gastos sociais, além de visão socialista convencional nas questões de gênero. O outro Peru, talvez, com ecos senderistas, o que é negado por Castillo. Como Nação inconclusa, os dilemas de nossos, imaginariamente distantes, coirmãos têm muito a nos dizer.


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“O humor nos aproxima” Paulo de Tarso Riccordi

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ichel Moro Gómez (32 anos) foi o grande vencedor da XXII Bienal Internacional de Humorismo Gráfico de San Antonio de los Baños, Cuba, realizada de 11 a 14 de abril. O Moro do bem papou o grande prêmio de humor, pela “nota requintada e muito pessoal” de seu trabalho. Levou ainda o primeiro lugar em quadrinhos de humor e o segundo lugar em caricatura. Foram 1.702 inscritos, de 53 países, examinados por um júri de grandes cartunistas de Cuba, Venezuela, Iraque e a norte americana Lizza Donnelly, presidido pelo cartunista Ares – Aristides Hernández. A premiação nas várias categorias indica uma forte presença do leste europeu e, crescentemente, do Irã: Miroslav Jacovljev (Sérvia), Jia Ruijun (China), Luc Descheemaeker/O-Sekoer (Bélgica), Víctor Vélez (México), Martín Alejandro Falloca (Argentina), Mariam Avramescu (Romênia), os colombianos Juan Camilo Lopera, Raúl Fernando Zuleta, Omar Alberto Figueroa, os iranianos Elham Khalili Mehr, Dariush Mehrdalan e Bahram Arjomandnia os ucranianos Konstantin Kazanchev, Vladimir Kazanevsky, Valery Momot e Vladimir Kazanevsky, mais Manuel Arriaga (Espanha), Igor Vartchenko (Chipre) e os cubanos Osvaldo Gutierrez, Brady Izquierdo, Yoemnis Batista del Toro, Ismael Lema e Reynaldo Hernández. A arte de todos pode ser encontrada no Facebook e no Instagram. A Bienal Internacional de Humorismo Gráfico é organizada pelo Círculo de Humoristas e Historietistas da Unión de Periodistas de Cuba, pelo Museu de Humor de San Antonio de los Baños e pelo Ministério da Cultura. A edição de 2023 será dedicada às artistas gráficas de humor, com um júri integralmente composto por mulheres.


diabo rosa PALAVRAS DA SALVAÇÃO Pronto! É só dar de comer a um miserável, que ele já vira dependente químico... Comecei um curso de Russo. Na oitava vodca a pronúncia melhora bastante.

bier

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QUADRINHA TORTA Hombre mui or ganizado Era o Padre Go dofredo: De manhã ia p ra igreja, De tarde pro ch inaredo.

É verdade que, quando uma galinha desencarna, ela vira alma penada? Se tiver alguém pedindo dinheiro em meu nome, verifique se não sou eu mesmo. Solidariedade no palácio: ninguém solta o pau de ninguém! O sultão muçulmano que libertou Jerusalém em 1184 foi Saladino, assim chamado porque comia muita alface, pimentão e azeitona. Preciso arrumar logo uma faxineira. Os ratos adoeceram e as baratas começaram a varrer a casa. Pra que ter medo da morte, se os outros é que vão pagar o enterro? Perereca é um animalzinho molhado que gosta de pular em cima da cama. É impressionante como o Alzheimer acomete pessoas que pegam dinheiro emprestado. As chamadas “forças vivas da sociedade” são geralmente as muito vivas! Acidente com carro fúnebre sempre tem morto no meio. A cidade tá fedendo a esgoto. Quando vão tapar a prefeitura? Pequenas empresas, grandes negócios: Proctologia Olho Mágico e Lutero Reformas. Comprei um semivelho por seminovo.

MAIS QUENTE QUE FIOFÓ DE GALINHA CHOCA...


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quer que desenhe?

schröder

Autoajuda informativa

J

ornalismo não foi criado para dar boas notícias, ao contrário, o capitalismo precisava de um espaço de crítica para se estabelecer. Assim surgiu a esfera pública com a imprensa representando a opinião crítica deste. Ao optarem por transformarem seus negócios de jornalismo para publicidade e entretenimento - quando não venda de queijos e vinhos ou proselitismo religioso- as empresas de jornalismo adotaram a auto-ajuda como gênero. As capas de Zero Hora a partir de novembro viraram manifestos de desejos e esperança num capitalismo que suicidou-se em 2016 e foi enterrado em 2018, substituído pela acumulação primitiva assentada na força e na estupidez. A manchete de hoje, 5 de abril de 2021, traz todos os indicativos do fim do jornalismo nesta empresa. Primeiro repete o lero-lero otimista que tenta reverberar num mercado

Quer que escreva?

inexistente composto de arremedo de capitalistas que parasitam o estado exploram seus empregados até o tutano do osso. Depois, Zero Hora alterna chamadas-desejo de aceno para seus sócios capitalistas com chamadas-realidade que o resquício de jornalismo ainda obriga. Aproveita para reforçar o discurso de que a crise econômica é fruto exclusivo da pandemia e não do pacote recessivo de Temer e do desgoverno de Bolsonaro. Finalmente, no nível da linguagem, a manchete abandona a necessária precisão que caracteriza o jornalismo para patinar num relativismo gosmento cada vez mais difícil de suportar. No primeiro semestre da faculdade aprendi com Antonino Gonzales que em jornalismo não existe perto ou longe e sim as medidas precisas que apresentem as distâncias que serão avaliadas pelo público.

O leite melou

Piada pronta e mórbida

O cinema de mestres Dois filmes do Vittório De Sica, “Milagre em Milão”, de 1951 e “Ladrões de Bicicletas”, de 1948 de Vittorio de Sica e outros dois de Roberto Rosselini, “Roma, Cidade Aberta”, de 1945 e “Alemanha, Ano Zero” preencheram meu domingo, na comemoração do Cult dos 125 anos do cinema. Estes filmes representam o chamado neorrealismo italiano e são a expressão artística de uma Itália e Alemanha miseráveis, destruídas pela guerra. “Milagre em Milão” é uma alegoria já mais esperançosa de um diretor e ator de expressão universal. “Ladrões de Bicicletas” é um dos melhores filmes da história do cinema. Belo, cru e desesperançado é um filme imperdível. Os filmes de Rosselini são precisos, lindos e compreensivelmente amargos. O suicídio infantil em “Alemanha, Ano Zero” é uma das cenas mais duras e tristes da história do cinema.


texto&traço

lu vieira & rodrigo schuster

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Quem vê cara vê coração

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nergúmeno! Que palavra maravilhosa, essa. Já diz a que veio na sua sonoridade. A língua, em energúmeno, não é como uma bailarina que fica dando rodopios pela boca. Não, não, não. Em energúmeno a língua é uma soldado no campo de batalha. Ela fica abaixada, rapidamente se levanta, solta uma rajada e volta a se esconder atrás dos dentes-trincheira. A palavra preenche a boca toda, pesada e ressonante como os atos de quem ela define. Energúmeno significa imbecil, boçal, desatinado. Para evitar repetição de palavras pode se usar seu principal sinônimo: Jair Bolsonaro. Nunca houve um energúmeno tão energúmeno como o atual presidente do Brasil. Vocês viram a cara de Jair Bolsonaro recentemente? Viram a tris-

teza no olhar, a opacidade da pele, as marcas da privação do sono? Pois é, eu também não. Se eu fosse chefe de estado de um país onde uma única doença está matando mais de três mil pessoas por dia, eu teria um olhar abatido e olheiras profundas, e não a pele de quem está dormindo oito horas por dia de um sono tranquilo e revigorante. Não que Bolsonaro tenha uma cara saudável e agradável, mas a questão é que ele não mudou nada nos últimos doze meses. Qualquer não energúmeno que estivesse no lugar dele teria envelhecido “dez anos ou mais nesse último mês”. Porém Jair Bolsonaro, o presidente da Necrolândia, ostenta a serenidade de quem está alcançando seus objetivos, enquanto o combo de contágio rápido e vacinação lenta faz o Brasil

O albúm MENINA DE CIRCO reúne histórias em quadrinhos sobre causos da infância e juventude de Santiago no pampa da fronteira com a Argentina. O livro tem 60 páginas a cores de aquarela e pode ser autografado pelo próprio cartunista gaúcho. O exemplar custa R$ 35 e poder ser solicitado pelo e-mail: macanudosantiago@gmail.com Divirta-se!

desenvolver cepas mais fortes que as do resto do mundo. Ninguém mais segura esse país!

Canção do Exílio Pandêmico Minha terra tem uma cepa, Que em todos vai pegar; Os coronas que aqui matam, Já não matam como lá. Nosso solo tem mais covas, Nossos hospitais só cloroquina, Nossos bancos são governo, Nosso governo não vacina. Em googlar, sozinho, à noite, Mais casos encontro eu lá; Minha terra tem uma cepa, Que em todos vai pegar.


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josé weis

Poemas datados ou nem tanto assim Modelo vivo (à galera do Cartum Café) Ela posa tal e qual veio ao mundo com bico de pena, lápis de grife ou crayon na mão, ilustres ilustradores tentam decifrá-la outros apenas bebem ou babam.

Epitáfio para o genocida Era um perna de pau, tinha cara de mau um caráter que não servia nem para cunhado nunca amuou mulher distante, muito menos a próxima incompetente para agir inapto para amar insensível para servir nunca passou do morto-vivo que se foi.

Véspera Se acaso ela voltasse amanhã, eu cancelaria os compromissos do dia Se acaso ela voltasse amanhã, eu a convidaria para dançar Se acaso ela chegasse amanhã, tudo seria uma cantoria; “Começaria tudo outra vez...” (a canção de um Sísifo) ...se ela acaso ela voltasse. A boina de meu pai Um jornal celebra o centenário do cineasta Ingmar Bergman, na fotografia ele está de boina lembrei-me de meu pai, que também usava boina e que também estaria completando cem anos, nos dias úmidos, usava boina até dentro de casa “é por causa da sinusite”, se justificava Bergman, seus filmes e sua boina A sinusite do meu pai e sua boina.

A invasão Muita gente morria mais de três mil por dia falecia um filho, um pai podia até ser a tua tia ou outra mãe que partia partiam muitos viventes artistas, amigos, parentes pura agonia, maldita pandemia.

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Natureza viva...

rabiscos


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Cabeças flutuantes Lu Vieira

Eugênio Neves


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Eugênio Neves

artes drásticas


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