Acontece 193 - Ed. abril de 2018 - turma 2D11

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JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE - ANO XIII - ED. 193 - ABRIL / 2018

LIBERDADE: UM PEDAÇO DO ORIENTE EM SP - p. 7

LEIA TAMBÉM NESTA EDIÇÃO:

FAROL SANTANDER REVITALIZA O CENTRO - p. 4 ONG PROMOVE EDUCAÇÃO INCLUSIVA - p. 5

O GRAFITE OCUPA NOVOS ESPAÇOS Por Daiana Pereira - p. 6

CONTRACEPTIVOS DE GRAÇA NO SUS - p. 9 A UNIVERSIDADE PÚBLICA É PARA TODOS? - p. 10


A nova febre de São Paulo Raí Fernandes

Hamburguerias vêm conquistando clientes com qualidade, preços acessíveis e decorações temáticas Leonardo Simões Raí Fernandes

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o lugar das redes tradicionais de fast-food, começam a se popularizar, em São Paulo, bares e restaurantes com cardápio especializado e decoração inspirada em símbolos da cultura pop. Muitas têm feito tanto sucesso que longas filas se formam em suas portas. Os temas são variados: desde aqueles voltados ao público LGBT até inspirações nos Vikings e no mundo nerd espacial. Uma das mais conhecidas na capital é a Big Kahuna, localizada nos Jardins e inspirada no renomado diretor cinematográfico Quentin Tarantino. Para André Santos, 28 anos, gerente do establecimento, o nome é inspirado em um restaurante do filme Pulp Fiction. E essa é uma das razões para os fãs serem apaixonados pelo local. O cardápio é relacionado a filmes e personagens cômicos dos filmes do diretor, e o exemplo mais caro é o lanche Ezekiel 25:17, inspirado em uma cena de ação do filme. O sanduíche conta com 5 hambúrgueres e 10 fatias de bacon, totalizando um valor de R$ 99,80. E acompanha uma camiseta exclusiva com a foto do lanche e de quem conseguiu finalizar a iguaria hipercalórica. Saindo da cultura pop, vamos para a Taverna Medieval, uma lanchonete dedicada ao mundo dos Vikings que chega a ter 2 horas de espera. O ambiente tem uma decoração própria, com espadas nas paredes que os clientes podem pegar para tirar fotos, e funcionários fantasiados de duendes e cavaleiros. A aceitação dos clientes é muito positiva. Para Italo Penarotti, 22 anos, “a taverna é um ambiente muito legal pelo fato de ser algo completamente diferente de tudo que eu já vi, é um ambiente muito divertido e muito familiar. O lugar é enfeitado com diversas coisas para você se impressionar

Hamburgueria inspirada em Quentin Tarantino

ao entrar e ficar encantado, realmente dá a impressão de voltar para a idade média”. Uma opção perto do Mackenzie é a Zeca’s Burguer. Ambiente muito popular e aconchegante no bairro, a hamburgueria tem o tema do rock’n roll, com shows ao vivo de covers do gênero várias vezes por semana. Para Elizabete Telles, 48 anos, uma das sócias do local, a lanchonete tem uma faixa etária bem variada pois o rock une todas as gerações. Com o menu do local sendo inspirado em diversas bandas, o lanche mais popular é o Motörhead. Ele é também o mais reforçado, pois conta com dois hambúrgueres, bacon e molho barbecue. A faixa de preço dos locais fica na média de 30 reais. Apesar de os valores serem semelhantes aos praticados por redes de fast-food, o maior diferencial é o que se tem no local não só pela temática, mas também com promoções exclusivas, como a de Páscoa, na qual o cliente compra um lanche e ganha um pote de sorvete. Além disso, outro ponto a ser destacado é a qualidade dos produtos. Muitos dos clientes citaram o consumo de um

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hambúrguer saboroso de “verdade”, destacando-se pela qualidade dos ingredientes. Um ponto negativo é o tempo de espera, muitas vezes longo demais, além da demora no preparo.

Jornal-Laboratório dos alunos do segundo semestre do curso de Jornalismo do Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie. As reportagens publicadas nesta edição não representam a opinião do Instituto Presbiteriano Mackenzie, mas dos autores e entrevistados das reportagens. Universidade Presbiteriana Mackenzie

Centro de Comunicação e Letras

Diretor do CCL: Marcos Nepomuceno Coordenador do Curso de Jornalismo: Rafael Fonseca Supervisor de Publicações José Alves Trigo

Editor: André Santoro Impressão: Gráfica Mackenzie Tiragem: 200 exemplares.


Vamos ao cinema juntos? Grupo de cinéfilos reúne pessoas para assistirem a filmes de uma forma diferente Brenda Vieira Pietra Mesquita

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sétima arte é a segunda atividade cultural mais procurada por brasileiros, de acordo com pesquisa realizada em 2016 pela Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio-RJ). Pessoas das mais diferentes idades têm crescido culturalmente com suas idas ao cinema. Mas parece que ficar no “escurinho do cinema, longe de qualquer problema” não é a mesma experiência quando o cinéfilo vai sozinho. A partir desse pensamento surgiu o grupo “Vamos ao cinema juntos?”, que há um ano reúne pessoas com uma paixão em comum para assistir a filmes e proporcionar momentos de descontração e eventualmente novas amizades. Tudo começou quando Gleison, 24 anos, idealizador do grupo, coordenava um projeto em que convidava as pessoas a praticarem inglês no trem. A potencialidade em unir pessoas com interesses em comum já era vista ali. Então, como

Bate-papo antes da sessão de cinema

52° encontro do grupo para assistir ao filme Tomb Raider

um amante da sétima arte, sentiu o desejo de unir cultura cinematográfica e calor humano, mas para isso acontecer precisava de um empurrão. Em parceria com Kíssila Machado, 28 anos, e Felipe Dantas, 26 anos, amigos que conheceu por meio de um aplicativo, conseguiu organizar encontros que agora contam com uma média de vinte pessoas por evento. Ao todo, já foram mais de 50 filmes assistidos por uma equipe de mais de 10 pessoas. O crescimento do projeto também se dá pelos eventos temáticos que os organizadores realizam através de um grupo no Facebook. “As pessoas novas costumam achar novidades, porque sempre procuramos inovar”, afirma Felipe Dantas. “Fomos ver ‘O rei do show’ com mais ou menos 40 pessoas e logo depois fomos a um karaokê. Foi uma noite memorável!”, conta. O grupo, na capital paulista, se encontra sempre em cinemas e shoppings conhecidos da cidade. E, apesar de ser sediado em São Paulo, tem integrantes de todas as partes do Brasil e até de fora. Esse é o caso da Camila Grande, 24 anos, que faz medicina em Buenos Aires. A estudante veio passar férias no Brasil e, por não ter amigos na cidade, se juntou ao grupo para ir ao cinema e gostou da experiência. “Eu

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estava procurando algumas pessoas para fazerem alguma coisa comigo e terem algo em comum”, disse. “Achei todos muito legais e há também a facilidade de se identificar com as pessoas que estão aqui porque elas gostam da mesma coisa que você”, afirma ela ao participar de seu terceiro encontro no grupo. Além de unir cantos do mundo, o grupo também une gerações. Dilte Xavier, 51 anos, foi ao seu primeiro encontro em março deste ano. Ela se interessou porque o grupo conecta duas coisas de que ela gosta muito: cinema e compartilhar coisas com as pessoas. “É minha primeira vez. Vim ver como funciona e quero vir de novo, eu gosto de estar com as pessoas. Não entendo muito de cinema, mas eu estou aberta a viver experiências novas”, diz. Embora o grupo seja sobre cinema, os integrantes não buscam apenas debater sobre o universo dos filmes, tampouco restringir os encontros a pessoas que entendam sobre o assunto. Para eles, o importante é a pluralidade de vivência e ideias. “Seria chato se fosse todo mundo igual”, diz Dantas. Segundo ele, a mistura de culturas e experiências é um ponto positivo e com isso “um pode aprender com ou outro”.


Farol Santander revitaliza o Centro Espaço foi aberto ao público no Edifício Altino Arantes, antigo prédio do Banespa Joice Martins Letícia Damásio

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naugurado no aniversário da cidade de São Paulo, 25 de janeiro, o Farol Santander caracteriza-se como uma nova referência cultural na cidade. Com o intuito de “ocupar” o Centro, o espaço convida os visitantes a saírem de seus bairros, ou até mesmo cidades, para vivenciar novas experiências. Projetado com a preocupação o moderno e o antigo coexistem dentro do edifício. As memórias são relembradas por meio das exposições históricas, seguidas pelo presente com a imersão no mundo artístico contemporâneo, e por fim aponta para o futuro, com a vista panorâmica da metrópole paulista. Cada instalação instiga o visitante a refletir sobre sua própria vivência na cidade, como a exposição temporária “Diurna”. “Essa sala, juntamente com a exposição ‘O Dia que Saímos do Campo’, está aqui para que repensemos a nossa interação com os espaços da cidade”, comenta Mariana Ávila Dutra, 26 anos, monitora de artes do Farol Santander. “A região central da cidade é muito rica em equipamentos públicos, principalmente culturais e turísticos, mas bastante degradada”, diz Caroline Afonso Manolio, 19 anos, estudante do 3º semestre de Arquitetura da FAU-USP. Sendo uma das obras, de caráter privado, do projeto de revitalização do Centro, a reabertura do edifício incentiva a reocupação da região. “A revitalização seria interessante em vista da boa infraestrutura de mobilidade, assim como do acervo cultural presente na região”, completa Gabriely Capua Pereira, 19 anos, estudante de Arquitetura da Unip-Norte. Apesar de não ser mais tão valorizado, o Centro já foi uma região de intensa concentração de capital. Famílias cafeeiras moravam no local e investiam em construções monumentais, como o edifício Altino Arantes, que foi inaugurado em 1947 para

Exposição permanente 360º, de Vik Muniz, presta homenagem ao edifício

sediar o Banco do Estado de São Paulo (Banespa). A construção foi inspirada no Empire State Buiding de Nova York (EUA), sendo por mais de uma década o prédio mais alto da cidade, superado apenas pelo Mirante do Vale em 1960. Na tentativa de resgatar o prestígio da região, três projetos de revitalização, apenas nos últimos quinze anos, já passaram pela prefeitura, porém nenhum foi concretizado. “O projeto Nova Luz, da gestão Kassab-Serra, era gentrificador (com características de substituição de populações mais pobres por outras de maior poder aquisitivo), pouco ligado às questões sociais e de habitação, além de ser de caráter inconstitucional, por promover desapropriações para uso privado. O projeto Centro Novo, do atual prefeito, também parece problemático por ser fortemente direcionado ao setor imobiliário, além de ser higienista e muito ligado à linha estética. Já o PPP da gestão Haddad aproxima-se mais do projeto ideal, por focar realmente numa recuperação da ocupação do centro através de habitações de interesse social, porém não foi de todo bem sucedido”, relata Caroline. “Pensar nessas políticas públicas é pensar em gestão e interesses políticos. Dessa forma, quando há uma troca de prefeitura, toda a discussão sobre as questões

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urbanas retorna à estaca zero”, retoma Gabriely. Mesmo com muito a se desenvolver ainda na região, o Farol Santander representa uma esperança para a revalorização do Centro. “O Banespa a gente já conhecia, mas nunca tinha entrado. Achei muito bom terem aberto para visitação, já que era um prédio que estava praticamente parado”, diz o visitante Luís Bernarde, 67 anos, aposentado.

Vista da metrópole paulista do 22o andar


Projeto social recebe estrangeiros em SP Mexicana é uma das intercambistas que vieram para ensinar línguas em ONG na Vila Umarizal Thais Paiva

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onge do centro da cidade, a ONG CCA Quadrangular abriu suas portas para receber até agosto deste ano intercambistas de todo o mundo que realizam um projeto social com as crianças que frequentam o local. Organizado pela AIESEC, movimento que tem o objetivo de desenvolver a liderança jovem por meio de intercâmbios, Camila Dalcin, líder de projetos para Intercâmbios Sociais, nos explicou que os projetos são desenvolvidos de acordo com as necessidades da ONG. “Os projetos têm que ser alinhados com o que eles precisam. Por exemplo, em ONGs com crianças podemos trabalhar com todos os projetos, o desenvolvimento desses projetos e companhia de jovens de diversas culturas podem gerar um impacto maior na vida delas”. Um dos projetos que acontecem nesse período na cidade é o X4Change, que se baseia em ensinar idiomas, espanhol e inglês, assim assegurando a educação inclusiva e de qualidade e promovendo oportunidades de aprendizagem ao longo da vida. Conversamos com Adriana Santabárbara, mexicana de 24 anos

Aulas descontraídas e movimentadas

Em uma folha sulfite, menino anota as palavra aprendidas

que trabalhou no projeto por seis semanas. “Eu escolhi esse projeto principalmente porque gosto muito de trabalhar com crianças, em segundo lugar porque me interessa aprender idiomas e o português é um dos meus objetivos”. Em seu primeiro dia de trabalho não foi direto para as aulas, pois no planejamento do projeto está a exposição de culturas diferentes além do ensino, e foi assim que começou o contato. Contou que levou doces mexicanos e cada criança reagiu de uma maneira. Porém, ela sente que a primeira impressão que gerou foi muito além do sabor prazeroso ou não. “Nós, quatro meninas, duas mexicanas, uma peruana e uma boliviana, chegamos e nos apresentamos; eles, as crianças, nos olhavam estranho, porque falávamos em espanhol, e outros com curiosidade. Desde esse momento acredito que começou um impacto porque se deram conta que do outro lado do mundo as coisas são diferentes”. Ela acredita que essa divergência de culturas é o maior impacto que causou, e comentou como as crianças necessitam que sua curiosidade seja aguçada. “O objetivo desse projeto é ampliar o panorama das crianças, fazer elas saberem que tem todo um mundo para conhecer e que elas não precisam viajar para conhecê-lo. Que aprender uma língua diferente pode abrir portas. E que outros lugares se

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interessam pela cultura brasileira”. Para Adriana o que surpreende em São Paulo é a desigualdade social. “A desigualdade é um problema porque, a meu ver, São Paulo não é uma cidade pobre, o Brasil não é pobre, tem tudo que é necessário para que sua gente, toda sua gente, viva bem. A importância de colocar atenção nas crianças é vital para que em um futuro São Paulo seja capaz de combater a violência que se vive não apenas na cidade, como no país”. Questionada sobre como seu trabalho mudou a cidade, Adriana disse que acredita ter sido pouco, mas o importante é contribuir com seu ‘grão de areia’. Ela acredita que o mais importante é o maior número de pessoas estarem levando a sério projetos como esse e que em um futuro darão resultados. Sobre como mudou o lugar que trabalhou, relata que sua maior alegria foi ver que, quando os novos intercambistas chegaram, as crianças já não os achavam diferentes, os olhavam com entusiasmo e muitas perguntas. Do Brasil ela leva um pouco de sua história, a alegria, a simpatia das pessoas que encontrou no caminho, o ritmo das músicas e a deliciosa comida. “Além disso levo com muito carinho as lembranças de muitos pequeninos e o desejo de que os pais de muitos deles mudem e lhes deem a atenção que necessitam”.


Os grafites não acabaram A retirada das pinturas da Av. 23 de Maio não impediu a manifestação dos artistas Daiana Rodrigues Pereira

Representaçao do ciclismo em São Paulo

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m janeiro de 2017, logo após sua posse na Prefeitura, João Doria provocou polêmica ao apagar os grafites da Av. 23 de Maio. Segundo ele, as pinturas estavam danificadas, apesar de muitas terem condições de serem preservadas. Ronah Carrero, 47 anos, formado em artes plásticas, também pintou na avenida e diz que, apesar de o grafite ser efêmero, sentiu muito ao ver que sua obra tinha sido tirada. Ela tinha lembranças de sua filha que nasceu exatamente no momento que ele estava na avenida fazendo o painel. Bruno Smoky e sua esposa e colaboradora artística Shalak Attack moram atualmente em Toronto e continuam disseminando os grafites por outros países, apesar da retirada de suas obras na 23 de Maio. Ele diz: “O fato de terem apagado é normal até para mim, mas eles sabendo que todo

aquele trabalho foi pago e feito por mais de 500 artistas/pessoas/trabalhadores, é bem frustrante”. Ainda no mês de janeiro do ano passado, o prefeito anunciou a criação de um “grafitódromo”, um espaço específico para os grafites que seria instalado na Mooca. Mas um dos únicos espaços destinados a isso atualmente é o Museu Aberto de Arte Urbana (MAAU), que fica perto da rodoviária do Tietê. O espaço tem novos grafites, mas está descuidado, e a única coisa que identifica o ambiente é uma pequena placa indicando o MAAU. Após a repercussão e revolta da população com os grafites, Doria disse, em entrevista realizada em setembro de 2017, que ia ampliar o museu de arte de rua, o que, no momento, sete meses após a entrevista, não parece ter sido realizado. Ele também citou a criação de cursos de grafite. Sobre o grafitódromo, Ronah argumentou: “Eu acho válido, pode ser mais um espaço, mas o grafite em sua essência não vai deixar as ruas”. Embora tenha tido repercussão ao longo dos meses, o assunto foi deixado de lado. Agora, em 2018, muitas pessoas dizem que gostaram do resultado final, a criação de jardins verticais. Entre os entrevistados, a principal resposta para isso é porque deixou a avenida com aparência de

mais limpa. Para Alexander Albano, 37 anos, policial civil, a avenida fica com a aparência mais bonita com o jardim, pois os grafites a poluíam visualmente. Para ele, os grafites são uma expressão artística, mas a prefeitura deve escolher lugares corretos para eles. Já para Diego da Silva, 29 anos, a mistura do jardim com os grafites seria uma boa ideia, pois há espaço para a natureza e a arte”. Um ano após o acontecimento, os grafites não acabaram e estão se popularizando rapidamente, mas de uma forma diferente. Agora os grafites estão tomando espaço nos prédios particulares. “Isso é uma tendência mundial, e não é de agora. Tive amigos que foram pintar na Holanda em 2008. Acho que é uma tendência mais de fora do que aqui. Há muito tempo, em São Paulo, já havia murais, campanhas publicitarias pintadas a mão e tudo mais. Isso na década de 80”, diz Ronah. Entre os artistas que se destacam nesse aspecto está Eduardo Kobra, com seus grafites espalhados por São Paulo. Na avenida paulista, há um mural de Oscar Niemeyer. Na Avenida Pedroso de Morais, Chico Buarque e Ariano Suassuna dão cor ao prédio da Fnac. E na avenida Faria Lima foi escolhido um casal andando de bicicleta e convidando os paulistanos a andarem pela cidade também, em um prédio de 60 metros de altura.

Museu de arte de rua na avenida Cruzeiro do Sul ganha novos grafites

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Tradição oriental em São Paulo Bairro da Liberdade reúne cultura, gastronomia e muitas histórias de vida

Mariana Oliveira

Maiza Costa Mariana de Oliveira

Rubens vende fontes que ele mesmo faz

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anter todas as tradições de um povo ao pé da letra em um país tão grande e miscigenado como o Brasil não é algo fácil. No bairro da Liberdade, onde se encontra uma das maiores colônias japonesas desde 1912, quando houve a chegada de uma das principais levas de imigrantes daquele país, podemos ver e desfrutar dessa rica cultura. Comidas, roupas, objetos de decoração e de superstição, massagens e tratamentos para relaxar o corpo são apenas alguns exemplos que podemos achar no local, sendo em feiras abertas, galerias ou até mesmo em parques, como o Jardim Oriental. O comerciante Rubens Yeassuo Tayama, de 70 anos, trabalha há 3 anos vendendo fontes de bambu feitas por ele mesmo. Com a esposa debilitada, sem poder trabalhar, e os filhos fora de casa, o senhor de pais e sogros japoneses conta: “Essa mistura de brasileiros com japoneses é muito comum, os pais nem conseguem proibir mais o casamento, quando quer casa mesmo”. Ele ainda afirma, sobre suas tradições japonesas na sua casa: “é pouco, abrasileiramos muito”.

Sueli Naoi Matai, 50 anos, de Jundiaí, é casada e tem duas filhas, uma com 21 anos morando no Japão e outra, Débora, de 14 anos, que mora com o casal. Ela, que morou no Japão, fala que aquele país é muito machista e diz que sua filha, que mora lá nos dias atuais, achou o mesmo. Ela também conta por que veio para o Brasil, já que seus pais ainda moram no Japão. “Voltei porque meus pais queriam fazer a tradição do Miai”, diz ela, referindo-se aos casamentos arranjados que ainda são comuns entre algumas famílias japonesas. A mestiça de 50 anos explica o motivo de sair de Jundiaí para vir até São Paulo: “Sempre estamos aqui na Liberdade para fazer mercado, nossa alimentação ainda é bem japonesa, comemos de forma muito saudável”. E motivo para ela e sua família gostarem da Liberdade? “Tem uma grande variedade e qualidade de alimentos, todos frescos, alguns vindos do Japão”, diz. Sobre a cultura e a tradição japonesa presentes no bairro, ela fala: “No próprio bairro, nas ruas mesmo a tradição não é mantida, os alimentos sim, mas não passa nem perto de parecer com alguma rua do Japão, falando esteticamente, na limpeza e no jeito das pessoas”. Anderson Issamu Koshima, de 35 anos, casado com uma brasileira, tem uma barraca de comidas típicas japonesas que irá completar

um ano e meio no bairro da Liberdade. Sendo da segunda geração, pois seus avós vieram com a imigração, ele conta: “ Meus pais mantêm algumas tradições, como a alimentação bem mais saudável do que na minha casa com minha esposa. Eles também são mais reservados e mais calmos”. O jovem Anderson, que acha que com as gerações vão sendo perdidas muitas das tradições, diz: “Querendo ou não a cultura japonesa é bem rígida, aí o pessoal mais novo tenta sair”. Ele finaliza: “O que eu mais sinto são brasileiros querendo incorporar a cultura japonesa e os japoneses meio que saindo da cultura”. Podemos perceber o quanto a cultura japonesa é grande, o difícil mesmo é mantê-la. O estudante de nutrição da USP Guilherme Maeda, 21 anos, que trabalha na barraca da família vendendo doces de feijão. Ele participa da quarta geração, trabalha ao lado de seu pai Pedro Maeda, seu avô e seu tio. Ele diz que na casa da família ainda restam algumas tradições, como de tirar o sapato antes de entrar e as comidas. O jovem estudante também fala: “Não morei no Japão mas passeei, e é muito diferente a tradição. Mesmo estando em um bairro temático japonês ainda tem diferença, mas as comidas chegam muito perto”. Infelizmente, as tradições, e costumes de cada povo vão se perdendo conforme aumenta a distância de casa.

Visão do bairro logo na saída do metrô Liberdade

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Viajar para fazer o bem Estudantes relatam como a experiência do trabalho voluntário transformou suas ações Mariana Apolinario Natália Peixoto

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trabalho voluntário no exterior, realizado por conta própria ou por intermédio de uma agência, cresceu entre os jovens brasileiros devido a benefícios como aumento da bagagem cultural, aperfeiçoamento de um segundo idioma e impactos positivos para a comunidade local. Empresas de intercâmbio como AIESEC, STB, Exchange do Bem, CI e Egali atuam como mediadoras da viagem ou diretamente em países da Ásia, África e América Latina. As agências oferecem projetos de no mínimo três semanas, que atendem desde crianças até idosos carentes, com deficiências ou necessidades especiais. Os valores variam conforme o local escolhido e o tempo de estadia. “Esse tipo de intercâmbio está crescendo ultimamente. A galera que faz gosta tanto que, quando tem oportunidade, volta. Quando eu fiz, tinha muito brasileiro e alemão. Na Alemanha, o governo paga para estudantes que estão no ‘gap year’ (ano de intervalo entre o ensino médio e a faculdade) fazerem trabalhos voluntários pelo mundo”, afirma Vitória Costa, 20 anos, estudante de Relações públicas na Anhembi Morumbi. Em janeiro, ela passou um mês na Cidade do Cabo, na África do Sul. A universitária participou do projeto da Exchange do Bem encarregado de cuidar de crianças em situações precárias. No geral, Vitória afirma que a experiência foi maravilhosa e recomendável para todas as pessoas. “Nada se compara ao que eu passei lá. O amor das crianças é algo indescritível, surreal e emocionante”. Mas a experiência também apresenta situações desafiadoras e chocantes. “A comunidade era bem precária, sem saneamento básico. Um aspecto negativo era a falta de

Vitoria Costa, 20 anos, realizou intercâmbio social na Cidade do Cabo

higiene da população, as crianças já chegavam sujas, com os narizes escorrendo e não havia papel higiênico suficiente para elas. A cidade também está passando por um problema sério de crise hídrica”, diz Vitória. O contexto insatisfatório contribui para a incitação do intercambista, que desenvolve novas perspectivas. “A lição mais positiva que eu aprendi foi valorizar o que eu tenho e ser feliz com os pequenos momentos. Eu vi como as crianças ficaram felizes com a nossa chegada. Elas eram muito atenciosas e prestavam atenção em cada detalhe possível. Passei a olhar as pessoas de outra maneira”. Já Laura Sabbatino Ramos, 18 anos, estudante de Ciências Econômicas da Unesp Araraquara, trabalhou com deficientes, principalmente com o público infantil, ajudando na interatividade social dos mesmos com a comunidade, por meio de jogos, esportes e atividades artísticas”. Fui para uma cidade chamada Chiclayo, no Peru, em dezembro do ano passado, pela AIESEC. Fiquei quase 50 dias. Contei características minhas para a agência e eles me passaram projetos que combinavam com o meu perfil. Como eu queria a América Latina e amei o projeto que era realizado no Peru, acabei optando por esse país”. Os projetos interativos da

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AIESEC possuem princípios que se baseiam nas metas globais da ONU. Um deles é assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, promovendo oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos. Para alcançar esse objetivo, Laura presenciou situações indesejáveis. “Tinha muita gente ignorante em relação às deficiências. O autismo, por exemplo, era tratado por algumas famílias como um demônio dentro da criança se exteriorizando. Alguns pais simplesmente abandonavam seus filhos por causa da dificuldade”. Apesar dos obstáculos, ambas as experiências proporcionaram transformações que afetaram a visão de mundo das voluntariadas. Laura afirmou que “aquelas crianças eram amor e pureza em tudo que faziam, muitas vezes me ajudavam mais do que eu as ajudava. O maior impacto que eu sofri foi em minhas atitudes, na maneira de agir com pessoas especiais e no modo de olhar para os deficientes, como transmitir que eles são capazes de muito mais do que dizem. Vitória diz que quando tiver uma chance de realizar a viagem novamente, não pensará duas vezes. “Gostaria muito de voltar para lá e ver a evolução do projeto. Eu me apeguei às crianças assim como elas se apegaram a mim”.


SUS oferece contraceptivos gratuitos Mulheres que não desejam ter filhos podem recorrer a pílulas, DIUs, injeções e laqueaduras Izabel Rodrigues

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Preservativos distribuídos gratuitamente

Pesquisa Nacional de Saúde realizada em 2003 pelo IBGE apontou que mulheres vão mais ao médico do que os homens, um percentual de 78% contra 63,9%. O SUS oferece, dentre várias especialidades da medicina, a ginecologia, bem como alguns métodos contraceptivos, como preservativos, pílulas, anticoncepcionais injetáveis, dispositivos intrauterinos, laqueaduras etc. Helena Silva, 48 anos, desempregada e moradora de Taboão da Serra, que estava no posto para uma consulta com o clínico geral, teve sua primeira filha com 30 anos. Após o parto, passou a tomar o anticoncepcional fornecido pelo posto para mulheres que acabaram de parir, o Micronor, que não afeta a amamentação. “Não me dei bem com a pílula, esquecia de tomar, não tomava na hora certa, e não deu outra, engravidei de novo”. Helena teve o segundo filho com 32 anos e, após o parto, quis fazer a laqueadura, um método de esterilização definitiva da mulher. Mas ela só poderia realizar o procedimento após 6 meses do nascimento do segundo

filho. “Como não queria engravidar de jeito nenhum, coloquei o DIU, dispositivo intrauterino. Só me pediram um exame de Papanicolau, era válido por 10 anos, mas tive 3 meses de hemorragia e tirei”. Após o imprevisto, Helena compareceu a palestras de planejamento familiar para conseguir a laqueadura. Depois de algum tempo, ela recebeu uma carta que seu marido teve que assinar e fez a laqueadura. Dentre os métodos contraceptivos oferecidos pela UBS Suiná (Unidade Básica de Saúde), localizada em Taboão da Serra, é disponibilizada a pílula ciclo 21, que Amélia Takahashi, 56, que trabalha na farmácia do posto, já utilizou. “Muita gente fala que engorda, eu não engordei mas também não fiz muitos exames, só respondi algumas perguntas pra doutora e ela já me deu a receita. Era bom porque eu não precisava comprar, sempre tinha no posto”. No momento da entrevista estava em falta a pílula e a injeção oferecida às mães que acabaram de ter filhos. “Como não tem aqui, elas têm que procurar em outras unidades ou comprar, não tem o que fazer”, disse Amélia. O anticoncepcional injetável é o menos procurado pelas mulheres na UBS Suiná. O medicamento é de uso mensal – há também os trimestrais, mas eles não são disponíveis gratuitamente. Dentre os métodos contraceptivos a que as mulheres que utilizam o SUS têm acesso, encontra-se a camisinha masculina e feminina, essa

indisponível no dia da visita ao posto. As camisinhas acham-se dentro de uma caixa pequena que fica na entrada do posto junto a alguns panfletos e comunicados sobre campanhas de vacinação, exames de rotina e palestras sobre saúde. No dia, havia apenas três preservativos na caixa, sem previsão de reposição, pois o produto estava em falta. Luciana Silva Santos, 25 anos, dona de casa, utilizava os preservativos masculinos fornecidos pela UBS mas engravidou, pois, segundo ela, a camisinha estourou e ela não utilizou o anticoncepcional emergencial, popularmente conhecido como pílula do dia seguinte. Após dar à luz aos 20 anos, Luciana utilizou, com receita da ginecologista, a pílula Micronor. “Mas o remédio me fez engordar muito, só tomei por um mês e como ainda tinha medo de pegar doença, voltei a usar camisinha masculina, mas engravidei de novo, até parece brincadeira, porque sempre usei, mas mesmo assim veio mais um filho”. As consultas com os dois ginecologistas disponíveis nas UBS Suiná costumam demorar de 2 a 5 meses e as receitas para as pílulas e injeções têm validade de 6 meses, as opções de DIU fornecidas variam de 8 a 10 anos, a laqueadura só pode ser feita diante de comprovação de complicações para gestação e a pílula emergencial não precisa ser receitada por um ginecologista mas precisa de uma receita concedida por um clínico.

Ciclo 21 é a pílula disponibilizada pelo SUS como um dos métodos contraceptivos

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Superação rumo ao diploma Número de estudantes de escolas públicas ainda é baixo nas universidades não pagas Bruno Andrade Julia Tamelini

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número de jovens oriundos de escola públicas nas universidades públicas ainda é pequeno. Dados da USP (Universidade de São Paulo) revelam que apenas 34,6% dos alunos ingressantes, em 2016, eram egressos do ensino público. Vários fatores desencadeiam a falta desses estudantes, o primordial é o prejuízo de aprendizado em relação aos concorrentes das escolas privadas. Além disso, a questão cultural de estudar para o vestibular não faz parte do dia a dia da periferia e a maioria das famílias não apoiam o jovem. Esse foi caso do paulistano Guilherme Falcão, 21 anos, que começou os estudos obtendo bolsa numa instituição Militar e posteriormente transferiu-se para a ETEC de São Mateus, localizada na Zona Leste de São Paulo. O rapaz decidiu cursar Direito aos 16 anos de idade. A princípio seu desejo era conseguir bolsa na FGV (Fundação Getúlio Vargas), para isso conseguiu bolsa no cursinho CPV. O aluno omitia-se muito sobre quem era, devido à sua condição financeira, e não queria ser visto como “pobre” entre seus colegas de classe média-alta da turma. Ele acrescenta: “Por algum tempo tentei mostrar-me como alguém que eu não era para a minha classe”. Nesse período, mudou-se para a casa de sua tia em Osasco-SP e empenhou-se durante 1 ano, mas não passou na faculdade. A mãe do estudante, Maria Sueli Falcão, 47 anos, sentiu-se triste pelo filho e aponta: “Eu sei que é difícil entrar, né? Para quem é da periferia, é quase impossível”. No ano seguinte, o jovem iniciou seus estudos sozinho com intuito de prestar Direito numa universidade pública como a USP, e também teve aulas particulares de redação. Guilherme conta: “Não sabia escre-

Guilherme Falcão em busca de seu futuro

ver bem, eu havia tirado 400 pontos na primeira redação do ENEM, mas na última tirei 960”. Ele acrescenta: “Eu também não tive muitas aulas de exatas. Em Física por exemplo, estudei muitas matérias que não vi no ensino médio”. Nesse período de sua vida ele passou por desestímulos, os quais o jovem da escola pública sofre por parte de amigos e alguns familiares. Essas pessoas duvidaram de sua capacidade. Segundo Guilherme alguns disseram que ele se formaria em cursinho e que nunca passaria, porém, isso não o fez desistir de alcançar seu sonho sendo muito bem apoiado pela sua mãe, irmã e tia. A mãe do estudante o incentivou bastante a prestar a Fuvest. “Imprimi uma folha do vestibular e coloquei na parede do quarto dele para estimulá-lo a continuar estudando”. Feito o vestibular, a dona de casa recebeu a notícia que Guilherme Falcão havia ingressado na USP após uma ligação da filha. Mas o jovem estava em Minas Gerais. O rapaz entrou pelo SISU e pela FUVEST, mas preferiu usar a vaga da seleção específica da USP para permitir que outro aluno de escola pública entrasse no curso. Segundo o jovem, ele demo-

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rou a entender que realmente havia passado na universidade “A ficha demorou pra cair, sabe?” Maria Sueli ficou muito orgulhosa do filho, segundo ela, quando viu a foto que ele mandou com o resultado da aprovação. “Aí foram só rojões”, diz a mãe. Ao entrar na Universidade o jovem sentiu dificuldade em fazer amizades. “Sentia-me defasado mesmo estudando na Faculdade de Direito da USP, onde meus colegas saíam bastante para festas e viagens, sofri por não ter tudo como eles e não poder pagar passeios”, porém o jovem afirmou que passou a ter orgulho de quem é e de sua história de vida. Mas nem todas as histórias terminam como a de Guilherme. Keuri Miranda. 20 anos, faz odontologia na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). A moça sempre quis cursar medicina, entretanto sua família não apoiou o terceiro ano de cursinho. Segundo ela, a mãe dizia que “tinha que começar uma faculdade logo, senão ia ficar quatro anos fazendo cursinho”. Atualmente, a jovem faz a universidade e estuda em um cursinho popular na Universidade Federal Fluminense para realizar seu sonho de virar médica.


Arte que transforma A popularização do Beco do Batman tem alterado o estilo de vida dos moradores da região Caio Borges

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ocalizado na Vila Madalena, na capital paulista, o Beco do Batman é um dos grandes pontos turísticos, não só para amantes de arte de rua, mas também para o público em geral. O movimento artístico começou durante a década de 80, onde a figura do Batman retratada nos muros chamou a atenção de diversos artistas, que por sua vez decidiram pintar a sua versão do personagem. Contudo, além de uma grande exibição de arte, o local também abriga moradores antigos do bairro, que foram obrigados se adaptar após a sua popularização. João Batista da Silva, 71 anos, aposentado, mora na região desde que tinha 1 ano de idade e conta como foi a sua experiência após a popularização do espaço. O morador aproveita a grande quantidade de visitantes do local para vender água de coco, bebidas em geral e para oferecer o banheiro de sua casa aos turistas, gerando uma renda extra para a família. “Logo no início foi feito um estacionamento aqui na vizinhança, o que era desorganizado e perturbava os moradores devido ao barulho, mas depois que fechou não houve mais esse tipo de problema”, conta o dono de um dos muros mais famosos do beco. Quanto à segurança, diz ter havido uma melhora. “Aumentou a quantidade de pessoas e portanto a vigilância aumentou. De vez em quando ocorrem alguns furtos, principalmente de celulares, pois as pessoas o utilizam para tirar fotos e acabam se distraindo, mas no geral foi um progresso”, relata o aposentado. Sobre a arte, João, que ficou conhecido em 2017 por pintar o muro de sua casa de cinza, diz não ser contrário. “Eu gosto da arte”, manifesta o residente. Além disso, conta que não possui uma relação ruim com os artistas, mesmo após o incidente.

Grande número de turistas visitando o beco, localizado na Vila Madalena

“Eles me respeitam e eu respeito eles. Tem que ser assim”, expressa o proprietário, que cita apenas um único caso em que não gostou de uma das artes e pediu para o artista retirá-la, mas complementa que isso não afetou a sua relação com o autor. André da Silva Lima, secretário, 40 anos, estava pela primeira vez no beco e deu a sua opinião sobre a questão da arte com os moradores. “É uma quebra de paradigma. O pessoal associa muito a arte à poluição visual, marginalidade, drogas, mas acho que com o tempo a pessoa vai se acostumando e a opinião vai mudando”. Outro turista, Gabriel Tamur, estudante de 19 anos, fornece uma visão mais equilibrada sobre a relação entre a arte e os moradores. “Eu particularmente não teria problema nenhum em conviver com essas pinturas, muito pelo contrário, acho tudo muito bonito. As pessoas têm muito preconceito e por isso deixam de apreciar”, diz. O artista plástico Mauro Sérgio Neri da Silva, de 36 anos, comenta sobre seu trabalho, sua opinião e experiências com o beco. “É uma ex-

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pressão democrática. Todos podem fazer, todos podem ver e ela exerce um papel muito importante de contribuição para a formação cultural do público, afinal é uma arte acessível. O beco é um dos lugares mais conhecidos em São Paulo para se ver grafite, o que acrescenta ainda mais ao crescimento da arte”, conta. Mauro também reforça o ponto de vista de João. “Eu frequento este lugar há mais de 20 anos. Desde então eu venho criando vínculo com os moradores. Nunca houve conflito. Apesar do que ocorreu com o João ano passado, não houve um confronto. Foi um protesto bom para ambas as partes. Ele conseguiu uma maior organização no local, que era a sua intenção, e novos artistas conseguiram espaço para expressar a suar arte no beco, além do aumento da visibilidade”, relata Mauro. Em relação à mudança do estilo de vida dos moradores, o artista opina: “Foi algo inevitável. Há quem goste e há quem não goste. Quem escolheu gostar está colhendo frutos e quem escolheu não gostar está se lamentando”, diz o grafiteiro.


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