UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE - CENTRO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS
Publicação dos alunos do segundo semestre de Jornalismo - Ano XII - Ed. 187 - Novembro 2017
A fauna da metrópole
Centro de Controle de Zoonoses, localizado em Santana, acolhe várias espécies e oferece animais para adoção. Página 3 Acontece • 1
Mente reprogramada Criada na década de 70, programação neurolinguística ajuda a superar crenças limitantes do ser humano Julia Alves Pinto
A
s limitações das pessoas são dadas com base nas suas crenças internas, fazendo com que as mesmas desenvolvam problemas como ansiedade e baixa autoestima. Essa é a premissa da PNL - Programação Neurolinguística -, que crê ser possível transformar comportamentos ruins em bons. A PNL ajuda a pessoa a descobrir o porquê de algumas atitudes e as modificar, aumentando a sensação de segurança. Geralmente as pessoas que procuram o tratamento têm o resultado esperado, como Ana Caroline Rodrigues dos Santos, estudante, 21 anos. “A partir do momento que eu mudei o modo de me enxergar isso refletiu em como eu encarava o mundo. Hoje me aceito como sou, aprendi a me impor e encarar as coisas de frente, não adianta fugir ou evitar os conflitos”, conta. A programação neurolinguística torna a pessoa mais consciente e cuida da parte de descobrir o que bloqueia a pessoa, ajudando-a a entender o que ocasionou o bloqueio e tornando-a mais empoderada. Muitas empresas estão começando a olhar mais para o comportamento humano buscando a PNL a fim de conseguir um melhor desempenho e motivar mais seus funcionários. A empresa Centia trabalha com PNL e física quântica. Telma Nogueira, diretora de planejamento
Telma Nogueira, diretora, na Centia
e desenvolvimento, 44 anos, diz: “Geralmente, as pessoas que procuram uma terapia têm um bom resultado porque estão abertas. Há duas maneiras para as pessoas virem aqui, uma delas é quando o problema a pegou de jeito e ela não consegue sair, e a outra é quando ela quer, por amor, evoluir”. Thais Gontijo Gomes, 26 anos, psicóloga, afirmou que é possível pegar o conhecimento da pessoa e remodelá-lo para melhor uso no dia-a-dia. De acordo com Telma é assim que funciona a programação, ajudando a pessoa a perceber o que é limitante, achar suas causas e mudá-la, fazendo com que o paciente veja a sua capacidade, confie mais em si. A programação neurolinguística é algo que ainda está crescenProfessor responsável: André Santoro
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Centro de Comunicação e Letras
Diretor do CCL: Marcos N. Duarte Coordenador do curso: Rafael F. Santos Supervisor de Publicações: José A. Trigo
Equipe: Ana Beatriz Truran, Bruno Roque, Clara Valdiviezo, Flávia Gonçalves, Gabriela Catan, Guilherme Annis, Helena Lima, José Ricardo Jardim, Julia Alves, Letícia Moura, Maithe Martins, Maria Luiza Penteado, Matheus Paes, Nicole Kloeble, Nicolle Boscariol, Ricardo Marangoni, Ritha Contarelli, Taisa Lira Cavalcante
Acontece • 2
do, mas que já é aceito por grande parte das pessoas. Algumas que procuram o tratamento na Centia já chegaram acreditando na PNL e não em física quântica e assim obtiveram um resultado melhor do que esperavam. Segundo Telma, a física é imprescindível para eles na hora do tratamento, e o paciente necessita entender. “É uma ciência estonteante porque tira o ser humano da caixinha em que ele viveu a vida inteira”, afirma. A PNL cuida das crenças e todas elas são formadas entre zero e sete anos de idade. Na vida adulta, em alguma situação, aquela crença é ativada atrapalhando as ações da pessoas. E quando ela busca entender a causa daquilo obtém um bom resultado e acaba vendo a si e o mundo de maneira diferente. Jornal-Laboratório dos alunos do segundo semestre do curso de Jornalismo. Centro de Comunicação e Letras - Universidade Presbiteriana Mackenzie. Foto de capa: Ana Beatriz Truran e Maithe Martins Impressão: Gráfica Mackenzie
Bichos em boas mãos O Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) abriga e cuida da saúde de animais de diversas espécies Ana Beatriz Truran Maithe Martins
O
Centro De Controle de Zoo noses, fundado em 1973, é um órgão associado à Secretaria Municipal da Saúde que desempenha diversos serviços, como o saneamento ambiental e a proteção da saúde pública. Além disso também conta com uma área específica para adoção de animais resgatados e tratados pelo centro, que oferece serviços gratuitos de castração, feita em cães e gatos com idade de três meses até oito anos em um dos postos que estão listados no site, e vacinação contra Raiva animal em cães e gatos, que é obrigatória por lei e pode ser feita a partir dos três meses de idade. O CCZ não conta apenas com cães e gatos resgatados, tendo ainda cavalos, porcos e outros animais que também estão disponíveis para adoção, porém nesses casos o adotante deve providenciar o transporte do animal. O centro também atende casos de emergência e recebe animais em estado terminal para eutanásia. Segundo Bericio Vicente, 35 anos, agente de saúde do setor de zoonoses, o resgate é feito somente quando há denúncia através do número 156. O CCZ não recebe animais trazidos pelas pessoas, pois nesse momento eles deixam de ser de rua e já têm um responsável. De acordo com Giuseppe Verrone Neto, 52 anos, agente de saúde da área administrativa do órgão, no mês de setembro 13 cães deram entrada no centro, a maioria fêmeas com filhotes, enquanto houve apenas 1 caso de animal agredido. Além disso, 31 cães foram adotados no mesmo mês. A adoção é feita pessoalmente, e os interessados devem trazer RG, CPF e comprovante de residência, além de pagar 23 reais de taxa.
Ao adotar o animal o responsável deve registrá-lo em seu nome, por isso não é aconselhável dar o pet de presente a alguém que não está ciente e de acordo. Até porque a pessoa se torna, segundo Bericio, “responsável por uma vida. A adoção deve ser feita com seriedade”. A estudante Carolina Fonseca, 19 anos, adotou uma cadela no CCZ em abril de 2016. “Eu falei (para minha mãe) que queria fazer uma tatuagem, e ela odeia taguagem! Aí quando faltava um dia para fazer, ela me disse que se eu não fizesse a tatuagem, eu poderia pegar um cachorro”. Ela não pensou duas vezes, escolheu adotar Amora e no fim a família a acolheu muito bem. Cães mansos, como o adotado por Carolina, não precisam passar pela adaptação com seus donos, mas os bravos devem ter interação de três a quatro dias antes do novo dono os levar. Além disso, Carolina também falou de sua primeira impressão do CCZ: “Eles cuidam muito bem (dos animais), eles têm muito cachorro”, e também comentou ter ficado impressionada com a quan-
tidade de pessoas que cuidam do local e dos animais. Quando o interessado em adotar vai conhecer os animais, pode ver todas as informações como a idade, peso e problemas de socialização em fichas ao lado de cada recinto. O CCZ também conta com um site, no qual é possível ver cães e gatos que estão para adoção. O centro conta com voluntários para manter o local funcionando, e os interessados podem se candidatar pelo site, telefone ou de forma presidencial. Após passar pela entrevista informa-se a área em que deseja atuar (banho e tosa, veterinária, entre outras). Muitos são aceitos para a “cãominhada”, que ocorre aos domingos. O número 156 é geral e pode ser acionado para obter informações a respeito dos serviços prestados, fazer denúncias e buscar auxílio em relação à fauna sinantrópica, ou seja, animais como morcegos, abelhas ou aranhas que entrem na casa das pessoas. O centro está presente na grande São Paulo na Rua Santa Eulália, 86, Santana ou pelo telefone 3397-8900.
Bericio Vicente na sede do CCZ em Santana, SP
Acontece • 3
Poesia se torna militância verbal Grupo ativista SLAM realiza batalhas poéticas mensalmente na Praça Roosevelt Clara Valdiviezo Guilherme Annis
O
SLAM resistência é um movimento independente criado no ano de 2013, inspirado nas manifestações públicas e políticas da época. Seu intuito é dar voz a grupos com pouca expressão, como mulheres e negros, por meio de batalhas de poesia falada. Pessoas que lutam por diferentes causas podem participar. O grupo conta com mais de 500 mil curtidas em sua página do Facebook. A poesia falada está no Brasil há cerca de nove anos e, hoje, são 36 SLAMs na cidade de São Paulo. As poesias tratam de temas como apropriação cultural, valorização da arte, empoderamento feminino, racismo e muito mais. Para cada noite, são 16 poetas, sendo 8 mulheres e 8 homens. O encontro do SLAM é dividido em duas etapas, a primeira quando o palco é aberto ao público para que qualquer um declame sua poesia, e a batalha que acontece posteriormente. Para participar da batalha é necessário se inscrever e ter um texto de no mínimo 3 minutos, já que a competição tem âmbito internacional. As batalhas ocorrem no SLAM, entre os SLAMs da cidade, nos estados do Brasil e depois se escolhe um representante do país para batalhar internacionalmente. Ericson Carlos Silva, 43 anos, popularmente chamado de Banks, é um dos organizadores e conta sobre o SLAM. “Começou com 15 pessoas e já chegou a atingir cerca de 800. Ele acontece toda primeira segunda-feira do mês, nas escadarias da Praça Roosevelt, por volta das 19h30. Todos estão convidados a integrar o grupo”, diz. Lucas Barbosa, 29 anos, formado em Filosofia pela USP e
integrante do movimento desde 2014, diz que encontrou o SLAM por meio de um vídeo do YouTube. Ele se interessou e quis saber mais. Ele ainda relata o quão importante é poder ter essa troca de ideias, essa diversificação de olhares, dentro de um mesmo grupo. A Praça Roosevelt foi escolhida como sede porque lá aconteceu uma série manifestações culturais em 2013, quando surgiu o SLAM. “Roosevelt é uma questão de ocupação, é uma praça pública. Públicos diferentes ocupam um mesmo lugar. A rua Augusta se elitizou, mas a Roosevelt ainda representa a diversidade”, diz Lucas. Hoje o filósofo conta que mesmo estando numa classe completamente diferente da qual nasceu não deixa de fazer parte da luta da periferia. Ele conseguiu se graduar numa universidade pública e conquistar sua independência. Seus progressos, segundo ele, não devem ser vistos como privilégio, mas como direito constitucional. O artista, que também é filiado ao PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), diz que em todas as esferas sociais há problemas, e no SLAM não é diferente. Ele conta
que às vezes é preciso saber lidar com o extremismo encontrado dentro de uma comunidade. “Já tivemos problemas com interpretações. Existem discursos extremistas dentro do grupo”, completa. Lucas relata sobre o primeiro choque entre o SLAM e a polícia militar, que aconteceu em março de 2017. Houve algumas reclamações na região da praça e a polícia tentou vetar o evento. “Sabemos que isso tem muito a ver com a eleição do prefeito Dória. Na época do Haddad, não tivemos nenhuma questão de repressão social”, completa. A intervenção dos militares aconteceu por volta das 20h30, e a justificativa foi o incômodo dos moradores em relação ao barulho. Sadrak, Bruna e Warlin Perevezão são três jovens por volta dos 20 anos que recitam poesia e passam eventualmente pelo SLAM resistência para relaxar e terminar o dia de uma boa forma. Eles oferecem os ouvidos a quem precisar falar, é um local pra desabafar. Sadrak é idealizador do SLAM “mente periférica”, que fica em Itaquaquecetuba: “é o único momento que a gente consegue ser a gente mesmo”, conclui.
Reunião do SLAM Resistência na praça Roosevelt
Acontece • 4
Recrutadores de pessoas Voluntários de ONGs compartilham experiências com os pedestres na Avenida Paulista Gabriela Catan
Gabriela Catan José Ricardo Jardim
A
maioria dos pedestres que passam pela região da Avenida Paulista já esbarrou nos “recrutadores” de pessoas que trabalham para algumas instituições. Eles trabalham de segunda a sexta, principalmente nos horários de pico, como meio dia e seis da tarde. E têm como objetivo atrair algum público que possa ajudar financeiramente a ONG em que trabalham. Contam que para isso precisam da atenção das pessoas, mas nem sempre essa é uma tarefa fácil. A rotina dos trabalhadores acontece em um local por dia, que é definido com um ou dois dias de antecedência, porém algumas vezes são horas antes. As fundações informam onde será o ponto de trabalho de cada um. O expediente dos voluntários é do meio dia até as oito da noite, com uma hora de almoço. As próprias ONGS procuram os voluntários, e a maioria deles fazem uma inscrição online e se candidatam. Como as organizações são sem fins lucrativos, as pessoas que trabalham recebem uma quantia mensal que gira em torno de um salário mínimo, dependendo da sua efetividade diária. A maioria é terceirizada, ou seja, contam com o intermédio de outra empresa, não a ONG, que os contrata e estabelece para cada um uma meta a ser atingida por dia. Os trabalhadores têm de falar com 15 a 20 pessoas na rua e conseguir convencê-las a ajudar a instituição, ou pelo menos que curtam e compartilhem a página deles nas redes sociais. As ONGs têm uma estatística própria, por isso param pessoas
Voluntária da Anistia Internacional em um dia de trabalho
de 24 anos para cima, pois essa idade garante que o cidadão tenha uma estrutura financeira e possa ajudar de fato. Algumas instituições, como a Anistia Internacional, não contam com a intervenção de alguma empresa, mas seguem o mesmo padrão de trabalho das terceirizadas, embora com mais flexibilidade. Flávio Dirceu, 23 anos, trabalha na ONG Anistia Internacional, que apoia os direitos humanos, e principalmente mulheres, negros e homossexuais. Flávio conta que acaba conversando com todo o tipo de pessoa, não importa a idade. “Acho importante conscientizar os menores também, luto por uma causa importante, acho que todos devem saber”, comenta. Apesar do grande movimento na Avenida Paulista, os voluntários comentam sobre a dificuldade de parar as pessoas e conversar. “Eu entendo que tudo é corrido em São Paulo, isso é compreensível, mas muitas pessoas não olham nem na nossa cara para dizer que estão com pressa”, diz Victoria Rocha Garcia, 21 anos, que trabalha há três anos com o GreenPeace. “O meu trabalho exige um grande esforço psicológico, precisamos
Acontece • 5
conquistar as pessoas para manter nossa ONG viva, mas de vinte pessoas, no máximo duas param’’, completa Flávio. Nas organizações existem pessoas que não se afetam muito com o desprezo dos pedestres. Eduardo Vasquez, 22 anos, da Fundação Abrinq, comenta que está ali para fazer seu trabalho e que não se importa com as pessoas que não ligam para ele: “Eu tento cumprir a minha meta, e só”, afirma. Outros se identificam com as causas. De formas diferentes, mas com um intuito em comum, os voluntários estão ali todos os dias. Para alguns eles são invisíveis, para outros representam um atraso no cotidiano. É difícil alguém nunca ter tido algum contato com um deles. Os que não tiveram ainda terão, e as particularidades de cada um é que vão tornar a vida de ambos uma experiência favorável ou não. “Lidar com pessoas não é simples, e na maioria das vezes não conseguimos nem nos comunicar. É complicado, mas todo meu esforço é recompensado quando alguém me dá um simples sorriso”, comenta Isabella Motta, 19 anos, da fundação Abrinq.
A ilusão da meia-entrada Jogo da seleção traz de volta a polêmica sobre os preços dos ingressos e o desconto para os estudantes
Estádio do Pacaembu, jogo São Paulo x Atlético-PR
Matheus Paes Nicolle Boscariol
A
Seleção Brasileira encerrou sua participação nas eliminatórias para a Copa da Rússia no último dia 10 de outubro com uma vitória de 3 a 0 sobre o Chile no Allianz Parque. Porém, apesar do grande público presente, muitos dos torcedores reclamaram sobre o preço dos ingressos: a entrada inteira mais barata saía por 250 reais. Não é novidade que o cidadão brasileiro convive com o alto valor dos ingressos, seja ele para acompanhar o time do coração, a seleção ou o show do artista favorito. Porém, esse alto valor aumentou ainda mais após a Copa das Confederações, em 2013. Isso advém da necessidade de garantir lucros, utilizados pelos clubes como pagamento de salários ou até mesmo pagamento das modernizações dos estádios, e também para os produtores de eventos. Os motivos para os altos preços da Copa de 2014 eram justificados pelo conforto dos estádios, pela festa mundial que é o evento e a chance de ver grandes craques como Neymar, Messi, Cristiano Ronaldo, entre outros. Mas os
clubes brasileiros, desde então, aumentaram significativamente o preço de seus ingressos. O preço médio do Allianz Parque para jogos do Palmeiras é de 80 reais para jogos do Campeonato Brasileiro, por exemplo. “Na Arena Corinthians os setores mais caros são os mais vazios”, revela o estudante Leonardo Gimenez, 18 anos. O grande motivo desse aumento vem, acredite se quiser, da meia-entrada, instituída por lei desde 2013. Em tese, ela tem objetivo de oferecer aos jovens e estudantes o direito a pagar metade do preço em eventos culturais e esportivos. Apesar de parecer algo estimulante para os jovens frequentarem mais eventos culturais, muitas pessoas não enxergam a iniciativa de forma positiva. De acordo com observações recentes, a meia-entrada é, basicamente, o valor cheio dos ingressos. Esse direito, segundo alguns economistas, acaba inflacionando o preço da inteira para garantir o lucro e cria-se a ilusão de pagar apenas 50% do valor. Isso fica ainda mais evidente quando se fala em futebol. O valor dos ingressos para os jogos, especialmente os da seleção, são altíssimos. A vantagem da meia-entrada para os beneficiados é pagar me-
Acontece • 6
nos e a desvantagem para aqueles que não são beneficiados é pagar o dobro. O estudante e torcedor Demetrius Kyriopoulos, 19 anos, explica por que não foi ao jogo: “O preço do ingresso está muito caro. ” Tem-se reparado em um aumento no número de estudantes, por exemplo, em uma partida entre Flamengo e Goiás pelo Brasileirão 2013. Cerca de 19 mil, dos 32 mil presentes no Estádio Serra Dourada, eram beneficiados pela meia-entrada. Isso faz com que os promotores de eventos, no momento de reservar 40% dos ingressos para estudantes, aumentem os preços, dobrando o valor original para garantir um preço médio estipulado. Em entrevista ao Huffpost Brasil, o economista e pesquisador da USP Carlos Martinelli fala sobre a situação: “Quem paga o ingresso integral acaba pagando mais caro e, quem paga ‘meia’, tem um desconto efetivo de apenas 33%, e não de 50%. O sujeito que pagou a inteira, na verdade, está subsidiando a ‘meia-entrada’”. A reclamação recorrente é que muitos desses jovens beneficiados não são pessoas carentes que realmente precisam desse desconto. Ou seja, para alguns, a lei apenas aumenta os valores reais das entradas dos eventos. Com isso, os que realmente deveriam ser beneficiados não são e aqueles que deveriam apenas pagar a entrada inteira são prejudicados. Apesar disso, muitos torcedores fazem uma força para conseguir ir ao estádio e aqueles que não conseguem assistem de outra forma: “A torcida sempre acaba acompanhando pela TV, ainda mais depois da chegada do Tite, o futebol melhorou, o time melhorou e não é à toa que já estamos na copa”, diz Demetrius.
Ocupar é preciso
Cidadãos sem opções de moradia se unem e ocupam prédio abandonado na Rua Maria Borba, no centro de São Paulo Letícia Moura Nicole Kloeble
A
Rua Maria Borba, tradicional reduto boêmio do centro de São Paulo, é palco de um drama que atinge cerca de 200 famílias: foi ali, em um prédio abandonado, que o Movimento de Luta Social por Moradia (MLSM) realizou uma ocupação em janeiro de 2017. A propriedade, que pertence à imobiliária Savoia e é alugada atualmente pela empresa GP de informática, já havia sido ocupada há cerca de dois anos, em uma ação que durou aproximadamente três meses, antes da Prefeitura entrar com um processo de reintegração de posse. Muitas das famílias são formadas por imigrantes. Os apartamentos do prédio são divididos de acordo com o tamanho das famílias. Para que nada fuja do controle do movimento, é necessária muita organização. “Tudo aqui é na base da conversa. A gente seleciona quem entra ou não porque temos muitas famílias com crianças, então não é qualquer um que pode. Ajudamos quem merece e não quem precisa. Cada um contribui com o que pode, mas a gente estabelece uma quantia de 100 reais para a manutenção dos apartamentos”, conta Andréia Santos, 31 anos, organizadora do prédio e contribuinte do MLSM. No mês de julho a prefeitura entrou com outro processo de reintegração para desocupar o edifício. Com a ajuda de uma advogada contratada pelos organizadores, a reintegração foi barrada um dia antes de ser efetivada, como conta a organizadora. “A advogada conversou com a juíza, que não ligou, daí ela foi lá e conversou com o desembargador, que achou melhor dar a resposta na sexta-feira. Tivemos na sexta a resposta que não iríamos sair, e que a reintegração aconteceria na segunda”.
Entrada da ocupação da rua Maria Borba
A maioria das famílias chegam até o movimento devido às dificuldades de arcar com as despesas, em especial o aluguel. “Minha mãe pagava 400 reais de aluguel e já estava no fundo do poço, sendo que na época o salário mínimo era de 650 reais”, explica Andréia, que mora em ocupação desde os 16 anos. Fabiana Guedes, 34 anos, moradora da ocupação, diz que, ao ficar desempregada, não conseguiu pagar o aluguel de seu apartamento “Perdi o emprego, não tive mais como pagar e vim para cá”. Andréia e Fabiana relatam certo receio em sair do aluguel e se mudar para uma ocupação. “Minha mãe ficou com medo, falou que não ia arriscar a vida dos filhos, daí eu mesma fui tentar arrumar um lugar”, conta Andréia. Já no caso de Fabiana a apreensão veio da própria moradora: “só vim quando não teve mais jeito mesmo de pagar aluguel”. De acordo com o IBGE, em 2010, aproximadamente 11,4 milhões de brasileiros viviam em aglomerados subnormais, conceito que inclui ocupações irregulares. O número representa cerca
Acontece • 7
de 6% da população brasileira. Entre os motivos para tal dado destacam-se o problema dos imóveis abandonados, altos preços de aluguéis, especulação imobiliária e déficit habitacional. Em geral, os espaços abandonados pertencem às massas falidas ou aos órgãos públicos. Há ainda proprietários com dívidas e documentação irregular. Já em relação à especulação imobiliária, as construtoras abandonam terrenos ou prédios com o objetivo de, no futuro, lucrar com os investimentos públicos de infraestrutura na região. Outro fator agravante é o baixo investimento na construção de moradias populares. Para os moradores de uma ocupação todo dia significa uma nova luta pelo seu espaço. “A gente abraça a causa, é um monte de gente que realmente não tem para onde ir, não tem parente nem nada aqui, então foi uma emoção muito forte, pra mim isso é muito mais do que um trabalho, eu vi como era a luta da minha mãe e isso pra mim foi uma lição de vida, minha mãe foi muito sofrida, muito guerreira”, conclui Andréia.
Melodias no vagão Em meio à aridez da cidade de São Paulo, apresentações musicais trazem alegria ao transporte público Helena Lima Ritha Contarelli
M
otivados pelo desemprego e em busca de divulgar sua arte, diversos músicos têm transformado os vagões do Metrô e da CPTM. Eles se apresentam semanalmente e têm que lidar com a proibição dessa prática na cidade de São Paulo. Pablo Nómas, musicista da banda Teko Porã, 33 anos, afirma: “no metrô nós somos apenas convidados a sair, já na CPTM os instrumentos são confiscados”. A banda, que existe desde 2012, surgiu com o propósito de juntar diversas pessoas que já se apresentavam nas linhas, e hoje conta com musicistas que tocam desde viola de arco até bandolim. Por ser uma banda itinerante, já houve outras formações com instrumentos e músicos diferentes, que muitas vezes deixam os trilhos para se apresentar em locais mais lucrativos. Um exemplo é o SESC, que possui uma ampla rede e promove a música independente, ou mesmo a Avenida Paulista, que muitas vezes traz um retorno financeiro maior. Para Pablo, “alegrar a cidade, as pessoas, humanizar e divulgar seu trabalho é essencial, mas o retorno é fundamental”. Para arrecadar dinheiro, os artistas penduram uma bolsa na barra fixa do teto, dessa forma todos os passageiros podem depositar sua gorjeta conforme se levantam para deixar o vagão. Outro fator importante na organização das apresentações nos trilhos é o tempo de duração das músicas. Algumas bandas optam por tocar uma única vez e em seguida trocam de vagão, na esperança de lucrar mais, já outras percorrem todo a linha emendando suas canções. Essas manifestações artísticas
Rafael Medeiros tocando no vagão da Linha Verde
têm se mostrado cada vez mais marcantes e presentes no dia a dia das pessoas que cruzam o subterrâneo da cidade. A usuária Justina Luz de Melo, 73 anos, comenta: “todos sabemos que é uma prática proibida, mas é emocionante ver pessoas tão simples e bem-humoradas tirando horas de seu dia para se apresentar para nós. Eu sempre busco ajudar”. A aposentada ainda acrescenta: “as pessoas, de um modo geral, estão sempre voltadas para os próprios problemas. Às vezes parecem até frias e sem emoção, mas dá para ver as expressões mudarem quando esses músicos entram. A música vem para trazer a emoção que estava faltando e lembrar as pessoas da própria humanidade, devolver a beleza para os nossos dias”. No Rio de Janeiro houve uma tentativa de regulamentar essa prática. A ideia era criar um sis-
Acontece • 8
tema de cadastramento inspirado em outras metrópoles, como em Londres e Nova York, em que os músicos são livres para tocar nas plataformas e estações. Outro exemplo é Paris, onde existe uma curadoria e pessoas que organizam as audições dos artistas. Infelizmente o projeto não vingou, e hoje esses músicos continuam se apresentando de forma ilegal. O posicionamento de autoridades em relação à música dentro dos vagões não recebe apoio de muitos dos usuários, demonstrando a necessidade do paulistano de viver em uma cidade menos cinza. O membro da banda Teko Porã, Pablo, conclui: “o governo diz que apoia a arte colocando um quadrinho aqui e outro ali, mas isso são apenas migalhas. De migalhas a gente vive bem, a gente quer comer, quer beber e quer arte. O metrô é público, então deveria ter um olhar mais humanizado”.
Chofer para todos Paralelamente ao crescimento de aplicativos como o Uber, aumenta também o número de usuários de motoristas particulares no país Flávia Gonçalves Ricardo Marangoni
O
ptar pelo serviço de um motorista particular deixou de ser limitado às celebridades, aos estadistas e às pessoas com alto poder aquisitivo. A disponibilidade aumentou tanto financeiramente quanto na maneira de encontrar e contratar um profissional. É uma ótima alternativa para quem busca otimizar seu tempo, possui receio ao dirigir, quer um pouco mais de comodidade ou se livrar do estresse nos congestionamentos. Benjamin Ribeiro da Silva, presidente do SIEEESP (Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo) e diretor do colégio Albert Einstein, usa um motorista particular há mais de 9 anos. “Recorri a esse serviço pela comodidade que o motorista particular oferece”, diz o empresário. Quem transporta Benjamin atualmente é o motorista Edson Aparecido Bispo, 38 anos. “Comecei no serviço por acaso. Eu trabalhava em transporte escolar, até que um dia meu encarregado me comunicou que o motorista particular do dono da empresa estava doente e que eu iria dirigir para ele durante o período que o outro motorista ficaria afastado”, relata. “Fiquei cobrindo o afastamento por um período de 15 dias. Retornei ao meu departamento. Passaram-se 45 dias e o dono do colégio me chamou para trabalhar com ele como seu motorista particular”, diz. Além de motorista, Edson Bispo conquistou o cargo de secretário particular, o que faz valer seu salário de R$ 5.000. Trabalhar no ramo de transporte particular não deixa de ser uma boa opção diante da concorrência de outros meios de transporte
Nelsom Nutti e o seu motorista em mais um dia de trabalho
como Uber e taxi. “O diferencial de optar por esse trabalho depende de alguns fatores, por exemplo: o cidadão não tem a condição de ter um veículo próprio para colocar no UBER. Táxi é uma máfia, para você obter um alvará para trabalhar com táxi, você não consegue por menos de 80 mil”, esclarece Edson. “E trabalhar usando táxi alugado não dá um lucro necessário para poder se manter. E tem também a questão de o cidadão optar por trabalhar como motorista particular porque tem aquela garantia de todo mês ter aquele salário e outros direitos trabalhistas”. Segundo o advogado Fábio Goulart, as condições que caracterizam o vínculo empregatício com o motorista são os mesmos de qualquer outra atividade. “A jornada diária segue a duração prevista da Constituição Federal, de um máximo de oito horas diárias e
Acontece • 9
44h semanais. Em casos excepcionais, é permitido aos motoristas a prorrogação de uma hora para dirigir até um lugar seguro para realizar seu descanso”, explica o advogado. “A compensação de jornada de trabalho somente poderá ser feito se houver previsão em Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho”, completa Goulart. Utilizar um motorista particular é benéfico até mesmo para a saúde, devido à tensão ocasionada no tráfego ou a irritação e ansiedade em meio à pressão de se chegar rápido. “Ter um motorista é mais prático, rápido e mais confortável, pois você usa um carro em melhores condições”, afirma o psicólogo Nelsom Nutti, 72 anos, usuário do serviço há três anos. “Além de ser prático, é mais seguro por você selecionar uma pessoa confiável e que dirige bem”, continua o psicólogo, que paga R$ 2.700 por mês pelo serviço.
Eu vejo flores em SP Ipês e outras espécies vegetais deixam as ruas da cidade coloridas na primavera Taisa Lira Cavalcante
S
ão Paulo, uma cidade conhecida por seu clima frio e sua cor cinza, ganha uma nova cara com a chegada de uma das estações mais quentes do ano: a primavera. Suas ruas, antes estampadas apenas por prédios e grandes construções, agora contam com belas árvores coloridas em sua composição. Segundo Sidney Fernandes, 53, professor de botânica e biólogo da Unifesp, as árvores mais comumente destacadas na capital paulista nessa época do ano são os Ipês, Primaveras, Jacarandás-mimosos, Íris-da-praia e Pau-formiga que, de acordo com Sidney, aparecem até mesmo antes da Primavera começar, resultado da situação climática da cidade, que faz com que as estações não sejam muito definidas nessa região. As árvores costumam desabrochar entre setembro e março e suas flores coloridas duram em média 30 a 180 dias. Para as árvores ficarem tão bonitas e floridas, é necessário muito cuidado. Entretanto, segundo dados divulgados pela prefeitura da cidade de São Paulo, a poda não acontece a não ser que seja solicitada por algum cidadão, que, caso veja necessidade, deve fazer uma requisição pelo telefone 156 ou pelo site do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC). Ainda de acordo com a prefeitura, o serviço que garante o corte e a poda de vegetação de porte arbóreo existente em todo o município de São Paulo é regulamentado pela Lei n° 10.365 e pode ser solicitado em prol de quatro finalidades específicas; a poda de limpeza, que apenas elimina os ramos, folhas e galhos praguejados, a poda
Árvore da espécie Primavera floresce no Sesc - Interlagos
de formação, que confere à árvore um formato adequado durante seu processo de desenvolvimento, a poda de emergência, que retira os galhos que colocam em risco a vida das pessoas e a poda de adequação, que adequa o desenvolvimento da árvore aos espaços, edificações ou equipamentos urbanos. Em casos de emergência, a prefeitura garante que, a partir do momento em que é solicitada, a poda deve ser realizada o quanto antes. Entretanto, nos demais casos, preza-se a época adequada para cada espécie e o período de reprodução da avifauna (pássaros que vivem nas árvores) também é levado em consideração. Além disso, por ser uma época de transição entre dois períodos opostos, o inverno (seco) e o verão (chuvoso), a estação que conta os anos também traz um clima mais ameno e agradável, como concorda Elenir Benício, 50, pedagoga moradora da capital paulista há 29 anos. “Além do clima gostosinho, a cidade também fica mais alegre e bonita”, comenta.
Acontece • 10
Bem distribuídas, as árvores que marcam a cara da estação podem ser encontradas em diversos pontos por toda a extensão da cidade. A Azaléia, planta de flores rosa que em 1986 foi decretada símbolo paulistano pelo então prefeito Jânio Quadros, pode ser encontrada em abundância na estação de metrô Jadim São Paulo, da linha 1-azul, na zona norte da cidade. Já na zona oeste, as orquídeas tomam conta e podem ser encontradas em grande quantidade no Orquidário Ruth Cardoso, localizado no parque Villa-Lobos. Já os Ipês, árvores com flores que variam entre amarelo, branco e cor-de-rosa e talvez sejam as plantas que mais se sobressaiam na estação, podem ser encontrados espalhados por todas as zonas da cidade, mas em especial no parque Ibirapuera, na zona sul, no Horto Florestal, na zona norte, e na avenida Sumaré, na zona oeste. As demais espécies também podem ser encontradas com facilidade nos mais diversos pontos da capital paulista.