UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE - CENTRO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS
Publicação feita pelos alunos do segundo semestre de Jornalismo - Ano XII - Ed. 190 - Novembro 2017
Esportistas e pioneiras
A modalidade do futebol americano praticada por mulheres ganha cada vez mais adeptas no Brasil. Página 4 Acontece • 1
A chegada do “Trap” Subgênero do hip-hop cresce no cenário musical brasileiro e ganha cada vez mais adeptos Guilherme R. Fojo João A. S. Suckow
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gênero musical popularmente conhecido como “trap” está, cada vez mais, atraindo músicos, produtores e coletivos a fim de definir a identidade dessa vertente, que ganha notoriedade na Europa e Estados Unidos. Surgido em meados dos anos noventa, esse subgênero foi criado como uma vertente do “hip hop” que se popularizou no sul dos estados norte-americanos, caracterizado por suas letras fortes e estruturas musicais incorporadas por duplos ou triplos “chimbais” subdivididos e ênfase no chamado “grave” pesado. O termo “trap” inicialmente era usado na cidade de Atlanta, Geórgia, para se referir a pontos de venda de drogas nos chamados “projects” , equivalentes aos governamentais CDHUs brasileiros, mostrando a violenta, porém humilde, origem deste recente gênero musical. No Brasil, o movimento se desenvolveu com a mesma agressividade e inconstância tanto em suas letras como produção e mixagem. É difícil dizer quando surgiu o trap no cenário nacional; “quando ouvi trap pela primeira vez achei que era algo relacionado a música eletrônica, uma coisa ligada ao beat e
não a rap. O que a gente vê hoje é uma mistura do trap eletrônico com o boom bap do hip-hop”, diz Tiago Barone,19 anos, estudante de produção musical que desenvolve e mixa suas músicas. Similar à algumas características do popularmente denominado, “funk” brasileiro o “trap” music, por seu jeito, reflete de maneira transparente e violenta vida nas periferias brasileiras. Através da glorificação da conquista estilos de vida luxuosos, muitas músicas contam aos ouvintes as possíveis consequências da criminalidade na vida dos artistas se não tivessem optado por produzir música. Exemplos de “tracks” que refletem tal proposta de conteúdo são, “Uzi” escrita por McIgu e Derek Lucas “Quando eu tinha uma glock”, na voz dos artistas Dfideliz, Derek, Klyn, Jé Santiago, Igor Hicks com produção e mixagem de Lucas Spike. Ao contrário da cena musical europeia ou norte-americana, poucos artistas surgiam exclusivamente dedicados ao gênero musica. Este fenômeno é algo novo, coletivos como os grupos paulistas Lowcliqueboys, que surgiu em 2014, e Recayd Mob, de 2016 deram oportunidades para a ascensão de uma concepção do rap nacional. Como retratado por Luan Melo, 19 anos, Assessor de Imprensa e Designer da Lowclique-
Professor responsável: André Santoro Universidade Presbiteriana Mackenzie
Centro de Comunicação e Letras
Diretor do CCL: Marcos N. Duarte Coordenador do curso: Rafael F. Santos Supervisor de Publicações: José A. Trigo
Equipe: Ana Beatriz Morgado, Ana Paula Mendes, Beatriz Freitas Vera Cruz, Camila Lippi, Fernanda Varela, Gabriela Pires, Guilherme Fojo, Isabela Assis, João Suckow, Letícia Santos, Mariana Alves, Natália Lucchesi, Natalia Queiroz, Paula Nunes, Sophie Chermont, Valentina Rosa, Yasmin Hatheyer
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boys, “A Lowclique não é apenas um coletivo de trap, ou uma banca, um time. Para mim a Lowclique é tipo família. Eu acho que o ponto da Lowclique é que você não precisa ter contato com todas as pessoas do coletivo, você sabendo que todos estão querendo fazer dar certo, e isso é motivador.” O assessor esclarece que a coletividade e interesse genuíno são os pilares dos grupos que surgem no cenário atual. As condições e recursos disponíveis para o desenvolvimento do trap é ainda são limitados, o privilégio de viver da música ainda não é uma característica do gênero. “A Lowclique ainda não tem a estrutura que precisa ter. Infelizmente no Brasil o Trap é um pouco difícil de se trabalhar porque as pessoas fazem o som em casa. Um bom exemplo disso é a Recayd (Mob). O Derek (membro do grupo) produz os sons mesmo em casa.” conta Luan. Em São Paulo, são poucas as casas de evento que se dedicam a divulgar e reproduzir o gênero. No cenário paulista, essas casas de eventos que reproduzem o som, não sao exclusivamente dedicadas a ele.São reservadas noites e eventos especiais para esses eventos e nos dias restantes, oferecem atrações de diversos focos musicais. Casas noturnas como Morpheus, Milos Garage e Casa da Luz são bons exemplos de lugares.
Jornal-Laboratório dos alunos do segundo semestre do curso de Jornalismo. Centro de Comunicação e Letras - Universidade Presbiteriana Mackenzie. Foto de capa: Letícia Santos Impressão: Gráfica Mackenzie
Informação que salva vidas O outubro rosa contribuiu para a conscientização sobre o câncer de mama, atingindo pessoas no mundo inteiro Natália Croccia Lucchesi Paula Nunes
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utubro rosa é um movimento mundial de conscientização e prevenção do câncer de mama. Começou em 1990 em Nova York com iluminações e a distribuição de laços rosa pelas ruas e em seguida começaram a surgir eventos de apoio ao movimento, como a corrida e caminhada contra o câncer de mama do IBCC (Instituto Brasileiro de Controle do Câncer), além das várias campanhas espalhadas pelo país patrocinadas pelo governo ou ONGs como o Instituto Arte de Viver Bem. A ação é muito importante já que, de acordo com o INCA (Instituto Nacional de Câncer), o segundo tipo de câncer que mais atinge os brasileiros é o de mama, perdendo apenas para o de próstata. Priscila Oliveira dos Santos, 37 anos, mastologista, faz questão de ressaltar que é muito importante ficar atenta aos sintomas e procurar um médico o mais rápido
possível. “O câncer de mama diagnosticado no estágio 1 tem mais de 90% de chance de cura, mas para isso é necessário que os exames de rastreamento sejam feitos”. A médica ainda explica a importância do outubro rosa: “são feitos mais de 57 mil novos diagnósticos de câncer de mama por ano. Isso é muito. E a doença é tratável e curável. É muito bom ter algo tão grande recebendo seu devido reconhecimento e atenção, tendo um mês dedicado a esse assunto. Essa conscientização é um excelente primeiro passo”. O já mencionado Instituto Arte de Viver Bem foi criado para dar força e elevar a qualidade de vida de qualquer pessoa interessada. No dia 3 de outubro, um ônibus rosa do projeto Circuito Casa da Mulher apoiando a prevenção do câncer de mama esteve no vão da sede da FIESP na Avenida Paulista, e lá estava Neide Silva, 56 anos, vendedora e voluntária da ONG, diagnosticada com câncer de mama duas vezes. Ela destaca a importância da informação: “os
Neide Silva, participante do projeto Circuito Casa da Mulher
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dois eu descobri tomando banho, através do autoexame. Foi essencial ter descoberto no começo, a partir daí eu fiz cirurgias, passei por quimioterapia, radioterapia, caiu cabelo, caiu tudo mas o que importa é que agora estou firme”. O instituto oferece oficinas com dicas de amarrações de lenços, curso de automaquiagem, SPA de mãos, atividades físicas, doação de cabelo, orientação de empregabilidade, distribuições de cartilhas dentre outras. E Eliana Pitta, 58 anos, corretora de imóveis, além de curtir a oficina de maquiagem, conta uma história de câncer em sua família. “Eu nunca tive câncer, graças a Deus, mas minha sobrinha de 35 anos tem no canal do ovário. Nessa idade é muito vaidosa, ela até tinha um namorado, mas quando começou o câncer ele disse que não estava preparada para lidar com uma doença tão grave porque ela vai ficar muito doente e seu cabelo vai cair. Acho um absurdo esses homens inúteis”. A corretora mostra apoiar o instituto. Além dos sintomas da doença não podem ser ignorados alguns fatores que aumentam o risco do câncer, de acordo com Priscila. “A mulher menstruar muito cedo, demorar para entrar na menopausa, tabagismo, usar pílula anticoncepcional por tempo prolongado, são coisas multifatoriais que não tem como evitar, mas é importante que saibam o aumento do risco no decorrer desses fatores”. Conclui que o mais importante é que a doença seja descoberta no começo. “Precisamos bater mais na tecla da importância do rastreamento na mamografia e no diagnóstico precoce. E não posso deixar de mencionar a importância de amigos e familiares no processo, é essencial ter gente que te traga coisas boas.”
Futebol americano é coisa de mulher A popularização do esporte no país atraiu novas protagonistas aos campos Letícia Santos
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nada, só achei que não conseguiria. Ela me chamou para ir em um treino e enrolei um mês. Mas um dia soube que ia ter jogo de futebol americano masculino do time Santos Tsunami e decidi ir, e por coincidência ela me disse que ocorreria uma peneira para o time feminino Buzzards e me convidou para ir. Topei na hora, uma semana depois lá estava eu, na peneira”. A modalidade praticada pela estudante é o Flag Football, que, diferente da prática convencional, tem menos contato físico e, por isso, não conta com equipamentos de proteção, o que diminui bastante o custo do esporte. Nessa modalidade entram em campo cinco jogadoras de cada time com fitas presas a um cinto de seus uniformes e o ataque perde a posse de bola quando a defesa retira as “flags”. Ao contrário do convencional, os pontos são marcados apenas por “touchdowns”, que valem seis pontos cada, podendo ser convertidos na linha de cinco ou 12 jardas, pois os campos não contam com “goal posts”, onde seriam marcados os “field goals” e chutes na bola são considerados jogadas ilegais. Ao jogar as garotas se empo-
deram. Vanessa de Carvalho, 29 anos, vistoriadora naval e capitã do time Buzzards, conta que procura incentivar e mostrar para suas companheiras do que elas são capazes. “Eu tento mostrar que elas podem mais do que imaginam. Não importa o que os outros dizem, nem o biótipo de cada uma, treinando todas são capazes!” e descobrem qualidades como a estudante de administração que joga como “linebacker”. “Minha posição em campo é de acordo com as habilidades que eu tenho. Na verdade, habilidades que eu descobri que tinha”, revela Patricia. Assim como muitos esportes pouco conhecidos no país, o “flag football” sofre com a falta suporte e apoio, mas a capitã do time Buzzards não desanima. Morando longe de sua família, conta a admiração e a relação que tem com suas companheiras de time e como elas se tornaram seu apoio. “Eu não sou de Santos, minha família é de Santa Catarina, e quando encontrei o time encontrei mulheres diferentes, lindas e guerreiras, que me deixaram muito à vontade e me incentivaram a nunca desistir de nada. Elas são minha família em Santos”.
futebol americano, que para muitos é considerado um esporte para homens, devido ao excesso de contato físico, se tornou bastante popular no Brasil, que de acordo com a NFL é o segundo país com mais fãs fora de solo americano, atrás somente do México. Essa afirmação foi comprovada durante a transmissão do 51o Super Bowl em 2017 pelo canal ESPN, que bateu recorde de audiência com mais de 754 mil pessoas acompanhando, 35% a mais que no ano interior. No cenário da prática do esporte, a busca também aumentou e ganhou novas protagonistas: as mulheres. O esporte está abrindo mais espaço e dando mais visibilidade para o público feminino. Nos EUA, um dos jogos da primeira semana da NFL em horário nobre foi narrado pela primeira vez por uma mulher, a jornalista Beth Mowins. Apesar do grande passo dado com uma narração feminina em horário de destaque, a estreia teve comentários do tipo: “nada pessoal, mas homens assistem esportes para não ter de ouvir as esposas ou namoradas”. Mas as mulheres não pretendem recuar. Mulheres jogando futebol americano não são uma novidade aos que conhecem o controverso Lingerie football, modalidade dos EUA onde as jogadoras praticam o esporte trajando ombreiras, capacetes e lingeries. Patricia Apóstolo, 20 anos, estudante de administração, conta que descobriu o esporte por meio de uma amiga nas redes sociais e que no início, apesar do interesse, hesitou. “Não tive medo nem Jogadoras do time Buzzards treinam o ataque
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“Apps”de carona miram público feminino O sentimento de insegurança faz com que muitas mulheres evitem motoristas homens Ana Beatriz B. Morgado Valentina Rosa
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praticidade que os aplicativos de carona trouxeram à vida dos passageiros fez esse tipo de serviço se popularizar em diversas cidades pelo mundo. Além de facilitar a vida de quem usa, o trabalho tornou-se opção de renda para os motoristas. “Estava trabalhando em uma empresa familiar, mas com a crise, começaram a eliminar alguns setores ou diminuir o salário. Saí e trabalhei como corretora”, afirma Denise Silva Santos, 56 anos. Como ela não teve sucesso no setor imobiliário e por sempre gostar de dar caronas resolveu se tornar motorista no Uber. Essa história é bastante parecida com a da também motorista Monika Moraes de Mello, 47 anos. “Trabalhei com várias coisas, a última foi na corretagem. Minha vida financeira ficou bem complicada”, afirma. Existe uma grande variedade de aplicativos e o procedimento para o cadastro é parecido em todos. Os motoristas, para aumentarem sua renda, acabam trabalhando com mais de um. “Eu trabalho com quatro aplicativos: Uber, 99pop, Cabify e Lady Dirver”, diz Monika. Apesar das várias opções, muitas mulheres encontram dificuldade para escolher. Depois que casos de assédios, por parte de motoristas, foram divulgados, muitas mulheres se sentem inseguras para continuar usando esse serviço. “Eu sempre aviso que estou no Uber, para ela (mãe) ficar comigo e se acontecer qualquer coisa ela ficar ciente. Sempre mando a foto da placa do carro, ela sempre acompanha”, afirma Bruna Chammas da Rocha, 18 anos, estudante. “Toda vez, de noite, quando eu estou sozinha ou só com meninas,
eu não cogito mais pegar Uber”, ressalta. Essa insegurança pode ser aliviada, já que em alguns aplicativos existe a opção de escolher uma mulher como motorista, como afirma Monika: “Na 99pop, há possibilidade de escolher mulher, mas o homem também tem essa opção. Os três homens que peguei no 99 eram pais com os filhos. Dois deles preferiam mulheres por serem mais cuidadosas”. Atualmente existem aplicativos exclusivos para o público feminino, como o Femitaxi e o Lady Driver, em que passageiras e motoristas são mulheres. A divulgação é muitas vezes feita por indicações. Por serem novos, muitas motoristas veem como um complemento. Por esse motivo, o tempo de espera acaba sendo maior, pois as motoristas, quando são solicitadas no Lady, por exemplo, podem estar fazendo corridas para os outros aplicativos mais conhecidos. O Lady Driver, especificadamente, por ser recente, ainda tem alguns problemas. Segundo Bruna: “O aplicativo não é muito fácil de usar, mas eu prefiro. Entro no carro e tem uma mulher. É
um alivio”. É permitida a presença masculina apenas como acompanhante. A motorista Monika, que trabalha no Lady, diz que as fundadoras já têm um projeto para aprimorar o aplicativo, o que permitirá ampliar a abrangência. “Eu moro em Alphaville, e lá nem tem, eu peguei quando estava em São Paulo, então se ampliar vale mais a pena”, disse Bruna. A necessidade de se sentir segura também é buscada pelas motoristas de aplicativos de carona. Monika comenta que esses aplicativos femininos são artifícios para que possamos viver em paz. “À noite eu não trabalho com outro aplicativo além do Lady”. Segundo Denise, existe um grupo no Whatsapp entre as motoristas. “Se alguém jogar qualquer letra, isso significa que ela está em perigo”. Em seguida, alguém do grupo liga para checar o que está acontecendo. A segurança que as passageiras sentem de terem uma motorista mulher é a mesma que a delas. “A mesma segurança que você está tendo, eu também estou tendo”, diz Denise depois de escutar das próprias passageiras um “Que bom que é mulher”.
Denise Santos trabalha há mais de um ano como motorista
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A voz infantil dentro dos estádios Público vira alvo de campanhas de marketing de times no mês de outubro Beatriz Freitas Vera Cruz
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eja na torcida ou dentro de campo entrando com os jogadores, as crianças ocupam parte dos estádios brasileiros. Os menores de 12 anos têm a entrada gratuita em qualquer estádio brasileiro, e as maiores pagam meia-entrada com a apresentação da carteirinha de estudante. O público infantil é muito importante para os times. Outubro é recheado de ações dos times voltadas para elas, visando às comemorações do dia 12 de outubro (dia da criança). O Corinthians proporcionou pinturas de rosto, esculturas com balões, malabaristas e artistas de circo, brinquedos infláveis e brindes para seus torcedores que participaram da Arena Kids, em todos os jogos feitos em seu estádio no mês de outubro. As comemorações também acontecem em conjunto com as do Outubro Rosa, que promove o controle do câncer de mama. No jogo
entre Coritiba e Grêmio, realizado na capital paranaense no domingo posterior ao dia das crianças (15), a entrada de pessoas de até 14 anos e de mulheres foi gratuita na torcida mandante. Não importando a idade, o amor pelo clube e pelo esporte e a emoção de estar no estádio, sentindo todo o calor da torcida, empurrando o time, são os mesmos. Vídeos de crianças emocionadas ao entrar pela primeira vez no estádio de futebol viralizam nas redes sociais, ganhando milhares de cliques e compartilhamentos, como o vídeo do pequeno torcedor português consolando o torcedor francês na final da Eurocopa de 2016. “Gosto de vir ao estádio porque acho que é uma experiência muito legal. Acho que o futebol é o esporte que tem as melhores regras”, disse Thomáz de Oliveira, 10 anos. “Os pontos positivos são o clima, toda a experiência da gente estar junto e de vivenciar o esporte, que contribui e agrega para a formação de qualquer criança”, completa Emanuel de Oliveira, 42 anos, pai de Thomaz.
Rafael Rocha, de 8 anos, no jogo entre Corinthians e Coritiba
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A preferência das crianças entre assistir o jogo dentro do estádio a assistir em casa, pela TV, é unânime. “Sinto mais emoção aqui do que em casa. A visão é muito melhor também”, disse Rafael Rocha, de 8 anos. “Aqui, por não ter os narradores e os comentaristas como nas transmissões pela TV, o torcedor pode tirar suas próprias conclusões da partida”, observou Thomáz. “Eu gosto muito de ver os jogadores de mais perto. Não tem nada de que eu não goste”, declarou Henry da Silva, 13 anos. Porém, levar crianças em estádios tem seu lado negativo. “Eu tenho um pouco de medo de dar confusão”, explica Luciana Rocha, 37 anos, mãe de Rafael. “Eu tento trazê-lo em dias que são jogos com times menores. Nunca em clássicos como contra o São Paulo, Palmeiras e Santos”, conclui. “Na escola, eles reforçam muito a resolução dos problemas dentro de campo e não toleram brigas”. Carlos Alberto da Penha Silva, 47 anos, é pai de Luan, de 5 anos, e disse que costuma mostrar vídeos demonstrando a violência dentro e fora de campo. “Demonstra o desequilíbrio emocional do jogador, e vídeos de torcedores no qual friso bem a crueldade e sofrimento dos pais”. A paixão pelo esporte desde criança é vista como essencial para os pais. “Esporte é vida, saúde, desenvolve a gente. É uma forma de educação. Se você conhece seu corpo, tem uma vida regrada, saudável, pratica esporte regularmente, você é uma pessoa mais feliz. A gente não precisa nem de pesquisa pra comprovar. Basta praticar esporte no dia a dia e você verá o resultado”, afirma Emanuel. “Quem sabe ele não vira um jogador de futebol?” brinca Matheus dos Santos, de 17 anos, responsável por Henry.
Do mundo para o mercado Em uma sociedade cada vez mais competitiva, até que ponto o intercâmbio faz diferença na hora da contratação? Camila Lippi Mariana Alves
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ntercâmbio é toda viagem em que o foco principal é adquirir conhecimentos interculturais pelas experiências vividas em outro país. Esse investimento interacional é visto com bons olhos pelos recrutadores de empresas, o que pode ser uma porta de entrada para o mercado de trabalho. Conforme dados da Pesquisa Selo 2017 divulgados pela Belta (Brazilian Educational & Language Travel Association / Associação das Agências de Intercâmbio), o mercado cresceu 14% no ano passado, levando mais de 240 mil estudantes para o exterior. Os principais destinos foram Canadá, Estados Unidos e Austrália. De acordo o paulistano Willi Jardim Costa Klink, 21 anos, estudante de turismo na Universidade de São Paulo, a importância do intercâmbio não é apenas aprender outras línguas, mas também ganhar uma grande experiência, seja ela por trabalho, estudo e por vivência. “É um desafio que a pessoa encara, ela se propõe a passar por situações que no cotidiano do seu país de origem não são confortáveis, mas ela pode estar disposta a aceitar essas situações de fora e aprender com elas”. Estagiário na empresa Campus Brasil (Agência de Intercâmbio) na área de “outbound”, que envia estudantes do Brasil para o exterior, ele sempre está observando o mercado recrutador e afirma que entre o estudante ter apenas a fluência em um idioma e ter a fluência junto com a vivência internacional, é a segunda opção que tem mais força. “Essa pessoa que vivenciou experiências com certeza vai sobressair”, finaliza.
Marianna é professora de inglês dos níveis Kids 3 e 4
Para a também estudante Marianna Alvarenga, 18 anos, que realizou uma viagem de quatro meses, o intercâmbio gera um grande crescimento pessoal por meio do processo de autoconhecimento. “Querendo ou não, nos transformamos e nos redescobrimos com o choque cultural”. E acrescenta que tanto a aprimoramento da língua quanto a experiência de viver sozinho têm o mesmo nível de importância. “Não se escolhe realizar uma viagem de intercâmbio por apenas um deles, visto que ambos apresentam grande impacto na vida do intercambista”. Em contrapartida, é muito questionada a importância do intercâmbio, uma vez que é possível aprender outras línguas de forma fluente sem sair do país de origem. Porém, muitas vezes, pessoas sem condições de fazer essa viagem in-
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ternacional podem ficar para trás na hora de procurar um emprego. Isso porque na hora da contratação, a competência profissional é analisada e associada com o desenvolvimento pessoal em ambientes e situações, sendo assim válida a experiência através do intercâmbio. Dessa forma, a versatilidade adquirida é muito bem vista pelos contratantes por conta de o indivíduo ter maior facilidade de adaptação. No caso de Marianna, o curso no exterior foi importante na busca por emprego. “No momento da minha contratação por uma escola de inglês, tanto o certificado quanto os quatro meses que morei em Londres tiveram um peso enorme na escolha”. Ela defende que o intercâmbio possibilita a visão do mundo com novos olhos, sendo dessa forma um diferencial.
Gravidez adolescente preocupa A quantidade de mães jovens no Brasil é similar à de países em que o casamento infantil é permitido Isabela Assis Natalia Queiroz
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gravidez na adolescência já é assunto discutido publicamente no Brasil, porém o número de gestações entre meninas de até 15 anos permaneceu constante nos últimos anos, com queda de apenas 5%, longe dos 23% em outras idades, o que leva o país a ter o sétimo maior índice de gravidez precoce da América Latina. No dia 26 de setembro, ocorreu o Dia Mundial de Prevenção de Gravidez na Adolescência, ação internacional que pretende conscientizar meninas com eventos, palestras e rodas de discussões. Um dos tópicos nessas discussões eram os modos de prevenção da gravidez. Uma pesquisa recente do IBGE mostra que 52% dos brasileiros nunca usam camisinha, que é o melhor meio de prevenção de gravidez e DSTs (doenças sexualmente transmissíveis). Daniela Freitas, 35 anos, engravidou aos 15 anos e conta: “[Fiquei] muito assustada. Para mim aconteceria com todo mundo menos comigo”. Especialistas da área da saúde e psicologia reafirmam que a educação sexual seria peça chave para a prevenção, que também evitaria o despreparo e medo dessas meninas; Maria Isabel Rosa, 56 anos, é enfermeira e confirma: “elas não têm orientações nem preparo, e têm que assumir algo com que elas não estão prontas para lidar”. Já na psicologia, se comprova que a adolescente grávida tem cinco vezes mais chances de ter complicações físicas e psicológicas. A psicóloga Jocélia Candido da Silva Almeida, 27 anos, acompanha adolescentes e insiste nas incertezas e dificuldades já existentes na vida do jovem e que se intensifi-
A psicóloga Jocelia acha que jovens precisam de mais preparo
cam na gravidez e criação do bebê. “Na fase da adolescência a criança ainda não sabe quem ela é, não se descobriu. Como ela será capaz de ajudar no desenvolvimento de um bebê?”. Daniela confirma que o peso psicológico é muito grande e que hoje não se imagina engravidando de novo: “A sensação de estar fazendo algo errado é maior”. O papel dos pais antes e depois gestação é imprescindível. Jocélia afirma que a ajuda dos pais deveria começar na prevenção: “Existe a falta de estrutura familiar, e às vezes isso faz com que os pais percam a mão na hora de educar e informar os filhos”. Confirmando a falta de preparo dos pais para receber tal notícia, Daniela relembra de quando contou para seus pais: “meu pai ficou decepcionado e minha mãe, surpresa”. Educação Sexual, que já é matéria curricular em várias escolas pelo mundo, ainda é vista como
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tabu no Brasil, dificultando o diálogo com jovens mesmo quando existe o acesso à informação. Em 2012, a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar mostrou que 70% dos jovens de 13 a 15 anos sabem que o SUS oferece preservativos gratuitamente, o que parece contraditório com os altos índices de gestação na mesma idade. O problema parecer ser mais ligado ao aspecto social e ao ambiente de exposição em que o jovem está inserido, já que 82% desses jovens também sabiam prevenir a gravidez. Além da saúde dessas gerações, o que se mostra preocupante é o contexto socioeconômico dessas jovens. No Brasil, um em cada cinco bebês nasce de mães adolescentes. Entre as mães adolescentes, três em cada cinco não trabalham nem estudam e sua maioria (70%) é de meninas negras. Outro fator preocupante é que quase metade das crianças com mães de até 15 anos tem pais com mais de 20.
A ONG do amor
Espaço atende crianças e adolescentes e oferece atividades educativas e de lazer Ana Paula Mendes Gabriela Pires
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ocalizada no bairro Jardim Rio Bonito, em uma região carente na Zona Sul de São Paulo, a ONG Fábrica de Sonhos nasceu a partir da sensibilidade de pessoas que, vendo a situação de uma família morando em um barraco com portas de guarda roupa com mais de dez filhos, se viram na obrigação de ajudá-los a dar apoio às crianças que passam pela mesma situação na região. Aline Ramalho, 24 anos, estudante de publicidade e propaganda, fala que como não tinham condição de construir casa para todo mundo, tinham que “fazer alguma coisa para que eles mesmos consigam o sonho deles”. A ONG funciona todos os dias da semana e atende crianças e adolescentes dos cinco aos dezoito anos de idade. Todos têm aula de culinária, teatro, leitura e artesanato, além das aulas de futebol e dos ensinamentos bíblicos. “Todos os voluntários são cristãos; a gente respeita muito todas as religiões, por isso não os incentivamos a irem para tal igreja. Mas a gente dá o estudo bíblico e eles adoram”, diz Janaili Fiuza Passos, 25 anos, estudante de pedagogia e uma das principais cuidadoras do lugar. Dentro da Fábrica, por conta do espaço extremamente limitado, cabem apenas 20 crianças. No bairro existem diversas comunidades, e em celebrações como o dia das crianças, já chegaram a presentear e atender mais de 100 crianças. “A ONG veio para beneficiar muito a gente”, revela Vanessa, mãe de algumas das crianças que participam das atividades propostas. “A maior dificuldade é financeira. Além de estar aqui a semana inteira, temos que correr atrás,
Janaili, uma das responsáveis pelo projeto, lendo para as crianças
vendendo coisas. Colocamos eles para vender Fini; para conseguir bancar os passeios, mas a maior dificuldade é essa, com voluntários e com recursos, mesmo”, explica Janaili. Apesar de terem doadores fixos, o valor nem sempre suficiente para as despesas. Além da falta de suporte financeiro, não contam com o apoio de nenhum profissional de fato. Sem advogados, ajudantes na faxina – muitas vezes auxiliados pelos adolescentes da própria ONG -, e nem psicólogos, sobra para as sócias buscarem apoio por fora. Janaili explica que é difícil para eles terem de fato um acompanhamento com as famílias, por não se sentirem bem instruídas em alguns aspectos: Tem mãe de adolescente que fica me pedindo conselho, pedindo para ir lá. Não sei nem o que fazer, tenho 25 anos. Eu faço terapia, aí eu pergunto para a minha psicóloga.”. Segundo Aline e Janaili, as atividades que as crianças mais gostam são as aulas de culinária e de teatro. A última, ainda mais contemplada, faz com que as crianças
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vivam sua realidade sob uma nova visão, mais consciente e tratada de forma mais adequada. “Semana passada eu fiz um curso de prevenção de abuso sexual infantil, e comecei a passar algumas coisas pra eles. É educação sexual, mesmo, eles ficam até constrangidos, porque os pais não falam sobre isso em casa. Aí eu falei que a gente tem que guardar, que não pode deixar ninguém tocar. Depois eu falei para eles contarem uma história, com fantoches, do que eles aprenderam. Foi muito forte. Falaram sobre pais, tios, ‘velhos do bairro’, coisa que eu nem tinha citado mas que eles sabem, porque sofreram isso diretamente. São crianças em vulnerabilidade, sabe?” O sonho dos voluntários, dos pais e das crianças é ter uma “Fábrica de Sonhos” gigante, como elas mesmas dizem, para alcançar mais pessoas que precisam, transportá-las e focar ainda mais no auxílio às famílias, pra ajudá-los em seus problemas pessoais, com a família e principalmente cuidar pra não desfazer o que é feito na Fábrica.
Masp recebe feira de antiguidades Antiquários despertam a curiosidade do público aos domingos na Avenida Paulista Gabriel Sabatini Gustavo Iglezias
As diversas antiguidades da barraca de Sérgio Longo
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esde 1979, no vão livre do MASP, é realizada das 10h às 17h, todos os domingos, a Feira de Antiguidades que reúne cerca de cem expositores e uma média de cinco mil visitantes a cada domingo. A feira, gratuita para visitação, é um paraíso para colecionadores e pessoas que se interessam por objetos antigos, que se apresentam em grande variedade, desde moedas e pequenas esculturas do século XIX até câmeras fotográficas de 1950. Para ter o direito de comercialização, basta ser membro da Associação de Antiquários do Estado de São Paulo (AAESP), como fez Sérgio Longo, 72 anos, aposentado e antiquário desde 1980. Sérgio recebe uma baixa aposentadoria, o que faz com que seu trabalho na feira seja ainda mais importante para sua renda. Em sua barraca há diversas antiguidades, como pequenas esculturas japonesas e russas, câmeras fotográficas, colares, artesanatos, entre outros.
Segundo ele, esses objetos chegam ao Brasil por meio de imigrantes, como os japoneses que traziam o marfim e os russos a prata. “Eles vão passando de mão e mão, agora estão comigo, mas em breve irei vendê-los, assim como o próximo comprador fará. Dessa forma, normalmente retornam ao país de origem”, afirma. Devido à sua localização e popularidade, muitos famosos e estrangeiros frequentam o espaço e procuram conhecer as barracas, como a de Carlos Augusto de Lima, 81 anos, aposentado e antiquário, e sua filha Fernanda de Lima, 47 anos, publicitária. Segundo eles, por ela já passaram o ex-ministro José Carlos Dias, o juiz Gilmar Mendes e o cineasta alemão Wim Wenders. Membro da feira desde o primeiro ano, Carlos comenta que não tinha nenhuma atração por isso, mas uma vez, em Montevidéu, no Uruguai, sua mulher comprou um lustre Galle, e como frequentavam leilões, ela decidiu
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vendê-lo e conseguiu um bom dinheiro. Depois disso decidiram abrir uma barraca no MASP. “A iniciativa deu certo, começou a entrar capital e nós decidimos abrir uma loja em Pinheiros, sem abandonar nossa barraca, e estamos aqui até hoje vendendo bengalas e fotografias”. Para quem é colecionador e se interessa por antiguidades, assim como Henrique Maia, 18 anos, desempregado, a feira é uma ótima opção de entretenimento para os finais de semana. Henrique coleciona moedas e cédulas antigas, e em sua primeira visita à feira seu foco não poderia ser outro. “Estou gostando muito, sua peculiaridade é algo que me atrai e estou ainda mais atraído por encontrar os objetos de meu interesse, as moedas”, diz. Ele começou a colecionar moedas na infância, quando tinha por volta de oito anos. Seus avós deram algumas e ele resolveu guardar e juntar com o tempo. “O que mais me fascina nessas antiguidades é que elas são objetos teoricamente ordinários, que quando guardadas trazem certas lembranças. Quando meu professor de história me contou sobre a existência da feira, vim assim que pude”, completou. A Feira de Antiguidades do MASP atrai pessoas de todas as idades e nacionalidades. É um ponto turístico que recebe muitos estrangeiros, ainda mais por estar localizada na Avenida Paulista. As coleções são compostas por antiguidades, mas também por objetos recentes valiosos, como por exemplo as moedas temáticas dos Jogos Olímpicos Rio 2016. O marfim japonês de Sérgio pode ser adquirido por 2.800 reais e sua câmera fotográfica de 1950 por 1.800 reais. Já as fotografias de Carlos variam de 50 a 100 reais dependendo de seu valor histórico.
Versão brasileira Conheça a experiência e as histórias de carreira de um grupo de dubladores da cidade de São Paulo Fernanda Varela
O
s estúdios de dublagem de São Paulo, como a Vox Mundi, SP Telefilm e a Unidub, traduzem inúmeros conteúdos, tanto para cinema, quanto para canais da TV aberta e por assinatura, tendo como principais clientes a Nickelodeon, HBO, Ani-
“Clube dos Cinco”: o time de dubladores reunidos para a entrevista
mal Planet e Discovery Channel, e produtoras cinematográficas, como a O2 Filmes e a Sony Animax. EsSe trabalho é realizado com muita dedicação e talento pelos profissionais que são responsáveis por dar “vida” a personagens
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que fazem parte da história e do cotidiano de espectadores desSes veículos. Em uma época em que os canais passaram a “proibir” dubladores adultos de fazerem vozes infantis em desenhos e filmes, Flora
Dublador e jornalista Bruno Dias
Paulita, Daniel Figueira e Gabriela Milani iniciaram suas carreiras no universo da dublagem. Por volta dos nove anos de idade, já se encontravam em estúdios para testes e gravações de vozerio (gravação de cenas conjuntas entre os dubladores no estúdio). “Comecei cantando”, conta Gabriela, 23 anos, dubladora de Stephanie, a menina dos cabelos cor-de-rosa do programa infantil LazyTown (Discovery Kids). Em seguida, entrou para o time de dubladores do programa Backyardigans, do mesmo canal, junto de Daniel, 24 anos, que passou no teste para viver o personagem Pablo, depois de realizar um curso de dublagem no estúdio Álamo. “Aí tudo engrenou”, conta. Flora, 24 anos, participou do primeiro curso de dublagem infantil da cidade junto de sua irmã, na época em que sua mãe procurava um curso de dublagem para si mesma. “Não havia turmas para adultos”, explica. “Quando terminei o curso, fui à Álamo, fiz um mês de estúdio voz e comecei a dublar”, conta a “voz” das atrizes
Ariana Grande (Sam e Cat, da Nickelodeon) e Chloe Grace Moretz (500 Dias com Ela). A música também trouxe Mariana Evangelista, 19 anos, para a carreira de dubladora, aos doze anos. “Uma das donas da Vox (Mundi) é praticamente minha madrinha, e um dia ela me ouviu cantar na piscina e disse para minha mãe me levar para fazer um teste”. Foi então que Mariana, sem nunca ter “entrado em teatro”, passou no teste para dublar um musical que passava no Discovery Kids. Hoje, sua voz está no ar no Disney Channel, com a protagonista Luna, do seriado Sou Luna. Nem todos tiveram um início “precoce” no meio. Heitor Assali, 25 anos, entrou para o teatro por conta da dublagem. Fez faculdade de teatro, e nesse ínterim, entrou para o curso de dublagem da Unidub. “Quando terminei o curso, a Angélica Santos (dubladora) que foi me levando por aí na vida...”, diz o dublador de Miles Teller, ator do filme indicado ao Oscar Whiplash. Bruno Dias, 32 anos,
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voz do Jeremias da Turma da Mônica e do Morgan dos Bananas de Pijamas, começou a carreira em 2007. “Fazia teatro desde criança”, conta Bruno, que escolheu a dublagem como uma profissão que lhe desse um sustento maior do que o teatro. “Fiz um curso no Senac e o professor disse que eu poderia dublar adolescentes, que eu tinha uma voz caricata”. Depois de dois anos de estágio, “engrenei”, finaliza. Os primeiros trabalhos em estúdio revelam experiências cômicas de iniciantes. “Eu comecei com o Viggiani”, lembra Mariana, referindo-se ao diretor Orlando Viggiani. “Eu tinha que fazer trezentas vezes a mesma reação de um personagem, porque ele queria a reação do fundo da alma, isso me deixou muito mais crítica em relação a mim mesma”. “De repente estava eu gravando com as dubladoras experientes e tendo que subir em duas listas telefônicas, porque sempre fui pequena, e com muito medo de errar”, ri Flora Paulita. “Entrei com este tom de voz já e tinha mais gente com o mesmo tom, então para conseguir trabalho no começo foi difícil”, lembra Heitor. A tarefa de um dublador é árdua. “Você precisa administrar, tem que estar no timbre de voz do personagem, precisa interpretar, ler texto de uma forma que não pareça lido... É um desafio para a vida toda”, explica Bruno Dias. “Vai além de falar”, diz Flora. E é graças ao trabalho deles que grandes produções internacionais ganham uma “versão brasileira”. Além de permanecer viva na memória de cada espectador, que cresceu ouvindo as vozes destes profissionais em seus personagens favoritos. É como conta Gabriela Milani: “Eu tenho dois irmãos pequenos, e às vezes eles estão lá assistindo Backyardigans e eu digo “meu Deus do céu”. “É uma história”, reflete, “eu vejo alguns trabalhos e eu digo: “nossa, depois que eu morrer alguma coisa que eu fiz vai ficar”“, conclui.