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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE - CENTRO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS

Publicação feita pelos alunos do segundo semestre de Jornalismo - Ano XII - Ed. 192 - Novembro 2017

Doação de órgãos cresce no Brasil

A conscientização é cada vez maior. Mas, apesar do aumento do número de doadores, as filas de pacientes ainda são longas. Página 6 Acontece • 1


Uma saída para a crise O número de profissionais do Uber já passa de 10 mil no Brasil. E todos os dias há novas adesões Julia Pacheco Rodrigo Torres

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crise em que o Brasil se encontra vem exigindo cada vez mais alternativas de trabalho para os brasileiros. E com isso a Uber vem ganhando cada vez mais espaço, com exigências fáceis de serem cumpridas e com a política de trabalho mais maleável, ter carteira de motorista com permissão para trabalho, documentos do carro e não ter antecedentes. O que acaba atraindo desde pessoas que fazem faculdade, trabalham com outras coisas, aposentados e desempregados. Segundo a empresa, 50% de seus motoristas usam o aplicativo como complementação de renda, o que acaba refletindo no atual momento que o Brasil vive. Entre os entrevistados, o maior motivo para se juntar ao Uber foi o complemento de renda, como diz Antônio dos Santos Reis, 74 anos, aposentado e motorista. “Entrei na Uber em julho deste ano para complementar a renda da minha casa e fechar as contas com um pouco mais de folga”. Ele também diz que a Uber foi a primeira opção para conseguir um dinheiro extra, e nunca pensou em fazer algo diferente. Críticas em torno da empresa também afetam a vida do profissional, como expõe o ex-motorista de Uber e agora auxiliar de coordenação Fabio da Silva Oliveira, 38 anos. “Combustível está muito

caro, a Uber cobra 25% de cada viagem, você condena seu carro, a probabilidade de multas aumenta, a insegurança nas ruas e o risco de bater seu carro são grandes”. Outras dificuldades, como o tempo rodado por dia para fazer valer a pena a diária, também sãos expostas por Antônio. “Para valer a pena preciso trabalhar de 10 a 12 horas por dia, para poder recompensar o gasto do carro e poder tirar um `salarinho´”. Mesmo com todas as críticas, os motoristas concordam que a Uber ainda é a melhor forma para complementar a renda em tempo de crise, como afirma o motorista e contador Fabio José Lussoza. “Não vale tanto a pena, porém ajuda muito no final do mês para pagar as contas e muitas pessoas até desempregadas usam a Uber para ajuda em casa”. Como a maioria dos entrevistados concorda que o Uber é, ainda com as críticas, uma das melhores formas de complemento de renda, perguntados sobre a forma de avaliação dos clientes com notas das viagens, os motoristas entram em um consenso que a avaliação dos clientes ajuda a fazer uma crítica sobre o seu trabalho, e ajuda no desempenho do motorista. Porém, uma das vantagens dos motoristas, que era não precisar de muitos requisitos para trabalhar na empresa, vai passar por alterações. O prefeito João Doria criou regras para o Uber e outros aplicativos similares poderem cirProfessor responsável: André Santoro

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Centro de Comunicação e Letras

Diretor do CCL: Marcos N. Duarte Coordenador do curso: Rafael F. Santos Supervisor de Publicações: José A. Trigo

Equipe: Arthur Codjaian Gutierres, Carlos Oliveira, Daniel Fabra, Fernanda Bastos, Isabela Bumerad, Julia Pacheco, Letícia Luchesi, Luiza Granero, Matheus Teles, Rodrigo Torres, Victória Gurjão

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Motorista esperando o cliente

cular na cidade. Serão obrigatórios o emplacamento dos carros das respectivas empresas na cidade de São Paulo, a realização de cursos e a obtenção de certificados por parte dos motoristas, inspeção veicular anual e a identificação visual do veículo como relacionado ao Uber ou outra empresa. Além disso, pela nova regra, os motoristas terão que se registrar no Cadastro Municipal de Condutores (Conduapp) e obter o Certificado de Segurança de Veículos de Aplicativos (CSVAPP), que será obrigatório. Essas novas regras irão mudar a vida dos motoristas, que precisarão de vários requisitos para trabalhar na empresa, além dos que já existiam, como o de antecedentes criminais. Jornal-Laboratório dos alunos do segundo semestre do curso de Jornalismo. Centro de Comunicação e Letras - Universidade Presbiteriana Mackenzie. Foto de capa: Fernanda Bastos e Victória Gurjão Impressão: Gráfica Mackenzie


O celular (ainda) é o vilão O uso indevido do aparelho causa mais de 50 mil vítimas por ano. E não são só os jovens que sofrem com isso Arthur Codjaian Matheus Teles

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s celulares já são um dos maiores causadores de acidentes de trânsito no Brasil e no mundo. Ao contrário do que muitos pensam, não são só os mais novos que possuem o hábito de usá-lo ao volante. Isso acontece devido à facilidade do uso do aparelho. Aplicativos como Waze, por exemplo, mostram o mapa da cidade e suas ruas, auxiliando o motorista a chegar no local. O taxista José Davi, 58 anos, é um exemplo. Está na profissão há 25 anos e, apesar de conhecer bem a cidade, usa o aplicativo Easy Taxi para agradar os clientes. “Hoje a maioria dos passageiros gosta do aplicativo. Embora não seja o melhor, porque a gente tem mais experiência, nós adotamos a opinião deles”, diz. Também revela que quase sofreu um acidente. “Já tive que brecar em cima, quase bati o carro. A gente faz o máximo para não usar, mas as vezes não tem jeito”. Muitas pessoas não entendem a importância de se prestar atenção na hora de dirigir. Uma pesquisa feita pela Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) mostra dados alarmantes. Divulgada no G1 em setembro deste ano, ela revela que, por dia, o uso indevido do aparelho deixa 150 vítimas. Por ano são 54 mil. Segundo o professor de autoescola José Damião, 60 anos, a falta de atenção está na cultura do brasileiro. “É cultural. O condutor não tem noção do perigo do trânsito. Nós formamos mal os nossos condutores. Não tem uma política pública que dê incentivo para a redução desse número de acidentes”, opina. Antes eram os mais jovens que

cometiam essas infrações. “Sim, os jovens entre 19 e 39 anos de idade”, afirma Damião. Porém atualmente todas as faixas etárias estão sujeitas a isso. “Hoje acontece com todo mundo. As pessoas não sabem o risco que é estar usando o celular e dirigindo”, continua. Conforme publicado no G1, em fevereiro de 2016, o número de multas por uso de celulares aumentou 22%. Por isso, foi tomada uma providência e este tipo de delito passou de médio para gravíssimo. “Desde de novembro de 2016, aumentou para 7 pontos na carteira e o valor da multa é 293 reais”, revela José. Humberto Yudi, 49 anos, que trabalha na Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) com educação de trânsito, conta um dos trabalhos da companhia para solucionar, a longo prazo, esse problema: “Temos carros elétricos paras crianças, em colégios primários, e fazemos abordagens na rua”. Ele deu uma aula no Mackenzie no dia 17 de outubro sobre segurança no trânsito. Apesar de ter sido sua primeira vez na instituição, essas aulas fazem parte de um programa de educação para jovens. Na palestra, Humberto mostrou dados preocupantes: 42,2%

dos que morrem em acidentes de trânsito são pedestres, 37,3% são motociclistas, 17,3% são motoristas ou passageiros e, por último, 3,1% são ciclistas. Para ele não são só os motoristas que precisam tomar cuidado com a falta de atenção devido ao uso do celular. “O acidente não é somente para quem está no volante, quem está na caminhada acaba caindo em escada e buraco. Todos (pedestres e motoristas) acabam perdendo”, afirma. A técnica de Damião, que é professor em uma autoescola, é proibir o uso de celular em sala de aula, assim o aluno treina concentração. “Eu não deixo o aluno usar o celular. Na aula prática, o instrutor não deveria deixar o aluno usá-lo também. Porque ele não é necessário. Virou uma rotina, um vício”, conta. Outra solução para diminuir esses acidentes é usar o seu próprio causador. Há aplicativos para celulares que deixam os aparelhos em modo silencioso e mandam respostas automáticas para as notificações recebidas. Esses aplicativos, como o Android Auto ou Apple Carplay, ligam automaticamente assim que o motorista começa a dirigir.

Motorista usando o celular enquanto o semáforo está fechado

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Educar é incluir Escolas municipais de Osasco desenvolvem forma de incluir alunos com deficiência, distúrbios do desenvolvimento e altas habilidades Isabela Bumerad

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chamado AEE (Atendimento Educacional Especializado) é uma forma de trabalhar habilidades que o aluno necessita para que ele possa aprender o conteúdo dado em sala de aula através das Salas de Recursos Multifuncionais (SRM), uma sala com materiais pedagógicos diversos para atender todos os tipos de deficiência. Ele é realizado por EMEIs (Escola Municipal de Ensino Infantil) e EMEFs (Escola Municipal de Ensino Fundamental) da cidade de Osasco, na Zona Oeste do Estado, com o objetivo de incluir a criança no ensino regular, mas de uma forma que ela consiga se adaptar. Atualmente em Osasco e São Paulo (capital) existem ONGs, clínicas e escolas específicas para crianças e adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), mas nem sempre são acessíveis financeiramente para as famílias nos dois últimos casos e geograficamente nos três. Assim, o projeto de inclusão que conta com professores, estagiários de pedagogia e agentes de inclusão além das SRM torna-se a saída mais viável para a família. A rede tem a obrigação de oferecer o serviço, mas a família pode optar por não o fazer. Entretanto, para que uma criança seja apta ao programa não basta que ela apresente alguma deficiência ou tenha um dos outros quadros que são atendidos. É necessário que ela passe antes por uma avaliação. “Um aluno que apresente uma deficiência física e que já tenha sido beneficiado por adaptações de mobiliário ou de materiais não necessariamente precisa do AEE, justamente por isso é feita uma avaliação”, explicou Gisleine de Cassia Soares Vianni, 49 anos, pedagoga e professora do Atendimento

Setor de educação inclusiva na Secretária de Edução de Osasco

Educacional Especializado. Para o estudante ser apto a receber essa oferta ocorrem alguns fatores como, primeiramente, uma caracterização inicial que seria o professor do aluno notar algo diferente nele como nos casos do TEA, TGD e altas habilidades que ainda não tenham laudo. Para aqueles quadros mais visíveis ou que já tenham laudo e também aqueles iniciais apontados pelo professor, os casos vão ser analisados com o intuito de ver a necessidade de receber o beneficio. Em caso positivo é chamada a família da criança. Nesse momento se juntam os professores, a equipe do AEE e a família para saber como é o estudante em casa, falar o que foi avaliado e ver se os pais permitem que o filho seja incluído nesse atendimento. Se a família permitir é feita uma ficha de encaminhamento para o programa e lá feita uma avaliação, depois é passado o parecer deles. A partir daí, se o parecer for afirmativo, começa um plano para o atendimento da criança com a aprovação dos pais. No caso de crianças com autismo é mais fácil identificar para fazer uma análise e, se necessário, o encaminhar para dar início ao

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processo por elas apresentarem um padrão comportamental muito parecido. A pedagoga explicou que esse padrão se dá por comportamentos como a falta de comunicação verbalizada, irritação, falta de interesses por assuntos que não sejam os que ele gosta e outros mais. Sobre essa dificuldade, a estudante Stephany Arivabene, de 20 anos comentou, sobre o primo dela, Abner, de oito anos: “Primeiramente, minha tia começou a perceber que ele era bem desligado, não aceitava muito bem o que os outros diziam, comia pouco e somente o que ele gostava, comendo só aquilo todos os dias, além de falar pouco”. O AEE hoje tem o reconhecimento da Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo como um avanço por trilhar um caminho pela educação inclusiva de qualidade. A pedagoga finaliza dizendo: “eu reforço que ainda não chegamos lá. Vivemos séculos de exclusão, crianças e pessoas com deficiência sempre foram excluídas. Em 10 anos de política não vamos acertar tudo. Temos problemas, sim, principalmente de políticas públicas, e são elas que tentamos melhorar para um educação inclusiva de qualidade”.


Um direito a ser conquistado

O respeito por espaços preferenciais ainda é um desafio para os idosos e pessoas com deficiência Sophie Cohen Chermont Yasmin Ahmed Hatheyer

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Lei Federal 10.048/2000, em seu artigo 3º afirma que as empresas públicas de transporte e as concessionárias de transporte coletivo reservarão assentos preferenciais identificados aos idosos, gestantes, lactantes, pessoas com deficiência e pessoas acompanhadas por crianças de colo. E desde de janeiro de 2016, os assentos também são oferecidos a pessoas obesas com caso de mobilidade reduzida, segundo Lei Federal 13.146/2015. Infelizmente, muitos cidadãos brasileiros têm descumprido as leis estabelecidas, desrespeitando o direito das pessoas necessitadas, como explica Ivete Pargominity, 70 anos, dona de casa. “São pessoas que não respeitam os idosos, não têm prioridade igual às pessoas mais velhas e, por isso, acho que o governo tem que tomar uma providência séria”. Quando cita sobre a falta de respeito da sociedade em relação ao preferencial, conta: “Há uma conhecida minha que trabalha e ela tem 72 anos, do bairro Higienópolis (onde eu também moro), ela pega 4 estações de trem, e nesse trajeto, ela fica em pé o tempo todo, ninguém deixa ela sentar”. Dalel Sania Auada Bumerad, 84 anos, que mora em Osasco, diz que não se manifesta em situações onde se encontra desconfortável. “Eu tenho vontade de falar, mas não consigo porque o trajeto é curto também, então fico pensando ‘eu não trabalho, ele trabalhou o dia inteiro, deve estar cansado’, e acabo não me manifestando”. E as atitudes futuras da parte da população jovem em melhorar nesse quesito? “Se a educação do brasileiro está longe ainda, nem sei o que falar. A gente (adultos) sempre tem a esperança de um país

Dalel Sania Auada Bumerad, usuária de transporte público

melhor”, diz Dalel. Já há outros casos em que nem todos os necessitados utilizam os transportes públicos, sejam eles ônibus, metrô ou trem. Há idosos, como é o caso de Herman Bartian de 73 anos, paulistano, que dizem que preferem dirigir, mas quando perguntado sobre o dever do necessitado em se posicionar diante de uma situação desagradável, ele argumenta: “A manifestação é sempre complicada”. E ao se referir sobre a vaga preferencial em estacionamentos, exemplifica: “você tem que pegar a pessoa parando. É diferente de você pegar a pessoa saindo, pois se ela estiver saindo e de vidro fechado, o que adianta eu fazer? Devo fazer um escândalo?”. Muitos daqueles que precisam do uso preferencial sofrem uma ou outra situação adversa. De acordo com os entrevistados, deve ser tomada alguma providência do governo e também das empresas de transporte, que assumem a responsabilidade de fornecer o preferencial. Nosso último entrevistado, Lu-

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cio Azoim, de 73 anos, também diz que já passou por situações em que se viu desrespeitado. “Não reparei se estava com o cartão (o cartão de idosos) ou não, só que na saída eu vi que realmente foi utilizada indevidamente”. Diante desse ponto, é preciso informar que de acordo com a Lei federal nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, os idosos com idade a partir de 60 anos têm direito de usufruir da carteira de idoso, assegurando a gratuidade do transporte público e também a preferência em estacionamentos. Os benefícios do cartão do idoso são ofertados exclusivamente para cada idade. Os idosos com idade entre 60 e 64 anos podem ter acesso ao cartão do idoso apenas para estacionamento prioritário. Já os idosos com mais de 65 anos, além de ter prioridade ao estacionar, possuem acesso gratuito ao transporte público. Quem não tiver o cartão do idoso e infringir essa lei poderá ser multado em até 200 reais e levar 7 pontos na carteira de habilitação.


Doação que salva vidas Número de pessoas que oferecem órgãos para transplantes aumentou 16% em 2017 Fernanda Bastos Victória Gurjão

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egundo o Ministério da Saúde, as doações de órgãos no Brasil aumentaram 75% nos últimos sete anos, batendo recorde em 2017. No primeiro semestre, o país contou com 1.662 doadores, 16% a mais do que o contingente do mesmo semestre no ano anterior. Atualmente, 34 mil brasileiros estão à espera de um órgão. O sonho da cirurgia começa a partir da fila de transplantes – momento inicial para o sucesso daoperação. A nefrologista Suelen Bianca Stopa Martins, 34 anos, afirma: “os pacientes em diálise ou no final da função renal são inscritos no Cadastro Técnico Único, que não é uma fila por ordem de inscrição”. Segundo ela, as listas diferem dependendo do órgão necessário. Existem algumas condições principais para a distribuição dos rins, dentre elas a compatibilidade, analisando o sistema sanguíneo ABO e o fator genético HLA, semelhante ao DNA. O estudo desses detalhes diminui o risco de rejeição. Quando há um doador compatível, o receptor é contatado. Suzana Ribeiro, 36 anos, está na fila esperando o terceiro transplante e conta: “nos dois primeiros [procedimentos] eu tinha doador, não entrei na fila. Foi mais tranquilo. Agora é a primeira vez que estou na fila. Entrei na posição 1.150, e agora estou em 1.096”. Formada em enfermagem, a goiana deixou a profissão pela sua doença: “nasci com um problema congênito. Quando fiz o primeiro transplante, estava bem debilitada. Tive que parar porque passava mal no trabalho”.

Transplantada de rim, Suzana Ribeiro espera doador compatível

Mesmo sendo um procedimento que melhora a saúde de pacientes como Suzana, médicos ressaltam que o transplante é um tratamento, não uma cura. No entanto, para pessoas como Maria Deolinda Cunha Sobral, 47 anos, o transplante mudou não apenas sua vida como também a de seu filho. Antônio Maria Cunha Sobral, 12 anos, transplantado quando tinha apenas um ano, nasceu com uma má-formação no fígado. A mãe e doadora conta: “ele era uma criança triste. Não sorria. Apenas ficava sentado, inclusive para dormir, porque não conseguia respirar. Uma semana depois, Antônio sorria”. Atendido pelo SUS, ele teve sucesso em sua cirurgia com maior rapidez e menor burocracia, ressalta Deolinda. Os benefícios do transplante, em comparação com a hemodiálise, são inúmeros. “[O paciente] não precisa ir três vezes por semana para ficar ligado, durante quatro horas, a uma máquina no hospital. Simplesmente troca isso pela tomada do remédio”,

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afirma Martins com relação ao indivíduo transplantado. Ribeiro, que antes tinha parte de sua vida privada comprometida por conta das sessões, diz: “A maior diferença é que com o transplante você não fica restrito. Por exemplo, você tem que fazer hemodiálise no Natal, Ano Novo, seu aniversário. Não interessa! Dia sim, dia não você precisa estar lá”. Apesar de todos os evidentes privilégios que o tratamento de substituição pode trazer à vida de alguém com quadro clínico grave, muitas famílias ainda negam a doação. Segundo dados de uma pesquisa feita pelo Ministério da Saúde, 43% dos brasileiros recusam a doação de órgãos de seus familiares após o falecimento. “Estou esperando que, com o falecimento de uma pessoa, a família tenha compaixão e permita a doação. Então, você depende de alguém e da família optar pela doação, naquele momento de dor. Sua vida está na mão de outras pessoas”, afirma Suzana, que continua esperando por seu novo rim.


Alcoolismo na juventude Apesar do apelo das mídias atuais, o vício em bebidas ainda é um tabu entre os jovens Carlos Oliveira Letícia Luchesi

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egundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil aparece em terceiro lugar, na América Latina, no consumo de álcool entre os adolescentes. Doenças como cirrose hepática, hepatite, fibrose, anemia, câncer, dentre outras, podem ser geradas pelo uso abusivo da substância. A psicóloga Cristina Gonçalves, de 24 anos, diz que já que o uso do álcool é legal no país, a primeira coisa que precisa ser falada é sobre como a substância é utilizada. A preocupação começa a ficar maior quando existe o abuso dessa substância. Então começa por aí, na legislação isso já é permitido, a pessoa não tem que se esconder para beber, pode sair, ir ao bar, estar numa mesa de família, tomar um vinho, uma cerveja. E a outra grande parte, que é uma parte que pesa muito, é ser aceito na sociedade. Então é comum que as pessoas bebam. A criança desde pequena já vê a família tomar cerveja ou vinho nos churrascos. “O álcool é droga como qualquer outra. Uma droga legalizada, aceita socialmente”, diz Cristina. Cristina comenta sobre como a legislação do Brasil em liberar bebida para maiores de 18 anos não ajuda em muita coisa. Segundo a psicóloga, jovem bebe, adolescente também, às vezes vemos até crianças, mas por que isso? Porque isso é naturalizado, antes da legislação, temos o “socialmente aceito”. Depois começa com a pessoa buscando sua identidade, querendo ser inserida no meio social, há uma transformação em seu organismo. “Se isso funciona em outro país, não tenho propriedade para falar, pois não estou incluída nessa cultura. Mas se pararmos para pensar, o álcool é uma substância

Cristina mostra seu arsenal de conhecimeno

difundida mundialmente, não é motivo de tabu. Acho que isso vai muito além da legislação, está no dia a dia, é do nosso cotidiano. Depende da cultura do lugar”, conclui a psicóloga. Fomos ao A.A. (Alcóolicos Anônimos), grupo Campos Elíseos, localizado na paróquia de Santa Cecília, em outubro. As reuniões ocorrem em uma sala localizada na lateral da igreja, identificada apenas por uma placa. O grupo tem o objetivo de reunir dependentes em álcool para que todos possam compartilhar suas experiências. Kevin Mendonça, 20 anos, palestrante do grupo, conta sua experiência, já que não pode falar dos demais participantes. Kevin conviveu com o álcool antes mesmo de nascer, já que sua mãe bebia muito, até quando estava grávida dele. O álcool foi a primeira droga que Kevin conheceu, seu primeiro contato foi aos 12 anos. Para Kevin, “a legislação não influencia, pois o ál-

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cool é igual às drogas, você conhece instantaneamente, acontece de um jeito com cada pessoa”. O jovem conta que o grupo recebe muitos frequentadores, mas que o quórum depende do dia da semana. Cada data possui um palestrante que traz algum tema em especial, e o de Kevin é a literatura. O anonimato é o alicerce espiritual do A.A. Ele leva a irmandade a governar-se, mantendo os princípios acima das personalidades. A unidade declara que seu futuro depende do bem-estar comum ser colocado em primeiro lugar a fim de manter o grupo unido. Kevin afirma que, depois que o A.A. começou a ter mais visibilidade no cenário mundiala, as pessoas, especialmente os jovens, passaram a ter mais coragem para expor publicamente o problema da dependência em álcool. No dia de nossa visita, o público era majoritariamente jovem e masculino havia apenas uma mulher no local.


Novas raposas Tendência do engajamento dos jovens na política se mantém inexorável, fomentando uma “revolução” de opiniões Daniel Fabra Luiza Granero

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e acordo com a pesquisa “O Jovem Brasileiro e o Futuro do País”, de 2016, realizada pelo Núcleo de Tendências e Pesquisa da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS (Famecos), entre os entrevistados de 18 a 34 anos, 47,4% têm política como interesse na hora da busca de informação e 70,24% se informam diariamente. Mais de 60% desses entrevistados disseram que já estão engajados ou já se engajaram em causas sociais. A tendência à esquerda política soma 46,59% da amostra, enquanto a preferência pela direita chega a 15,76%. O coordenador do projeto identificou maior envolvimento virtual com as causas do que nas ruas. “Acredito que a juventude tem dentro de si algo que nenhuma outra fase da vida possui, que é a quantidade exorbitante de vontade de mudar as coisas”, diz Rodrigo Delauney, 17 anos, estudante, filiado ao Partido Comunista do Brasil, ativista no movimento da juventude Socialista. O estudante reflete como o jovem deve lutar por seus direitos: “O que os jovens precisam é buscar conhecimento, sair do raso dos memes e piadas prontas para se aprofundar”, enfatiza. Rodrigo afirma que existe uma falta da presença, não somente dos jovens, mas da sociedade como um todo, dentro do cenário político brasileiro. “Diversos políticos não defendem ideias baseadas em convicções ideológicas para o bem do povo, e sim em seus interesses pessoais”, afirma. Delauney ressalta a natureza do sistema político brasileiro: “representa apenas empresários, seja do agronegócio, do sistema financeiro ou de outras áreas do empresariado”. O estudante com-

Felipe Jamacaru, 17 anos, integrante da juventude do PSDB

plementa que este fato é facilmente comprovado quando observamos os diversos casos de corrupção que chegam até os altos cargos do Estado brasileiro. “A juventude tem sangue nos olhos para mudar e revolucionar tudo a todo momento, mas nem sempre isso é positivo”, diz Rozana Barroso, 18 anos, estudante secundarista, vice-presidente da União Brasileira de Mulheres em Campos do Goytacases, município do estado do Rio de Janeiro. A estudante acredita que o maior desafio que os jovens enfrentam é de conciliar a maturidade do entendimento que a política é um meio onde as pessoas ignoram uma classe e beneficiam outras, com a vontade e sede por revolução de todo jovem organizado politicamente e disposto a mudar os rumos do Brasil. A estudante relata sua participação na política. “O meu papel é alcançar cada vez mais a população como um todo”, afirma. Ela vê importância em dialogar com a juventude e com a classe trabalhadora sobre os direitos que são tirados. “Eu fui criada, desacreditada de que existia, mesmo a chance de ter uma perspectiva de vida sendo pobre e preta. Mas a par-

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tir do momento que tive acesso à informação, minha vida mudou completamente”, ressalta Rozana. Ela compartilha suas lutas políticas: “devemos nos emancipar de um sistema que enriquece uma minoria nas costas, de uma maioria que nem carne na mesa todos os dias tem”. “O progresso das gerações se complementa ao progresso de uma nação”, afirma Felipe Jamacaru,17 anos, estudante, filiado do PSDB e integrante do movimento Pulsar das Ruas. O estudante acredita que a representatividade do jovem está escassa nos mais diversos setores da sociedade, mas ainda vê esperança para tal cenário: “A vontade de conquistas de espaço pelos jovens é grande e a ausência de jovens na politica deve acabar no futuro, fomentando uma igualdade etária”, complementa. Felipe comenta sobre a a desqualificação sofrida por políticos mais novos. “Nunca aconteceu comigo. Sempre vi um empenho para que os meus valores não se percam nas mazelas que o mundo pós-moderno pode oferecer”, ressalta. “A conquista não é um discurso, é uma atitude, real e tão natural quanto a seleção de Darwin, complementa.


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