UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE - CENTRO DE COMUNICAÇÃO E LETRAS
Publicação feita pelos alunos do segundo semestre de Jornalismo - Ano XII - Ed. 181 - Outubro 2017
O skate invade a metrópole
Adeptos do esporte ocupam espaços urbanos ociosos e transformam o cenário da cidade de São Paulo. Página 6 Acontece • 1
O Brasil na rota da música Só em 2017 são esperados ao menos 18 grandes festivais em solo brasileiro, o que pode consolidar essa tradição na cultura do país Isabela Assis Natalia Queiroz
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Brasil virou parada obrigatória dos grandes ícones da música. Só este ano já foram mais de 10 espetáculos com shows grandiosos e apresentações de todos os gêneros. Kevin Allan, 24 anos, estudande de design de games, que já foi em dois festivais e espera ansiosamente pelo Rock in Rio (realizado em setembro deste ano), afirma: “Cada evento vem trazendo artistas de uma tribo diferente, o Milkshake traz artistas LGBT, Lollapalooza mais indies, Rock in Rio os artistas de World Music. Isso faz com que todo mundo queira ir em algum festival”. A crítica mais recorrente é sobre o preço. Geni Ernestina do Santos, 54 anos, levou a filha ao Rock in Rio 2013 e iria de novo esse ano, mas pontua: “Eu iria sempre, mas o preço é muito alto”. Já Tatiana Aparecida de Assis, 39 anos e gerente financeira, rebate: “Os preços são bem altos, mas isso se justifica: são shows internacionais, com grandes estruturas e aí estamos falando em dólares”. Mas as duas chegam à mesma conclusão: se os ingressos fossem mais acessíveis ambas iriam mais vezes. Ela acredita que a onda dos eventos musicais não vai parar: “Acho que é uma tendência, que junta acesso e economia. Hoje em dia é muito mais fácil trazer artistas
Show da cantora MØ no festival Lollapalooza do ano de 2017
para cá ou ver shows fora do seu estado”. Outro festival de peso é o Rock in Rio, que já bate a marca de 17 edições desde 1985, com mais de 1.588 artistas escalados. Hoje em dia muito se discute sobre a falta de bandas de Rock no festival. Tatiana percebe a diferença, mas discorda da inquietação de certo público: “Desde a primeira edição ele não tocava só rock, teve até show do Pepeu Gomes e Ivan Lins. As pessoas ficam muito ligadas ao Professor responsável: André Santoro
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Centro de Comunicação e Letras
Diretor do CCL: Marcos N. Duarte Coordenador do curso: Rafael F. Santos Supervisor de Publicações: José A. Trigo
Equipe: Ana Beatriz Morgado, Ana Paula Mendes, Beatriz Freitas Vera Cruz, Camila Lippi, Fernanda Varela, Gabriela Pires, Guilherme Fojo, Isabela Assis, João Suckow, Letícia Santos, Mariana Alves, Natália Lucchesi, Natalia Queiroz, Paula Nunes, Sophie Chermont, Valentina Rosa, Yasmin Hatheyer
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nome, mas ele representa uma atitude”. Pelos palcos do Rock in Rio, já passaram vários ícones do RnB, Pop, Eletrônica e Indie. Mesmo em grande expansão, o mercado dos festivais no Brasil está longe de ser saturado. Os fãs ainda esperam franquias como Glastonburry, que acontece na Inglaterra desde 1970, e o Coachella, da Califórnia, fundado em 1999. Kevin completa: “Aqui tem muita gente de todos os estilos e idades querendo consumir música”. Jornal-Laboratório dos alunos do segundo semestre do curso de Jornalismo. Centro de Comunicação e Letras - Universidade Presbiteriana Mackenzie. Foto de capa: Guilherme Fojo e João Suckow Impressão: Gráfica Mackenzie
Evento marca 20 anos de Harry Potter Editora Rocco celebra o aniversário em livraria na capital paulista com 250 fãs Ana Paula Mendes Sophie Cohen Chermont Yasmin Ahmed Hatheyer
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o dia 26 de junho de 1997 foi lançado o primeiro livro da saga “Harry Potter” ,chamado “Harry Potter e a Pedra Filosofal”, escrito pela britânica J.K. Rowling. Em 2017, a saga completou 20 anos. Por causa disso houve edições comemorativas, e no lançamento das novas capas brasileiras, a editora Rocco (que publica os livros no Brasil) organizou 13 eventos no dia 19 de agosto nas principais locações do país. Um desses eventos aconteceu na livraria Saraiva do Shopping Morumbi e foi regido pelos representantes do principal site brasileiro da saga (Potterish), Ana Luisa Constantino e Rodrigo Cavalheiro, ambos de 25 anos. O evento proporcionou a participação da plateia através de brincadeiras relacionadas ao tema Harry Potter, o que tornou o encontro bastante agradável para os fãs que presenciaram esse momento. Um dos pontos altos da tarde foi o “Diário de Fã”, no qual alguns fãs mais antigos contaram sobre sua experiência com a saga; um deles foi Ivis Zaira Pereira, estudante de Design de Interiores na Unip, de 24 anos, fã da história desde 2000, que depois nos contou: “Foi algo que mudou muito a minha forma de pensar, hoje eu agradeço a Harry Potter, porque eu tenho muitos amigos por causa disso”. De acordo com a representante do Pottersih, Ana Luisa, “hoje em dia a gente tem uma paciência maior, veio ‘Animais Fantásticos’ (o novo filme spin-off da saga), novos fãs e tudo isso, a gente abraça, a gente senta, explica, a gente quer que a pessoa tenha o amor por Harry Potter que nós temos”. Ademais, novidades sobre a saga foram apresentadas como a estreia de dois novos livros: “Harry Potter:
Representantes do Potterish conduzindo o evento na Saraiva
Uma História da Magia, O livro da Exposição” e “Harry Potter, Uma Jornada Pela História da Magia”. Mesmo após 10 anos do lançamento do último livro, Harry Potter continua fazendo um sucesso estrondoso, tanto que até lojas brasileiras, como a Riachuelo e a Magazine Luiza, passaram a vender produtos com o tema da saga. O vendedor da loja Casa do Herói do shopping Ibirapuera, Renato Pires Guimarães Sapatini, 25 anos, afirma que “os pedidos chegam mensalmente, porque sempre tem saída”. A perpetuidade da saga pode ser vista, também, quando Rodrigo Cavalheiro, 23 anos, outro representante do site Potterish, presente no evento, nos diz: “a gente não esperava uma participação tão grande, eu estava esperando umas 60, a Ana estava esperando umas 100 e vieram 250 [pessoas]. ” Isso se deve à intensidade da história, que ao longo de 20 anos cresceu e amadureceu junto aos fãs e que acabou por mudar a vida de todos que a acompanharam. A estudante de Publicidade e Propaganda Tabatha de Lacerda, de 25 anos, conta: “minha história com Harry Potter é de longa data, eu descobri com 9 anos porque ganhei o livro de uma ex-namorada do meu pai e me interessou muito aquele universo de magia”. Ela acrescentou: “O que eu mais gosto desse universo
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são todos os ensinamentos de vida que ele traz e por ser um conteúdo para todas as idades justamente por isso, passando por família, amizade, amor, esperança, igualdade etc. É o que me encanta de verdade e mudou minha vida nesses aspectos”. Já que a saga tem como idioma oficial o inglês, a universitária que cursa Educação Física no Senac, Natalia Zanivan Andrade, de 20 anos, diz: “foi Harry Potter que me fez aprender inglês, e hoje isso ajuda muito na minha profissão”. E ainda completa dizendo que a história trouxe diversos valores de amizade, fidelidade, e a não ter preconceito com quem é diferente do “padrão”. Comprovando mais uma vez que realmente o Universo de Harry Potter mudou a vida de muitas pessoas, das mais diversas idades. E, por fim, a estudante de Publicidade e Propaganda da ESPM-RIO, Isabella de Andrade Bihren, de 19 anos, declara: “ A saga me fez enxergar o mundo com outros olhos e foi meu refúgio em tempos difíceis”. E quando perguntada sobre se o protagonista da trama influenciou o mundo, ela cita: “Existe uma frase de A Pedra Filosofal dita pela Prof. Minerva que diz ‘Esse menino vai ser famoso, não haverá uma criança em nosso mundo que não saberá seu nome!’. E eu acho que isso traduz totalmente o que é Harry Potter para o mundo”.
O emprego por meio da tatuagem Os desenhos ainda geram bastante discussão, principalmente quando associados à busca por trabalho Camila Lippi Mariana Alves
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ivendo uma circunstância de contradição, na qual a tatuagem é considerada um tabu por parte da sociedade, mas ao mesmo tempo inúmeras pessoas tatuadas circulam pelas ruas, os desenhos na pele causam polêmica, principalmente quando relacionados a empregos. Em agosto de 2016, o STF (Superior Tribunal Federal) proibiu que órgãos excluam de concursos públicos candidatos tatuados. A medida foi apontada como uma maneira de acabar com a discriminação que persiste no mercado de trabalho. Para Rafaela Dufloth, 21 anos, gestora financeira que tem 17 tatuagens, essa diferenciação ocorre em empresas conservadoras e parte muitas vezes do líder. “Não tinha problema até aparecer com desenhos grandes”. Segundo Andréa Denise de Farias, 41 anos, tatuadora no estúdio Blue Animal Tattoo e Piercing, o preconceito é velado. “A pessoa não vai falar que é preconceito pela tatuagem, mas vai falar que a sua sobrancelha está torta e não pode contratar”. Em uma pesquisa realizada pela internet, o Núcleo Brasileiro de Estágios ouviu mais de 14 mil jovens, a partir de 16 anos, em todo o país. Em 25% dos casos, disseram que se tivessem que contratar teriam alguma restrição com os tatuados. Entretanto, Andréa e o marido, Anderson Oliveira de Farias, 39 anos, também tatuador no estúdio Blue Animal Tattoo e Piercing, admitem que houve mudanças. “Se pensar em 20 anos atrás mudou bastante, está bem mais fácil”, diz Anderson. Áreas profissionais relacionadas com a comunicação, beleza, cultura e até tecnologia são
Gustavo Veríssimo, 25 anos. Ananda Braz de Andrade, 22 anos
adeptas à contratação de tatuados. Breno Bitarello Sad, 31 anos, diz que nunca enxergou essa arte de uma forma isolada. “Pintura, desenho, escultura, tatuagem se influenciam mutualmente”, e acrescenta: “comunicamos ao próximo a todo momento. Quem nos olha nos lê”. Doutor em Educação, Arte e História da Cultura, Bitarello defende que as tatuagens se popularizaram muito rapidamente, devido ao grande impacto das mídias sociais na divulgação, destacando o Facebook e o Instagram. “Há muita coisa boa aparecendo e as pessoas estão conhecendo as possibilidades da tatuagem como meio de expressão e experimentalismo estético”. Os tatuadores Andréa e Anderson também acreditam que a mídia teve um importante papel nessa linguagem, apontando artistas e jogadores de futebol como os principais influenciadores. Para muitas empresas, a resistência na contratação se deve ao cuidado de preservar a imagem
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coorporativa. Grande parte da população ainda não trata com seriedade e muito menos deposita confiança em pessoas com o corpo repleto de desenhos, principalmente quando se trata de áreas mais conservadoras, como a da saúde e advocacia. O tatuador Anderson ressalva que na área militar também existem restrições. Com isso, são diversas críticas em cima de algo que deveria ser visto como uma forte expressão cultural. Já outras empresas, mais modernas, como lojas esportivas e bares, considerados ambientes de trabalho mais informais, não se importam com as figuras de seus funcionários no corpo, uma vez que a aparência não é sinônimo de competência. Rafaela Dufloth afirma que as restrições no mercado de trabalho não são necessárias. “Entendo que, para algumas profissões que trabalham com o público, haja mais restrições. Ninguém está menos qualificado por alguns desenhos na pele”.
Por dentro do Caixote Os desafios do teatro brasileiro vividos pela companhia independente localizada na Avenida Pompéia Fernanda Varela Gabriela Pires
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stando há dez anos no mercado, a Cia. Dom Caixote se mantém viva por meio de muito trabalho, muita disposição e amor pelas artes cênicas. Foi criada depois que Luís Felipe Petuxo, 33 anos, que trabalhava há alguns anos em um estúdio de teatro dirigindo peças, decidiu criar um ambiente onde pudesse, com alguns outros colegas, expressar seus pensamentos de forma ilimitada, sem imposições de terceiros. Além dos espetáculos durante os finais de semana pela Cia., há diversas oficinas durante os dias úteis: “Eu tenho a paixão que é dar aula, fazer o sonho de outras pessoas acontecerem”, diz o criador do espaço. Em meados de 2011, participaram de um festival de teatro na Dinamarca, onde descobriram uma nova forma de transmitir mensagens aos pequeninos: as peças infantis são feitas de igual para igual, fazendo com que a criança consiga interpretar e lidar com o que é mostrado da sua própria forma. Luís diz “odiar tratar a criança ou o adolescente como um idiota” e faz questão de falar sobre tabus como violência, sexo, morte, traição como algo natural. A sede da companhia, assim como o espaço Teatro Cia. Dom Caixote, onde muitas das peças são encenadas, está localizada no bairro da Pompéia. A mais nova produção, em cartaz desde junho deste ano, aos sábados e domingos às quatro horas da tarde, é a peça Mozart para Crianças. Apesar do título, a obra é destinada a todas as idades, e promete levar o espectador a uma viagem inspiradora pela vida de um dos maiores mestres da história da música clássica. “A criança entende tudo isso com muita naturalidade” diz Cassia Bisceglia, espectadora que ficou “encantada com a maneira que a Cia.
utiliza o espaço cênico, tão pequeno, explorando as infinitas possibilidades do teatro, que tudo tem a ver com a imaginação da criança”. Talita Nativa, espectadora e fã do trabalho da Dom Caixote, disse sobre Mozart para Crianças: “Fui com meus filhos e saímos de lá com uma sensação maravilhosa, meus pequenos fizeram perguntas e disseram que eles nunca desistiriam de seus sonhos”. A Cia. já foi premiada inúmeras vezes por suas peças e seus integrantes, tanto em seu país quanto fora, tendo marcado presença em festivais na Alemanha, Áustria, África e Japão. Apesar de um “currículo” rico, lidam com a dificuldade financeira em seu trabalho, assim como a maioria das companhias independentes. Desprovidos de patrocinadores, contam somente com o dinheiro arrecadado nas peças semanais e nas oficinas dadas, onde precisam dividir entre pagar as contas do local e pagar os membros da Cia., que estão desde a bilheteria até o palco e seus bastidores. O objetivo é manter a casa sempre cheia, principalmente com seu “público fixo”, que realmente se
interessa e aprecia o trabalho feito por Luís Felipe e os outros artistas. Petuxo diz não haver muita mudança quando perguntado sobre o teatro no atual cenário econômico brasileiro, mas afirma ser sufocante precisar “fazer a nossa máquina andar com o nosso próprio combustível”. Com seus espetáculos diferenciados, garante que quem assiste suas peças e procura lições de moral sai frustrado: “a ideia é criar diálogo” – mais um motivo para não serem “reconhecidos” no que trabalham. “O teatro é isso, é se arriscar o tempo inteiro, sair da zona de conforto”, termina. O trabalho com a arte do teatro não é fácil, mas o esforço e talento dos profissionais da Cia. Dom Caixote geram trabalhos de qualidade e histórias memoráveis, como afirma Talita Nativa: “A Cia. sempre me surpreende com os recursos cênicos que encontram ótima dramaturgia e atores jovens com uma vontade imensa de fazer Arte de ótima qualidade”. “Eles nunca me decepcionam”, finaliza.
O diretor Luís Felipe Petuxo (esq.) e o ator Vitor Faria
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Construindo o Beco Na Faria Lima, skatistas juntam forças para transformar rua sem saída em espaço cultural Guilherme R. Fojo João A. S. Suckow
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os últimos 10 anos, tem sido comum achar pela cidade de São Paulo espaços culturais exclusivamente voltados ao entretenimento ou ao esporte. O Beco do Valadão é um deles. A rua Mathias Valadão, travessa da Avenida Faria Lima, era uma rua sem saída onde carros e motos eram irregularmente estacionados e entulhos eram constantemente descartados. Para a felicidade dos jovens da região, essa rua excluída do caos, e pavimentada com 30m x 7m de concreto queimado, similar ao que vemos na marquise do Ibirapuera, era o lugar ideal para esportes radicais. Foi completamente acidental. Segundo Gabriel Campelo, organizador do movimento “Skatetata”, que agora toma conta do beco, “foi durante a construção da “Nova Faria Lima”, no governo Maluf, que a rua foi fechada e acidentalmente pavimentada com o mesmo concreto que o restante da avenida”. Não demorou para que os primeiros obstáculos voltados a esportes radicais urbanos, como o skate e BMX, fossem montados no beco. Em meados de 2013, um pequeno obstáculo, apelidado de “borda”, surgiu no canto do beco e dali o crescimento foi exponencial. Campelo, um dos pioneiros do “pico”, nos diz que os primeiros esboços do que o lugar se tornaria foram as “viradas de massa” durante as madrugadas de São Paulo, que fizeram o lugar crescer no escuro. “É no meio da Faria Lima, um lugar com muitos trabalhadores, muita gente focada, então serve como ferramenta para descontrair. As pessoas passam olhando e, às vezes, abrem um sorriso, ou
Luiz Frizarini - “Backside Noseslide Tail Grab” - Beco do Valadão
vendo alguém caindo ou acertando uma manobra. Um lugar de alegria”, diz Luan Keller Monea, 22 anos, estudante de educação física e frequentador do espaço. Tem sido incomum achar toda essa descontração no meio de um marco econômico da cidade. Era de se esperar que o espaço, por ganhar uma visão maior, fosse subsidiado por entidades públicas ou privadas, mas isso não aconteceu. Muito pelo contrário. Foram diversas as vezes em que ambas as esferas, às vezes até em colaboração, tentaram impedir a ocupação do local. Além da constante reclamação por parte de condôminos dos prédios ao lado, houve também questões com food-trucks e diversos agentes de lei, que de alguma forma tentaram atrapalhar a ocupação do espaço. A questão do “Beco”, antes de qualquer subsídio de entidades, está ligada diretamente à ideia de transgressão. “É a questão da ocupação de espaço público, você tem que usar a rua não só para se locomover, temos que usar as ruas como lazer, ela é propriedade sua também. É sua função zelar por ela, limpar ela e usá-la como bem entender desde
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que não atrapalhe ninguém.” Quando as frequentes “coletas de lixo” eram convocadas pela prefeitura, os frequentadores,já se organizavam para combater tal ação. Quando o dia chegava, os modos de resistir e preservar aquele lugar eram diversos, alguns deitavam nos obstáculos, outros fingiam estar usando algo mesmo sem utilidade, porém o modo mais comum adotado pela maioria desde o início dessas demonstrações era formar uma barreira e impedir que o “cata-bagulho” entrasse. Para formalmente tornar o “Beco do Valadão” um espaço de cunho cultural para jovens, seria necessário um processo de “Desafetação”, pois ainda é considerada uma via arterial da cidade de São Paulo, mesmo sem saída. Tal processo formalizaria o local como um espaço de cunho cultural e retiraria a credencial de via, que impede que o espaço se torne mais um estacionamento não regulamentado. Esse processo se torna difícil, afinal não é considerado interesse público e demora um mínimo de seis anos para se concretizar, ou seja, mais que um mandato político.
Streamings fazem sucesso A facilidade e a mobilidade das plataformas online conquistam público e contribuem para sucesso das séries Letícia Santos Paula Nunes
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s usuários de serviços de streaming vêm crescendo desde a chegada do Netflix ao Brasil em setembro de 2011, mas aumentaram consideravelmente em 2016, ano em que o número de assinantes dobrou de 3 para 6 milhões, quando o mercado brasileiro começou a ser considerado pelo CEO da empresa, Reed Hastings, como um foguete. Em dezembro do mesmo ano a plataforma contava com 6 milhões de assinantes no Brasil de acordo com o site Notícias da TV. A pesquisa foi feita por uma empresa que preferiu não se identificar, tendo em vista que a Netflix não divulga o número de assinantes e nem o faturamento por mês. Atualmente a empresa conta com mais de 100 milhões de assinantes, sendo metade desse número fora dos EUA. O grande diferencial dos streamings é a mobilidade e a flexibilidade da programação, que fica a critério do espectador, que não fica refém da grade de exibição dos canais televisivos. Além disso, quem escolhe a programação também é quem vai assistir, contando com enorme variedade de títulos. Apesar da recente explosão de sucesso da Netflix, os streamings virtuais já eram conhecidos no Brasil antes mesmo da chegada da plataforma, o mais conhecido deles Mega Filmes HD, que foi tirado do ar em novembro de 2015 pela operação Barba Negra da Polícia Federal, que busca acabar com sites que reproduzem filmes e séries online sem direitos autorais. Serviços de transmissão online como Amazon Prime e HBO Go
Thawany Aguiar, estudante de RI e fã de Game of Thrones
geralmente possuem uma mensalidade para o acesso do conteúdo. Sendo Netflix a principal. Mas a demora da disponibilização dos títulos por parte da empresa faz os consumidores buscarem as séries em outros meios. Thawany Domingues, de 20 anos, conta que o canal é sempre sua primeira opção: “Assisto pelo Netflix quando tem todas as temporadas disponibilizadas”, mas quando não acha o que procura tenta em outros lugares. “Quando não tem, procuro no Google. Lúcifer, por exemplo, na Netflix só tem a primeira temporada, então a segunda estou assistindo em um site americano”, admite a estudante de Relações Internacionais. O crescimento do streaming foi seguido pela queda no número de assinantes de TV por assinatura. De acordo a Anatel, em maio de 2017 o número de assinantes da
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TV paga diminuiu em 0,73%, perdendo 136.787 usuários em comparação com o mês anterior. Acredita-se que grande parte dos usuários migraram para os canais de transmissão online, tendo em vista o crescimento constante da plataforma, seu baixo custo e variedade de conteúdo. O público que não é atraído pelas facilidades das distribuidoras online acaba sendo conquistado pelo sucesso e repercussão das séries. Aline Freitas, de 19 anos, e estudante de Rádio e TV, conta que a única série que acompanhou até o fim foi “13 Reasons Why”, que aborda o bullying sofrido pela jovem Hannah Baker e os motivos que a levaram a cometer suicídio, graças à discussão que gerou e pela polêmica do assunto retratado. “Assisti a ‘13 Reasons Why’, aquela que fez muito sucesso e todos estavam comentando.”
Veganismo diminui em 10% risco de morte Esse estilo de vida está alcançando e conquistando cada vez mais os brasileiros, mas isso é bom ou ruim? Beatriz Freitas Vera Cruz Natália Croccia Lucchesi
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ada vez mais ouvimos falar sobre veganismo, e definitivamente esse modo de vida está ganhando espaço no mercado e na vida de milhares de brasileiros. Um especialista em estudos nutricionais na Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard concluiu que aumentar o consumo de proteínas vegetais diminui em 10% o risco de morte. Outra pesquisa norte-americana feita em 2016 aponta que, se todas as pessoas adotassem o veganismo 8,5 milhões de vidas seriam salvas até 2050. Segundo a nutricionista Fernanda Brunacci, 39 anos, a dieta vegana pode ser tão vantajosa quanto uma dieta normal. “Uma dieta vegana bem equilibrada apresenta mais fibras e bem menos gordura saturada e trans que
as dietas convencionais. Em princípio, isto evita diversos tipos de câncer, ajuda na prevenção de doenças cardiovasculares e da obesidade”. Porém, ela apresenta alguns pontos que necessitam de maior atenção. “As pessoas devem evitar incluir excesso de carboidratos na dieta, consumir diariamente alimentos que são fontes de proteínas vegetais, como grãos e leguminosas, e fazer acompanhamento com exames laboratoriais para detectar possível carência de suplementação de vitamina B12”. A dieta de um brasileiro não atende as porções recomendadas de vegetais e frutas e, como conse-quência, faltam nutrientes como ácido fólico e vitamina C. “Não existe um determinado alimento da dieta vegana que faz falta na dieta tradicional, mas as pessoas que seguem a dieta carnívora deveriam ter o cuidado de adequar as quantidades de folhas, legumes
Durval Junior, 27 anos, gerente do mercado orgânico Aldeia
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e frutas em sua dieta”. Giuliana Schack, 20 anos, estudante de medicina veterinária, conta que optou pelo veganismo há três anos. “Inicialmente optei por esse caminho pela compaixão aos animais mas com o passar do tempo percebi que o consumo de carne vai muito além disso: a degradação das florestas, o efeito estufa, a falta de água, dentre outros”. O gerente do mercado orgânico Aldeia, Durval Júnior, 27 anos, afirma que o crescimento do mercado vegano é garantido. “As pessoas estão cada vez mais conscientes de que comer carne de animais não faz bem para o planeta”. E acredita que nosso futuro está em pequenas atitudes involuntárias. “Vejo que cada vez mais pessoas possuem seus “momentos veganos” no dia-a-dia: não comendo carne vermelha em um determinado momento, não ingerindo derivados de leite em outro, comprando casacos que não sejam de pele animal”. Muitas pessoas acabam desistindo de uma alimentação vegana por ser considerada cara, mas o vegano Pedro Rodante Vicente, 20 anos, afirma que isso não é totalmente verdade. “Comer fora pode ser caro, mas, os ingredientes veganos utilizados para cozinhar em casa na verdade são muito mais baratos, dá até para economizar”. Apesar de não ter problemas com gastos, ele afirma ter tido problemas em achar um local para comprar tais produtos. “Antes lembro de precisar ir a um mercado específico para poder comprar produtos veganos. Hoje é muito mais acessível comprar e fácil de achar”. O jovem conclui que optar por ser vegano é muito gratificante. “Eu automaticamente ajudo na economia, melhoro minha saúde, bem-estar social e principalmente minha consciência está tranquila”.
Os brechós da Augusta Preço, qualidade e sustentabilidade motivam os clientes que buscam roupas de segunda mão Ana Beatriz Morgado Valentina Rosa
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rua Augusta é famosa por ter bares, boates e casas de entretenimento. Entretanto, um de seus lados é dominado pelo comércio. Ela tem muitos brechós que misturam desde roupas “vintage” a roupas mais populares. Os brechós têm como finalidade vender, por um preço mais barato, roupas usadas e de qualidade, para gerar lucro pessoal, já que a maioria das lojas são administradas por pessoas físicas. O primeiro brechó brasileiro foi criado no século XIX, no Rio de Janeiro. Desde então, novos brechós foram criados e se espalharam pelo país. Na galeria Ouro Fino, na Rua Augusta, é possível encontrar o brechó “Bric a Brac – Passado Presente”. A loja pertence a Gilza Magaly de Camargo, 84 anos. Ela está há quase 40 anos no mesmo local e diz que sempre foi uma garimpeira. Segundo ela, as pessoas procuram roupas diferentes e originais. Segundo dados de 2015 do IBGE, houve queda na compra de mercadorias no país, fazendo a população procurar roupas de segunda mão em brechós. Por conta disso, houve uma ascensão nas vendas desse tipo de estabelecimento de 210%, segundo dados do Sebrae. Ainda segundo a pesquisa, em dois meses do ano de 2015 o número de estabelecimentos do tipo aumentou em quase mil lojas. Segundo Carla Alves, 30 anos, dona do brechó “Devant Vintage,” ”essa cultura de compra de segunda mão é comum na Europa. Lá é uma cultura de sustentabilidade” e afirma que, durante a crise, o brechó “é uma alternativa para comprar roupas mais baratas”. A ideia de que é possível com-
Roupas usadas são uma alternativa da moda na atualidade
prar roupa de qualidade por um preço bom foi reforçada durante a “ 1ª Feira de Brechós da Vitrine Criativa”, na rua Augusta, no mês de agosto. “Se você procurar bem, dá para achar muita roupa legal e por um preço bom. Comprei muita coisa barata”, diz Gabriela Rabelo, 18 anos, estudante. “Agora, com a crise, o pessoal tem procurado mais por brechós, por causa do custo x benefício”, diz Juliana Herculano, 28 anos, vendedora do “Renovar Brechó”. “Trabalhamos com roupa sempre atual. Moda do dia-a-dia e de festas. Pessoas físicas agendam horário e trazem as peças para ser feita a avaliação e o pagamento. Não trabalhamos com doações”. A experiência de sete anos nessa área permite a Juliana afirmar que muitos clientes, além de buscar roupas mais baratas, já possuem um pensamento contrário ao desperdício, a favor de um pensamento com mais ideias sustentáveis. Segundo Isabela Aldred, 17 anos, estudante, ir a brechós é “bom para você ver roupas vintage”. “Vintage” é uma expressão dada a roupas antigas que permanecem na moda e segue uma
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ideia contrária ao chamado “fast Fashion”. Carla Alves não gosta da ideia do “fast fashion” e afirma que nunca aceitou a cultura da moda em massa. “Eu não gostava de ir em uma loja e comprar uma roupa que todo mundo tivesse a mesma, então eu sou garimpeira desde que eu me entendo por gente”. A ideia de produção em massa, o “fast fashion”, é muito prejudicial à sustentabilidade, pois a fabricação em excesso causa desperdício. Esse pensamento motiva a “slow fashion”, que são pequenas empresas, que reduzem a produção, estimulando o consumo consciente. “As pessoas estão pensando mais assim, então acabam procurando mais os brechós”, afirmou Tate Zeca, 23 anos, estudante de moda. A ideia de sustentabilidade motivou a estudante a vender roupas que não usava para poder realizar o sonho de montar sua marca. “Comecei a vender as roupas porque quero juntar uma grana. Essas roupas são aquelas que estavam paradas no meu armário. Então, o conceito do meu brechó é muito diferente do Vintage”.