BNI Especial Natal

Jornais regionais partilham Natal de todo o Portugal

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NATAL EDIÇÃO PARTILHADA

Especial Natal O ‘MAIS/Semanário’ aceitou o desafio que Marsílio Aguiar, diretor do ‘JM – Jornal da Madeira’, lançou a um conjunto de títulos publicados de norte a sul de Portugal, Açores inclusive. Um projeto pioneiro e independente de partilha de histórias com objetivo de, em cada jornal regional, celebrar o Natal de todo o país

‘MAIS/Semanário’ | Póvoa de Varzim e Vila do Conde

Rabanada Poveira na tradição de Natal

Escrever sobre o Natal é referir o grande momento de encontro e da reunião da Família, que no norte do país assume a particular tradição em todos se juntarem à volta da mesa, onde estão os doces característicos da quadra, e na qual na gastronomia local sobressai desde há várias décadas a Rabanada Poveira, que pela sua divulgação nos últimos anos já vem conquistando os portugueses de norte a sul.

A rabanada é um doce de referência na comunidade piscatória poveira. Elaborada com base em ingredientes acessíveis, enquadrava-se bem numa população cujas raízes não se sustentavam na abundância e que incorporavam na gastronomia a singeleza da sua vida quotidiana. A diferença estava na criatividade de quem confecionava, por isso a Rabanada está longe de ser um produto homogéneo. De casa para casa, ou mesmo em cada família, encontravam-se várias soluções, segundo as posses ou os gostos, e reforçando-se assim os sabores com diferentes opções (vinho branco, vinho tinto, vinho do porto, leite, água, etc.).

No entanto, o que associa a Póvoa à Rabanada não é propriamente esta tradição familiar.

A conhecida “Rabanada Poveira” é um produto mais recente, com forte feição comercial e fruto de uma adaptação das tradições locais. No início da década de 50, Leonardo da Mata apresentou a “Rabanada” na ementa do seu restaurante, procurando assim encontrar uma solução para as sobras de pão, o chamado bijou ou molete, mas designado pelos poveiros de “trigo”. Recorde-se que tradicionalmente as rabanadas eram feitas de pão cacete.

Definido o propósito, Leonardo da Mata pôs mãos à obra no sentido de conseguir um resultado convincente. Um percurso feito de tentativas até obter o resultado pretendido. A questão fundamental sempre foi a qualidade do pão facto que, com o passar dos tempos e a moda do “pão quente”, veio dificultar a tarefa.

Mantendo a tradição da comunidade piscatória, o autor recorreu a ingredientes básicos e o resultado final refletiu a mestria do cozinheiro.

José da Mata (filho e colaborador) conta que havia entre os compradores de rabanadas no restaurante clientes que sabiam distinguir quando os doces eram feitos pelo Sr. Leonardo ou pelos funcionários.

O sucesso das “Rabanadas Poveiras” ou das “Rabanadas do Leonardo” levava a grande procura deste produto quer na Póvoa quer na região, sendo frequente o envio para o Brasil.

Era “obrigatório” para quem nos visitava levar para casa uns exemplares do doce de referência da Póvoa. Contou José da Mata que em certas situações (exemplo de jogos de futebol com equipas que traziam muitos adeptos) era necessário haver polícia para disciplinar a fila que se formava para comprar as rabanadas.

Este doce sobreviveu à morte do seu criador e é hoje possível encontrá-lo na ementa de muitos restaurantes da Póvoa de Varzim, mas, como acontece nestas coisas da gastronomia, cada um tem um toque pessoal que o individualiza.

Com base no propósito da divulgação da Rabanada Poveira foi criado há cinco anos a Confraria dos Sabores Poveiros e também o Concurso da “Delicia da Rabanada”, que no passado dia 13 conheceu a realização da sua 13ª edição, que além de reunir muitos participantes, foi também uma iniciativa solidária já que os doces confecionados foram vendidos ao público, cuja receita total foi entregue a uma instituição de solidariedade social local.

Receita da Rabanada Poveira Ingredientes Pão “trigo” (molete ou bijou) - de preferência seco e de boa qualidade, com massa bem fermentada; Leite em quantidade suficiente para que os pães fiquem “a nadar”; Ovos, em média 1 ovo por pão; Açúcar; Canela em pó e pau de canela; Sal (1 pitada) Confeção Aparar o pão nas pontas e parti-lo ao meio de forma a ter uma grossura homogénea. Colocar o leite a aquecer ao qual se acrescenta 1 pitada de sal, um pau de canela, canela em pó e açúcar a gosto. Demolhar os pães nesse leite morno para que fiquem bem cobertos e bem empapados. Espremer bem os pães e colocá-los numa travessa a repousar. Em seguida demolhá-los no ovo deixando absorver bem e fritar em óleo quente e abundante para que as rabanadas fiquem “a nadar”. Retirar e polvilhar com açúcar misturado com canela.

Receitas transmitidas pelo Sr. José da Mata, filho do Sr. Leonardo (2004)

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‘Aurora do Lima’ | Viana do Castelo

Pastéis de Jerimu um doce familiar

Os pastéis de Jerimu não se encontram, regra geral, à venda. Mas, são uma presença quase insubstituível na mesa dos vianenses. A receita passa de geração e geração, mas o seu ingrediente principal não é segredo: é a abóbora menina.

Os “pastéis de jerimu” poderão não ser conhecidos por toda a gente. Mas, as gentes de Viana do Castelo sabem bem o que isso é. As suas origens perdem-se no tempo, enquanto a sua receita vem sendo transmitida ao longo de gerações, como um precioso tesouro, reservando esta iguaria para a mesa farta da noite da consoada e do dia de Natal vianense.

Embora não sendo um doce exclusivo de Viana do Castelo, é, porventura, um dos mais apreciados na cidade situada nas margens do rio Lima nesta quadra de Natal. Suspeita-se que a sua origem possa estar no receituário conventual e que, entretanto, pulou os muros dos conventos para chegar à mesa do povo.

Hoje, a doçaria de Natal está muito diferente.

Muitas das sobremesas são adquiridas em pastelarias e, não raras vezes, até em grandes superfícies. Dizem-nos que é mais fácil assim e mais barato. Mas, os “pastéis de jerimu” são mais do que uma mera sobremesa ou um doce caseiro. Neles está implícita a tradição do Natal, não só pelo sabor, mas também pelo cheiro, aspeto e até a envolvência nos preparos deste doce.

Uma das notas mais características dos pastéis de jerimu, que é feito com abóbora menina, é o aroma a canela. Os vianenses acostumaram-se ao perfume desta especiaria e associam-na a esta iguaria muito apreciada nesta quadra natalícia.

Hoje, esta iguaria já é vendida em alguns estabelecimentos, tais como pastelarias. Mas,

aqui há uns anos, recordam os mais velhos, este era um doce confecionado pelas famílias.

«Ninguém vendia, porque toda a gente fazia e, como tal, também ninguém comprava, porque havia sempre alguém na família que sabia fazer».

«Das poucas coisas que as pessoas compravam já feito», recorda um dos nossos interlocutores, era o “Bolo Rei”, mas a verdade é que, «a doçaria clássica de montra não tem grande piada, porque a doçaria da mesa do Natal é exclusiva dessa quadra festiva. O resto, as pessoas comem ao longo do ano, como o bacalhau, as rabanadas e os nossos pastéis de Jerimu».

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‘barlavento’ | Algarve

Charolas, o cantar algarvio ao deus menino

Charola Ossónoba de Estoi

É uma tradição antiga, com raízes na quadra natalícia, que está bem viva sobretudo no interior dos concelhos de Faro, Olhão e Tavira.

Ainda antes do advento, já as várias charolas desta região estão a ensaiar novos versos e músicas de louvor ao deus menino. No primeiro dia de janeiro saem à rua para espalhar a alegria ao som de castanholas, pandeiros, ferrinhos e acordeões.

Na sede da Charola Ossónoba de Estoi, o saxofone dá o tom e o apito marca o início ao ensaio. Luís José Isidoro, 65 anos, exímio tocador de pandeireta e «charoleiro» desde a infância, é o líder deste grupo com cerca de 30 elementos de todas as idades. Tem 13 anos e é o mais jovem desta freguesia. O ensaiador traz consigo pautas e versos cujos autores já se perderam no tempo, o chamado «canto velho».

Rimas simples de tradição popular. «No meu tempo de menino e moço, quando chegava ao mês de setembro, já andava com as castanholas e fazia a música na minha cabeça». «Antigamente o menino era levado num balaio, ou numa alcofa em empreita. No tempo do meu pai, levava-se o menino em andores. Ia cheio de ouro que as pessoas abastadas emprestavam» para as tournées das charolas peças vilas e aldeias do barrocal. Hoje é uma caixinha mais modesta, onde se recolhem os donativos que

Charola Ossónoba de Estoi

ajudam a pagar as despesas da charola.

«Isto tem sempre com um cunho dedicado ao Natal, ao nascimento do menino Jesus, às festas natalícias e dos Reis», diz Vitorino Inácio, 68 anos, da Charola da Casa do Povo da Conceição de Faro. A preparação começa com dois meses de antecedência, duas vezes por semana, até ao grupo constituído por 30 elementos, «ficar operacional». «É gente de todas as idades. Tem havido continuidade e temos cá muita juventude, uns artistas a tocar». O grupo soma 35 anos de atuações ininterruptas, mas a origem é centenária. «As charolas eram grupos de malta que na última noite de dezembro iam cantando e batendo de porta em porta pelas ruas para anunciar o ano novo.

Ao mesmo tempo pediam enchidos, vinho e dinheiro. Fazia-se mais nas zonas interiores do Algarve», acrescenta Alvaro Vale.

E na tradição há espaço para inovar? Responde Sílvia Navio, da Charola Aldeia Branca de Estoi, fundada em 2005 e com 26 elementos exclusivamente do sexo feminino. «A tradição é tocarmos em vários sítios, festivais, cafés e casas particulares. Quando tocamos a valsa das vivas tentamos fazer versos de improviso, o que se torna muito engraçado», na interação com o público.

Regra geral, há cinco momentos em cada atuação das charolas. Marcha de entrada, estilo, valsa das vivas, marcha de saída e o hino da charola. Ensaiam desde outubro. O professor Nelson Conceição escreve as novas músicas e as letras são criação coletiva. Começam a tocar a 1 de janeiro e durante o mês, «há dias em que é de manhã até à noite».

Ao contrário do folclore, as charolas não usam trajes. Apenas fitas coloridas a decorar os instrumentos e estandartes com o nome do grupo ou da associação. E nem todas cantam ao menino. Segundo Sérgio Martins da Charola Flor de Liz, fundada em 1962, esta é, aliás, uma particularidade das charolas da freguesia de Santa Barbara de Nexe (concelho de Faro). «Cantamos à fraternidade, união, amizade. Somos uma charola laica impulsionada pelo espírito republicano». Ainda têm alguns

Charola Ossónoba de Estoi

dos elementos que a fundaram em 1962, «um património vivo». Hoje são cerca de 20 elementos dos 7 aos 70 anos. Nos improvisos, os versos admitem uma forte componente de crítica social e sátira política.

Quem visitar o Algarve no início de 2016, poderá assistir ao Encontro de Charolas de Faro, marcado para dia 10 de janeiro, no Teatro das Figuras. A 35ª edição promete juntar cerca de uma dezena de grupos.

Bruno Filipe Pires

Charola Ossónoba de Estoi

Charola Ossónoba de Estoi

Charola Ossónoba de Estoi

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‘Aurora do Lima’ | Viana do Castelo

Cantar para anunciar o nascimento do Menino Cancioneiro que esteve á beira da extinção volta a ouvir-se nas igrejas do Alentejo

Naquela que é considerada a província mais descristianizada da Europa, o Alentejo, as populações rurais preservam uma maneira muito peculiar de celebrar o Natal: cantando.

Nada de muito peculiar numa região que, em 2014, viu a Unesco inscrever os seus cantares na lista representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade. Mas, ao contrário do cante de todos os dias, que invoca o trabalho ou a saudade, as “modas” que se entoam na noite de consoada são de uma religiosidade extrema. É o cante ao Menino.

Perde-se nos confins da memória a origem do cante alentejano. Há historiadores que afirmam que terá tido origem nos tempos da permanência árabe no sudoeste peninsular.

Outros acreditam que será uma corruptela pagã das canções litúrgicas próprias aos mosteiros católicos medievais. Também há quem defenda que o cante provenha de períodos mais remotos e que, ao longo da sua transmissão oral, tenha bebido em “todas as fontes”, como assinala uma celebre cantiga popular.

Mas poucos são “vestígios palpáveis” que atestem esse longo percurso que o cante alentejano percorreu até aos dias de hoje. Sabe-se, com alguma certeza, que os grupos corais, tal como os conhecemos, serão herdeiros da tradição orfeónica e que os primeiros a aparecerem organizados terão surgido já no século XX. Sendo que, de entre o vasto cancioneiro popular do Sul, os versos mais longínquos serão precisamente aqueles que, por estes dias, homens e mulheres ainda cantam neste período de 12 dias que celebra a Natividade, entre as noites de Natal e a noite de Reis.

Ao contrário do cante às Janeiras e aos Reis, que era praticado de porta em, em especial junto às casas mais abastadas onde era reclamada alguma compensação pela atuação, o “cante ao Menino” sempre foi visita das igrejas, tal o teor da religiosidade destas composições poéticas. Ainda mais arrastado do que os habituais cantares tradicionais do Alentejo, recorrendo a poemas extensos, por vezes romances, de difícil execução, o “cante ao Menino” é, por

certo, um dos mais antigos legados da cultura oral do Alentejo.

Paulo Lima, responsável pela candidatura do cante junto da Unesco, reconhece com agrado esta passagem das canções de Natal do Alentejo, que antes eram entoadas de forma espontânea, da rua ou do interior dos lares, para eventos organizados, nomeadamente nas igrejas. Diz o antropólogo que “existe hoje um trabalho de refolcorização desta temática, o que é muito interessante”. Paulo Lima afirma mesmo que este é “o grande momento do cante.

Nenhum outro tem o efeito, a repercussão e uma ligação tão profunda à comunidade como este período”.

Em quase todos os concelhos do distrito de Beja estão agendadas cerimónias de celebração do “cante ao Menino”. Um fenómeno impensável em meados do século passado, quando esta tradição coral esteve à beira da extinção.

José Francisco Colaço, estudioso das tradições locais, refere que os próprios grupos corais alentejanos nunca se interessaram muito por este repertório de cariz mais religioso. Antigamente, refere, “havia até alguma recusa em participar neste tipo de cantares. Só muito recentemente é que os grupos corais, pouco a pouco, começaram a entrar nesta lógica”.

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‘Diário do Minho’

Do musgo ao vinho: o verde Natal do Minho O Natal na região do Minho tem sofrido fortes desfigurações na sua vivência mais tradicional, mas ainda preserva, nos meios mais rurais e nas famílias mais alargadas, alguns costumes antigos. O Minho é a mais verde região de Portugal e o Natal tem bem presente esta cor, no musgo dos Presépios e no vinho verde único no mundo.

A «viagem» natalícia começava – e para algumas crianças privilegiadas de hoje ainda começa – não com a carta ao Pai Natal - mas com um passeio pelas bouças e terrenos pedregosos em busca do melhor e verdejante musgo com o qual se construía o mais belo presépio.

Este era formado não apenas com o musgo mas também com pedrinhas, pinhas, serrim e as mais diversas figurinhas em barro pintado. Era num dos cantos mais frequentados da casa (na sala ou na cozinha) que surgia a recriação, em miniatura, do quadro do nascimento de Jesus e da respetiva árvore de Natal.

A tradição minhota fazia valer o sobreiro como a mais genuína árvore natalícia, mas os cuidados da preservação da espécie e a abundância do pinheiro, fizeram com que recaísse sobre o segundo a facilidade e a preferência nesta quadra.

Bastião do catolicismo em Portugal, as crian-

ças do Minho foram ensinadas a que quem trazia os presentes ou prendas era o Menino Jesus e não o «coca-colado» Pai Natal. Mas o segundo, à força do mercantilismo da quadra, conseguiu subalternizar o Menino que é a raiz de toda a festa do Natal.

O próprio Presépio, preparado nas vésperas da festa, era um organismo «vivo»: a criançada ia mexendo nas personagens e o Menino Jesus só era colocado na manjedoura na noite de consoada. Até lá, os pastores com as suas ovelhas «passeavam-se» pelo presépio e os Reis Magos peregrinavam desde os seus castelos em busca da gruta de Belém, onde encontravam Maria e José, com o menino conchegado nas palhinhas, debaixo do bafo do burro e da vaca.

A ceia de Natal minhota era preparada a preceito. Quanto maior a família mais feliz seria o Natal. À mesa colocava-se o melhor bacalhau cozido com as batatas e os frescos da horta.

O vinho verde acompanhava o repasto, desde misturado com o azeite no prato à malga que cada um bebia amiúde. O prândio tinha por epílogo os doces do preceito: aletria, mexidos ou formigos, as rabanadas e o bolo-rei.

Naquela noite ninguém levantava a mesa. Os mais velhos acreditavam que as «alminhas» dos antepassados vinham tomar parte do ale-

gre e familiar banquete. Este é um costume que está ainda arraigado em muitas localidades minhotas.

Come-se e bebe-se para além da norma. Ninguém censura os excessos. Tradicionalmente, as famílias esperavam pela hora da Missa do Galo para poderem beijar o Menino Jesus.

Desde os doces à hora da Missa, pequenos e grandes entretinham-se à volta da lareira, onde ardia o «canhoto de Natal», jogando às cartas ou, com os pinhões, à piorra de quatro faces: Rapa; Tira; Deixa; Põe. Para vencer o gelo da noite – porque se ia a pé para a igreja – havia ainda os que aqueciam o vinho na lareira e lhe juntavam açúcar, mel e canela.

Não era de estranhar, por isso, que a Missa do Galo fosse das «mais bem cantadas» do ano.

Para os mais pequenos, as prendas surgiam «miraculosamente» junto do presépio após a Missa do Galo, colocadas no sapatinho que lá tinham «deixado».

No almoço do dia 25, servia-se a «roupa velha», feita com as sobras da ceia da noite de consoada. Este prato era secundado, para os que ainda tivessem barriga, com um assado ou os rojões à moda do Minho. Álvaro Magalhães

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‘Diário Insular’ | Angra do Heroísmo

“O menino mija?”

Natal nos Açores celebrado até ao Dia de Reis

Padre Dolores

Por esta altura do ano é comum ouvir-se dizer pelas ruas da ilha Terceira, sem qualquer pudor: “Olha que o meu menino mija!”. A frase pode parecer estranha ao ouvido de quem chega de fora, mas para os locais tem um significado especial.

No Natal, é com esta expressão que os terceirenses convidam amigos e família a passar lá por casa, para molhar a garganta com um licor da época, adoçar a boca com uma fatia de bolo e pelo meio dar dois dedos de conversa.

Depois da ceia de Natal e até ao Dia de Reis, a mesa mantém-se posta com doces, salgados e bebidas, à espera de quem possa aparecer.

A tradição já dispensa convites, mas quando os amigos se cruzam na rua o desejo de Boas Festas é quase sempre acompanhado da lembrança de que lá por casa o menino mija.

O costume já remonta aos tempos do povoamento das ilhas, segundo o padre Francisco Dolores. “Nos Açores, em ilhas isoladas, as pessoas aproveitavam todas as oportunidades para confraternizar, sobretudo as festas religiosas”, salienta.

Por todo o arquipélago se ganhou o hábito de visitar vizinhos e familiares próximos. O serão era passado à conversa, junto ao presépio, e muitas vezes acompanhado por cantigas.

Quinta Martelo

Segundo Francisco Dolores, noutras ilhas, os convites eram diferentes: “Não vais ver o meu menino?”, “Olha que em minha casa também há presépio”, “Temos a lapinha”. Na ilha Terceira, quando o dono da casa se demorava para oferecer um cálice de anis ou de licor, o convidado perguntava em tom brincadeira: “O menino mija ou não mija”.

Embora atualmente haja mais fartura em cima das mesas, a expressão manteve-se até aos dias de hoje e a tradição continua viva. Ana Maria Costa confirma-o. Da sua pastelaria, no centro de Angra do Heroísmo, saem todos os anos Bolos de Natal para encher as mesas de quem já não tem tempo para os preparar.

“Vende-se muito bem essas coisas que cheiram a tradição, diferentes do que se encontra nos supermercados”, realça.

Na ilha Terceira, ao contrário de outras regiões, os doces fritos são deixados para o Carnaval e o Bolo-Rei não é tradicional.

Na mesa de Natal de Ana Maria Costa, não falta, desde a infância, o Bolo de Natal, influenciado pela Rota das Índias, com especiarias, mel de cana e frutas cristalizadas, que deve ser preparado com um mês de antecedência para ficar “mais saboroso”.

São também tradição as bolachinhas de Natal

– umas bolachas de manteiga, com uma parte mergulhada em chocolate – os figos passados, por vezes recheados com nozes ou amêndoas, as frutas cristalizadas e, claro, os chocolates.

Antigamente, as bebidas também eram caseiras e davam um cheiro especial à casa pelo Natal. Havia licor de leite, anis escarchado (um licor feito com sementes de funcho) e licor de tangerina, que era preparado no fim do verão, para ficar mais macio.

O consumismo enfraqueceu, de certa forma, o espírito inerente à tradição do “Menino Mija”, na opinião do padre Francisco Dolores, que ainda assim acredita que o convite peculiar que continua a ser feito pelos terceirenses significa “solidariedade, entreajuda e convívio”.

Carina Barcelos/DI

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‘Jornal da Madeira’

Missas do Parto marcam Natal na Madeira

A celebração das Missas do Parto é uma das maiores tradições religiosas do Natal na Madeira e Porto Santo. Acontecem a partir de 15 de dezembro e têm a particularidade de, após a celebração, haver um convívio no adro com muita música e iguarias da época.

Missa do parto - Cantares

As Missas do Parto são uma das tradições religiosas que marcam as festividades do Natal na Madeira e que põem os madeirenses a ir à missa de madrugada. São celebradas na maioria das paróquias de 16 a 24 de dezembro, no entanto em algumas localidades decorrem de 15 a 23, devido ao pároco ter a seu cargo mais do que uma comunidade. A novena à Virgem Maria, pelos nove meses de gravidez, acontece entre as 5 e as 7 horas da manhã, embora haja localidades em que é celebrada à tarde.

Em cada dia, a missa é organizada pelos paroquianos de cada sítio que têm também à sua responsabilidade o convívio no adro. Após a celebração, formam-se grupos de cantares que, ao som dos instrumentos musicais típicos como o rajão, as castanholas, a braguinha, o pandeiro, a gaita, o bombo e o acordeão, vão entoando a música: “Virgem do Parto/ Ó Maria, Senhora da Conceição/ Dai-nos as festas felizes/ A paz e a salvação”, entre muitas outras.

Nestes últimos anos, as Missas do Parto têm registado uma grande afluência de pessoas que, apesar do frio da madrugada, mantêm viva uma tradição única no país que é vivida em todas as paróquias da Madeira e do Porto Santo. Cada localidade tem a sua particularidade. Por exemplo, em Câmara de Lobos as bandas filarmónicas, durante a noite, percorrem o sítio para “chamar” a população para a “Missa do Parto”. Quem quiser, abre as portas da sua casa aos elementos da banda, recebendo-os com uma mesa farta de iguarias caseiras que vão desde os licores, passando pelas broas de mel, o bolo de mel e o bolo de família, muito típicos desta altura festiva. Em outros concelhos, são os búzios que chamam os paroquianos de madrugada para a celebração.

Já próximo à hora marcada da Missa do Parto, os paroquianos seguem em romaria para a igreja e, em alguns sítios são acompanha-

Missa do parto - Cantares

dos pela banda. A liturgia é muito específica e cada antífona começa com “Ó” evocando o ventre redondo de Nossa Senhora, a Senhora do Ó, que é celebrada a 17 de dezembro. Desde o século XIX, a Senhora do Ó é conhecida na Madeira como a Virgem do Parto. Na missa há a invocação ao Espírito Santo, o canto da Ladainha e também são entoados os cânticos à Virgem, ao seu parto e à alegria do nascimento de Jesus.

Cacau e canja Depois da missa, é feito um convívio que junta centenas de pessoas no adro da igreja a cantar versos populares, em honra da Virgem Maria.

Para combater o frio, há o cacau quente e os licores e, para saciar a fome, há a canja, as sandes de carne de vinho e alhos, o bolo de mel e as broas de mel, iguarias típicas da época.

Como são nove Missas do Parto, há muitas pessoas que participam em várias paróquias.

Há até famílias, amigos e colegas de trabalho que formam grupos, fazendo um “roteiro”. Há umas missas mais concorridas que outras. Boa Nova, Camacha, Nazaré, Curral das Freiras, Santa Cecília, Ponta Delgada e Canhas são algumas das mais procuradas. Todos os anos o Bispo do Funchal, D. António Carrilho preside a várias missas do parto. E se antes estas missas eram mandadas celebrar por paroquianos, hoje em dia os pedidos são variados, havendo as Missas do Parto pelos pastores, enfermeiros, militares, polícias, jornalistas e até pelos “arredados”, que acontece na Ponta Delgada, que é para as pessoas que raramente vão à missa. Com as novas tecnologias, as missas do Parto são já um evento marcado através do Facebook.

As Missas do Parto são consideradas uma adaptação local das novenas ao Menino Jesus praticadas nos séculos XVIII e XIX no Norte

Missa do parto - Igreja paroquia dos canhas 2012

de Portugal. Há também quem defenda que estas remontam ao tempo da colonização e da tradição da Nossa Senhora do Ó que se enraizou e ganhou a conotação de novenário na Madeira.

O que é certo é que, atualmente, são cada vez mais as pessoas que participam nesta tradição que marca o Natal madeirense e que, depois da missa e do convívio, vão para os trabalhos a entoar: “Virgem do Parto/ Ó Maria, Senhora da Conceição/ Dai-nos as festas felizes/ A paz e a salvação”.

Marília Dantas mariliadantas@jm-madeira.pt

Missa do parto - Igreja paroquia dos canhas 2012

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‘Notícias da Covilhã’

Noite de Natal é na rua à volta do Madeiro

População das beiras passa a noite em convívio, a comer, beber e cantar, ao redor da fogueira gigante, com vários metros de altura

O convívio é uma constante à volta do Madeiro até romper o dia

Se no resto do País a noite de Natal é passada em casa, nas beiras, tal como acontece no concelho da Covilhã, as famílias saem à rua, após a consoada, para conviverem à volta do Madeiro, a fogueira gigante que tem gente ao redor até ser dia.

Cada terra tem a sua especificidade, mas com mais ou menos metros de altura, feita de raízes de árvores ou troncos, sejam as juntas de freguesia ou a “malta do ano” quem vai buscar a lenha, acesa antes ou após a Missa do Galo, o Madeiro é sinónimo de Natal.

Embora na Covilhã o costume se tenha perdido e não seja actualmente nem regular nem espontâneo, em todas as freguesias a secular tradição está bem enraizada.

No Teixoso, bem próximo da cidade, sempre foram os rapazes que iam “às sortes” a quem competia fazer o Madeiro. Desde que a inspe-

ção militar foi substituída pelo Dia da Defesa Nacional, as mulheres passaram a estar incluídas. Este ano o grupo de 39 jovens começou a organizar-se em Agosto e os tempos livres das últimas semanas têm sido passados a recolher a madeira que encontram ou que lhes dão. Roubá-la sempre fez parte da tradição, o que já levou alguns à barra do tribunal. Por isso tenta-se que a maioria seja cedida, “para evitar problemas”, explica Paulo Eusébio, para quem é “um orgulho e uma responsabilidade fazer o Madeiro” que terá de ser “quanto maior, melhor”, para o grupo não ficar mal visto na inevitável comparação que se faz sempre com os anos anteriores.

“No meu tempo ardia até ao ano novo”, espicaça João Oliveira, de 67 anos, que na sua altura usou carros de bois para cumprir a tradição. Paulo Eusébio sublinha a expectativa anual da população até à semana do Natal, quando levam a lenha para a frente da Igreja, em carrinhas, gruas e tractores. A base é feita com raízes, depois leva lenha miúda e galhos no meio e os troncos grossos por cima, enfeitado no final com rama.

Daniela Lourenço, 18 anos, mostra-se satisfeita por ter chegado a vez dela andar a distribuir filhós e bebida à volta da fogueira, como toda a vida viu. “Não consigo imaginar o Natal sem o Madeiro. Faz parte da rotina na noite de Natal”, salienta.

Carlos Madaleno, investigador e coordenador do Museu de Arte Sacra da Covilhã, vinca que “o fogo foi sempre sacralizado”. Neste caso, simboliza o nascimento da luz. “É uma tradição feita fora da Igreja, mas com profundo

Na vila do Teixoso desta vez cabe à malta de 95 preparar o Madeiro

sentido religioso”, sublinha.

José Dias, 70 anos, conta aquilo a que sempre assistiu no Teixoso. “No final da Missa do Galo o padre vem até ao adro com uma tocha, acende os archotes dos rapazes que se posicionam à volta do Madeiro e, ao mesmo tempo, acendem o lume.

Aqui, apesar dos inevitáveis excessos durante a noite, sempre foi reprovável assar carne no Madeiro. “Não utilizam aquele fogo”, realça Carlos Madaleno. A Sul do concelho, o costume é o oposto, como sucede na vila do Paul.

A fogueira, montada pela junta de freguesia e populares, é acesa horas antes da missa, para as pessoas se aquecerem quando chegam.

Depois entoam-se músicas alusivas ao Natal e há grupos a cantar as Janeiras, que mais tarde assam nas brasas as chouriças, morcelas e outros bens que lhes são dados.

“O Madeiro faz parte da minha identidade. A consoada é com a família, mas depois saímos à rua, vamos à missa, ao Madeiro. Continua a ser uma noite de convívio noite fora”, conta Leonor Narciso, de 60 anos, que afirma sentir a responsabilidade de “incutir nos mais novos a tradição” que também lhe foi passada.

O investigador Carlos Madaleno destaca também o aspecto “agregador, de convívio social” deste costume. “Tem uma dimensão importante de unir as pessoas, de proporcionar a confraternização noite fora”, enfatiza.

Ana Ribeiro Rodrigues

João Oliveira (ao centro) lembra que no seu tempo a fogueira ardia até ao Ano Novo

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‘O Almonda’

O presépio de Machado de Castro na Igreja da Misericórdia de Torres Novas

O Jornal da Madeira lançou o desafio de colaboração a vários jornais regionais, onde incluiu “O Almonda” para divulgar um tema relacionado com o Natal. “O Almonda” decidiu colaborar, apresentando um dos ex-líbris de Torres Novas, o presépio de Machado de Castro, da igreja da Misericórdia de Torres Novas, peça escultórica de grande interesse cultural e artístico, que os torrejanos e os visitantes devem conhecer.

Associado ao Natal e à moderna tradição da árvore natalícia e da habitual troca de presentes, o presépio é um dos elementos mais significativos para os cristãos e representa um dos momentos mais marcantes da história do cristianismo. Em Torres Novas temos a oportunidade de contemplar um significativo conjunto escultórico que, datado de entre finais do século XVIII e princípios do século XIX, nos dá a conhecer a realidade dos presépios nacionais num período de grande difusão do género entre nós. Referimo-nos ao presépio da Misericórdia torrejana, autoria de Machado de Castro, e estudado por Paulo Renato Ermitão Gregório no âmbito do seu trabalho sobre a Igreja da Misericórdia da irmandade torrejana e no qual se baseia este trabalho.

Foi pertença dos proprietários da Quinta de São Gião: Manuel Joaquim de Campos e sua esposa.

Posteriormente venderam-no a João Caetano Pereira, de Torres Novas, que mais tarde fez dele doação à irmandade da Misericórdia. O presépio encontra-se encerrado num armário propositadamente criado para o efeito, entre o cadeiral dos mesários e o altar consagrado ao Senhor dos Passos, numa localização feliz que não fere a estética do espaço barroco da igreja, a qual por si só é merecedora de uma visita à cidade do Almonda – Torres Novas.

Ocupando apenas a metade superior do nicho para ele criado, o presépio apresenta-se encaixado num espaço de forma cúbica. O cenário que mais não é que a representação da paisagem natural - encontra-se organizado em diferentes níveis, qual desenvolvimento em cascata das diferentes ações que nele se desenrolam e representam. Todo o espaço cénico faz convergir as suas linhas de força na “gruta” onde se deu o nascimento de Cristo. A Natividade é assim o

ponto de fuga para onde convergem todas as dinâmicas cenográficas deste presépio barroco.

São quatro os núcleos em torno dos quais se articulam os diversos momentos narrativos representados neste presépio.

O primeiro núcleo, que se situa em plano baixo e primeiro, é o do nascimento de Cristo. Este núcleo central é a peça dinamizadora de todo o conjunto em torno do qual todo o cenário e respetiva ação são articulados. É simultaneamente o ponto de partida e o ponto de chegada, é o ponto no qual se inicia e se encerra o círculo narrativo de toda a composição.

Numa “gruta” emoldurada lateralmente por colunas do maior sabor clássico, com capitéis de feição coríntia, curiosamente da mesma família estilística dos saídos do cinzel de Mateus Fernandes (IV) e seus pares no início do século XVII, que podemos encontrar no portal da igreja - o que lhe dá um carácter de dignidade e diferenciação relativamente ao restante espaço -, divisamos a cena da Natividade representada por pequenas figuras de barro policromadas, de feitura fina, reveladoras de mão hábil na sua moldagem e alegre e vistoso jogo de cores vivas e atraentes.

São maiores estas figuras que as restantes apresentadas, forma que o escultor encontrou para salientar a importância do núcleo narrativo em questão e ao mesmo tempo conferir uma realidade perspetivada do espaço representado.

Para além das figuras habituais - o menino Jesus, sua mãe, José, o carpinteiro, acompanhados dos animais do estábulo - encontramos no interior da “gruta” um grupo de anjos (a orquestra angélica) que entoam cânticos regidos por um anjo, que, em contraponto aos restantes, rege o coro de partitura na mão.

A salientar a importância do momento, encontramos a parte superior da entrada da “gruta” emoldurada por grupos de puttis acompanhados de uma figura tutelar, em posição central, que estamos em crer possa ser uma representação de Deus-Pai. O segundo núcleo que nos é possível observar é constituído pelos oferendantes e pelos pastores.

Este conjunto de figuras apresenta-se, junto à gruta, vindo de ambos os lados do cenário, numa espécie de abraço, num movimento de envolvimento que dá um cunho caloroso à composição.

O terceiro núcleo que podemos visualizar é composto pela caravana dos denominados Reis Magos, que segundo a tradição, seguindo a estrela, chegaram junto do menino recémnascido. Este terceiro núcleo é de longe o mais movimentado, pois a caravana, várias vezes régia, serpenteia ao longo da metade superior da cena, operando assim a ligação entre o cenário superior de cariz urbano e o inferior de aspeto marcadamente rural onde nasceu Cristo.

O quarto núcleo mostra-nos uma faceta mais

mundana do presépio. É constituído por rebanhos, com seus pastores, e múltiplas cenas do quotidiano: um carro de bois que transporta uma mó de moinho; um grupo de pessoas no ato da matança do porco; a lavadeira que lava a roupa no rio; o caçador - fidalgo - com seu mosquete e acompanhado do cão. Temos ainda moinhos com as velas - brancas - ao vento, casario disperso e aglomerado por detrás das muralhas de um castelo. São ainda várias as representações de igrejas e casas de diversas formas e origens geográficas do território nacional. No fundo, estamos perante uma representação do quotidiano português de setecentos, de feição predominantemente rural.

Para além destes núcleos narrativos temos ainda apontamentos retirados da Bíblia tais como o episódio da matança dos Inocentes e elementos - descontextualizados e incompletos - da anunciação aos pastores e da fuga para o Egipto. Interessantes são ainda as figuras no canto inferior direito do presépio, tendo em conta a posição de observador do esteta - que possivelmente representam dois evangelistas, não sendo de excluir a hipótese de estarmos perante “os cegos tocando sanfona”, elementos característicos deste tipo de presépios, embora neste caso sem a presença de instrumentos sabemos que ao longo dos anos vários elementos desta composição se foram perdendo.

Todo o conjunto revela a grande qualidade do presepista, seja na execução das figuras em barro, nas moldagens de cartão ou na articulação dos diversos socalcos de todo o presépio.

A forma como os diferentes núcleos é apresentada, a relação entre eles e a multiplicidade de narrativas transmitem-nos um gosto bastante evoluído. Uma proposta onde podemos percecionar elementos da atitude estética rococó na forma de organização das cenas e dos diversos quadros narrativos que fazem lembrar as propostas de Antoine Watteau na pintura, com as representações das cenas ao ar livre, os núcleos de cumplicidade entre as personagens nomeadamente os pastores - e uma atmosfera de certa forma melancólica, muito ao estilo das “fêtes galantes” género no qual o pintor foi introdutor.

O presépio da Misericórdia torrejana encerra em si os principais elementos caracterizadores desta forma de expressão plástica e religiosa tão exemplificativa da nossa cultura de finais do século XVIII, princípios do século XIX. Obra de grande qualidade estilística e denotadora de uma técnica de presepista bastante elevada e consolidada merece ser divulgada por si só, e não como mais um elemento estilístico da igreja da Misericórdia. Pois esta encontra-se, em nosso entendimento, ao nível de outras obras deste mesmo autor, como é o caso do presépio do Convento do Sagrado Coração de Jesus que em muitos aspetos é de composição similar.

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NATAL EDIÇÃO PARTILHADA

‘Região de Leiria’

Campanha de Natal Ardinas solidários há 15 anos

A iniciativa surgiu, em 2000, com o objetivo de ajudar o Centro de Acolhimento de Leiria. A adesão do público gerou entusiamo e vontade de repetir a experiência. Até hoje, 15 anos depois, não há Natal na região sem a campanha “Fazer o Bem Olhando a Quem”

Começou discretamente e tornou-se uma ação de referência na nossa região. A campanha de solidariedade “Fazer o Bem Olhando a Quem”, promovida pelo semanário REGIÃO DE LEIRIA, teve a sua primeira edição no ano 2000.

Desde então nunca mais parou, mantendo-se fiel aos propósitos para que foi criada: angariar fundos para uma instituição de solidariedade social da região, através da venda da edição de Natal.

Além dos objetivos, também a forma como se desenrola a campanha permanece inalterada.

Por se ter revelado uma fórmula de sucesso, o jornal optou por manter e até incrementar um sistema de venda que se sustenta em três pilares: as empresas e instituições que compram exemplares em bloco para distribuírem por colaboradores, clientes e fornecedores; as bancas; e, por último, os ardinas solidários, distintivo que se cola aos colaboradores e convidados do jornal que durante vários dias percorrem as ruas da região a vender jornais.

Ao longo de 15 anos, a única alteração registada na campanha relaciona-se com figura do mandatário que deixou de existir quando os governos civis se extinguiram. Vários governadores apadrinharam a iniciativa e participaram ativamente, através da aquisição de exemplares e da venda na rua. Foram eles José Leitão, José Miguel Medeiros e Paiva de Carvalho.

Em 15 ações de campanha, o REGIÃO DE LEIRIA canalizou para mais de 40 instituições do distrito de Leiria e concelho de Ourém a totalidade do valor angariado. A receita acumulada é superior a 100 mil euros.

Nos últimos anos, foi notória a redução do poder de compra dos portugueses. A campanha ressentiu-se de um contexto de crise que começou há seis anos e teima em prolongar-

se. O jornal e os seus ardinas mantiveram os argumentos de venda, mas os cidadãos e as empresas não mantiveram a capacidade de contribuir.

De qualquer modo, os valores anualmente angariados nunca envergonharam nem justificaram o fim deste projeto solidário, bem pelo contrário. Para a história da campanha ficam os anos em que a edição de Natal esgotou e em que os ardinas, por força da sua “cantata” e boa disposição, conseguiram convencer os leitores a dar, por um exemplar, muito mais do que ele custava. Na venda de rua, o valor mais alto de que há memória é de 50 euros por um jornal e o ano mais “solidário” foi 2006 com 14.500 euros angariados.

Para se chegar a um valor como este, foi fundamental o contributo das inúmeras figuras públicas que se associaram ao REGIÃO DE LEIRIA nestas ações, desde deputados a secretários de Estado, passando por atores, atletas, artistas, titulares de cargos públicos e muitos outros. Entre os mais conhecidos estão Luís de Matos, André Nunes, João Portugal, Pedro Miguéis, Assunção Cristas, Teresa Caeiro, Teresa Morais, Olegário Benquerença, Manuel Fernandes, António Violante. Da região é habitual a presença de David Barreirinhas, Odete João, Laura Esperança e Maria do Céu Mendes.

Inestimável para a campanha é também a contribuição das empresas e dos municípios da região, entre os quais se destacam Leiria, Batalha, Porto de Mós e Pombal.

A primeira edição da campanha e as três seguintes, tiveram o Centro de Acolhimento de Leiria como entidade beneficiária. O REGIÃO DE LEIRIA tem procurado diversificar as áreas sociais para as quais contribui através desta iniciativa solidária. Porém, algumas entidades têm vindo a repetir-se, em virtude

da premência das suas necessidades para projetos concretos e diferentes.

Em 2015, a APPDA ( Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo de Leiria) volta a ser a instituição contemplada. O valor a angariar destina-se à aquisição de mobiliário e equipamento para as instalações que adquiriu e está a adaptar nos Pinheiros, nos arredores de Leiria.

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