03/05/2020 00h00
Jânio de Freitas – Na cabeça do poder Bolsonaro piora. “Eu realmente sou a Constituição.” “Quem manda sou eu.” “Não é assim [decisão adversa do Supremo] que se trata o presidente.” “O chefe supremo sou eu.” A prepotência extravasa. O pouco que havia de insegurança e perplexidade com sua transição, de desprezível figurante na Câmara ao quase repentino pouso na Presidência da República, cede a uma noção de poder exacerbada pelo desarranjo mental. Bolsonaro agiganta-se aos seus próprios olhos. Psicanalistas, psicólogos e psiquiatras sabiam dessa progressão. As produções do desatino passaram de ocasionais a frequentes, daí a diárias, já são várias no mesmo dia. Bolsonaro está no ponto avançado em que confessou a criação de “uma quase crise institucional”. “Estivemos muito perto”, com sua pensada e contida reação ao veto, pelo Supremo, da entrega da Polícia Federal a um amigo dos seus filhos investigados. “Não engoli.” “Não engulo.” Na mesma medida em que Bolsonaro avança no desvario, os níveis institucionais e os segmentos sociais menos desinformados arrefecem seu pasmo e suas inquietações com as atitudes tresloucadas de Bolsonaro. Passam a ser recebidas quase com naturalidade, satisfazendo-se os zeladores das instituições com a emissão de notinhas e declarações em três linhas, anódinas na intenção e no efeito. Deveriam vir de carimbos, para poupar trabalho inútil. Esse contrassenso lembra que os extremos costumam se encontrar. Se de uma parte temos Bolsonaro, de outra temos um quadro de poderes institucionais também doentio. Com muitos apagões de consciência, errático, sem energia. Condição que prevaleceu, em diferentes graus, na quase totalidade de nossa história pós-monarquia, e que insinua mais uma vez, na democracia fugidia. A possibilidade de dar um choque nessa situação de dupla patologia está, hoje, nas mãos de duas pessoas. E dá dimensão gigantesca às suas missões. São eles o decano do Supremo, ministro Celso de Mello, e seu colega mais recente, Alexandre de Moraes.