Cartilha Contra a Intolerância Religiosa

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Licença & Agradecimentos Esta obra é publicada sob licença copyleft, podendo, ser copiada e distribuída desde que citada a fonte e que não seja alterado seu conteúdo. Para baixar o arquivo completo desta publicação: www.cenbrasil.blogspot.com www.cetrab.org.br www.ciafro.org.br Outros sites farão a distribuição do arquivo em pdf desta cartilha para que todo o povo tenha acesso às informações aqui contidas, na perspectiva de que o conhecimento não é propriedade nem de pessoas, nem de organizações, mas de toda a coletividade humana. Agradecemos às pessoas que colaboraram voluntariamente para o sucesso desta cartilha escrevendo, fornecendo materiais, dialogando, propondo idéias, buscando colaborar no sentido de fazer com que a luta em prol da religiosidade seja de todos nós, religiosos ou não, mas que antes de tudo, acreditamos na democracia.


Cartilha Contra o Desrespeito Religioso Realização Coletivo de Entidades Negras - CEN Apoio Secretaria Especial de Promoção de Políticas para a Igualdade Racial - Seppir/PR Colaboração Centro de Tradições Afro-Brasileiras - Cetrab Coordenação Editorial Marcos Fábio Rezende Correia Edição/Diagramação/Revisão Marcio Alexandre M. Gualberto Autores Almiro Sena Luiz Fernando Martins da Silva Marcelo Monteiro Marcílio José Rosa e Silva Dolores Lima Colaboração Yoná Valentim

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Ilustração Marcos Silva Bigod Fotos Wilson Pastor (in memorian) Fotos gentilmente cedidas pelo Cetrab

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Nota Explicativa

As fotos usadas nesta publicação infelizmente demonstram aquilo que muitas casas religiosas, estudiosos e praticantes vêem denunciando há muito tempo: crescem a cada dia os casos de desrespeito religioso em nosso país. Os dizeres destas fotos estão espalhados em vários locais da cidade do Rio de Janeiro. Nas bases dos viadutos da avenida Brasil (uma das principais vias de circulação de automóveis da cidade), são muitos os dizeres ofensivos à umbanda, ao catolicismo e, principalmente, ao candomblé. Lamentavelmente, para afirmar nosso compromisso com a liberdade de culto concluimos que é importante demonstrar do por quê dizermos isso. E aí, mais uma vez o dito popular torna-se verdadeiro, ou seja: uma imagem acaba valendo mais que mil palavras.


As religiões de matriz africana, notadamente o candomblé, têm sido vítimas, em todo o país dos mais diversos tipos de discriminação religiosa. Sejam ofensas pessoais a pessoas devidamente paramentadas, cusparadas ou mesmo agressões físicas, individualmente, homens e mulheres, que se vestem de brancos, usam torços e elekés (fios-de-conta) têm sido discriminados o tempo todo. Se por um lado a discriminação e o desrespeito religioso se dá no âmbito individual, podemos afirmar que no espaço coletivo/institucional a coisa não é diferente. A associação direta que é feita do candomblé com a feitiçaria, a magia negra e com a figura do Diabo cristão tem sido recorrente. Prova disso são os programas televisivos das igrejas evangélicas neo-pentecostais e, mesmo programas humorísticos que usam de recursos ofensivos à religiosidade de matriz africana para, pretensamente, tentar fazer humor. Optamos nessa cartilha por falar de desrespeito religioso e não intolerância religiosa por um motivo simples, mas fundamental, pois não se atém apenas a uma questão de semântica, mas avança na conceituação do que realmente significa o desrespeito e a discriminação religiosa em nosso país. O verbo tolerar significa você conviver com algo que você não suporta, que você não aceita, que você não respeita, por isso você apenas tolera. Logo, a intolerância seria algo que viria daqueles que não são tolerantes. Até aí, tudo bem, o problema é que nós, como religiosos de matriz africana não queremos ser tolerados. Nós queremos ser respeitados e queremos que nossa fé tenha o mesmo nível de aceitação e de entendimento que temos pela fé dos outros. Portanto, não buscamos que nos tolerem, buscamos que nos aceitem, que nos suportem, que nos respeitem. Essa cartilha busca, antes de mais nada, orientar as pessoas ligadas às religiões de matriz africana a compreenderem seus direitos e suas formas de agirem quando forem discriminadas por aqueles que praticam desrespeito religioso contra o Candomblé e a Umbanda. Por outro lado, queremos também que as pessoas entendam um pouco dos fundamentos éticos, morais, teológicos e doutrinários que fundamentam essas religiões para que percebam o quanto, muito

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Contra o desconhecimento, a informação. Contra o desrespeito religioso, os rigores da lei!

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de seu desrespeito se dá por conta da sua ignorância sobre a religiosidade alheia. Afirmar que Exú não é o Diabo, não deve ser dever nosso, como religiosos de matriz africana, até porque a figura do Diabo não existe em nossa tradição. Cabe, aos cristãos, aos evangélicos, sim, afirmarem que Exu não é o Diabo, pois afinal, foram eles que construíram essa relação entre essas duas entidades. Para nós, compreendermos a dimensão cristã, a fundamentação teológica que cria a Santíssima Trindade é algo simples, porque antes de tudo respeitamos essa tradição religiosa. Avançaremos muito quando os cristãos puderem entender que Xangô, Yansã, Iemanjá, Ogun, Exu, Oxossi, Oxum e todos os outros orixás, voduns, inquices e encantados fazem parte de um belíssimo panteão que no fundo, almeja o mesmo que todas as outras grandes tradições religiosas, louvar e exaltar o Criador, o deus único a quem, com muita humildade chamamos de Olodumare. Marcio Alexandre M. Gualberto Coodenador Nacional de Política Institucional do CEN


Da idéia do Babalorixá Sivanilton (Pecê) do Ilê Axé Oxumarê, acolhida pelo Coletivo de Entidade Negras/CEN surgiu em novembro de 2005 a Caminhada Pela Vida e Liberdade Religiosa. Foram anos de muita fé e luta para montar uma atividade política do Povo de Axé que não ganhasse o caráter lúdico. Todo este esforço foi recompensado este ano com dois gestos significativos e que demonstram amor e respeito de todo o povo do candomblé. De um lado o CEN despe-se de vaidades e monta a Comissão Pela Vida e Liberdade Religiosa, abrindo mão do controle da Caminhada para todas as entidades nacionais que tratam da cultura religiosa afro-brasileira. Ao seu tempo, estas entidades reconhecem a importância da atividade para o povo de axé do país e a consolidam em âmbito nacional a partir do ano de 2009. Também foi elaborado um documento que entra para os anais das Religiões de Matrizes Africanas intitulado Carta de Salvador e que é composto de quatro parágrafos. Sendo os iniciais copiados abaixo: “Nós sacerdotisas, sacerdotes, vivenciadores e simpatizantes da tradição de matriz africana, reunidos nesta cidade entre os dias 20, 21, 22 e 23 de novembro de 2008, para participar da IV Caminhada pela Vida e Liberdade Religiosa e do Seminário Liberdade Religiosa uma Questão de Direitos Humanos, sobre as bençãos de Olorum, Nzambi, Mawu Lisa, Deus vimos de público afirmar que: - Devido à importância político-social que hoje representa a Caminhada pela Vida e Liberdade Religiosa e sua confluência na proposição organizativa das comunidades tradicionais de norte a sul, leste a oeste do país, decidimos por maioria torná-la oficialmente a Caminhada Nacional pela Vida e Liberdade Religiosa, podendo a mesma abrigar todos os segmentos da tradição de matriz africana no território nacional, passando sua organização para o coletivo de entidades signatárias desta carta.” A partir de então, o documento pontua uma agenda nacional para as religiões de matrizes africanas durante o biênio de 2009/10. Conforme transcrito abaixo: - Devido à importância político-social do recenseamento a ser realizado em território nacional pelo IBGE em 2010 e ao fato de nunca ter sido dada a devida importância ao segmento afro-brasileiro, buscando de fato o estabelecimento do perfil qualitativo e quantitativo da nossa população, definimos pela realização de uma campanha de

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Ações futuras para o Povo do Axé

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ação afirmativa nacional protagonizada pelas entidades negras representativas da tradição de matriz africana em parceria com as demais entidades do movimento social negro, elaborada e criada a partir da realidade vivenciada nas comunidades de tradição. Para esta campanha buscar-se-ão as necessárias parcerias com os órgãos governamentais em todas as instâncias. A Carta de Salvador foi assinada pelo CEN, CETRAB, INTECAB, MONABANTU, FENACAB, CENARAB, AFA, CEDRAB, CIAFRO, ABAM, ACOMA, Rede Religiões AfroBrasileiras e Saúde e por mais de 400 autoridades religiosas de terreiros de candomblé de mais de 10 estados do Brasil que participaram do encontro. Ela é fruto da unidade interna. A Carta surge no momento em que a Intolerância Religiosa ronda a sociedade brasileira e os terreiros e que a busca de afirmação dos religiosos de matrizes africanas tornam-se nítidos através de uma série de parcerias com o Estado. Notamos que o axé, o nguzu, a força vital necessita jorrar em abundância e compreendemos o momento que vivemos. Os terreiros são os maiores centros irradiadores dos anseios políticos do povo negro em sua essência mais ancestre. São o ponto focal da resistência com suas raízes fortes e vibrantes de onde brotaram os elementos mais significativos das tradições africanas e sua diversidade no Brasil. Agora, continuamos a pedir bênçãos aos ancestrais e às divindades, arregaçar as mangas e trabalhar, pois este é apenas o começo. Que os Orixás, Inquisses, Voduns e Encantados para sempre sejam louvados. Marcos Rezende Coordenador-Geral do CEN


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Olhares introdut贸rios

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Respeito Religioso O respeito a todas as religiões, à liberdade de credo e de culto, garantindo-se, sobretudo, o pleno exercício de manifestação da fé de todos os seus integrantes, é um dos princípios fundamentais da Constituição Federal, estabelecido como uma das normas basilares de todo o Ordenamento Jurídico brasileiro. Evidentemente, o único limite que pode ser interposto é o do respeito a religião do outro, vez que, para garantir-se o livre exercício de variados credos e cultos é imprescindível que não se admita qualquer desrespeito a eles, principalmente, se esta agressão originar-se de integrante de religião distinta. Ou seja, ninguém, sob justificativa alguma, nem mesmo sob o pretexto de propagar sua religião, tem o direito de atacar, menosprezar, agredir ou ofender as pessoas, os símbolos, o vestuário, os ritos ou qualquer forma de manifestação religiosa. Esse respeito, coaduna-se, justamente, com o valor maior da dignidade da pessoa humana, verdadeiro super-princípio consagrado no art.1°, inciso III, da Constituição Federal, sobre o qual assenta-se toda a construção jurídica da nossa sociedade. Isto é, para um País como o Brasil, definido no art.1°, caput, da Carta Magna, como um Estado Democrático de Direito, a proteção da diversidade e do exercício de credos, crenças e cultos é, mais do que um dever legal, um compromisso constitucional que, se não for devidamente cumprido, ofende gravemente a própria concepção de Estado adotada por seu povo. Dessa forma, é imprescindível que toda a população e, sobretudo, as autoridades compreendam a exata dimensão do elevadíssimo significado que a garantia da liberdade religiosa possui para o Brasil, afinal o respeito à religiosidade do outro, mais do que um gesto de boa vontade, constitui-se, para o nosso povo, naquele preceito mínimo sem o qual não pode existir País, Estado ou Nação. Assim, congratulamo-nos com a relevante inciativa do Coletivo de Entidades Negras em elaborar esse importante documento de informação para o povo brasileiro, rogando a proteção de Deus, Olorum, Jeová, Alá e de todas as demais divindades que, segundo, a religiosidade de cada um, conduzem o universo. Dr. Almiro Sena Promotor de Combate ao Racismo e Intolerância Religiosa do Estado da Bahia

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Oriunda de África, onde sua Tradição Cultural ainda é considerada primitiva, chega ao Brasil daquele século à religiosidade guardada apenas nas mentes de nossos Ancestrais. Em seus corpos carregavam apenas saudosismos dos seus costumes e cultura coletiva, desfrutados em sua terra de origem, o mesmo preservado pelas Comunidades de Terreiro, até os dias de hoje, independente da etnia matriz. Por preservar valores tão primordiais e, contraditoriamente, tão desinteressantes para a sociedade pragmática, monolítica e imediatista, dos dias atuais, valores completamente antagônicos ao das Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, é que a discriminação e desrespeito vêm se dando. As Religiosidades de Matriz Africana, com destaque para Umbanda e Candomblé, tem tido seus valores sistematicamente atacados, seus símbolos destruídos e seus membros profundamente desrespeitados. Seja de forma individual, por grande parte dos adeptos de outros segmentos religiosos que ao se depararem com nossos irmãos em trajes simbólicos (vestes, torços, pulseiras ou colares), trata como estranho àquilo que desconhecem, agredindo com olhares, gestos ou palavras. Seja do ponto de vista coletivo, atacando nossos Ancestrais divinizados, nas mídias e nos muros de toda a cidade, como é o caso do Rio de Janeiro. Historicamente nossas Sacerdotisas, nossas Iyás (Mães), não se acomodaram diante da intolerância e da perseguição, desde os tempos em que tal prática era legitimada pelo Estado, através dos seus aparatos de segurança, quando a polícia invadia Terreiros e levavam seus símbolos e até pessoas presas. Hoje, a cultura de ações discriminatórias contra as Religiosidades de Matriz Africana, demonstra uma face do retrocesso deste tempo, com a manutenção por parte das políticas de estado, quer seja: como agente ativo da discriminação, conforme podemos exemplificar quando da derrubada do Terreiro de Candomblé em Salvador; ou agente passivo da discriminação, a exemplo da liberação dos vândalos que invadiram o Terreiro de Umbanda no Rio de Janeiro, após quebrarem seus símbolos e afirmarem que aquele não seria o último terreiro a ser atacado.. Encontramos-nos diante de sinais de que “um basta” se faz necessário! Que traga ao entendimento das religiões e daqueles que nos perseguem e nos demonizam, o significado de estado laico e os prejuízos, as perdas e os perigos que sofrem as sociedades, nos diversos países em que a intolerância religiosa é simbólica, velada ou latente.

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Não queremos Tolerância e sim Respeito! (Frase de Mãe Beata de Yemanjá)

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É relevante identificar que esta cartilha trata o tema do ponto de vista do desrespeito, por entender que lutar contra intolerância significa pedir tolerância e o que se quer para as Religiosidades de Matriz Africana é tão somente o mesmo respeito que ela tem com todo ser humano, seja de que religião for ou mesmo que não tenha nenhuma. De certo que os que discriminam o fazem por ignorância e muitas vezes pela necessidade de afirmação delas, é também por falta de compreensão da sua dimensão. Consideramos que toda e qualquer religião é construída a partir de uma visão de mundo, cabe ao campo da teologia mediar o entendimento, não seus próprios valores, mas pregar o principio de irmandade e respeito ao próximo com base no entendimento e respeito a visão da religiosidade do outro. Cosmovisão, Territorialidade, Terreiro e Relação de Pertencimento, na visão das Religiosidades de Matriz Africana, não se contrapõem a nenhuma, pois seus princípios e fundamentos teológicos estabelecem a relação de coletividade, solidariedade e, em muitos casos, refiliações, considerando o convívio, dentro de um mesmo espaço comunitário, de pessoas de diferentes origens sanguíneas, se reconhecendo como irmãos, pai mãe e assim sucessivamente. Notoriamente o antagonismo gerado parte das religiões cristãs que através da figura do diabo, criada pela bíblia, atribui símbolos negativos e associa sua imagem a de Exu, cuja relação inexiste do ponto de vista da ancestralidade africana e da verdadeira origem de Exu, o primeiro ser criado da mesma existência genérica que constituiu e constitui cada ser humano. Dê forma velada, podemos afirmar que a Intolerância Religiosa atribuída as Religiões de Matriz Africana, estão intrinsecamente ligadas ao processo de Discriminação Racial, latente em todo o Brasil, por se tratar da Tradição Cultural e Religiosa oriunda do continente africano. Logo, a Religiosidade do Povo Negro. Dolores Lima e Marcelo Monteiro Coordenação Nacional do CETRAB


É exatamente essa expressão que me vem à cabeça quando penso no atual estágio do combate à discriminação religiosa no Brasil. Com isso quero me referir ao protagonismo assumido pelos ministros religiosos, praticantes e simpatizantes de religiões de matriz africana em defesa dos seus direitos contra a secular discriminação praticada por segmentos da sociedade nacional e pelo Estado. Passeatas, caminhadas, greve de fome, seminários, encontros, palestras, ajuizamento de ações judiciais; pedidos de amicus curiae e requerimentos para instauração de procedimentos administrativos, direito de resposta, publicações, vídeos, CDs e DVDs de todo o gênero vem sendo produzido, notadamente por ativistas, em prol da liberdade religiosa, do norte ao sul do país. Mas, como sempre cabe mais um, como diz o ditado popular, é muito bem vinda a cartilha com que ora nos brinda o CEN - Coletivo de Entidades Negras, que vi nascer e crescer e se reproduzir nacionalmente. E, justamente por constante instigação do seu Coordenador Geral, Marcos Rezende (ora em conluio com o jornalista-ativista Marcio Alexandre Gualberto), acabei por me dedicar mais do que eu pretendia à luta contra a discriminação religiosa. Não posso olvidar, antes, nesse processo de crescimento, pessoas que oportunizaram espaço no início dessa empreitada, como o jurista Hédio Silva Júnior e o saudoso ministro religioso Pai Francelino de Xapanã. As idas à Salvador para acompanhar casos denunciados por Marcos Rezende, na condição de Ouvidor da SEPPIR - Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, me fizeram conhecer uma pessoa admirável e doce a quem devo muito, principalmente por haver me iniciado nos mistérios do Candomblé, com quem também aguçei mais ainda os meus sentidos para a percepção da importância de levar mais adiante o trabalho que vinha desenvolvendo: o babalorixá Silvanilton Encarnação da Mata, mais conhecido pelos íntimos como "Babá Pecê d'Oxumarê", atual liderança religiosa do Ilê Axé Oxumarê, de Salvador, na Bahia. Deixando de lado a tradicional postura de (pseudo) neutralidade dos gestores públicos diante do embate social, como Ouvidor da Seppir, procurei maximizar as possibilidades de resolução das reclamações que recebia de diversos pontos do Brasil sobre práticas discriminatórias por motivo religioso contra as diversas religiões de matriz africana, especialmente o Candomblé e a Umbanda. Muitas foram solucionadas e outras estão por solucionar, mas nenhuma delas obteriam algum tipo de atenção não fosse a coragem daqueles e daquelas, muitas vezes com risco de morte, em denunciar as violações sofridas ou de que tiveram conhecimento.

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A união faz a força - breves notas sobre a luta pela liberdade religiosa no Brasil a propósito do lançamento desta cartilha

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Discriminações de todos os tipos e praticadas de todos os meios possíveis por pessoas (religiosas ou não) e instituições privadas ou públicas: leis de preservação do meio ambiente e dos animais contra tratamento cruel; práticas de atos administrativos ilegais ou com excesso de poder; julgamentos tendenciosos ou casos prematuramente extintos; agressões psicológicas, físicas ou verbais; desigualdade no acesso a bens e serviços públicos; publicações de toda ordem, programas de rádio e de televisão etc. Dentre tantas virtudes da atuação individual ou coletiva nesse contexto apontamos a exigência do cumprimento das leis internacionais e nacionais em vigor, como ferramenta de apoio à política de combate à discriminação religiosa, por parte do aparelho de Estado, uma das mais estratégicas atitudes tomadas por todos. De Porto Alegre a Manaus autoridades administrativas, judiciais e legislativas, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados etc., vêm sendo pressionadas e fiscalizadas para a resolução dos casos ocorridos, gerando no campo do Direito, decisões administrativas, judiciais e legislativas exemplares, como recentemente aconteceu em Salvador com a Prefeitura restaurando um terreiro de Candomblé indevidamente destruído pela mesma (além da implementação de diversas políticas públicas para fortalecimento dessa religião) e no Município do Rio de Janeiro, onde casos ajuizados por mim, contra pastores e adeptos de segmentos religiosos evangélicos neo-pentecostais, prestigiaram a aplicação da Lei Caó (Lei n. 7.716/89), até então não aplicada a essas hipóteses por advogados, Ministério Público e Delegados de Polícia. O resultado, visível a olho nu, de tudo o que relatamos é a paulatina redução do espaço social e estatal para práticas discriminatórias de cunho religioso, e a construção de um espaço público mais democrático e igualitário. E a cartilha elaborada pelo CEN tem muito a contribuir, pois que, parafraseando Cervantes, no processo não importa a chegada, e sim o caminho. Axé! Luiz Fernando Martins da Silva Ogã do Ilê Axé Oxumarê e Advogado na cidade do Rio de Janeiro.


Junto a um grupo formado por várias lideranças e representantes de diversos segmentos de entidades sociais e religiosas, formamos a Comissão de Religiosos de Matrizes Africanas na Bahia contra intolerância e desrespeito religioso, onde buscamos juntos encontrar uma formar de atenuar, o problema da Intolerância Religiosa no Brasil, que se incide sobre as religiões Afro descendentes, que vem sofrendo com ataques desrespeitosos de alguns segmentos religiosos que se sentem no direito de agredir, a liberdade de culto e a cidadania dos religiosos de Matrizes Africanas. Nos últimos anos vem se afirmando discussões em torno do combate a intolerância religiosa, na qual podemos perceber que nada é que de um processo de descriminação e racismo que vem sendo imposto sem limites e sem respeito à pessoa humana. Enquanto cidadão e Religioso venho sofrendo junto a todos os meus irmãos de religião, de seguimentos espiritualizados como: candomblé, Umbanda e outros que formam esta comissão, todos os ataques diretos e indiretos de grupos de religiosos protestantes, que nos agridem verbalmente e até fisicamente, dentro dos nossos espaços de culto sagrado, agredindo os nossos direitos de cidadania, e ferindo assim, a democracia que segundo a constituição Federativa do Brasil, nos garante por lei, a liberdade de culto, pensamento e expressão religiosa. Percebemos que o problema de descriminação religiosa do Brasil, nada mais é, que fruto de uma sociedade racista originada de um sistema escravocrata, que desde o inicio do processo de colonização do Brasil, vem impondo o seu pensamento, tentando descaracterizar a cultura e a religião dos Afros descendentes, com objetivo de apagar a memória de um povo, as suas lembranças, tradições, expectativas de vida, crença e a fé em seus deuses, através do chicote desumano do branco e catecismo de religiões oficiais a serviço do sistema de colonização como forma de calar as vozes daqueles que sofriam, eles tentaram apagar da memória do negro escravo, a sua historia a, sua cultura e religiosidade, traços necessários para identidade, resistência e perpetuação de uma raça. E que ainda até hoje sofremos com o efeito do imperialismo colonial europeu, que sempre tentou submeter às outras raças e culturas o seu sistema dominatório, que era regido não com bases em palavras, mas através do sofrimento e da dor. Hoje apenas se mudou a forma de domínio, pois nos tempos modernos utiliza-se a caneta ao invés do chicote que surte quase o mesmo efeito. Na função de Babalorixá (líder religioso no candomblé) não posso ser conivente com uma religião que persegue e fere o outro em nome de Deus, acredito no princípio divino que a nossa função independente do nosso

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Intolerância Religiosa um Desrespeito a Humanidade

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seguimento religioso é semear a paz, amor e esperança para as pessoas e não criar separativismos, baseados de forma egoísta e pequena em ideologia pessoais de um grupo, devemos respeitar a verdade do outro, pois não importa a denominação de Deus seja ela qual for; javé, Alá, olodumaré ou olorum, só muda a leitura de cada um, pois Deus é único e nos mostra em seus ensinamentos básicos que devemos amar e respeitar ao próximo sempre que nos for impostos alternativas. Por varias razoes é necessário e vital se criar políticas afirmativas, que venha constituir um processo de educação e conscientização da sociedade, pois este é um dos poucos caminhos, que podemos tomar, partindo do princípio que vivemos em um estado que é laico que nos permite a liberdade de expressão do pensamento e fé, se baseando em direitos garantidos dentro da lei, mas especificamente neste caso a Lei CAÓ (nº. 7.716/89) que segundo o art. 1º. Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de descriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Devemos ter a sensibilidade de perceber que a descriminação e a intolerância é uma das principais mazelas já gerada pela humanidade, que produz um dos principais motivos de separação das raças, gerando assim desigualdade e conflitos desde o princípio em todo o mundo, pois é um grande mal que atinge a todos e vai de encontro ao processo democrático, ferindo assim, não apenas os seguimentos religiosos de Matrizes africanas, mas também a constituição e a própria essência humana. Pois perante as Leis ou a Deus somos todos iguais, seres humanos, independente de cor raça ou etnia, embalados com o mesmo sonho de Paz, amor e liberdade pelo qual clama toda a humanidade quando invoca a sua fé, pois todos os caminhos nos leva a Deus, Javé, Buda, Mawú, Ala,Tupã, Zambi ou Olorum. Babalorixá Anderson de Oxalá do Ile Axé Ala Obatalandê Membro da Comissão de Religiosos de Matrizes Africano Contra a Intolerância Religiosa


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Casos emblemåticos de intolerância e desrespeito religioso

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Caso de Mãe Gilda de Ogum O Tribunal de Justiça da Bahia, no dia 06 de Julho de 2005, confirmou a condenação da Igreja Universal do Reino de Deus à indenização por danos morais para a família de Mãe Gilda, cuja foto foi estampada no Jornal Folha Universal em matéria extremamente desrespeitosa às religiões de matriz afro. A sessão de julgamento estava lotada e emocionou os presentes:familiares e amigos de Mãe Gilda, militantes dos movimentos sociais, estudantes, jornalistas e demais pessoas interessadas no caso emblemático. As portas do Tribunal abriram-se para o povo de santo, que, ao final, entoou um canto para Xangô na voz de Jaciara filha da ialorixá Mãe Gilda - na frente do prédio. Foi ressaltado no julgamento que o caso não se tratava de uma simples ação indenizatória, mas que os interesses envolvidos diziam respeito a todo o povo de santo, bem como a toda a sociedade, uma vez que a atitude da Igreja Universal foi um grande desrespeito aos direitos culturais da população afro-descendente e à liberdade de crença em geral. O Tribunal foi unânime pela manutenção da sentença do juiz de 1° grau: obrigação da IURD de publicar a sentença na capa do seu jornal por duas edições seguidas e o pagamento da indenização, cujo valor foi reduzido de R$1.372.000 para R$960.000, acrescida a correção monetária e os 20% de honorários. Apesar das possibilidades de recurso não estarem esgotadas, este julgamento pode ser considerado uma grande conquista, já que confirmou uma atitude incisiva do Poder Judiciário na luta contra a intolerância religiosa. A decisão é de máxima relevância para o combate às discriminações sofridas historicamente pelo povo de santo, pois demonstra que posturas de intolerância que se tornam obstáculos concretos à liberdade do exercício da fé não podem mais ser admitidas em nosso país. A decisão do juiz Clésio Rômulo Carrilho Rosa, da 17ª Vara Cível de Salvador tem tudo para fazer história no combate à intolerância religiosa. No dia 13 de janeiro deste ano, o magistrado assinou sentença que obriga a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) a indenizar os familiares da ialorixá Gildásia dos Santos e Santos, a Mãe Gilda, em pouco mais de R$ 1,3 milhão, por danos morais. Em outubro de 1999, o jornal da igreja, Folha Universal, publicou uma foto de mãe Gilda numa matéria com o título “Macumbeiros charlatões lesam o


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bolso e a vida dos clientes”. A Iurd tem até o dia 30 de março para recorrer da decisão Além do pagamento da indenização, o juiz determina que a Iurd, que foi acionada conjuntamente com a Editora Gráfica Universal, publique na primeira página da Folha Universal e na capa do seu encarte Folha Dois o teor da decisão por dois números consecutivos. O descumprimento da decisão rende multa diária de R$ 5 mil. A decisão é de primeira instância e ainda cabe recurso dos réus, mas já é considerada um grande passo na luta do culto africano contra a intolerância religiosa que vem perseguindo o candomblé e a umbanda nos últimos anos, inclusive, na Bahia, chamada de berço da cultura negra no Brasil. “Essa não é uma vitória apenas da comunidade do Terreiro Axé Abassá de Ogum, mas de todo o povo do candomblé que sofre perseguição religiosa. Foram quatro anos de espera, de luta”, desabafa a ialorixá Jaciara Ribeiro dos Santos, filha e sucessora de Mãe Gilda no comando da Casa, que fica em Itapuã. A primeira vitória no processo tem toda uma simbologia para a comunidade do Axé Abassá, pois eles entendem o ataque como estritamente ligado à perda da sua sacerdotisa. Três meses depois de ter sua foto divulgada pelo jornal evangélico, Mãe Gilda morreu por conta de um infarto fulminante. “Minha mãe era hipertensa, mas tinha uma vida saudável, se cuidava, fazia hidroginástica. Depois da matéria no jornal da Universal, ela ficou extremamente deprimida, pois muita gente chegou até a imaginar, ao ver o jornal, que ela tinha se convertido à Igreja Universal. Foi muito desgastante. Ela assinou a procuração para que os advogados entrassem com o processo no dia 20 de janeiro de 2000 e morreu no dia seguinte”, relata Jaciara. Um projeto de autoria da vereadora de Salvador, Olívia Santana (PCdoB), transformou o dia 21 de janeiro, data da morte de Mãe Gilda, em Dia do Combate à Intolerância Religiosa. A foto utilizada pela Iurd no jornal é uma reprodução da que ilustrou a matéria da revista Veja, de 26 de setembro de 1992, sobre manifestações pelo impeachment do então presidente Fernando Collor. Na matéria da Veja, Mãe Gilda aparece com suas roupas de sacerdotisa, tendo aos pés uma oferenda pelo afastamento do presidente. A imagem de Mãe Gilda foi reproduzida numa matéria do jornal Folha Universal da Iurd, edição de 26 de setembro a 2 de outubro de

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1999, rodeada por recortes que oferecem serviços de ajuda espiritual para resolver problemas. O texto diz que estava crescendo no Brasil um mercado de enganação. Na foto utilizada pelo informativo, Mãe Gilda aparece com uma tarja preta nos olhos. A capa do jornal traz informações de que a sua circulação é nacional, com tiragem de mais de 1 milhão e 372 mil exemplares, exatamente o valor da indenização em reais que agora a sentença judicial obriga a Universal a pagar aos familiares de Mãe Gilda. “Nós tínhamos em casa guardada a reportagem da Veja. Um dia andando aqui em Itapuã eu recebo o jornal da Universal e dou com a mesma foto numa reportagem extremamente ofensiva. Dois meses antes o terreiro já havia sido invadido por membros de uma outra igreja evangélica, ou seja, foi o segundo ataque consecutivo que minha mãe sofreu por causa da sua crença”, narra Jaciara. A partir deste dia Jaciara apoiou a mãe a mover uma ação judicial. Com a morte de Mãe Gilda ela assumiu o comando da batalha. “Corri atrás, busquei apoio e consegui a ajuda valiosa do pessoal da ONG Koinonia, que nos deu toda a assessoria jurídica. Chegamos a ir até Brasília, numa caravana que reuniu mais de 400 pessoas. Fomos recebidos pelo presidente Lula e entregamos a ele um dossiê sobre a intolerância religiosa que volta e meia atinge um terreiro aqui na Bahia. Agora finalmente ganhamos a primeira batalha”, relata Jaciara. A ONG que deu a assessoria para o processo, a Koinonia, palavra que significa “comunhão”, foi criada há dez anos e trabalha em parceria com a Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais (AATR-BA). “O trabalho com os terreiros começou na área ambiental e daí foi percebida a necessidade que eles tinham no campo jurídico, para regularização de áreas, organização jurídica para os seus trabalhos sociais”, explica a advogada Helga de Almeida.


Ao longo da história do Brasil os terreiros de candomblé foram vítimas de perseguição policial, da imprensa, da igreja católica, do poder público, de grupos neo-pentecostais e agora até mesmo de traficantes nas favelas cariocas Casos de Babalorixás (pais-de-santos) expulsos dos locais onde moram são cada vez mais comuns. No início do ano 2000, o Babalorixá João* foi retirado por traficantes do terreiro que tinha na Zona Oeste do Rio. Segundo ele, os bandidos viam de forma negativa a presença do Babalorixá no local. Para trás, João deixou sete anos de trabalho, além de tudo que possuía. "Chegaram no meu terreiro, me bateram e disseram que eu tinha 24h para sair. Aí não tive alternativa. Praticamente perdi tudo o que era meu pessoal porque na mudança priorizei mais as coisas do terreiro", conta ele, que pediu anonimato por medo de represálias Morando atualmente em outro estado, o Babalorixá, diz que nunca mais teve coragem de voltar ao local e por precaução evita ir ao Rio de Janeiro. Nem mesmo coisas que deixou em casa de vizinhos, ele voltou para retirar. "A gente fica inseguro. Não tive coragem nem de vender o terreno. Hoje em dia me acho até uma pessoa vencedora por ter conseguido recomeçar. Muitos em meu lugar teriam desistido, mas confiei nos orixás e atualmente estou bem melhor”. Adeptos dessas religiões são obrigados a conviver com ofensas de todos os tipos. Seja nas ruas ou no trabalho. Nelson Silva de Oliveira é praticante do candomblé há 12 anos. Morador de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, o professor de História diz ser freqüente as discriminações. “Uma vez terminou a aula e estava conversando com um grupo de alunos sobre religião. Ai disse a uma aluna que eu era candomblecista. Ela levou um susto porque tem aquela visão de que o candomblé é coisa de pessoa sem esclarecimento. Outra vez meu colega disse que uma menina recebeu a pomba-gira (entidade cultuada na umbanda), trancaram-na numa sala da escola juntamente com outras quatro pessoas dizendo que ela estava com o demônio no corpo, sendo que na nossa religião, nem existe a figura do demônio", esclarece o professor.

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No Rio de Janeiro traficantes atacam religiosos em favelas

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Falsa democracia religiosa De acordo com o relatório da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), das 314 denúncias recebidas entre 2005 e 2007, 17% diziam respeito a discriminação religiosa. Segundo o professor de direito e ex-ouvidor da SEPPIR, Luiz Fernando Martins da Silva, isso é mais comum do que se imagina. "Basta ligar a televisão que é possível ver a desqualificação que alguns segmentos neo-pentecostais fazem com as religiões de matriz africana. Este é um exemplo de como não somos uma democracia religiosa", fala. Essas desqualificações, segundo o advogado, vão desde ligação dos orixás do candomblé a demônios que fariam mal a saúde física e mental das pessoas, induzindo-as à pobreza e criminalidade, até o uso de palavras discriminatórias para descrever as religiões. Em novembro de 2007 o advogado denunciou a procuradoria geral de justiça um pastor que apresentou ao departamento de polícia uma pessoa acusada de ter provocado a morte de um turista italiano na Zona Sul. O sacerdote alegou que ele havia se convertido e cometera o crime por estar povoado de demônios. No dia seguinte vários jornais notificaram o ocorrido dando nome aos demônios de Zé Pelintra e Exu Caveira. O caso está em andamento na 44 DP, em Inhaúma. Mas, segundo Luiz Fernando, essas discriminações não ocorrem somente entre membros de religiões opostas: "Muitas vezes o estado também pratica discriminação negando os direitos dessas religiões através de atrasos na emissão de documentos para regularização jurídica dos terreiros". Estratégias para driblar o preconceito Segundo dados censitários os seguidores de candomblé, em suas diferentes vertentes e a umbanda somam 571.329 adeptos, ou seja, cerca de 0,34% da população brasileira. Número tido por pesquisadores como fidedignos, tendo em vista que boa parcela de seguidores dessas religiões declaram-se "católico" e "espírita" aos recenseadores. Isso acontece em parte, devido ao estigma que essas religiões carregam. Segundo a Ialorixá (mãe-de-santo) Francis de Iemanjá, que tem um terreiro na Zona Norte do Rio, não faltam exemplos de preconceitos sofridos pelos praticantes: “Tenho uma filha de santo que trabalha em um colégio e não a


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deixam entrar com ojá (pano branco que alguns praticantes usam na cabeça e que faz parte do ritual). Outra, que morava numa favela da Zona Norte foi insultada e jogaram uma ponta de cigarro em sua roupa porque ela estava vestida de branco”. Mãe Francis diz que o preconceito começa quando os adeptos saem do culto. Para ela, é fundamental que aconteçam palestras que esclareçam para a população o que são as religiões de matriz africana. A gente sai do terreiro e na condução já somos discriminados. Quando entramos no ônibus todo mundo fica olhando como se fôssemos assombração. Acho que tem que ter mais palestras com as crianças e adolescentes nas escolas para explicar que nossa religião não é nenhum capeta. Nós cultuamos a natureza, o orixá”, explica. André Porto, coordenador do MIR Movimento Inter Religioso do Rio de Janeiro e responsável na América Latina pela URI - Iniciativa das Religiões Unidas também concorda com a Ialorixá que essas discriminações acontecem muitas vezes pela falta de conhecimento que as pessoas têm dessa religiões. "Para haver respeito é importante um conhecer o outro. A discriminação muitas vezes vem da própria ignorância. Para entender a sua humanidade é preciso conhecer a humanidade do outro. Através do contraste acaba aprofundando as raízes da sua própria identidade", diz. Desde a Eco-92, o MIR, que é ancorado ao ISER (Instituto de Estudos da Religião), vem realizando ações com objetivo de promover o diálogo e cooperação entre os grupos religiosos. Atualmente o grupo congrega cerca de 20 religiões. As reuniões acontecem toda segunda terça-feira do mês, às 18h30, na Glória. Os encontros têm objetivo de aproximar religiões para que um dia, o sonho da Ialorixá Francis se realize: "Espero que um dia esse preconceito acabe e que possamos praticar nossos cultos e sairmos

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Prefeito pede desculpas pela demolição do terreiro em Salvador No último dia 5 de março, durante reunião com representantes das entidades negras, o prefeito evangélico de Salvador - BA, João Henrique, PMDB/Ba, pediu desculpas pela destruição do terreiro Oyá Onipó Neto no último dia 27 de fevereiro. A ação provocou mobilizações das entidades do movimento negro e de líderes do candomblé que foram do Campo Grande à Praça Municipal, para pressionar o governo, como o Coletivo de Entidades Negras, a Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-Ameríndia e o Movimento Negro Unificado. Técnicos da SUCOM (Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo) iniciaram um processo de demolição do terreiro, no bairro do Imbuí. Além dos locais reservados para as cerimônias religiosas, foram danificados também assentamentos dos Orixás e objetos sagrados. Dois dias após a demolição do terreiro, a superintendente da SUCOM, Kátia Carmelo foi exonerada. Ela disse que o fato não teve ligação com o caso do terreiro. O promotor do Ministério Público, Almiro Sena, ouviu a Mãe de Santo Rosalice do Amor Divino, responsável pelo terreiro de candomblé e afirmou que a demolição foi inconstitucional e que chamaria os servidores do município para prestar depoimento. Mãe Rosalice disse que nunca recebeu uma notificação da prefeitura informando que o terreiro, havia sido construído numa área ilegal. Ela informou ainda que estava sendo perseguida por um vizinho, segundo ela, um engenheiro da SUCOM, de nome Sílvio Roberto Ferreira Bastos, que demonstrava atitudes de desrespeito religioso e preconceito. "Uma vez ele me chamou de lixo, já cuspiu e procurava brigas, mas só discutimos uma vez"... Episódios, como a parcial demolição sofrida pelo terreiro Oyá Onipó Neto, revelam a fragilidade a que estão expostos os terreiros que não têm regularização fundiária ou documentos que atestem seus limites. A situação também contribui para a perda de espaço com invasões, fato já comprovado em locais conhecidos como o Axé Opô Afonjá, a Casa Branca e o Vodun Zo. Sem documentação legal, é mais complicado reaver a posse. O projeto Mapeamento dos Terreiros, estudo feito no ano passado pelo Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (Ceao-Ufba), mostrou que 78,4% deles não têm ambiente favorável à prática do culto (amplo espaço, áreas verdes) e que somente 41,7% de pais ou mães-de-santo teriam


“Não vejo como presumir que a morte de um animal, a exemplo de um galo num culto religioso, seja uma 'crueldade' diferente daquela praticada (e louvada pelas autoridades econômicas) pelos matadouros de aves”. O entendimento é do desembargador Araken de Assis, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Para ele, não se caracteriza como contravenção o sacrifício de animais nos cultos e liturgias das religiões de matriz africana. Assis votou pela rejeição da Ação Direta de Inconstitucionalidade que contesta a Lei 12.131/04. A norma deixou de proibir o sacrifício de animais ao acrescentar parágrafo único ao artigo 2º da Lei Estadual 11.915/03 -- Código Estadual de Proteção aos Animais. O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do presidente do TJ gaúcho, desembargador Osvaldo Stefanello. Para Assis, a liberdade de cultos, cujos limites estão restritos à lei penal e aos direitos fundamentais, é assegurada pela Constituição Federal. A exceção fica para eventuais excessos. Segundo ele, homens e mulheres diariamente matam um número incalculável de animais para comê-los, variando de acordo com a cultura de cada povo o caráter doméstico do animal ou seu uso para fins alimentares. Exemplificando, citou a figura do cachorro, que, dependendo dos costumes, é considerado animal de estimação ou fina iguaria. Citou como precedente, no sentido de consagrar a liberdade de culto, caso julgado pela Suprema Corte dos EUA, no qual, apesar de leis locais proibirem expressamente o sacrifício de animais, se entendeu que deveria ser respeitada a tolerância religiosa. Votou pela procedência parcial da ação a desembargadora Maria Berenice Dias. Ela propôs a retirada da expressão final do parágrafo, que faz referência à matriz africana, argumentando que outras religiões também têm como prática o sacrifício de animais. Os magistrados Alfredo Foerster, Alfredo Guilherme Englert, Vladimir Giacomuzzi e Paulo Moacir Aguiar Vieira julgaram a Ação integralmente procedente. Para o desembargador Foerster, a vida deve prevalecer sempre. Os outros três entendem que o parágrafo 2º do Código proíbe uma série de condutas cruéis com relação aos animais, e o parágrafo único, ao excepcionar da vedação as religiões de matriz africana, seria uma espécie de salvo-conduto para a prática de crueldades. As informações são do TJ-RS.

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Pedido de vista adia decisão sobre sacrifício de animais

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Como reagir a isso?


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A LEI nº 7716/89 (LEI CAÓ) tipifica todos os 'crimes resultantes de discriminação de RAÇA, COR, ETNIA, RELIGIÃO ou PROCEDÊNCIA NACIONAL.' Todos os artigos que tratam das formas de discriminações e as respectivas penas, desde o impedimento ao acesso dos negros e outras 'minorias' aos órgãos de serviço público até a propaganda racista pelos meios de comunicação, podem e devem ser aplicados aos casos q u e c h a m a m o s d e INTOLERÂNCIA RELIGIOSA. To d o s e s t e s c r i m e s s ã o inafiançáveis e devem ser julgados pela Justiça Comum (significa na prática que não podem ser julgados no JECRIM - JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL, em que geram penas leves, dentre elas a famosa 'cesta básica'). Cabe ressaltar que os acusados de intolerância ou outra forma de racismo são, frequentemente, acusados por INJÚRIA REAL, que trata-se de um crime leve, encaminhado ao supracitado JECRIM e depende de QUEIXA-CRIME; ou seja, desgastante ao nosso 'Povo de Santo' além de implicar numa leve pena, gerando a já conhecida IMPUNIDADE. As autoridades policiais devem aplicar o procedimento que é o expresso pela LEI CAÓ. Isto pode ocorrer por despreparo ou pré-conceito. Passo-a-passo: A) Quando um Templo ou religios@s sofrerem discriminação, deve sempre fazer um registro de ocorrência em uma delegacia de polícia da localidade ou do bairro mais próximo. Infelizmente, em algumas regiões ou estados brasileiros ainda não comnstituiram delegacias especializadas para crimes de racismo e discriminação religiosa, como em São Paulo. No Rio de Janeiro houve iniciativas que sofreram descontinuismos mas, que estão sendo retomadas por ação do movimento social religioso local, como a recomendação do cumprimento da LEI CAÓ, que visa gerar inquérito policial,

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desdobrando em AÇÃO PENAL, onde, @(s) acusad@(s) responda criminalmente. Lei que determine que os processos criminais exijam reparação civil de DANOS MATERIAISdevem ser aplicadas; ou seja, a vítima pode receber uma indenização em dinheiro de prejuízos materiais sofridos pela intolerância. Já os DANOS MORAIS precisam ser requeridos em uma outra ação, específica em uma vara cível, necessitando de contratar um Advogado ou constituir um Defensor Público. A AÇÃO PENAL , que será julgada numa vara criminal, terá o MINISTÉRIO PÚBLICO como Autor da Ação. B) O DISQUE-RACISMO, em localidades onde estão instalados, agem para denunciar os casos de intolerância ao MINISTÉRIO PÚBLICO que oferecerá a denúncia pelos crimes definidos pela LEI CAÓ. Em ambos os casos, é importante que as entidades da sociedade civil atuem juntas para pressionar o Ministério Público. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA, também se constitui importante instrumento. C) Buscar OUVIDORIA GERAL DE ESTADO e/ou a CORREGEDORIA DE POLÍCIA para denunciar os casos de negligência ao atendimento policiais dos registros de ocorrência de forma da letra da lei. Para prestar as informações que subsidiem a ouvidoria, deve se ter anotado o nome do policial, a hora da ocorrência e o número da viatura policial. D) Agrupar provas como: fotos e depoimentos gravados, das pessoas que agiram com preconceito e a qualificação das mesmas, especialmente o nome completo e o endereço são necesárias para a consecução eficaz da ação . Independente destes passos, sugerimos imprimir na íntegra a LEI CAÓ e divulgá-la plenamente. A organização e a mobilização do nosso povo são os ingredientes fundamentais para superarmos estes obstáculos e lutarmos por uma sociedade realmente JUSTA e FRATERNA. Em localidades onde ainda não exitam este instrumento, é recomendável busca orientações dadas por instituições de referencia no comabate a discriminação religiosa. Marcílio José Rosa e Silva Advogado

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Dolores Lima Coordenação Nacional do CETRAB


Direitos Liberdade de Crença e de Culto Constituição Federal CF de 1988, art. 3º , incisos I e VI; art. 4º, inciso II; art. 5º, incisos VI e VIII; art. 19, inciso I “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” “Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II - prevalência dos direitos humanos;” “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;” “Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencionálos, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;”

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Leis e Direitos Assegurados

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Lei no 4.898 de 9 de dezembro de 1965 “Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: a) à liberdade de locomoção; b) à inviolabilidade do domicílio; d) à liberdade de consciência e de crença; e) ao livre exercício do culto religioso; f) à liberdade de associação;” Discriminação Religiosa Código de Processo Penal art.5º, inciso I, §3º “Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito.” Lei Caó - Art.1º da LEI 7.716 de janeiro de 1989: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97) Pena: reclusão de um a três anos e multa. § 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97) Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. § 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97) I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo; II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas ou televisivas. § 4º Na hipótese do § 2º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do material apreendido. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.459, de 15/05/97) Associação Religiosa Constituição Federal, art. 5º incisos:


Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá: I - a denominação, os fins e a sede da associação; II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados; III - os direitos e deveres dos associados; IV - as fontes de recursos para sua manutenção; V o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução. VII a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.”

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Direitos do Ministro Religioso Previdência Social Lei n. 8.212 de 24 de julho de 1991 “Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: V - como contribuinte individual: c) o ministro de confissão religiosa e o membro de instituto de vida

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“XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;” Código Civil “Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. Parágrafo único. Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocos.


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consagrada, de congregação ou de ordem religiosa;” Visto Temporário Lei n. 6.815, de 19 de agosto de 1980 “Art. 13. O visto temporário poderá ser concedido ao estrangeiro que pretenda vir ao Brasil: VII - na condição de ministro de confissão religiosa ou membro de instituto de vida consagrada e de congregação ou ordem religiosa.” Acesso a hospitais, presídios e outros Lei n. 9.982, de 14 de julho de 2000 “Art. 1o Aos religiosos de todas as confissões assegura-se o acesso aos hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados, desde que em comum acordo com estes, ou com seus familiares no caso de doentes que já não mais estejam no gozo de suas faculdades mentais.” Processo Penal “Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: VIII - os ministros de confissão religiosa;” Casamento religioso Constituição Federal “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.” Lei dos Registros Públicos “Art. 71. Os nubentes habilitados para o casamento poderão pedir ao oficial que lhe forneça a respectiva certidão, para se casarem perante autoridade ou ministro religioso, nela mencionando o prazo legal de validade da habilitação. Art. 72. O termo ou assento do casamento religioso, subscrito pela autoridade ou ministro que o celebrar, pelos nubentes e por duas testemunhas, conterá os requisitos do artigo 71, exceto o 5°.” Código Civil


Decreto-Lei n. 1.051, de 21 de outubro de 1969 “Art 1º - Os portadores de diploma de cursos realizados, com a duração mínima de dois anos, em Seminários Maiores, Faculdade Teológicas ou instituições equivalentes de qualquer confissão religiosa, são autorizados a requerer e prestar exames, em Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, das disciplinas que, constituindo parte do currículo de curso de licenciatura, tenham sido estudadas para a obtenção dos referidos diplomas. Art 2º Em caso de aprovação nos exames preliminares, de que trata o artigo anterior, os interessados poderão matricular-se na faculdade, desde que haja vaga, independentemente de concurso vestibular, para concluir o curso, nas demais disciplinas do respectivo currículo. Art 3º Revogadas as disposições em contrário, o presente Decretolei, entrará em vigor na data de sua publicação.”

Templo Religioso Constituição Federal, art. 150, inciso VI, alínea “b” “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: b) templos de qualquer culto;”

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“Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração. Art. 1.516. O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil.”

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Legislação Internacional

Ensino Religioso

Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, art. 13, item 3 “Os estados-partes no presente Pacto comprometem-se a respeitar a liberdade dos pais - e, quando for o caso, dos tutores legais - de escolher para seus filhos escolas distintas daquelas criadas pelas autoridades públicas, sempre que atendam aos padrões mínimos de ensino prescritos ou aprovados pelo estado, e de fazer com que seus filhos venham a receber educação religiosa ou moral que esteja de acordo com suas próprias convicções.”

Lei de Diretrizes e Bases da Educação, n. 9.394, de 20 de Dezembro de 1996, art. 3o, inciso IV e II. “Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;”

Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996

“Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para

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a habilitação e admissão dos professores.


diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso."

Intolerância Religiosa

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, ASSINADA EM 1948:

Artigo II. 1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.

Artigo XVIII. Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em público ou em particular.

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§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas

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Coletivo de Entidades Negras – CEN Apresentação Institucional Em agosto de 2005, nasce em Salvador o Coletivo de Entidades Negras da Bahia (CEN). O lugar simbólico foi perfeito: o antigo Belvedere da Sé, a nova Cruz Caída de Mário Cravo, ao lado do Memorial das Baianas Negras do Acarajé, patronas dos mercados da cidade da Bahia, pioneiras do empreendedorismo. O CEN agrega ancestralidade positiva, a experiência da tradição, conecatadas em tempo real com as inquietações da juventude negra e suas novas perguntas e novos quereres. O CEN quer plugar os terreiros na tomada universal, quer linkar os afoxés aos movimentos urbanos, ao hip hop. O CEN junta as agendas acadêmicas ao senso comum. O CEN é natureza, é tribo, é mito e imagético. O CEN é beco, avenida, praça e jardim. O CEN é solidariedade global. O CEN é mais um esforço do povo negro para que a nossa sociedade melhore, seja mais generosa, mais mãe e Pátria nossa, capaz de salvar os seus filhos multicoloridos do abandono e da pobreza, da desesperança e da falta de fé num mundo mais justo e solidário. O CEN é uma organização não governamental, sem fins lucrativos e vínculo a nenhuma corrente político partidária, sendo constituído de associados que unidos pelos objetivos comuns de cooperação mútua estimula a parceria, o diálogo local e a solidariedade entre os diferentes segmentos sociais. Dentre seus objetivos destaca-se o de defender os direitos e interesses das comunidades religiosas de matriz africana, bem assim, preservar e fortalecer a cultura afro-brasileira e africana e seu legado civilizatório, realizando campanhas de conscientização para os direitos fundamentais, caminhadas de mobilização, manifestações culturais, congressos, seminários, intercâmbios e outros fins, numa busca constante por soluções e alternativas para a melhoria da qualidade de vida da comunidade negra brasileira. Tem como publico alvo de suas ações homens e mulheres, crianças e adolescentes negros e não negros que vivem em situação de vulnerabilidade, excluídos do mercado de trabalho, com baixa escolaridade e sem perspectivas de inserção social. Sua missão é combater coletivamente a exclusão social, discriminação racial e de gênero por meio de propostas que corroborem para a reparação do erro histórico da escravização e promova a inclusão da mulher nos diversos segmentos sociais de forma digna. Atua em nível nacional, hoje em 15 estados da Federação sob três grandes linhas de atuação: juventude, gênero e religiões de matriz africana.


Coordenador Geral Marcos Rezende Coordenador Nacional de Política Institucional Marcio Alexandre M. Gualberto Coordenadora Nacional de Formação Lindinalva de Paula Coordenador Nacional de Saúde Ademir dos Santos Coordenadora CEN/PE Lindacy Assis Coordenadora CEN/MA Cristina Miranda Coordenadora CEN/SP Coordenação colegiada Coordenador CEN/DF Francisco Nguzentala Coordenadora CEN/MG Djanganga Kiamaza Coordenadora CEN/RJ Coordenação colegiada Coordenadora CEN/AP Swane Brasão Coordenador CEN/PB Paulo Nóbrega Coordenador CEN/AL Olegário Vencesllau Coordenador CEN/PR Márcio Marins

Organização Nacional do Movimento Negro

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Onde estamos e quem somos

www.cenbrasil.org.br

Coordenador CEN/Região Amazônica Alberto Jorge Diretoria Nacional GLBTT Renildo Santanna Diretoria Nacional de Juventude Rebeca Tárique

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Esta cartilha é fruto de um trabalho e prol da religiosidade de matriz africana. Ao assumir o compromisso de ter religião de matriz africana como um dos seus eixos de atuação, o Coletivo de Entidades Negras deu um passo real em direção à valorização do espaço sagrado e de resistência da população negra brasileira. O CEN promove há anos a Caminhada do Povo de Santo em Salvador; o CEN é membro da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa no Rio de Janeiro e em Minas Gerais; o CEN promoveu ações em defesa de um terreiro de candomblé que foi derrubado pela prefeitura de Salvador. Enfim, o CEN age, e ao agir afirma seu compromisso. O CEN no entanto não faz isso sozinho. A Carta de Salvador, assinada por um conjunto representativo de organizações que lidam com os temas de religiosidade em nosso pais, atestam a legitimidade do CEN em estar neste campo e, ao mesmo tempo, aponta para a necessidade de ações que levem à união dos vários grupos distintos. Ao assinar a Carta de Salvador, este conjunto de organizações aponta caminhos, sugere novas possibilidades e deixa claro que sim, é possível caminhar junto. Esta cartilha é uma prova disso.


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