Você é o milagre

PEDRO TADEU FERREIRA MACEDO

Você é o milagre 1ª edição

Águas Mornas – Santa Catarina Edição do Autor 2012

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Você é o milagre © Pedro Tadeu Ferreira Macedo

Editoração Gráfica, capa, layout e arte final: Marcos R. Rosa (marcosrrosa@gmail.com)

MACEDO, Pedro Tadeu Ferreira. Você é o milagre. Águas Mornas, SC: Ed. do autor, 2012. 100 p.

1. Reminiscências, 2. Poesias. I. Título

ISBN: 978-85-914861-0-6

CDD – B869

Proibida a reprodução total ou parcial (exceto a última, com citação completa da fonte), sob qualquer forma ou meio, sem permissão expressa do Autor.

(Lei nº 5.988, de 14/12/1973).

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Não há nenhuma pretensão maior do que simplesmente apresentar a visão e o entendimento do mundo criado por Deus.

Não há intenção de doutrinar, mas focar a visão cristã em pontos muito discutidos e pouco vividos do cotidiano. O alerta é para dizer que a lição única da mensagem de Cristo é o amor.

Pedro T. F. Macedo

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Corria o ano de 1948. A dificuldade em alimentar a família era insustentável. Cinco bocas para alimentar. Ainda que duas filhas já tivessem morrido. Não era só isso. A mulher estava grávida de sete meses. É bem verdade que havia acontecido alguns abortos nesse intermédio, mas pudera!...A danada da mulherzinha não podia ver uma cueca pendurada no varal e já ficava grávida!

Não era o problema de uma boca para alimentar que preocupava o “Seu Juca”. Não. “Onde come sete, come oito”. A droga do problema é que a mulher vinha passando um trabalhão a cada parto. Ia ser preciso levar para a maternidade. Em casa, nem pensar em ganhar o filho. Onde arrumar dinheiro para pagar as despesas com a maternidade era o problema maior. Estava sem emprego e a vendinha quebrada só vendia fiado e ninguém pagava direito.

Além disso, seria necessário tratar com bastante antecedência com o “Seu Mané Júlio” uma corrida de táxi, pois, certamente o filho viria à noite, já que essas coisas acontecem sempre em horas muito ruins. A experiência garantia esta situação como certa.

O tempo é inexorável, iguala ricos e pobres em sua duração. Chegou o mês de março.

Completou-se o tempo para a Dona Lídia dar a luz.

No dia 02 de março foi “aquela” correria e como o

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“Seu Juca” previra, foi em hora imprópria que a criança avisou que ia nascer. Malas arrumadas, toca a chamar o carro do “Seu Mané Júlio” e correr para a Maternidade Carlos Correa. ― Não. Não tem dinheiro para pagar a maternidade. Pode botar na enfermaria.

A enfermaria era um lugar comum para trinta leitos. Sem cortinas de separação entre uma cama e outra. Sem distinção entre graus de enfermidade.

Era uma antecâmara do inferno, se é que ele existe.

Mas a enfermaria estava lá. Repleta de pessoas gemendo. Vomitando. Expostas as suas fragilidades e dores, as pessoas, dignas representantes da raça humana. Reclamações constantes, nomes de baixo calão, xingamentos, ais, histórias de vida, contadas em alto tom para serem conhecidas por um maior número de pessoas.

Dona Lídia estava lá neste mundo desconhecido e inóspito. As dores são constantes e fortes. Acostumada às dores e ao sofrimento, não se queixa. Já são dois dias de tormento na enfermaria.

Gritos de dor, lamentos, suspiros, reclamações, choro. É o cardápio apresentado às senhoras hóspedes de tal repartição. Nada da criança nascer!

O mundo que a rodeia a assusta.

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No terceiro dia, pela manhã, a filha mais velha do casal vem ver como a mãe está. Vê o sofrimento. Condói-se. Ao mesmo tempo em que conta a notícia para a mãe de que arrumou emprego de professora e que vai começar hoje de tarde, diz com todo orgulho da nova profissão: ― Agora já posso pagar. A senhora vai para um quarto de segunda. Pelo menos a senhora vai ter um melhor atendimento e vai poder dormir à noite.

Juntadas as palavras com a decisão, lá vai Dona Lídia, com seu barrigão estourando, para o quarto de segunda. Até parece que a criança que estava por nascer não queria nascer pobre. As dores aumentaram. As contrações amiudaram. A criança nasceu. Um menino, 4,5 kg. Seria chamado de Judas Tadeu.

Seria!... Mas houve uma série de ponderações. O menino receberia, de cara, logo que chegasse à escola, um apelido nada conveniente.

Corria o risco de não ser chamado de Judas Tadeu, mas apenas Judas. Judas lembraria o traidor. Não seria uma herança muito conveniente a ser dada ao menino. Além disso, a vida da família tinha sido renovada, já que três meses antes o avô paterno, de nome Pedro, havia morrido. Um bom momento de

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homenagear o avô na nova vida que se apresentava era dar ao menino o nome de PEDRO. Tira o Judas, coloca o Pedro e o nome do menino será Pedro Tadeu. Homenageou-se o santo e salvou-se o menino de uma herança indesejada.

Só quem já trabalhou para o Estado sabe com era difícil e demorado receber o santo dinheirinho ganho como professor. Deu a hora de Dona Lídia ir para casa. Tudo estava bem e teve alta em cinco dias depois do parto. Já não era sem tempo. A saudade da criançada que ficou em casa era muito grande. O “Seu Juca” arrumou um dinheirinho emprestado, ou melhor, um dinheirão.

Foram quatro contos de réis. Dinheiro de meio ano de salário de professor. Devendo um dinheiro assim quem é que dorme direito? O remédio é vender a vaca que está dando leite. Naquele tempo, uma vaca dando leite era de grande valor. Acertado o preço de quatro contos de réis e uns trocados, o pasto vazio e a cabeça leve, vamos para frente que há de se dar um jeito. Palavras do “Seu Juca”.

Só que “desgraça pouca é bobagem”, dizia “Seu Juca”. Dona Lídia ficou doente e secou o leite do peito. É bem verdade que nem se sabe se alguma hora a criança sugou algum leite daquele peito murcho. A criança não parou de chorar.

Também pudera! Dos cinquenta quilos que Dona

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Lídia pesava, tirados os quatro quilos e meio do bebê, (filho de pobre sempre nasce grande), mais a água da bolsa da placenta, sobraram pouco mais de quarenta quilos. Agora doente, se tivesse que tirar mais alguma coisa, sumiria. A natureza é sábia. Não dava para tirar mais nada daquele corpo. Muito menos leite.

O quê fazer agora? Sem vaca e sem leite.

Os vizinhos todos pobres. Nenhuma vaca nas imediações. Coitada da criança! Morrer de fome, ou se alimentar da fé dos pais. Muito mais da mãe que dizia: “― Deus há de dar um jeito!” E deu. A vizinha, Dona Maria, uma negra muito boa, ofereceu os seus peitos ainda cheios de leite. Seu filho mais novo estava com pouco mais de seis meses e ainda dava umas mamadas. Serviu para não morrer de fome e adquirir alguma defesa. O pequeno “Dinho” grudouse aos seios ressequidos como alguém que se agarrasse à vida. O pouco leite gera novas necessidades e juntadas à tamanha fé, faz surgir alguma criatividade. Também não era sem tempo que a fome apertou e o menino berrava que era um condenado. Só que a criatividade não pode buscar recursos muito longe do que dispõe a parca dispensa: CARDOSA e farinha de mandioca.

(Cardosa é nome dado à sardinha adulta) Já que a família está comendo dia sim e outro também este

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cardápio, nada mais lógico do que juntar-se ao restante da família, a ovelha desgarrada que só queria vida mansa e tomar leite. Nada disso!

Cardosa nela!

Uma cardosa num pouco de água a ferver, tudo bem amassadinho e depois coado que é para não passar nenhuma espinha, um pouco de farinha de mandioca bem peneirada e está feito um mingau de primeira.

“GATO COM FOME COME SABÃO!” Barriga vazia não tem muita escolha. Deu certo! O menino parou de chorar. Até arrumar alguma outra coisa para fazer o mingau, juntou-se aos dois ingredientes um pouco de melado de cana. Deu certo novamente. Só que o improviso virou rotina. Depois, foi acrescido um pouco de banana, bem madura e bem amassada. Esse foi o alimento do pequeno Dinho até a idade de poder juntar-se à família, no café da manhã com pão feito de farinha de milho e inhame.

A única coisa que encurtou foi o nome: de Pedrinho para Dinho.

Os tempos ruins não são fáceis de passar e assim eu me lembro, com saudades, embora os tempos continuassem difíceis, dos pés carregados de goiabas, das pitangas, das baleeiras, das

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cabeludas, das bergamoteiras. É por isso que a criançada do sítio não morre de desnutrição. Tudo quanto é baguinha a gurizada bota na boca. Mas o que mais me faz lembrar, com saudades, é das pescarias no Rio Aririú. Rio que para mim parecia um mar. No entanto, não passava, nos vãos mais largos, de dois metros de largura. Além dos bagres, traíras, sarus, piavas, havia o camarão de água doce. Coisa que ninguém comia. Tinha veneno.

Dava feridas e não sei quantas coisas mais. É evidente que nos meus três anos de idade eu não acreditava nessas coisas, e, com uma boa peneira de taquaras me esgueirava para dentro do rio, afregulhava as margens, as tocas e lá vinham dois ou três camarões saltitantes dentro da peneira.

Muitas vezes a peneira vinha vazia. Depois de umas boas horas, mergulhado no lodo, aparecia um punhado de camarões no fundo de uma lata velha.

Lata que virava panela. Um foguinho atrás de uma pilha de tijolos, um pouquinho de sal e estava pronto um bom petisco. É preciso, antes de qualquer coisa, falar um pouco de nossa vizinhança. As casas eram muito espaçadas umas das outras, mas bem perto de nossa casa vivia uma família de negros. Ficava a uns trinta metros de nossa casa. Nos fundos, a uns cem metros moravam um casal de velhos, pais dos

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negros da frente. Pessoas muito bem quistas na vizinhança, meus inimigos número um. Eu explico!

Dona Lídia, minha mãe, tinha medo que o pequeno Dinho, com três anos de idade se arriscasse e se metesse em aventuras na beira do rio, para as suas arriscadas pescarias. Para ela apenas imaginárias, já que nunca apareceu camarão em casa. Recorreu à dona Biana que avisasse quando o Dinho se aproximasse do rio. Só que o rio era a minha vida.

Os peixes, as bagueiras mais carregadas, o maior número de passarinhos, as bergamoteiras mais doces, os melhores locais para armar as arapucas, tudo estava na beira do rio. Era só me aproximar do rio e dona Biana gritava: “― Olha o Dinho no rio!”

ETA frasezinha mais miserável! Afastava-me do prazer mais agradável e me garantia, de quebra, umas boas varadas com vara de marmelo. Minha vingança era atirar pedras nos patos e marrecos de Dona Biana. Na verdade era a única vingança que me ocorria, uma vez que não podia me vingar diretamente nela. Como tudo é dinâmico e às vezes a gente não dá valor àquilo que realmente vale, nunca estendi o zelo de Dona Biana. Comecei a pensar num modo mais duro de castigar a delatora.

O castigo dado aos marrecos não chagava ao conhecimento da dona. Era preciso inventar alguma

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coisa para que ela ficasse sabendo da minha doce vingança.

Dona Maria Biana lavava para fora. Lavava no rio que passava em nosso terreno. Bem no meio do pasto. Havia um trilho no pasto gasto pelo constante ir e vir de Dona Biana ao rio nos seus afazeres e labutas com as roupas que, diga-se de passagem, ficavam branquinhas que dava gosto de ver. O trilho era ladeado por touças de capim e mata pasto. Não havia jeito de Dona Biana pisar fora do trilho. Descalça, sem olhar para o chão, trouxa enorme na cabeça num equilíbrio perfeito de dar inveja aos artistas do Circo de Soleil, vinha a estraga prazer, arrastando os pés cansados pelo trilho, até o rio.

Rapaz pequeno não pensa nas consequências, só nos atos. O primeiro ato foi dar nós nos fiapos de capim, unindo as pontas de um lado e de outro do caminho. Dona Biana tropeçaria com certeza!

A vingança só é doce enquanto planejada.

Me parecia tão suave ver a velha senhora se desequilibrando ao enlaçar os pés pelos capins amarrados! Seria preciso algo mais substancial para criar um clímax que condissesse com meu ato vingativo. Merda. Montinhos de merda pelo caminho!

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Ato pensado, ato feito. Lá vem Dona Biana cantando uma canção de escravos. Corre a esconder atrás das moitas para deliciar o resultado da traquinagem.

Dona Biana tropeçou, xingou. Escorregou, xingou.

Saiu roupa voando para tudo quanto era lado. Nova tropeçada. Nova escorregada. Nova xingada. Para mim, criança, foi tão engraçado que não contive o riso. Denunciei-me. Arrumei uma inimiga declarada.

Nunca mais pude chegar perto do rio. Era só me ver e gritava Dona Biana: “― Olha o Dinho no rio!”

Aos gritos de “Dinho no rio”, Dona Lídia acorria pressurosa. Mas junto trazia uma varinha de marmelo que era para dar ênfase aos seus argumentos incompreensíveis de que não devia me aproximar do rio. Para mais reforço ainda, fazia zunir uma varada que deixava lanho nas minhas pernas branquinhas. Além das pernas branquinhas, meus cabelos também eram branquinhos. Encaracolados, compridos e loiros desbotados. Havia por trás desses cabelos compridos alguma promessa de Dona Lídia, mas não sei qual seria.

Um belo dia estou feliz, agora já com cinco anos, mergulhado no rio, a pescaria indo de vento em popa, quando escuto o fatídico grito: “– Olha o Dinho no rio!”. Acompanhado do grito vem o brado de Dona Lídia: “– De hoje tu não me escapas”. O desespero me deu asas nas pernas. Corri como um

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condenado. Dona Lídia se atrasou um pouco para procurar a vara de marmelos que eu havia quebrado e jogado no forno de pão. Quando Dona Lídia se distraiu para apanhar uma nova vara, passei por trás dela e me escondi debaixo da casa. O chão de nossa casa tinha um declive que acabava em zero com o assoalho. Fui me arrastando até o último cantinho. Ali, todo sujo de barro, fiquei encolhido e quieto por várias horas.

Descobri que arrumar um inimigo é coisa muito séria. Principalmente se a gente é tão fraca como uma criança.

Passei a visitar o vizinho mais abaixo. Lição aprendida, me fiz amigo. Me fiz companheiro de caçadas e confidências. O nome dele era Lalau.

Procuraram o Dinho em todos os lugares possíveis. Inclusive no lugar onde estava. Mas não me encontraram atrás da pedra da pilastra que sustentava o assoalho. Dormi. Quando acordei estava um rebuliço danado. A vizinhança fora chamada para ajudar a procurar o desaparecido.

Com a gritaria toda acordei. Só que não podia sair simplesmente. Seria uma surra na certa. O “Seu Juca” já estava pronto para se jogar no rio à procura do garoto. Nisso escuto uma voz muito conhecida que pergunta: “― Vocês procuraram direito debaixo

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da casa?” a resposta foi afirmativa, mas o vizinho Lalau não se deu por contente. Pegou uma pomboca de querosene (tipo de lamparina feita de lata, com um pavio de pano no centro, onde se colocava fogo e fornecia uma claridade bruxuleante e precária) e se arrastou para debaixo da casa.

Como queria ser achado, me mudei de lugar e me tornei visível. Lalau me pegou no colo e me levou para sua casa, não deixando que apanhasse uma boa tunda. Não ia abandonar o amigo e companheiro da caçadas nas bagueiras do seu José Henrique, um outro vizinho, mais conhecido como “seu Zérrique”. Dono de uns pés de içara, um tipo de palmeira que dá uns frutos roxos tipo açaí. Muito apreciado pelos sempre famintos sabiás. À noite fui trazido para casa com uma forte recomendação do Lalau para que não batessem no guri. Por via das dúvidas corri para a cama e logo dormi, cansado que estava pelas aventuras do dia. Mais tarde, passados três anos, convidei o Lalau para ser meu Padrinho de Crisma.

Com o meu padrinho Lalau ampliei o meu círculo de aventuras. Agora conhecia todos os bons pontos de pesca da redondeza. Quem viesse de fora para pescar procurava o Dinho que estava sempre pronto para acompanhar e dar as dicas para uma

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boa pescaria. Descobri que o saber dá poder e o poder traz muitas regalias.

Meu pai sempre teve uma vendola. Era mesmo um armazém. Tinha de tudo um pouco. Ou de tudo um quase nada. Mas tinha! Tinha fumo de corda, cachaça, farinha, sal, cigarros, vendidos no varejo e sempre bem contados e controlados pelo “Seu Juca”, meu pai. Um dia uma gurizada se juntou, já que era dia santo e nada se tinha para fazer, resolvemos inventar a feitura de cachimbos de bambu. Funcionou. O fumo era de rolo comprido feito uma corda e não tinha como controlar o tamanho. Como era vendido a quilo, sempre sobravam uns pedaços bem pequenos. Me apropriei de alguns deles e forneci a matéria prima para a gurizada. Depois de várias cachimbadas, criança pequena inventa de seguir o exemplo dos pais e dos mais velhos, tomamos um porre de cachimbo. É!...

Aprendi que cachimbo dá porre. E que porre!...

Vomitei até não poder mais. A terra rodava sob meus pés e eu caí em cima de um monte de barro para fazer tijolos e dormi (se é que se pode usar esse termo para o suplício que passei). Acordei à noitinha. Não havia mais ninguém. Ao me levantar ainda estava tonto. Para surpresa de minha mãe não quis comer nada naquela noite. Depois eu soube que porre de cachimbo pode até matar. Mas

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não morri. Eu era um sobrevivente. Oitavo filho de uma mãe O negativo e um pai A positivo.

Nos tempos difíceis o “Seu Juca” tinha montado uma olaria. Era uma olaria artesanal. Tudo feito à mão. Para fazer quinhentos tijolos por dia o “Seu Juca” tinha quase que se matar e aos filhos pequenos. Estendia os tijolos pelo chão, enquanto estavam moles, para dar uma endurecida. Isso me faz lembrar umas boas artes, baseadas nas minhas teorias infantis contra a lei da gravidade. Teoria testada, pilha de tijolos amassada. O resto da história, já vou contar.

Como eu falei, o “Seu Juca” colocava os tijolos espalhados pelo chão para secar e depois seres levados ao forno para queimar. O tijolo saía molinho da forma para o chão. Certo dia apareceram muitos tijolos amassados, com marcas de pés.

Quando questionado para saber se não era eu quem tinha amassado os tijolos, respondi categoricamente que não. Eu havia andado por cima deles, mas tinha feito o corpo bem levinho, não sendo, portanto, os meus pés que haviam amassado tantos tijolos. O pior é que o “Seu Juca” estava a fim de descobrir o mistério dos tijolos amassados e mediu as pegadas, confrontando-as com os pés da gurizada. Por puro azar, as pegadas conferiram com o tamanho dos meus pés. Levei uma surra. Injusta! Tinha certeza

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de ter andado por cima dos tijolos, pisando “de levinho”.

Olaria naquele tempo era uma piada. Tijolo não se vendia. Mas como não havia mais nada para se fazer e ficar parado era ser chamado de preguiçoso, “Seu Juca” fez muitos tijolos. Lembrome de um dia em que nos chamou para ajudá-lo a recolher os tijolos secos que a chuva vinha forte e rápida. Recolhemos todos os tijolos, espalhados para secar, nas várias pilhas de secagem pela rua.

Juntamos aos outros que já estavam no forno para serem queimados. Forno cheio dava ao todo uns doze mil tijolos. Um mês de serviços forçados e mal remunerados. Tudo prontinho, trabalhamos até altas horas da noite. Amontoamos lenha perto do forno, dentro do rancho, que era para a chuva não molhar.

No outro dia era só tocar fogo e queimar durante dois dias e uma noite.

Naquela noite a chuva foi torrencial. Choveu a noite inteira. Ao nos levantar, ainda me lembro muito bem, o “Seu Juca” estava sentado numa velha cadeira de palha no rancho de baixo, um tipo de paiol de onde se via os fundos do terreno e onde estava localizada a olaria, olhando na direção da olaria. Olhei na mesma direção. A olaria estava toda debaixo d’água. A lenha havia sido carregada pela força da água. Só dois dias depois as águas

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sumiram. O forno carregado com os tijolos secos era agora um monte de lama. A água tinha dissolvido os tijolos. Desse dia em diante o “Seu Juca” não trabalhou mais na olaria.

Para sobreviver, dona Lídia fazia pães e vendia para a vizinhança e aos raros transeuntes.

Fazia também santa fé, cocada, queijadinha e toucinho do céu. Tudo uma delícia.

Lembro-me uma véspera de Natal. Meu pai sortiu a venda. Cheia de produtos natalinos, doces, chocolates, balas, presentes, estoque completo de mercadorias. Era 24 de dezembro de 1954, uma sexta feira. Meu pai fazia planos de ganhar uns bons trocados com a venda dos produtos. No sábado, dia 25, iria cedo à Missa das 7 e depois voltaria para atender a freguesia que seria certa e proveitosa. Só que não poderia abandonar todo o estoque. Alguém teria que ficar cuidando.

Seu Juca lançou olhares avaliativos sobre a filharada e a escolha parou sobre a minha pessoa.

Claro que não era por competência. Mas isso não importava. O que importava é que havia sido o escolhido para cuidar de toda aquela mercadoria.

Diga-se de passagem, uma mercadoria muito cobiçada. Ninguém iria notar uma “beliscadinha” aqui e ali no meio de tanta coisa tentadora.

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Chegou domingo de Natal. A proibição de não abrir os presentes antes do retorno da Missa foi infrutífera. A gente já sabia que em dia de Natal o Seu Juca não batia em ninguém. Podia ser que até batesse dobrado na próxima vez, mas a vida sempre foi um risco. Depois de algumas guloseimas e a recomendação do jejum para os que iriam comungar, a família se alojou na carroça e lá se foram, meus cinco irmãos, dois mais moços e três mais velhos, meu Pai e minha Mãe.

Seu Juca ainda recomendou que dissesse à clientela que não demoraria. Só que demorou!...

O vigário não fez a Missa das sete. Deixou tudo para a missa das nove. Não ir a Missa em dia santo ou domingo é pecado mortal. Seu Juca não podia arriscar a ir para o inferno. Mesmo Dona Lídia não deixaria. Esperou a Missa das nove. A missa atrasou um pouco, o vigário se entusiasmou com a presença de tão grande multidão, o sermão ficou um pouco mais comprido. Na hora de ir embora, o povo não arredava pé diante da igreja. Muitos veículos com cavalos assustados. Muita confusão. Tudo foi atrasando. Seu Juca estava mais nervoso que o cavalo novo que puxava a velha carroça. Já estava dando meio dia quando conseguiu chegar a casa.

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Mal largou as rédeas nas mãos de meu irmão José e correu para ver a freguesia. Não havia ninguém. A venda, antes cheia e bem arrumada, estava uma bagunça e... vazia. Estoque, mercadorias de natal, prateleiras, sacos de mantimentos, tudo vazio.

Haviam saqueado a venda do Seu Juca. O homem ficou branco e falou as palavras mais acusadoras e mais elogiosas ao mesmo tempo em que escutei. “O guri jogou tudo fora. Havia uns 500 contos de réis aí dentro. Ficamos falidos”. Escutei uma voz triste que disse muito rápido: “Não bate no menino”.

“O que tu fizestes, rapaz!” “Vendi tudo”. Foi a minha resposta. “Como vendestes tudo? Nem na escola estás! Aonde está o dinheiro?” E já foi abrindo a gaveta do dinheiro e só encontrou moedas e dinheiro trocado.

“Isso é lá dinheiro? Não tem nem cem contos aqui. Tinha 500, talvez 600 contos de mercadoria.

Não sobrou praticamente nada”. Respondi depressa: “Setecentos e oitenta e sete contos em dinheiro, mais o fiado que não tive tempo de somar”.

“Onde está esse dinheiro?” A agonia do meu pai era visível, mas o meu regozijo era maior. Com toda cerimônia, retirei uma velha lata de banha de

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porco e debaixo dela estava uma pequena fortuna.

Setecentos contos de réis em notas grandes.

Oitenta e sete era de dinheiro trocado, na gaveta.

Peguei a caderneta de anotações do FIADO enquanto seu Juca contava os setecentos contos.

“Tá certo!” foi o que conseguiu falar. Apresentei a caderneta e lhe disse: “Confere o fiado, vê se está certo!”

“Não precisa. Vamos comer que todo mundo deve estar morrendo de fome. Deve estar certo!”

Passou a mão na minha cabeça e lá fui comer a comida salgada mais doce da minha vida. É que arrancar um elogio do Seu Juca e um carinho, como uma passada de mão na cabeça, era coisa muito rara.

A venda do “Seu Juca” tornou-se parada obrigatória para os peixeiros da localidade da Barra do Aririú que vinham vender suas cardosas e suas cocorocas. Ali comiam pão com cocada. Para beber, um copo de refresco de groselha, feito pela dona Lídia, que Coca-Cola não havia naquela época. Pelo menos não em Aririú. Não havia também energia elétrica. O refrigerante era colocado num porão com serragem fininha e sal para refrescar. Bem que uma gasosinha retirada do porão fresquinho já era um luxo naqueles tempos difíceis.

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Hoje, vendo a gurizada tomando refrigerantes a toda hora, lembro-me que naqueles tempos bicudos tomava-se refrigerante, no máximo, quatro vezes por ano: Natal, Páscoa, dia do aniversário e quando se visitava a fábrica de bebidas do seu Evaldo Luchi ou Bash, não me lembro. Só lembro que era uma festa. Podiam-se tomar quantos refrigerantes a gente aguentasse. De graça. Era um verdadeiro milagre. Só mais tarde descobri que as garrafas oferecidas não conservavam as tampas e o gás fugia.

Apresentavam defeito. Por isso iam para doação e consequente propaganda.

Um belo dia o “Seu Juca” foi fazer uma viagem a Florianópolis e voltou de lá com ideias de mudança. O que a dona Lídia achava da família se mudar para Campinas? Campinas era um loteamento novo às margens da rodovia que leva o nome de Presidente Kennedy, no vizinho município de São José. Da conversa resultou que dona Lídia gostou da ideia e “Seu Juca” tocou para Campinas, comprou um lote à prestação. Um lote não! Um banhado! Um buraco! Mas buraco não era problema para o “Seu Juca”. De buraco e barro ele entendia.

O buraco não era outra coisa senão falta de barro dentro dele. Comprou o terreno bem barato e começaram os preparativos para a mudança.

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Segundo as determinações do “Seu Juca”, a distribuição dos serviços ficaria da seguinte maneira: - Eu vou prá lá com os dois rapazes aterrar o terreno. No fim de semana a gente volta de ônibus.

- Mas os rapazes são tão pequenos! – argumentou dona Lídia.

- Pequenos nada! Se trabalharem do jeito que comem!...

E ficou decidido. Numa segunda feira bem cedo, cangamos o baio na carroça (cangar era o termo usado por nós para arriar o cavalo à carroça) e fomos para a aventura. Sim! Aventura. Eu tinha só oito anos. Sair de casa, mesmo que fosse para trabalhar era uma coisa muito divertida. Quanto mais que o “Seu Juca” tinha alugado um barraco, nos fundos de uma casa, com nove metros quadrados (9 m²) inteirinho para nós, os homens.

Na primeira semana de trabalho quase matamos o baio, um cavalo já avançado em idade.

Para não dizer que já estava velho! “Seu Juca” determinou a cota de doze carradas diárias. Cavavase o barro com enxada e enxadão. Juntava-se com pás e jogava-se na carroça. Enchia-se até a borda.

Andava-se um quilômetro para ir e outro para voltar.

Ao meio dia, pirão d’água com carne seca. Pela manhã e pela noite, café com pão. Nem pensar em

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leite ou outra mistura. O baio era solto ao final do dia para que procurasse alimentos por conta própria.

Pela manhã chacoalhava-se uma vasilha com milho em grão e o som atraía o baio como um ímã poderoso.

Falando em alimentos por conta própria, a farinha de mandioca veio em grande quantidade, que farinha era coisa barata. Mas a carne seca veio escassa. Sem a dona Lídia para fazer o devido racionamento, a carne acabou ligeiro. “Seu Juca” foi embora na sexta feira e ficamos eu e o Zeca, meu irmão mais velho que eu dois anos e meio, para darmos continuidade aos trabalhos. Quanto mais a gente trabalhava mais fome tinha. Acabou a carne.

O dinheiro deixado era só para o pão. Foi aí que começaram os tempos bons das pescarias. Como dava siri em Campinas!... E manjubas!... E camarões! A gente ia pescar com o dono do barraco onde morávamos. Ele tinha um filho muito pequeno e não era companhia para pescarias. Quando se ia pescar manjubas não era preciso levar vasilhas para trazê-las para casa. Era uma tarrafada só. Botava-se a tarrafa nas costas e vinha-se tirar os peixes no terreiro da casa. Era claro e o seu Álvaro, este era o nome do pescador, já tinha energia elétrica.

Manjuba é uma espécie de sardinha. Olha que se pegava manjuba para comer com fartura durante

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dois a três dias. Para pegar o siri a gente fazia um facho com um pedaço de pneu velho. Pegava-se só garra azul. Siri grande! Carnudo. Tempo bom!

Levamos três semanas para dar conta do aterro.

Meu pai não voltou nem deu notícias. Depois foi ir para casa e receber os abraços de saudade da dona Lídia.

A casa nova foi feita toda em madeira de pinho. Pinus araucária. Madeira nativa muita utilizada na época e matéria prima mais barata.

Depois de pronta foi pintada de verde. Ficou assim por muitos anos. Casa pronta, mudança em cima do caminhão. Todo mundo se empoleirou por cima dos trastes velhos e lá fomos felizes para a casa nova e para novas aventuras. Tudo tinha um gosto bom de liberdade. Havia acabado o limite do interior.

Estávamos morando numa cidade grande. Não que o lugar que a gente morasse fosse grande. Só que a gente dizia que morava em Florianópolis. Não era para esnobar, não! Era o jeito de se falar.

Campinas tinha ônibus de hora em hora para Florianópolis. Aprendi a andar de ônibus. A ir para a cidade, sozinho. Isso me abriu muitas portas.

Principalmente as portas da imaginação. Bem na cabeceira da ponte Hercílio Luz funcionava o porto.

Aquilo era lindo! Os grandes barcos atracados traziam o mundo para bem perto de mim. Eu ficava

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horas apreciando o ir e vir dos trabalhadores das docas. Gente forte e suada, acostumada a carregar sacas de café de cem quilos e jogá-las sobre a pilha enorme do armazém ou do navio. Aquela gente toda suada e faminta deu-me uma ideia.

Minha mãe resolveu fazer pães e doces para vender e sustentar a família. Era uma boa doceira.

Os doces simples e gostosos eram muito apreciados. Disse para minha mãe que queria ser um vendedor ambulante de doces. Os vendedores ganhavam vinte por cento de comissão. Trato feito.

Peguei minha balainha de doces, tapada com uma toalha bem limpinha e me joguei para o porto. Tinha mesmo chegado um navio. Oito horas da manhã.

Quando anunciei a mercadoria e alguém gritou: “― É uma beleza!...” Só consegui salvar a balaia e o pegador. Os doces foram todos. Por milagre, o dinheiro correspondente estava em minhas mãos.

Havia descoberto o filão da mina. Ganhei uma porção de dinheiro, o mês inteiro. Mas tudo que é bom, dura pouco. O navio foi embora e com o navio os meus famintos fregueses. A balaia cheia de doces! O jeito foi andar pelas ruas e oferecer o produto. Corri pelo mercado público. Ponto de ônibus. Repartição pública. Lojas de roupas. Fui fazendo a minha freguesia para os tempos de miséria no porto. Aos sábados e domingos tinha

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corrida de cavalo. Os viciados nas corridas não arredavam pé do lado da raia. A fome os acometia e eu vendia balaias e balaias de doces e cocadas.

Num ano ganhei tanto dinheiro que consegui economizar doze contos de réis. Não sei o que é isso hoje. Só sei que a primeira quadra de Campinas tinha doze lotes desocupados. O dono, na época, 1960, ofereceu os doze lotes por doze contos. Meu pai me perguntou se não queria comprar para o futuro. Minha resposta foi que não. Não ia querer gastar o meu rico dinheirinho comprando um banhado. O banhado vale hoje mais de vinte milhões de reais. Foi a minha primeira falta de visão.

A segunda falta de visão foi pegar todo dinheiro e comprar roupas. Em menos de um ano estava sem calças e sem camisas. Cresci muito e nada mais me serviu.

Agora com meus dez anos, quase onze e totalmente solto, fiquei feliz que não houvesse vaga na escola pública perto de casa. Meus familiares estavam preocupados com as companhias. Já ia fazer onze anos. Três anos de rua me tinham ensinado tudo que a rua pode ensinar. Mas ensino formal, nada. Minha irmã mais velha, ou melhor, a segunda mais velha era freira e não sei por que cargas d’água arrumou para eu ir para o seminário

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estudar para padre. Era um desejo antigo e sonhado de minha mãe. Aceitei.

Em fevereiro de 1961 fiz minha primeira viagem para fora do Estado. Quatro horas da manhã tomei o ônibus da empresa Auto Viação São Cristóvão para Porto Alegre. Lá, um tio meu, irmão de meu pai, iria me esperar e colocar dentro de outro ônibus para Passo Fundo. Meu destino era o Instituto Menino Deus, mais conhecido como seminário redentorista, no bairro Boqueirão.

Nos meus quase onze anos era uma aventura sem limites. Pedi para meu pai comprar a passagem e reservar o banco da frente, bem ao lado do motorista. Hoje em dia esse banco é reservado ao cobrador. Queria ver tudo. Não podia perder nada, de uma viagem tão sonhada. A previsão de chegada era por volta das dezoito horas.

A estrada até Porto Alegre era de chão batido. Dependendo da maré, se estava baixa, quando chegasse à cidade de Torres, já no Rio Grande do Sul, deixava-se a estrada e tomava-se a faixa de areia da praia por uns sessenta quilômetros.

A areia era retinha e podia-se correr bastante. Mas antes de chegarmos a Laguna, bem antes de Torres, numa curva bem acentuada, não deu tempo de frear e batemos em um caminhão. Foi vidro para

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tudo quanto era lado. Gritos. Gente caindo pelo corredor.

Devo continuar.

esclarecer

uma

coisa

antes

de

Ao chegarmos a Imbituba, entrou um senhor bem vestido e bem falante que conversou com o cobrador e quando regressamos da parada de meia hora para lanche e banheiro, esse senhor tinha tomado o meu lugar. Falei com o cobrador, mas obtive como resposta que eu era pequeno e podia sentar num banco mais atrás. Sentei-me com uma senhora também gorda, já que o ônibus estava lotado.

Fiquei fulo, arreliado. Meu projeto de ver todos os detalhes do caminho ia ficar incompleto.

Hoje eu vejo como agiu bem o meu anjo da guarda.

Tirou-me do banco da frente, colocou-me entre dois bancos, bem protegido. Resta dizer que o único passageiro que teve que ser internado no hospital de Tubarão, foi o gordo que tinha usurpado o meu lugar. O primeiro carro que passou, fizeram parar e colocaram o homem no bando de trás e lá se foi.

Nunca mais ouvi falar dele. Só sei que vi muito sangue e que sua vista tinha sido afetada com os cacos de vidros e estilhaços.

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Ficamos ali na beira da estrada, esperando que a polícia recebesse o recado e viesse fazer o laudo. As horas foram passando, a fome foi apertando. Não havia casas por perto. Só um riacho cantarolando uma canção monótona como o tempo da espera. Lá pelas duas horas da tarde dei uma olhada na mochila e descobri que minha previdente mãe havia colocado dois pães e um pedaço de carne generoso. Coisa rara naqueles tempos!

Passei por baixo de cerca, achei uma boa pedra na beira do rio, apanhei uma folha de inhame, improvisei uma vasilha, peguei um pouco d’água e fiz um suntuoso banquete. Lembro-me, ainda, dos cobiçosos olhares dos outros passageiros que nada tinham para comer. O tempo passou e já quase noite apareceu um policial, de carona com um caminhão. Desculpou-se que a delegacia estava com o jipe quebrado. É bom lembrar que as caronas eram raras. Chegamos de noite a Tubarão. Fomos direto para uma oficina. Saímos todos para fora do ônibus que foi varrido e limpo. Retirados os restos de vidro do para-brisa que um novo só em Porto Alegre. Foi improvisado um plástico transparente para o motorista enxergar e já de noite prosseguimos viagem. Resta dizer que me empoleirei novamente no meu lugar bem na frente.

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Minha preocupação era de chegarmos ao destino e não haver ninguém me esperando. Falei com o motorista e ele me tranquilizou, dizendo que eu poderia dormir na garagem. No entanto, ao chegar à rodoviária meu tio estava me esperando e me levou par casa das irmãs missionárias de Jesus Crucificado. Lá fiquei perambulando o dia todo.

Dormi aquela noite muito agitado. No dia seguinte, bem cedo, me colocaram num ônibus para Passo Fundo.

O seminário era uma grande construção com quatro alas, fechando dois grandes pátios, com uma construção no meio, onde ficava a capela. De um lado, no térreo, ficavam as salas de aula, biblioteca, banheiros e dois grandes corredores. Os corredores eram assoalhados de cerâmica vermelha. As salas de aula eram assoalhadas com tacos de peroba e canela, fazendo um desenho em preto e branco, muito a gosto da época. As salas de aula tinham carteiras individuais e enormes. Ali dentro se guardavam os livros e materiais necessários aos estudos. Diga-se de passagem, muito puxados. No lado direito da capela, ficava o jardim. Cheio de flores e bem cuidado por um irmão redentorista, já que o seminário era dos padres redentoristas.

Houve um tempo que fiquei empolgado com a matéria de ciências. Inventei um rádio tocado a

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energia do ar. Pegava só uma rádio. Pelos meus cálculos, a antena da rádio não podia distar mais do que quatro quilômetros. Só funcionava com fone de ouvido. Aprendi também a fazer pólvora. A motivação era começar a fazer foguetes. Na época os padres passavam para nós todo o programa norte americano de conquista do espaço. Mais propriamente o projeto APOLO. Fiz uns dois quilos de pólvora. Testada e aprovada em uma espingarda velha feita com cabo de guarda chuva. Juntei os dois quilos de pólvora, cuidadosamente feita em quantidades pequenas, arrumei um bambu açú, de uns dez centímetros de grossura. Fiz um acabamento em forma de cone que era para subir sem dificuldade. Misturei a pólvora com serragem para que não explodisse, mas fosse queimando e impulsionando o foguete até as nuvens.

Havia elaborado, cuidadosamente, um pavio. Feito, segundo os meus conhecimentos, dentro da maior técnica. Derreti uma vela, molhei um barbante nela.

Depois enrolei num pouco de pólvora. Repeti a operação várias vezes, até que ficasse de uma grossura razoável. O barbante tinha um comprimento de uns vinte centímetros. Achava que era o suficiente para acender e correr até a porta da capela. Não contei para ninguém a minha aventura.

Não queria passar pelo desgosto de ser

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ridicularizado pelos colegas. Coloquei o artefato bem no centro do jardim, onde havia um pé de jasmim, carregado de flores. Ajustei o pavio, peguei a caixa de fósforos de acender as velas do altar, acendi o pavio e me retirei às pressas para saborear o gosto do sucesso do projeto. De repente senti um empurrão violento que me jogou de encontro à porta da capela. Não escutei nada. Estava surdo.

Levantei-me preocupado em ver o que estava acontecendo com o foguete encostado ao pé de jasmim. Só que não havia mais pé de jasmim. Em seu lugar havia uma cratera. Corri e me enfiei no banheiro. Pouco a pouco os sons voltaram aos meus ouvidos. Escutei uma gritaria. Todos correndo em direção à capela, depois ao jardim. Aos gritos de “foi atentado terrorista” os padres chamaram a polícia. Depois, pelos comentários dos colegas, fiquei sabendo que a explosão havia sacudido todo o seminário. Até hoje, nem os padres nem a polícia solucionou o caso. Também acabou aí o meu sonho de fazer foguetes. Von Braunn que se divertisse sozinho.

Fiquei no seminário pelo período de cinco anos. Estudei latim, Francês, inglês. Muita história e geografia. Nada de matemática. Saí e fui servir ao exército. Como não dava tempo de estudar o segundo grau, fiz o “madureza”. O “madureza”

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consistia de dez provas de conhecimentos fundamentais, relativos ao segundo grau. Hoje seria o supletivo. Passei. Encorajado fui fazer o vestibular da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Em 1970 foi o primeiro unificado. Valia para todos os cursos. Meu pai dizia que era para jogar dinheiro fora, pois, na UFSC só passava quem tinha feito cursinho preparatório, tivesse estudado o segundo grau em bons colégios, e eu, em resumo, só tinha concluído o ensino fundamental. No dia da publicação dos aprovados, fomos, eu e meu irmão mais novo do que eu e um colega para o bairro da Trindade, na cidade de Florianópolis, onde fica sediada a UFSC. Quando chegamos o locutor estava citando o número vinte e cinco. Esperamos até o final da leitura. Seiscentos nomes. Nada.

Frustrados, abaixamos as cabeças e corremos a tomar o ônibus de volta. Mas antes de tomar o ônibus eu disse: “― Vou dar uma olhada nos vinte e cinco primeiros”. Meu irmão e meu colega caíram na rizada. Não quiseram esperar. Foram embora. Como eu poderia pensar em passar na UFSC e ainda ter a petulância de querer passar entre os vinte e cinco primeiros. Voltei e pedi para dar uma olhada na listagem dos vinte e cinco primeiros. A resposta foi que todos já estavam ali, menos o dezoito, um tal de PEDRO MACEDO. Sou eu. Gritei... Na mesma hora

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alguém me agarrou pelos cabelos. Cortaram todo ele que era comprido. Deixaram todo pipocado, num modelo jamais imitado e que me deixou muito feliz.

Devo confessar também que nunca mais outro modelo atraiu a atenção e os olhares das moças da minha terra. Jogaram, por cima dele e do resto de mim, uma lata de tinta. Minha camisa nova que tinha ganhado no Natal ficou imprestável. Mas o importante é que estava feliz. Estava na UFSC. Queria fazer medicina. Meu pai disse que não teria dinheiro para pagar um curso tão caro. Já tinha que ajudar meu irmão mais velho que fazia agronomia na cidade de Pelotas. Me formei em LETRAS. Dizem que meu pai acompanhou a leitura dos aprovados pelo rádio. Que teria chorado e dito em tom bastante alto para os que estivessem perto escutarem: “― O filho da puta é inteligente mesmo.”

Vindo de meu pai é um elogio sem precedentes. Só sei que não me cobrou o dinheiro emprestado para a inscrição do vestibular. Outro fato inédito. Não perdoava dívidas.

No ano seguinte me casei com a mulher dos meus sonhos.

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ASSIM A VI. MISTERIOSA E SOLITÁRIA. NO MESMO INSTANTE TANGÍVEL E FUGIDIA. DESCONFIADA E SEDENTA DE ACONCHEGO. ÍMPETO DE ENTREGA E RECUO. MAR DE ONDAS QUE SE ENTREGAM E JÁ FOGEM. FOI ASSIM QUE A VI. ASSIM QUE A VI ME CATIVOU. MAR A DESCOBRIR. DESCONHECIDO INFINDO. ALI ESTAVA ELA INTEIRA E JÁ FUGINDO. AINDA HOJE ASSIM A VEJO. O MESMO MAR, AS MESMAS ONDAS...

E TRAZEM ÁGUAS E DUNAS...

E SE ME TOCA E A BEIJO, TAMBÉM ME FOGE. SOU NÁUFRAGO NUM MAR QUE DESCONHEÇO. NÃO SEI SE ESTOU NO FIM OU NO COMEÇO. A DESCOBERTA AINDA NÃO É TERRA À VISTA. O MAR A DESCOBRIR AINDA É INTEIRO. O TEMPO PASSA E A VEJO MAIS BONITA. O MAR SE EXPANDE, EU ME ENCOLHO. É MINHA DITA?...

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Claro que junto vieram os pesadelos. Mas a gente quando é jovem não pensa nas coisas ruins.

Um ano depois veio a primeira filha. Não! A filha não foi pesadelo. Foi benção. Na verdade oito meses e quinze dias. Depois mais uma. Depois mais dois homens. Depois mais duas filhas. Depois dois abortos. Depois fiz vasectomia. Era uma operação pouco conhecida, mas minha mulher não podia ter mais filhos. Tinha dilatação na veia do útero. Tocou para eu contribuir na contenção da prole.

Em 1979 voltei para a faculdade. Fiz Pedagogia. Colei grau em 1982. Em 1986 fiz concurso público e me efetivei no Colégio Antonio Lehmkhul, em Águas Mornas, SC. No Governo de Pedro Ivo Figueiredo de Campos, em 1987, assumi o cargo de Diretor de Assistência ao Estudante. Neste cargo tive a oportunidade de criar a Lei do transporte escolar em Santa Catarina. Foi um fato bastante curioso. Como tinha sido um aluno que teve de andar oito quilômetros, a pé, para poder estudar, vi como meus colegas ficaram para trás, por não verem a importância do estudo e terem que andar 8 km todos os dias para ir e mais 8 km para vir. Apresentei um projeto de lei na Assembleia Legislativa do Estado.

Todos os Deputados foram unânimes em dizer que era uma Lei que mexia com o Orçamento e que

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devia ser de iniciativa do Governo. Mas que nem adiantava o Governador apresentar a Lei para votação na Assembleia que não passaria. Iria dar muita despesa às Prefeituras e os Deputados não iriam se indispor contra suas bases eleitorais. Foi uma ducha de água fria. Só que não sabiam o tamanho da minha teimosia. Entrei na equipe que ia fazer o Orçamento. Um serviço muito chato e cansativo. Colaborei com a equipe. No fim sobrou um saldo de 12 cruzeiros. Moeda da época. Um dos membros da equipe foi logo dizendo para anexarmos a um dos itens orçamentários e acabar logo aquela pendenga. Eu entendia muito de orçamento, já que era ex-funcionário do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. Propus a criação de um novo item orçamentário, com o título de transporte escolar. Acharam a ideia ridícula.

Doze cruzeiros não davam para comprar nem um bloco de passe escolar. Insisti na ideia, disse que havia colaborado com toda equipe, que não tinha feito nenhuma emenda, que queria o apoio deles.

Não entenderam, mas cederam ao meu apelo. O Orçamento foi enviado à Assembleia Legislativa.

Nenhum Deputado se preocupou com um item de 12,00 cruzeiros. O Orçamento foi aprovado e virou Lei do Orçamento. Junto com o Orçamento, o item transporte escolar virou LEI. Estava criado o transporte escolar em Santa Catarina. Conversei

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com o Governador, e ele autorizou suplementação orçamentária. Foi o item que mais dotação recebeu naquele ano, só superado pelo da folha de pagamento dos servidores. Naquele ano de 1987, colocamos mais de 33.000 alunos de volta à escola.

Hoje o transporte escolar é uma realidade. Depois de criada a necessidade, a sociedade exige aquilo que lhe é de direito.

Assumi, em 1989, o Cargo de Diretor Geral da Secretaria de Estado da Educação. Na ausência do Secretário titular, assumi, por um mês, o cargo maior da Secretaria da Educação. O titular era José Tafner. O melhor homem que conheci. Franco, leal e simples. De uma sabedoria de criança. Daquelas crianças de que deve ser feito o reino dos céus, apregoado por Jesus Cristo. Não pensem que era um homem tolo, não. Foi duas vezes reitor da FURB, em Blumenau. Hoje é dono da ASSELVI, sediada em INDAIAL e espalhada pelo resto do Brasil, via internet.

Vivi muitos anos felizes. Vinte e sete, para ser exato. Vinte e sete anos de casados. Um belo dia fui surpreendido com um telefonema do Oficial de Justiça da cidade de Palhoça, cidade onde morava, dizendo que eu precisava contratar um advogado e ir com urgência ao Fórum. Era uma terça feira, 04 de novembro de 1997. Como a

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conversa com o Oficial de Justiça não podia ser passada por telefone, fui ao Fórum. O Oficial me entregou uma cópia do processo de separação de corpos e o aviso de que deveria procurar um advogado que ele me orientaria como proceder dali para a frente. Mas que eu não sonhasse em dormir em casa até dia 19 de novembro, dia da audiência de reconciliação, marcada pelo Juiz. Fui ao advogado e mostrei a cópia do pedido e separação de corpos, aqui transcrita: “Sr. Dr. Autorizo Vossa Senhoria a tomar as providências referentes à medida cautelar de separação de corpos uma vez que minha vida está em risco. Meu marido me pressiona todo dia a dormir no quarto do casal.

Temo que ele vai me matar. Se a exame de HIV que ele fez e o ‘caderninho’ forem provas suficientes, quero o divórcio e indenização pelo mal que ele está fazendo e fez para mim e para a nossa família.

Fulana de Tal-04/11/97.”(Os erros de tratamento e concordância não são meus).

Oito linhas que fizeram o Juiz me afastar de casa, dos meus filhos, dos meus sonhos.

Argumentei com o Advogado que não iria sair de casa. Ele me falou que o Juiz mandaria a polícia e que eu sairia na marra. As acusações contra mim eram muito graves. Pressionar para dormir no quarto de casal, mesmo sendo casados, é ESTUPRO.

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Além da ameaça contra a vida. Mesmo que não existisse tal ameaça, o Ministério Público não poderia ficar impassível frente a uma denúncia desta natureza. Resultado: fui a minha casa onde não havia ninguém a essa hora, peguei umas roupas, na saída encontrei meu filho Fernando, disse adeus e... nunca mais entrei naquela casa que foi um sonho e vinte e três para ser construído. Minto. Fui uma vez quando minha filha mais nova me ligou dizendo que estava muito doente e que não tinha ninguém em casa. Consultei um médico pelo caminho, falei dos sintomas e ele receitou um medicamento. Fui lá, levei o remédio, disse para ficar tranquila que já ia passar e nunca mais voltei.

Tenho que esclarecer que o exame de HIV a que me submeti nada tinha de trágico ou de segredo. Eu estava com uma diarreia há vários dias.

Já havia feito muitos exames e nenhuma causa provável tinha sido encontrada. O médico sugeriu que para ficar tranquilo era bom fazer o exame de HIV, pois, diarreia é um dos sintomas provocado pelo vírus. Como minha esposa havia sido submetida a várias intervenções cirúrgicas, raspagens etc., nada impedia que ela fosse portadora do vírus e tivesse me contaminado. Se eu fizesse o exame, uma vez dado negativo, ela não precisava fazê-lo e tudo ficaria esclarecido. Fiz o

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exame e deu negativo. Mais tarde descobri que a causa provável da diarreia era a diabete. Com a glicose muito elevada, o organismo se defendia provocando a eliminação de parte do açúcar através das fezes. Ou então uma reação à lactose, já que hoje está confirmada a intolerância do meu organismo a essa proteína do leite.

O ‘caderninho’ era o esboço de um livro que estava tentando escrever. A Justiça reteve como prova. Demorei a começar outro. Havia acabado o encantamento, e, como num canto de fadas acabou o casamento. Ela não quis a reconciliação. Entregou a minha correspondência ao seu Advogado, que entregou ao meu, que me entregou. Achei aquilo muito triste. Eram trinta e um anos de convivência, confidências, cumplicidades... E acabava assim?!...

Trinta e um anos se contados os três de namoro e um de noivado.

Nada é tão humilhante quanto sentir que tudo que se fez na vida não tem valor. Um sentimento de impotência e injustiça invade os sentidos, quando se tem invadida a privacidade e dela se tira conclusões que são suas, pessoais e intransferíveis no sentimento e na veracidade. Julgar os outros com os sentimentos, de culpa e de medo, é gerar uma aberração cujo filho é a maledicência, a incompreensão e o desespero. Não há vencedores

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nem vencidos. Apenas sobram derrotados. Meu mundo caiu. Não sei o que vale. Meus valores foram derrubados por terra numa intransigência e ódio que superaram todo o possível. Alguém me fala em amor e me condena sem direito à defesa, pois, o veredicto já estava dado, antes mesmo de me sentar no banco dos réus. Podia dizer o que quisesse, até mesmo pedir perdão de falta não cometida, mas já sabia a sentença. Condenado. As bocas e ouvidos se fecharam. Meus próprios filhos aderiram à sentença propalada. Ficaram surdos e mudos aos meus apelos solitários e sequiosos do carinho. De uma atenção. De um afago, mesmo longínquo, com olhos tímidos, um lampejo de piedade e amor filial.

Nada!... Apenas o olhar frio da condenação.

Domingo vazio na casa nova e grande, embora, maior fosse o meu desespero e minha dor.

Lancinante. Profunda. Angustiante. É a dor de ver morrer, juntamente com os sonhos acalentados, toda possibilidade de futuro. Senti num instante o que é ser velho e só. Vi desfilar diante dos meus olhos todo o calvário da minha velhice solitária. Quis morrer. Quis que a terra me engolisse. A terra não foi compassiva, do mesmo modo, como aqueles que considerava meus, ficou quieta e silenciosa. Apenas cresceu a angústia. A garganta ardendo num choro que se recusava a vir para não conceder o alívio das lágrimas. O peito oprimido, o coração doendo, no dia

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seguinte a torrente de lágrimas jorrou como catarata num soluço que resumia todos os sentimentos. Foi um soluço dorido, profundo, sentido, levando, na torrente de lágrimas, toda a dor, juntamente com todos os sonhos. Lágrimas salgadas me avisando que a vida não era mais um doce viver, mas a dor da sobrevivência. Sobreviver para que? Para amar os menos amados, foi a resposta que me veio.

Aceitei o desafio. Vou dar a volta por cima. Serei um novo homem. Romperei com o passado. Nada do que foi será!...

CHOVE E EU CHORO NA CHUVA. PERDI UM AMOR, UM SONHO QUALQUER. TRANSFORMOU-SE EM VINHO, A DOCE UVA. FICOU AMARGA, AZEDA, AQUELA MULHER. ZOMBOU DE MIM, ME FEZ INFELIZ. TIROU DE MIM MINHA PAZ, MINHA CALMA. TIRANIZOU A MIM QUE SÓ A QUIS, TRAZENDO TRISTEZA PRÁ DENTRO DA ALMA. EU CHORO TRISTONHO O MUNDO PERDIDO, UM SONHO DESFEITO, UMA MÃO SEM LUVA. MEU CHORO PROFUNDO É CHORO SENTIDO. NINGUÉM VÊ MEU TORMENTO E MINHA TRISTEZA. DAS LÁGRIMAS QUE CHORO NEM TENHO CERTEZA. MINHAS LÁGRIMAS SE PERDEM, POIS CHORO NA CHUVA.

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Meu mundo desabara... Nada do que possuía, ou pensava que possuía era mais meu.

Tudo me fora arrancado de um instante para outro. Eu que pensava ter um lar feliz, um casamento sólido, uma casa nova e bem montada, um escritório completo com internet...

Até os filhos... Se foram... Afastaram-se de mim como quem se afasta de um leproso mais horrendo...

Tinha colocado minha felicidade no mundo que me rodeia... Descobri a duras penas o significado bíblico que diz: “Infeliz do homem que coloca sua felicidade nas mãos de outro homem”.

Descobri que minha estatura humana era ínfima.

Sofria de nanismo. Era preciso encontrar de novo o paraíso perdido. Era preciso crescer para as alturas.

Mas o crescimento verdadeiro só vem com o sofrimento. Entender que não se é nada; entender que o grão de trigo precisa morrer para dar frutos; entender que o mundo que nos rodeia não nos traz felicidade; entender que a felicidade está no modo como nós envolvemos o mundo; que a felicidade é a partir de nós e não para nós. Assim como o amor verdadeiro.

Chegar a esses conceitos é caminhar para o calvário. É sentir toda dor que um homem pode

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suportar. É pedir para o Pai afastar este cálice, se fosse possível. Mas como na história de dois mil anos atrás, a única resposta que escutei foi a do silêncio. Um silêncio que me deixava só, único e solitário, não restando mais nada como resposta a não ser eu mesmo. Então entendi. A resposta está em cada um de nós, em nossa história, no modo de como fazemos as coisas e tomamos nossas atitudes. Este será o nosso céu ou o nosso inferno.

Também não adianta procurarmos caminhos já prontos para nos desviarmos das atribulações da caminhada. Não há caminho. Apenas o caminhante.

O homem é síntese de si mesmo. Não existe rumo se não se sabe aonde vai, ou não se sabe aonde se quer ir. Eu sei o que quero. Sei aonde devo ir. Sei a atitude a tomar. O mundo está inteiro por descobrir!...

Pelo menos o meu mundo!...Vou entrar nele de cabeça erguida. Ninguém vai me ensinar o caminho!... Quero trilhá-lo sem pressa. Quero degustá-lo como se fosse um petisco típico. Quero saborear cada ato como se fosse o último, o único e o necessário!...

EU JUREI ALÇAR PEQUENEZAS DA TERRA.

VÔO

ACIMA

DAS

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Se for preciso, criarei asas de albatroz, mas voarei acima de todas as pequenezas, pois minha alma foi feita para a imensidão. Não me curvarei aos entraves que tentarão, em vão, me atrasar na caminhada.

Já sinto até um alívio por pensar assim e por tomar esta decisão. Sinto que a caminhada já não é tão longa quanto parecia ser. Já dei os primeiros passos. Pode ser que não tenha fé suficiente para mandar a montanha lançar-se ao mar, mas tenho forças o bastante para carregar um punhado de terra de cada vez.

Não vou mais jogar a minha felicidade para um lugar distante de mim, como uma utopia a alcançar. Vou fazer os meus sonhos bem aconchegados a mim, pequenos, íntimos, realizáveis. Assim como o tempo é feito de pequenos intervalos, minha felicidade será feita de pequenas realizações. Se o dia está ensolarado, me alegro com o sol. E louvo a Deus por isso. Se o dia amanhece chovendo?... Que maravilha de chuva.

Molhei meus pés?... Como é bom sentir o contraste dos meus pés quentinhos!... Dei uma tropeçada?...

Que bom!... Hora de aprender. Só se aprende quando há obstáculos. A vida está cheia deles.

Somos seres em constante aprendizagem, parar é estagnar. Si tropeçamos é porque nossa vida, nossa

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trajetória está muito retilínea, muito monótona, entrou na rotina. Rotina é sinônimo de estagnação. “― Mas eu gosto de rotina...” Então você parou de crescer. Invente rapidamente alguma coisa nova.

Tem medo de errar? Pois não tenha!... O erro é próprio de quem está aprendendo. Quem já aprendeu tudo não precisa mais viver. A vida é tempo para aprender. É eterna aprendizagem.

Fique atento!... Não existe um só instante de nossas vidas que não nos seja apresentada uma chance de aprender. Às vezes dói... É quando somos convidados a andar mais depressa. Já perdemos muito tempo numa outra trajetória que não era própria do nosso viver. Vamos dizer assim: erramos. Vamos, às vezes, por um caminho que achamos ser o nosso. Vivemos a vida dos outros.

Temos então que dar um salto para recuperar o tempo perdido. Isso pode ser doloroso, mas até a dor é aprendizagem. Mas a dor de quem perde um ente querido?...

Ninguém pode perder o que não tem...

Ninguém é dono de ninguém. “A vida é feita da ânsia da vida por si mesma”, como dizia Gibran Calil. Pode até vir de você... Mas não é para você.

Cada ser tem sua própria trajetória. Você pode crescer com o outro, mas não pode crescer pelo outro.

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Acima de tudo não tenha pressa. A pressa é inimiga da aprendizagem. Tenha sempre a certeza de que não está só. A vida é una e fora da unidade nada existe. O que você faz para os outros, faz para si mesmo. Seja de bom, seja de ruim. Nisto reside a sabedoria de amar os inimigos, como prega Jesus Cristo.

A vida não tem outros sentidos. Ela é o sentido, em si mesma. A nós, compete apenas vivêla. Transformá-la num mundo de possibilidades. Ir em direção do bem, até alcançar o Bem maior, destino de todos os chamados à vida. Costumamos nos amarrar, nos prender em nossos próprios nós: os nossos erros. Talvez falha de nossa educação castradora e preocupada com o mal, que pregava o inferno, em detrimento do paraíso. Somos filhos da “teologia do cagaço”.

Digo que é hora de nos libertarmos dessas amarras e nos lançarmos à semeadura. Um é o que planta, outro é o que colhe, mas se somos UM, que nos importa quem colha?

Os erros são próprios de quem tenta construir. A correção se faz durante a caminhada.

Quando chegarmos ao destino, a vida muda de dimensão e passamos para a eternidade.

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ENFIM MORRI. E NÃO ERA DECISÃO E NEM PASSAGEM. ERA VIDA NOVA. PLENITUDE A ME SORRIR. RUPTURA, CISÃO. NÃO TEMPESTADE, MAS ARAGEM. NÃO EXPERIÊNCIA, MAS PROVA. ESTAVA NU, LIVRE E SOLTO. E TODAS AS COISAS ERAM VELHAS E NOVAS. EM TUDO O AMOR NOS CIRCUNDAVA. E NÃO HAVIA NADA QUE PUDESSE ENTRISTECER. EU VI A LUZ DIVINA E CONHECI A VERDADE, E TODAS AS COISAS FORAM RENOVADAS. ... E CADA COISA ERA TÃO DOCE....

E TÃO HUMANA QUE MERGULHEI EM DEUS... ... E OS ANJOS CANTARAM HINOS DE LOUVOR E DE ALEGRIA. O HOMEM VENCEU A MATÉRIA, TORNOU-SE LUZ. E ME ABRAÇOU JESUS E DISSE: ¨― VEM!” ― AMÉM!

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Nada do que foi feito foi por acaso. Você é único e individual em todo o universo. Joia rara, diria um ourives. Eu digo que preciosa. O universo não seria completo sem a sua presença no mundo.

Eternamente fomos pensados por Deus. Isto significa que já existimos desde todo o sempre. Com Ele formamos a unidade do todo. Como o todo precisa de todas as partes para existir por inteiro, você é essencial, necessário, vital. O Evangelho diz: “Tudo foi feito por Ele, com Ele e n’Ele, e nada subsiste sem Ele.” (Jó,1-2,5) Portanto você é vida preciosa, amada, querida, e eterna com o Pai. Segundo Jesus Cristo, o Pai quer que sejamos felizes, tenhamos vida plena e a nossa alegria seja transbordante. Cada instante pode e é importante.

Você pode dourá-lo do jeito que você quiser. Você é dono de todos os seus momentos. Pode transformálos. Levá-los a uma dimensão de não tempo e perpetuá-los como obras primas de sua construção de vida. Construir a sua eternidade. Tornar-se um ser realizado, cheio de vida e de alegria. Esta chave misteriosa está em seu poder, em sua mente. Jesus Cristo diria: “O reino do céu está em vós.” Nada pode nos tirar a tranquilidade de nossas vidas, a não ser a força que brota dentro de nós. Que é nossa e depende de nossa determinação. A mão que é capaz de ferir é a mesma que é capaz de afagar, acarinhar, jogar beijos, embalar. A força para fazer

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essas coisas acontecerem está dentro de você.

Ninguém poderá tirá-la, colocar para fora ou trancafiá-la. Somente você. Todos os sentimentos bons e maus brotam em seu coração. O campo está todo por semear. Você é o semeador. A semente está no depósito do seu coração. E o mais importante: quanto mais você semeia, mais aumenta o estoque daquilo que você semeia. É uma grandeza inversamente proporcional às suas ações.

Um velho e conhecido filósofo dizia: “Conhece-te a ti mesmo.”...”A verdade está dentro de vocês. A verdadeira felicidade está no conhecimento da verdade”.(Sócrates) Jesus Cristo diz: “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. O povo hebreu estava sob o domínio romano e achava que era infeliz por que não tinha liberdade. “Busquem primeiro o reino dos céus e sua justiça e o resto vos será acrescentado.” (Mateus 6,33) A felicidade que buscamos, fora de nós, longe de nós, nunca encontramos. A verdadeira felicidade mora conosco.

Já é propriedade nossa. Só a teremos, se a utilizarmos, se a doarmos. Não fomos educados para usufruir da nossa felicidade. Fomos educados para buscar a felicidade. Só que nos ensinaram o caminho da busca por veredas erradas e caminhos tortuosos. Ensinam-nos a buscar a felicidade fora de nós. Por isso nós nunca a encontramos. Nunca vivemos o nosso momento.

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Não é nos locupletando que ficaremos saciados. A verdadeira sabedoria está na alegoria do amor ao inimigo. Somos um todo indivisível.

Quando amamos o inimigo, estamos amando o que há de pior em nós. O amor ao inimigo é o começo da verdadeira sabedoria. É o caminho do verdadeiro conhecimento. É aí que conhecemos a verdade e certamente ela nos libertará. Ao nos esvaziarmos, abrimos espaço para o nosso crescimento interior.

Começamos a enxergar um pedaço maior de nós mesmos. Perceberemos os outros “eus” ao nosso redor e os amaremos como partes essenciais do nosso ser. Ao sairmos de nós deixamos o limite daquilo que é finito e temporal e passamos à dimensão do infinito e do não tempo, aspiração de nosso coração que busca, sempre longe, a felicidade que está tão perto. Assim como a felicidade está dentro de nós, o reino está dentro de nós. Para encontrar o reino é preciso prestar atenção aos detalhes. Os detalhes são coisas simples. Coisas que não prestamos, normalmente, a atenção. Mas é ali que Deus se revela. Deus se revela nas coisas simples, nos simples e com simplicidade. “Eu Te agradeço, Pai, por que não revelastes essas coisas aos sábios e entendidos...”

Deus se revela aos simples que o buscam. Muitos marcos, nos Evangelhos, indicam isso. Precisamos de muita coragem para mudarmos o nosso modo de

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pensar e de ser. A criança é simples. “Em verdade vos digo que se não vos tornardes como crianças não entrareis no reino dos céus”. A maior coragem é enfrentar o inimigo que está dentro de nós. O pior inimigo não é o que mora em outra casa, outra rua, outro bairro, outra cidade. O pior inimigo mora em nós mesmos. São os nossos defeitos. OS NOSSOS DEFEITOS SÃO AS PERCEPÇÕES ERRADAS de nós mesmos. A maior coragem está em enfrentá-los.

Têm vários agravantes. Nossos inimigos interiores são invisíveis aos nossos olhos. O inimigo oculto é traiçoeiro, insidioso, arrasador. Todos os vizinhos o conhecem. Apenas nós o desconhecemos ou ignoramos. Por conveniência ou insensatez. Temos a incapacidade inata de pensar que os inimigos ignorados não existem. É quando se tornam mais perigosos. Nossos inimigos interiores têm que estar bem à nossa frente, bem desnudos, bem visíveis, também aos nossos olhos. Temos, então, que ter a coragem necessária para enfrentá-los e dominá-los.

Nisso consiste a virtude. Combater os próprios defeitos. Então juntamos como aliadas: a coragem, a firmeza, a constância, a coerência, a verdade; nos tornamos indivíduos admirados pelos que nos rodeiam. Antes viam apenas os defeitos. Agora veem um lutador, um guerreiro, um ser em crescimento para as alturas. O mais importante é que cada inimigo dominado se torna um aliado e dá

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forças para combater os outros defeitos que nos assaltam. Outros puderam..., também posso.

Como todas as pessoas, tenho lastros no passado. Não dá para arrancar e jogá-los fora. A vida é uma sequência de fatos, de acontecimentos.

Uma ruptura é sempre um trauma. Uma ruptura numa vida de cinquenta anos é um trauma com profundidade de 50 anos.

Quando se pensa que está tudo superado, tudo volta à tona com agressividade e dor. É uma depuração constante que lembra Prometeu, amarrado na montanha, entranhas abertas e as aves de rapina lhe devorando o fígado.

Tal como Prometeu, meu único crime foi amar. Amar é padecer com resignação. O amor supera tudo. Supera até a dor da saudade. Embora minha saudade seja uma constante infinita. Não tem lenitivos; e os pseudo alívios dos encontros só servem para recrudescer a dor da separação e da intransigência.

Nesses momentos de maior dor é que descobri com intensidade a grandeza do amor de Deus para com as criaturas que se abrem ao seu amor. Chega a ser uma concretude, a percepção desse amor carinhoso e aconchegante. O sentir-se

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amado faz a criatura transbordar em lágrimas, por não conter a alegria infinita.

Quando o ser se esvazia dos preconceitos, descobre que todos os seres são constituídos da mesma dignidade, são frutos do mesmo amor criador. Que na beleza da natureza, Deus se revela soberano, exatamente por se apresentar livre de todo preconceito. Como se toda a matéria tivesse menos dignidade do que o espiritual, o sobrenatural.

A exaltação do poder do Criador está exatamente na sua manifestação através da matéria. Despiu-se de toda grandeza, tornou-se matéria visível pela força do Espírito. Sem nenhum preconceito tornou-se leis da física, química, matemática. Através do conhecimento se revela, aos poucos, aos que o procuram.

O ser humano vai descobrindo a ciência, vai se descobrindo, descobre Deus. Revela no humano sua verdadeira grandeza, tornando-se matéria humana, assumindo a humanidade como coisa necessária ao conhecimento da sua verdade. Quis partilhar conosco o caminho para o conhecimento verdadeiro, mostrando que a nossa salvação é um ato pessoal de entrega, de doação, de plenitude no amor.

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QUE BELEZA A NATUREZA DE DEUS PAI O ESPLENDOR QUE O ESPÍRITO REALIZA NA ESPRESSÃO DO PURO AMOR. O ESPÍRITO SE RECRIA AO FAZER-SE NATUREZA. SE CONSOME NA MATÉRIA SE RESSALTA CRIADOR. FAZ NO HOMEM A CONSCIÊNCIA DO AMOR QUE EM SI SUBLIMA. DE SI TAMBÉM FAZ CIÊNCIA QUE EM DESCOBERTA CULMINA. PARA REAVER A CRIAÇÃO, NO HUMANO DESVIADA, MANIFESTA-SE EM JESUS. PARA PROVAR QUE É DE AMOR A NATUREZA CRIADA, POR AMOR SE ENTREGA À DOR E NUMA MORTE DE CRUZ TODA TERRA É RENOVADA. NESTE GESTO FRATERNO, DE AMOR À CRIAÇÃO, NOS LIVROU DO FOGO ETERNO E NOS DEU A SALVAÇÃO. ...E ESTA SE REALIZA NO AMOR QUE É MANIFESTO E SEMPRE SE ATUALIZA NA PRESENÇA DO MEU GESTO.

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É uma pena que o ser humano só descobre certas belezas depois de um sofrimento intenso.

Outra verdade é que só se aprende quando há barreiras. Todos os obstáculos estão aí colocados de maneira amorosa para possibilitar nosso crescimento. Imagine fazer alguma coisa que não nos é muito agradável. Não pode haver nisso prazer algum. Agora imagine fazer exatamente esta mesma coisa, com a consciência que está colocada ali, num gesto carinhoso de Deus, para o seu crescimento.

Todo crescimento verdadeiro é um abrir-se prazeroso para a vida. É um alegrar-se de criança.

“Em verdade vos digo, se não vos tornardes como crianças, não entrareis no reino dos céus.” Não esticar os olhos muito para frente, mas contentar-se com o momento. O momento é a vida. Somos seres mediatos. Devemos colocar nossa felicidade no aqui e no agora. Costumamos jogar nossa felicidade para ser aproveitada quase sempre no futuro. O futuro terá seu momento próprio de aqui e de agora.

Quando nos exercitamos continuamente a jogar nossa felicidade para o futuro, vamos aprender a lição de jogá-la para o futuro e assim faremos habitualmente. Seja criança. A criança brinca com o que tem; alegra-se com o que tem; não faz distinção de pessoas; não é preconceituosa. Num abraço ela se dá por inteiro. O sorriso sempre ilumina. Nunca usa de “mas” e “talvez”. Viver cada momento como

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coisa rara. Como se fosse o último ato de nossa vida passageira. Iremos fatalmente descobrir o reino e consequentemente nos descobriremos amados pelo Pai. Não amados num velho conceito de amor exigente, mas amados graciosamente, amados com intensidade, sem restrições, sem pudor. Um amor que é plenitude e imensidão. Um amor que é aconchego e delícia. Um amor que transborda em lágrimas. Não de tristezas. Lágrimas de felicidade por não poder conter tamanho contentamento verdadeiro. Onde estava eu tão perdido que nunca tinha te encontrado? Como pude passar uma vida tão tumultuada que não te percebi no movimento?

Não te percebi na calmaria? Não te percebi no abraço? No mendigo da sarjeta? Na beleza da flor que se abre à vida? Na prostituta, que como eu, entrega sua vida e seu corpo em troca de migalhas.

Quando a vida é dom. Dom eterno. Presente régio para os príncipes e princesas herdeiras do trono verdadeiro que chamamos céu. Podemos, como Paulo de Tarso, exclamarmos extasiados que “olhos humanos jamais viram, ouvidos jamais escutaram e coração jamais sentiu o que Deus tem preparado para nós, os seus eleitos”. (Cor. 2,9) Ainda não nos demos conta de nossa grandiosidade. Somos filhos bem amados do Pai Eterno. Somos sua consciência no mundo, mas não temos nem consciência de nós mesmos. Estamos mortos para a vida. “Lázaro, vem

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para fora!” o convite não é para o passado. É um convite sempre novo. Sempre atual. Sempre amigável. É o convite do Deus criação; do Deus amor; do Deus carinho; do Deus humano; me agasalha, me protege, me chama constantemente à vida. “Lázaro, vem para fora.” Sai dos teus preconceitos. Sai de tua tumba pessoal e vem para o mundo que está por ser feito. Um mundo novo, reconstituído pelo amor e pela partilha. Onde a ganância e a incompreensão darão lugar ao diálogo e a troca de riquezas pessoais.

Não necessariamente de bens perecíveis, mas a troca saudável do conhecimento de Deus e da salvação dos homens. Não da salvação dos pecados cometidos, mas das obras não realizadas; em mim mesmo e no vasto mundo que me rodeia. Nos gestos que atualizam a salvação realizada por Cristo. A prática do amor sem interesse que não outro do que fazer a vontade do Pai. Fazer a vontade do totalmente outro é morrer para si. Mas o que é a vida senão um doce e continuado morrer a cada instante para que surja logo a seguir um momento mais interessante, totalmente novo!? “Se o grão de trigo não morrer não dará frutos.” Morremos no dia anterior para acordarmos revigorados no dia seguinte. Suspiramos que passe rápido a hora que esperamos pela amada. Queremos que morram bem depressa os momentos que antecedem o filme

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que desejamos assistir. Que morram os dias que nos afastam do grande passeio à Disneylândia.

Queremos que se acabem os quilômetros que nos separam do destino almejado. Tomamos remédios para matar a doença que nos aflige. A morte é, portanto, a melhor parte e a constante de nossas vidas. Uma bactéria é capaz de se tornar avó em apenas um segundo; ela não morre; se transforma.

A morte não é término, mas começo de uma vida nova. É continuação de vida plena que se renova através de todas as mortes que vão dando sequência e atualizando o nosso existir. O espermatozoide, o óvulo, o feto, o bebê já são vida.

Por algum desvio de educação e cultura, em algum momento de nossa história de vida, alguém negligenciou o ensinamento de que viver e morrer faz parte de uma mesma vida. Embora o que importa em tudo isso, é a vida, dom amoroso do Pai que a todos ama com ternura. Deus, sendo amor, na sua essência primordial já era e sempre foi amor. O amor é a precedência de todas as coisas. Como o amor é doação, Deus precisava se doar. Precisava se doar a uma inteligência capaz de entender seus atributos, tomar consciência de sua grandeza e buscar a sua perfeição. Acena ao homem qual o caminho a seguir. Como um pai dedicado repete a lição primeira e única a ser aprendida: o ser humano foi feito para o amor. “Te amo. Por isso preciso de

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ti.” O amor vem primeiro. Mas é um amor tão intenso e tão pleno que faz anteceder a si próprio e nos coloca à frente de todas as realizações divinas.

Antes da grande luz, do faça-se a luz, do big-bang, da criação dos mundos, das coisas, da vida, dos animais, “eu já pensava em ti e já te amava...”

(Jer.1-5) Depois que viu que tudo era bom, depois de toda a terra preparada para ser a morada humana, proclama o edito eterno do amor criativo e criador: “Façamos o homem a nossa imagem e semelhança.” (Gn 1-26). Com paciência, esperou que o ser humano evoluísse e tomasse consciência de sua grandiosidade e da sua beleza como criatura amada em plenitude pelo Pai, até poder exclamar: “Eu e o Pai somos um.” (Jó 14-9). Depois de se identificar com o homem, assume sua condição de miséria e se oferece numa doação de amor, a uma morte de cruz, de todas a mais ignominiosa, para mais uma vez mostrar ao homem que é de predileção o seu amor e que morre com ele toda possibilidade de aniquilação, estando o ser humano morto com Cristo, mas ressuscitado com ele para a vida. Já agora, vida plena e para todo o sempre. “Eu vim para que todos tenham vida, vida plena e alegria transbordante”. (Jó 10-10) A vida plena é dom, presente; e nada precisamos fazer por merecê-lo. Como todo

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presente, só devemos aceitá-lo, ou, não. Para aceitar o presente divino basta dizer: “Eu creio que Jesus é o meu salvador.” Embora este dizer não deva ser da boca para fora. É um dizer de convicção; um dizer com fé. Toda fé verdadeira é concomitante às obras, pois, fé sem obras é morta, como diria São Tiago. (2-26) A pessoa, agora salva, descobre-se amada por um amor verdadeiro; duradouro e sem limites.

Num gesto de confiança filial se entrega ao abraço carinhoso do Pai. Sua alma transborda de alegria e nada mais em sua vida pode ser tristeza. Seu coração está pleno. O amor de Deus o consumirá. O ser humano, pleno de amor, procurará a justiça e será misericordioso. Exatamente como o Pai. Para ser justo vai procurar fazer aos outros, o que quer que lhe façam. Como é justo vai saber que ainda erra. Errando vai querer perdão. Como vai fazer aos outros, o que quer que lhe façam, vai perdoar. O perdão é misericórdia. Misericórdia quer dizer perdoar de coração. “Com a mesma medida que medires, serás medido.” (Lc 6-38) A medida do meu perdão é, acima de tudo, justa. Nem poderia ser diferente. Deus não se intromete na minha liberdade nem para conceder o perdão. Eu é que tenho que dar e dizer até onde Ele pode se “intrometer” na

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minha vida. A promessa é plenitude. A medida está apresentada. A decisão é minha.

O caminhar pela vida me coloca diante de situações que desconheço. Tragédias, injustiças, incompreensões, doenças, ingratidões, alegrias, encontros. Todas me afetam de uma maneira ou de outra. Nós reclamamos, esperneamos, nos sentimos impotentes. Algumas vezes nos alegramos. Nosso grande defeito é nos angustiarmos ao ficarmos frente a frente de coisas que não entendemos nem procuramos entender. Se parássemos e nos perguntássemos: “O que a vida está querendo nos ensinar com esta situação?” A vida pode ser substituída pela palavra Deus, para aqueles que acreditam. De certo não é por acaso que a situação me é apresentada. Já não foi por acaso quando, pelo menos 200.000.000 (duzentos milhões) de espermatozoides concorreram para a minha formação no ato da fecundação. A vida é muito importante para permitir acasos. Deus é muito cioso de cada lapso de tempo que nos concedeu para o exercício da liberdade. “Não cai um só cabelo de vossas cabeças sem que o Pai saiba e permita.” (Mt. 10-30) A liberdade é, acima de tudo, um ato ético.

Uma regra fundamental, sábia, simples e bíblica: fazer, aos outros, aquilo que queremos que nos façam. Se fôssemos resumir mais ainda, diríamos

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uma só palavra: RESPEITO. No respeito a mim próprio e aos outros, completo a regra fundamental do convívio, da aprendizagem.

Na decisão do indivíduo, no ato livre de sua vontade, está a realização de todos os “acasos”. O ser humano é o grande fazedor de milagres. Pode deixar tudo como está, ou pode mudar tudo que toca, tal qual Midas, na sua maldição, que em tudo que tocava se transformava em ouro. Para o ser humano não é maldição. O toque humano depende da intenção. Pode virar bem ou mal; pode virar dor ou alegria. O mesmo ato, praticado com liberdade, leva ao crescimento. Praticado na escravidão do vício, ou da ganância, leva à destruição e à miséria.

O que me prende a este mundo é o desejo de praticar o bem. Este será o meu grito de liberdade.

O bem não é um ato praticado e pelo qual sou considerado bom. Ser bom até que é muito fácil. O difícil é praticar o bem. Um ato considerado bom pode, na verdade ser um ato mal. Como dizia Vitor Hugo: “quem salva o lobo mata o cordeiro.” Se salvo ou protejo um bandido, movido pela “bondade” do meu coração, posso estar matando, ali adiante, um pai de família trabalhador; uma pessoa de bem; uma criança. Vivemos em sociedade e a experiência social redigiu certas regras para a proteção e o controle social. Devo respeitá-las, pô-las em prática

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e incentivar os outros para que as coloquem em prática. Meu ato só é bom se não fere a nenhuma dessas normas. Isto é: o ato humano bom está assentado em base ética correta. Roubar dos ricos para dar aos pobres, como fazia Robin Wood, parece um ato bom, mas está assentado sobre base ética incorreta. Roubar é um ato condenado por todas as sociedades éticas. O ato para ser bom tem que ser total e inteiramente bom. Até o meu amor ao próximo não pode ser maior que o meu amor por mim próprio. Amar o próximo como a si mesmo é a medida correta. O próximo que mais precisa ser amado é justamente aquele que é mais difícil amar.

Aquele que mais precisa de amor, o mais necessitado, geralmente, me é antipático; é sujo; é feio; é pobre; é um chato. É quase um inimigo. Daí a alegoria do amor ao inimigo. Devo amar no outro aquilo que é dom divino. Aquilo que é amado pelo Pai e que me delegou o supremo prazer e alegria de poder manifestar o seu amor ao mundo, como uma coisa pura e verdadeira. Não tem alegria maior do que fazer o bem. Fazer o bem ao inteiramente outro, desconhecido, simples, ignorado. Mesmo que receba como paga a ingratidão, pois, o amor verdadeiro não busca recompensa. Sabe que já recebeu, por antecedência, o verdadeiro dom da salvação. Não peça a Deus mais nada. Nem mesmo um milagre. Você é o milagre. A obra que eu faço

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deve ser a manifestação do amor transbordante.

Amor que é alegria que contagia, fazendo com que as pessoas que conosco convivam sejam capazes de exclamar como os jovens da cidade de Emaús: “Não é verdade que nosso coração estava alegre enquanto ele caminhava conosco?”(Lc.24,32) Como os jovens de Emaús, devemos voltar e anunciar a novidade: estamos repletos da alegria de Deus. Estamos entusiasmados. Palavra grega que significa estar repleto de Deus. Quem está repleto de Deus não tem lugar para mais nada. Tem lugar só para as alegrias que transbordam em obras e prazer de se saber salvo no amor de Cristo. Vai buscar, na ciência, um entendimento maior para poder entender toda a grandeza de seu destino.

Sabe-se amado por um amor sem limites e busca no entendimento uma maneira de crescer para o Pai. Não que todo sofrimento desapareça de uma vez por toda da vida do que crê. O sofrimento vem, já que é inerente à vida humana, mas só o fato de se saber amado pelo Pai, passa a ser secundário todo sofrimento. A gente tem que se lembrar do: “Pai, faça-se a tua vontade e não a minha”. É uma lição a ser aprendida e vivida. Na hora do sofrimento temos que repetir como quem acredita: “Pai, eu não entendo, mas seja feita a tua vontade”. Tal atitude, se feita de coração, afasta todo o sofrimento.

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QUE ME IMPORTA SE O MUNDO VAI ACABAR AMANHÃ?

DEUS ME AMA!...

O amor de Deus colocou uma jovem de 18 anos em minha vida. Após a separação bateu o desespero. Pensei em acabar com minha vida.

Parecia que não havia mais sentido em nada a minha volta. Essa menina me fez ver que eu era rico em dons. Que era um felizardo, se comparado à vida dela. Convidei-a para morar comigo. Vivemos quatorze anos juntos. Fi-la estudar. Fez supletivo, faculdade de enfermagem, pós-graduação na Universidade Federal de Santa Catarina. Fez concurso público para uma prefeitura do interior do país e passou em primeiro lugar entre 1.368 candidatos. Foi efetivada com um bom salário. A perdi para o mundo. Não consegui fazê-la entender que a minha opção de vida era para os mais necessitados. Separamo-nos. Dei-lhe um carro zero, uma casa mobiliada e votos de ser muito feliz. A vida continua. Mas não se iludam. Tenho coração.

Estou sofrendo uma enormidade. Sei que ela não precisa mais de mim e minha opção é para os mais necessitados.

Estou aposentado. Tenho um bom salário.

Daria para levar a vida flauteando. Mas é tão

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deprimente ver um idoso esperando uma vaga para entrar na mesa de dominó, ou de canastra. Afinal só tenho 64 anos. Suponhamos que Deus me dê mais alguns anos de lambuja!... Não vou ficar parado, esperando a morte chegar. Tomei uma decisão que pode parecer muito doida. Vou fazer medicina na Bolívia. No Brasil a medicina é muito cara. Se conseguir terminar o curso, irei ingressar nos médicos sem fronteiras. Irei trabalhar na África.

Como diz na Bíblia, o gigante Sansão matou mil filisteus com uma queixada de burro. Agora IMAGINEM o que pode fazer Deus na África com um burro velho e inteiro nas mãos!... Quero fazer a Sua vontade.

Hoje é dia 12 de junho. Dia dos namorados.

Estou no Aeroporto Hercílio Luz, em Florianópolis.

Vou embarcar para Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. Vou fazer medicina. Não faço no Brasil por que é muito caro. A mensalidade, aqui, fica em torno de R$ 4.000,00. Na Bolívia, R$ 390,00. Meu salário de Professor aposentado não suporta o pagamento do curso de medicina no Brasil, mas na Bolívia, sim.

Serão seis anos. Estarei com 70 anos. Meu tio mais novo, irmão de meu Pai tem 90. Vai que a natureza resolve me conservar tanto tempo assim!... Serei útil. Se morrer antes, em todos os lugares do mundo tem sete palmos de terra disponíveis. Bem que hoje

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em dia não se usa nem tanta terra assim. Além do mais, morrer, todos vamos. Aqui ou lá. Quando chegar a hora, estarei pronto. Agora vou tomar um café e embarcar que o auto falante avisou que é hora do embarque.

Estou em Santa Cruz de La Sierra, num quarto apertado, sem mobília. Tem uma cama e um armário pequeno. Não deu para comprar nada, ainda. Fui tirar algum dinheiro e o caixa automático engoliu o meu cartão de crédito. Hoje já é terça-feira e nada do meu cartão ser liberado. Aluguei um quarto, numa casa com mais quatro brasileiros. Fica a oitocentos metros da faculdade. Dá para ir a pé, se não estiver chovendo. Já fiz a minha matrícula.

Descobri que no quarto ano tem um brasileiro mais idoso que eu.

Sábado, fim de junho, resolvi matar a saudade e fiz um churrasco. Convidei algumas pessoas e outras vieram sem ser convidadas. Mas o importante é que nos encontros da vida e nas promessas que Deus faz aos nossos corações é que colocará marcos para facilitar nossa caminhada cambiante. Pois, hoje encontrei duas pessoas que me deram testemunho do amor de Deus. Eu esperava este sinal. Minha sensação de alegria e gratidão foi tão grande que chorei. O choro levou embora toda dúvida que ainda insistia em invadir os

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meus pensamentos, se estava ou não no caminho certo. Houve um tempo que as lágrimas tinham me levado todos os sonhos!... Foi uma reafirmação do que o Pai diz a todos e a cada um de nós:_” Não me peça mais nada. Não me peça mais um milagre.

VOCÊ É O MILAGRE”. É necessário que nós tenhamos consciência que fazemos parte de um plano perfeito. Um plano feito por Deus, perfeição infinita, e, portanto, não poderia cometer nenhum erro. Eu faço parte desse plano. Sou, portanto, escolhido por Deus.

Não é por acaso que estou aqui e agora.

Então tenho que perguntar, que estou fazendo. Não sou um tolo. Sou uma criatura de Deus. Sou um gesto criativo de Deus. Um gesto de amor perfeito, já que Deus é amor. Sendo Deus eterno, que quer dizer, presente constante, ou seja, que não há nem passado nem futuro, eu sempre existi e sempre fui pensado por Ele para fazer parte de um plano perfeito. Só que eu, homem ou mulher, busquei outros caminhos que não levavam a uma vida mais estreita com Deus, supremo Bem. Mas nós tínhamos a liberdade de fazermos o que queríamos. A história bíblica conta que Adão fez a sua vontade e não a de Deus, afastando-se do caminho verdadeiro. A Bíblia fala que o homem foi

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expulso do paraíso. O que é o paraíso senão o sentimento da presença de Deus. Agora o homem tem a consciência pesada. Se sente envergonhado, se sente nu e vai se esconder. Mas como se esconder da presença constante de Deus que ocupa todos os espaços e todas as aspirações dos homens? Criar um mundo dos homens. Um mundo artificial, falso, só imaginário. Mas um mundo onde ele poderia esconder-se de Deus pois estava envergonhado. O primeiro passo é esconder de Deus sua consciência, a consciência de que está errado. A parte mais saliente é o órgão genital que Adão vê diante de si e diz: “ - Vou esconder de Deus esta parte feia do meu corpo.” Então faz uma tanga de folhas. Cria para si um mundo ilusório de que pode esconder-se de Deus, dando inicio a criação do mundo humano. O escritor bíblico fala que o mundo, a criação, foi feita por Ele, com Ele e n‘Ele e nada do que foi feito existe sem Ele. E é verdade. A mente criativa de Deus faz todas as coisas. Só que Deus fez o homem a sua imagem e semelhança. O homem é criativo. Mas só pode criar algo verdadeiro, dentro da fonte verdadeira que é Deus.

Não pode pegar nada de fora. Já que fora nada existe. Só em sua imaginação. Mas ele não pode buscar em Deus, porque ele está querendo fazer às escondidas. Sim as coisas estão em Deus, Ele vai saber de tudo. Mas o homem é muito experto e cria

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um mundo virtual. Tanto que Deus pergunta: Adão onde estás? Em sua resposta ele diz: “- Vi que o senhor chegou e fui esconder-me. Tive medo por que estava nu”. “- Como sabias que estavas nu?

Comeste da árvore da vida, do conhecimento do bem e do mal?”

O melhor caminho é o caminho da verdade.

Deus é a verdade. Só que Adão estava começando a criar um mundo seu. Fora de Deus, fora da verdade e lhe responde: a mulher que me deste…

Desvia a atenção de sua falta e joga em outro lugar.

Um lugar de falsidade. Mas esse lugar NÃO EXISTE. É um lugar falso e a falsidade não existe em Deus, onde estão todas as coisas. Criou a mentira. Só que Deus não conhece a mentira, e a mentira não cabe em Deus. No entanto cai perfeita no mundo dos homens. Deus pergunta à mulher o que ela fez a seu homem e ela continua com a mentira. “- Foi a cobra.” O homem não volta para Deus e Lhe diz: “- Sou o culpado. Perdoa-me.”

Deus vai fazer um caminho novo. Vai em direção do homem. Vou fazer-me criatura humana e vencer a mentira. Vou entrar em seu mundo e mudar a trajetória da mentira e provar ao homem que meu amor é para sempre e sem medida. Então se faz homem em Jesus e prova que seu amor é verdadeiro e sem limite. Para dar testemunho de seu

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amor misericordioso se entrega a uma morte de cruz e perdoa a todos. Até àqueles que o ofendem.

Dizendo: “- Pai, perdoa-os porque não sabem o que estão fazendo”. Desde esse dia, nós estamos perdoados e lavados com o sangue do cordeiro de Deus e, portanto, salvos em Jesus Cristo. Somente o amor verdadeiro salva. Não há amor maior do que dar a vida pelos outros. Ele deu a nós sua vida preciosa e com ela toda possibilidade de retorno à verdade, já que Ele é a verdade, o caminho e a vida.

Quando lhe perguntaram o que estava fazendo na terra, porque tinha vindo, ele respondeu que era para que todos tivessem vida, vida em abundância e alegria transbordante. Também disse que a maior alegria do Pai é saber que seus filhos caminham na verdade. Portanto tenho que conhecer a verdade em sua totalidade. A verdade de Deus, a verdade das coisas, dos fatos, da ciência, de meu irmão. Tenho que ter em minha atenção que a verdade que conheço é a minha. Os outros terão as suas. Mas todas as coisas tem suas essências. É nessa essência que vou buscar o conhecimento verdadeiro, porque Deus é a essência verdadeira de todas as coisas. Na dúvida tenho que perguntar: que Deus quer com esta apresentação, seja de fatos, seja de ditos. Não posso julgar. Tenho que buscar até encontrar a verdade. Por isso tenho que conhecer. Tenho que buscar a ciência. Tenho que

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perguntar às pessoas que são experientes, aos livros que comprovadamente servem de busca e conhecimento. Tenho que perguntar ao meu coração. Deus disse que escreveu suas leis em nossos corações. Que o reino está dentro de nós e que devemos procurar em primeiro lugar o reino dos céus e aquelas outras coisas nos serão acrescentadas. Tenho que abrir os olhos e os ouvidos. É por eles que vem o conhecimento. A razão só vai entrar em ação se os olhos e os ouvidos estiverem atentos. Mas, às vezes, nós não damos atenção às coisas pequenas. Somos tentados na busca do conhecimento em pegar as coisas maiores. As pequenas não nos atraem. São muito pequenas. Não vão ter importância. Estamos enganados. Deus se apresenta nos detalhes. Deus é simples e é na simplicidade que ele vai se manifestar. Quero que atentem para a palavra manifestar. Quer dizer: fazer festa com as mãos. As coisas que nos são apresentadas na vida, é Deus fazendo festa. Esse é um pequeno detalhe, uma coisa simples. Sim, é isso mesmo, mas é nas coisas simples que Deus se apresenta. Temos que nos lembrar que Deus é a verdade. A verdade em todas as coisas. Ele é a essência de tudo. “todas as coisas foram feitas n’Ele e nada existe sem Ele.” Só para não esquecer, a essência é a coisa pela qual o ser ou objeto é, ou deixa de ser. Deus em sua essência

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é amor. O amor é primordial. O amor não pode se alegrar se fica sozinho. A essência do amor é doarse. O puro amor, essência de Deus, é doar-se por inteiro. Doar-se em plenitude, sem restrições, sem pudor. Descaradamente. Para isso seria necessário a criação de uma criatura que fosse capaz de tomar consciência desse amor. Mas não deveria ser um ser submisso, um robô. Não. Deveria ser uma criatura capaz, mas não obrigada. Deveria ser uma criatura feita de tal maneira livre que pudesse negar, não querer, amar e não amar. Até fazer coisas fora de Deus. Entretanto, fora de Deus nada existe.

Então, Deus fez uma criatura chamada homem, com a capacidade de criar em si e fora d’Ele, um mundo todo artificial, virtual. Agora já existem dois mundos.

Um de Deus, essencial, e um do homem, sem essência, apenas virtual. O homem mostra-se autossuficiente. Não quer seguir vivendo no mundo essencial de Deus baseado na essência de Deus, o amor. Quanto mais entra em seu mundo, mais longe de Deus. Outra impossibilidade, pois é impossível afastar-se de Deus já que tudo está n’Ele. Mas em pensamento, em seu mundo virtual onde vive, não vive, pois a vida está só em Deus. Estava instituído o pecado. Afastamento de Deus. No plano soberano havia uma saída. Entrar Ele próprio no mundo dos homens e por dentro salvar o homem do seu próprio orgulho e autossuficiência. Por isso se faz homem

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em Jesus Cristo e vem a terra para provar que é de amor a criação da natureza e do homem. Não veio salvar os homens do pecado. Veio para dizer que seu amor não tem limite. É um amor incondicional.

Veja, estou aqui e te chamo com um gesto de amor para que participes comigo da verdadeira salvação, qual seja, doar-se inteiramente ao totalmente outro, provando a essência do amor maior.

A natureza com todas suas coisas não está posta desta maneira só para que seja vista e nada mais. É para aprender. A vida é oportunidade de aprendizagem. Tudo está colocado de maneira carinhosa para que nós aprendamos. Não é castigo.

Não é vingança. Somente um gesto de amor para que aprendamos e possamos crescer até o desenvolvimento total, para que possamos passar a outra dimensão, à dimensão de não tempo, à eternidade. Então vamos viver a vida eterna com o conhecimento verdadeiro de Deus e com a bagagem dos conhecimentos adquiridos no tempo de aprendizagem. Quanto maior o conhecimento, maior a intensidade do prazer e felicidade. Tudo na vida se aprende com a experiência. Como vamos aprender a viver com Deus na outra vida se não fizermos nesta vida a experiência de Deus? É necessário experimentar Deus. Devorá-lo, comê-lo, degustá-lo,

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palpá-lo, senti-lo, amá-lo. Onde está Ele? Nos detalhes. “Se fiel no pouco e sobre muito te porei.”

Deus é como uma cortina. Quando se abre um pouco, vai SE DEIXANDO VER UM POUCO MAIS. NÃO SE ABRE POR INTEIRO. A descoberta é uma busca continuada como um quebra cabeça, até que se revela por inteiro. Você vai ver e descobrir Deus em uma flor; em uma criança; no canto do passarinho; num por de sol; em um sorriso amigo; em um abraço; em um beijo; no silencio; na música; na dor; na alegria; em um carinho… cada detalhe é um convite para que se note a presença e o amor de Deus dando-se em presente a seus filhos que tem, já agora, o reino e a alegria da doação sem interesse.

Um copo de água não vai ficar sem recompensa.

Cem por um aqui na terra mais um prêmio no céu.

Como se vai entrar no céu para receber o prêmio e não se vai ficar para sempre? Como um pai vai poder dizer a um filho: “- Vem receber um prêmio.

Mas agora ponha-se para fora que você não é bemvindo.” O prêmio torna-se igual a um castigo.

Primeiro mostra a beleza do céu e depois afasta seu filho planejado desde todo sempre. Não há lógica.

Deus não é um sadomasoquista. Deus é Pai de infinito amor e Ele que nos fez, sabe dos limites de cada um. Já sabia desde toda a eternidade e assim

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mesmo, conhecendo-nos, nos amou por primeiro.

Somos obras de seu amor eterno. Somos parte da essência de Deus que é amor. A essência de Deus não pode morrer. É para sempre. Nós somos para sempre. Negar a eternidade com Deus é negar a própria existência de Deus, amor perfeito que fez um plano perfeito do qual nós fazemos parte. Partes essenciais, porque um todo não é todo se falta uma parte dele. Somos únicos e individuais em todo universo. Gerados por uma sabedoria infinita, planejados por um conhecimento sem falha e um amor sem fronteira. Como pode alguém fazer uma criatura já sabendo que será condenada para todo sempre. Existe algo que não é verdade em toda esta historia de Deus bondade, de amor perfeito, de condenação eterna.

Todas as coisas que estão postas em nossos caminhos são gestos de carinho de Deus. São convites continuados para aprender e continuar o caminho até Deus. Todos os objetos são marcos para nós descobrirmos e percebermos que estamos no caminho correto.

Quando buscamos Deus com sentimento verdadeiro, Ele se revela. Seja com uma alegria muito grande, seja com um bem estar de felicidade.

Também devemos recordar que a felicidade não é feita de momentos felizes. Felicidade é um estado

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de ser. É um estar em paraíso. Isso não quer dizer que não vai haver sofrimento. Você pode sofrer e ser feliz. Quando se está e se sente na presença de Deus, na sua imediação, mesmo que se sofra se pode ser feliz. Um exemplo é a mãe ao ganhar seu filho. Tem muita dor, mas é feliz. Está fazendo um ato de amor quase perfeito. Está doando-se a uma criatura totalmente desconhecida. O ato de amor é a imediação com Deus, verdadeiro amor e onde vive a felicidade.

Os primeiros homens criados por Deus viviam em um paraíso e eram felizes porque estavam perto de Deus. Todo ato de amor leva-nos para perto de Deus e é instantâneo o sentimento de felicidade.

Deus é paraíso. O paraíso está posto até hoje para todos os homens. Basta que se queira descobrir o estado de ser paradisíaco. Não há outro caminho para a felicidade. O caminho para a felicidade é o caminho que passa pelo amor. Amor sem dor é egoísmo disfarçado. O amor é Deus, suprema felicidade d’aqueles que O buscam. Fora d’Ele, nada existe, tudo é ilusão, aparência. Mas Deus é realidade e não aparência. Todas as coisas estão n’Ele e por isso só as encontraremos se as buscamos em sua essência, isso é, em atos de amor. Tudo que buscamos baseados no amor está perto da essência de Deus e por isso é verdadeiro.

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Para os filhos, as mães são exemplos de amor verdadeiro. Os são em verdade. As mães são exemplos de amor verdadeiro. A seus filhos se parecem boas pessoas. É que os atos de amor vão tornando as pessoas boas. Estão vivendo perto de suas essências. Destino de todas as criaturas feitas por Deus, para que descubram, tomem consciência que nós devemos ser no mundo a consciência de Deus. Mas uma consciência viva, capaz de mostrar ao redor uma ação verdadeira, provocada por um amor verdadeiro, amor baseado na origem do homem, imagem e semelhança com Deus.

Então as pessoas que conversarem conosco vão exclamar como os jovens de Emaús: “- Não é verdade que nosso coração se alegrava enquanto ele falava conosco?” É que a proximidade com Deus é paraíso. Paraíso não é um momento de ser, mas um estado de ser. Paraíso é permanência. Não é um momento de alegria que foge em outro momento. É um estado de espírito permanente. É um saber amado pelo amor total de Deus e por isso o coração está sempre alegre. Mesmo que haja sofrimento. É um entregar-se ao amor verdadeiro com tal confiança que não tem medo de sofrer nem de morrer.

Vou narrar uma pequena história que escutei quando era criança. Não sei quem é o autor.

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“Uma vez um menino cego estava só em sua casa e houve um incêndio. Todo edifício estava em chamas. As pessoas se aproximaram e berravam para que o menino cego saltasse. Ele já estava na janela e olhava, sem ver, as pessoas no solo. O fogo já lambia seus cabelos. Teria que saltar rápido, ou morreria. As pessoas continuavam gritando: “- Salta, salta.” Mas o menino não saltava. Seu pai lhe havia dito que a janela se encontrava longe do solo. Se ele saltasse morreria. O menino confiava em seu pai.

Seu pai nunca havia feito nenhuma trapaça, nem com ele nem com seus vizinhos. Era um homem verdadeiro. Só falava a verdade. Mas ele não escutava a voz de seu pai. O pai do menino estava vindo de seu trabalho e quando viu a multidão perto de sua casa se apressou e quando chegou e viu seu filho, o fogo lambendo seus cabelos, disse: “- Salta filho.” O menino reconhecendo a voz do pai saltou e se salvou.”

O primeiro passo para a salvação é a confiança em Deus. Quando eu confio, me entrego.

Salto no escuro porque reconheço a voz de meu pai e sei que é verdadeiro e sua palavra é a verdade.

Deus não interfere em nossas vidas sem que o permitamos. Mas se eu digo todos os dias que Ele é livre para fazer o que quiser com a minha vida, Ele vai transformar.

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Se nosso grito de liberdade é fazer o bem, então Ele vai envolver-nos e proteger-nos e vai chamar-nos em direção do bem, fazendo para nós, um crescimento verdadeiro. Vamos ficar felizes.

Estamos caminhando na direção de Deus e isso é paraíso. Nós temos a força da transformação. Tudo que tocamos pode se converter em paraíso. Em nossas mãos está o milagre da criação de um mundo novo. Não necessitamos pedir a Deus um milagre.

NÓS SOMOS UM MILAGRE.

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INSPIRAÇÕES DE VÁRIAS ÉPOCAS As poesias que se seguem são frutos de uma compilação do primeiro livro publicado pelo autor, intitulado “CAMINHANTE”, lançado em 1991 em edição limitada e não registrada, e de algumas recentes, escritas durante a produção da presente obra, inclusive em idioma Espanhol, língua que o autor está aprendendo a admirar no decorrer de sua estada na Bolívia.

E porque escolher a poesia como forma de expressão? De onde vem este entusiasmo que leva o poeta a transpor barreiras para externar seus sentimentos?

O Mestre Vinícius de Moraes ensina que “a maior beleza dessa arte modesta e heroica seja a sua aparente inutilidade. Isso dá ao verdadeiro poeta forças para jamais se comprometer com os donos da vida. Seu único patrão é a própria vida: a vida dos homens em sua longa luta contra a natureza e contra si mesmos para se realizarem em amor e tranquilidade.”1 Alguém discorda?

1

Disponível em: http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/article.php 3?id_article=716.

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TROCADILHOS Há caminhos que são trilhos.

Há momentos de incerteza.

Há exemplos que são brilhos.

Há um tempo prá beleza.

Os trilhos, se são de ferro, Levam a distâncias infindas.

O exemplo, se é certo, Leva bem mais longe, ainda.

Os momentos, se propícios, Da incerteza libertam.

Os exemplos e ofícios Muitos caminhos acertam.

Os brilhos dão incerteza.

Muitos exemplos até brilham, A beleza não põe mesa Pelas passarelas que trilham.

Há momentos que perduram E exemplos que empobrecem.

Há belezas que não duram E caminhos que enobrecem.

Há trilhos que são caminhos, Na incerteza de um momento.

Há brilhos que são exemplos.

Há a beleza do tempo Se o caminho é maldito Leva ao fogo do inferno.

Se o exemplo é bendito Nos leva ao reino eterno.

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A CENA Uma jovem vestida de freira Alimentava um pobrezinho...

N찾o sei qual do dois era o mais pobre...

Mas n찾o foi isso que eu vi...

Vi o AMOR POBREZA, dando ao AMOR POBRE, a riqueza do EVENGELHO. N찾o sei qual dos dois comovia mais: Se a simplicidade do DAR, ou a simplicidade do RECEBER. Vi tanto RECEBER naquele DAR...

Vi o pr처prio Cristo.

Mas... qual dos dois era o Cristo?...

O que estava dando, ou o que estava recebendo?...

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A BELEZA DE SER A beleza de ser gente Pensar, agir e cantar, Celebrar o ser vivente Naquilo que a vida dá; Sentir a brisa no rosto, Ver uma criança correr, Da comida sentir gosto, Saborear o viver.

Depois olhar ao redor, Descobrir o essencial.

No detalhe apresentado, Amar a todos por igual.

Depois sentir o prazer Do amor que se espalhou, Ver que a vida tem sentido Naquilo que se sonhou.

Descobrir que o verdadeiro É o amor de Deus por mim.

Amor que também fez o outro Ao nos amar tanto assim.

Ver no outro o principal: Aquilo que é vida e certo.

Deixar o feio de lado Ter o amor sempre perto.

Devo amar na criatura Aquilo que Deus criou.

Onde o ser é formosura E onde Deus me amou.

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ALEGRE-SE Alegre-se! Hoje é “o dia”.

Não é nem será mais um Como todos que passaram.

Hoje é o dia, De alegrar-se por aqueles que choraram, Por aqueles que sorriram, Por aqueles que sonharam.

Hoje é o elo entre o passado e o futuro.

Sem o hoje seria caos, desassossego.

Não haveria sonho, nem futuro.

O bebê morreria prematuro.

Não haveria esperança, só o medo.

O hoje é o milagre pretendido, É o amor que tem que ser vivido, A palavra amiga que vive tão calada A amizade que tem que ser acalentada. É o “te amo” que vive tão escondido, É o sorriso que tem que ser distendido. É hoje. E se digo hoje, é que estou vivo.

E vida é para ser vivida A alegria não pode ser escondida Mostre que hoje você não está cativo.

Mostre que viver é tão preciso, Quanto é preciso navegar.

Mostre que viver hoje vale a pena Que sua alma não foi nem é pequena, Que vale a pena ser feliz quando o amanhã chegar.

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BOM DIA! Quero expressar O que sinto realmente Ao te dizer bom dia, meu amigo.

Quero que saibas que estou contente.

Agora, mais ainda que falei contigo.

Apertei tua mão num gesto corriqueiro Mas eu quero te dizer primeiro É que te amo com amor intenso.

Não me envergonho de dizer, Assim tão claramente O que me vai no coração e em minha mente.

Há muito as pessoas não se tocam Por um pudor escuso e sem sentido. É que internamente invocam Uma cultura antiga, um inimigo.

Que impede que você se dê inteiro Nesse abraço que não é interesseiro Mas que se dá inteiro em um momento.

Lembra um gesto do divino Que para nos abraçar e dar alento, Do grande Deus, se faz menino.

Para que entendamos que o amor não quer o mal Que em cada abraço cada um se faz Natal.

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INVEJA Ah! Quanta inveja Ao vê-la quando passa.

Todos a olham, a admiram.

Tudo se cala, até a praça.

Fico a pensar se não foi uma injustiça Fazê-la tão bonita, tão postiça, Ajeitada, esbelta, aprumada, Que o nordestino diria “arretada”.

Tudo nela é um encanto puro E eu fico encantado, juro.

Quando ela me olha e me sorri.

Não sei o que faço e me esqueço Não sei se estava no fim ou no começo. Às vezes penso que morri.

Hoje acordei pensando nela.

Me levantei, olhei pela janela.

O sol brilhava inteiro para mim...

Um pensamento louco veio a minha mente: ...e se Deus tivesse feito toda essa beleza, Ela, o Sol, a natureza inteira assim, Fosse tudo para mim somente...

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FÉ Nada do que acontece é por acaso.

Nem uma flor, nem mesmo um vaso.

Dentro de um plano perfeito fui criado.

Desde toda eternidade eu fui pensado.

E fui criado com amor eterno.

Igual a ti o mesmo amor se nos gerou.

Fomos feitos para a vida plena.

Para a alegria e o gesto terno.

Amando como alguém já nos amou.

Alegria que tem que ser transbordante, Mostrando que acredita a todo instante, Num Deus que é por nós apaixonado.

Acreditar que a vida é dom E que é presente régio.

Que a felicidade está em nós E tem que ser vivida.

Trancafiá-la é deixar feridas, É isolar-nos é deixar-nos sós.

Viver é amar sem preconceito.

A felicidade mora no meu peito É de mim que ela sai e vai ao outro.

E nesse doar-se é que descubro Que amar é mais doar que receber.

Que ter é bom, mas não é tudo.

O ser humano foi feito para ser.

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LECCIÓN UNICA En la vida todos somos unicos.

Caminamos solos y tambiém aislados.

Pero a veses, encontramos algo Que a nosotros empuja y deja animados.

Son los bienes de Dios, nos dirá alguién.

Y procurará querer un poco para si.

Es que el querer es fuerte también En todos los seres que igual a mi.

Me quedo a piensar si es todo cierto.

Si la vida es sueño o acción perene!...

Veo los hermanos que se jusgan espiertos Y no están contentos com lo que tienen.

Es que siempre buscamos muy lejos Lo que es y está tan cerca.

Queremos todo, hasta mil besos.

Despues viene el temor de que si pierca.

Una sola cosa hay que saber en la vida: Aprender muy bien la lección del amor.

No hacer eso es hacer herida.

No hacer eso es causar dolor.

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LA NATURALEZA Que belleza la naturaleza De Dios padre el explendor Que el espiritu realiza Em la expresión del puro amor.

El espiritu se recrea al hacerse naturaleza Se consume el la materia, se resalta creador.

Hace en hombre la consciencia Del amor que en si sublima.

En si también hace la ciencia Que en decubierta culmina.

Para reaver la naturaleza En el humano desviada, Se hace hombre en Jesus.

Y para probar que es de amor La naturaleza criada, Por amor se entrega al dolor Y en una muerte de cruz Toda la tierra es renovada.

En eso gesto fraterno De amor a la creación Livrou nosotros del infierno Y nos dio la salvación.

Y ella se realiza en todo amor que es manifesto Y siempre se atualiza en la presenza de mi gesto.

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LA VIDA Se la vida es plena El coraz贸n es tierno El amor se implanta Y la ternura encanta.

Se el coraz贸n es tierno La ternura encanta, La vida es llena El amor eterno.

Se el amor se implanta La vida encanta La ternura es tanta Que el coraz贸n perdona.

Se el coraz贸n perdona, La vida es tierna, El amor perdura Y todo es ternura.

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QUANDO ELA PASSA Quando te vejo passar tão distraída, Não me notas nem me dás o teu sorriso, Penso que é dos teus braços o que eu preciso Sempre que me sinto triste nessa vida.

Mas como ter certeza que é em mim que pensas!...

Aos teus passos ligeiros sempre te acompanham Um milhão de olhos, que pra mim, te arranham.

Buscam, como eu, muitas recompensas.

O balanço ritmado desse teu traseiro, Balança junto o meu pensamento.

E tenho certeza, aqui neste momento, Não balanço eu, balança o mundo inteiro.

Mas se te voltas e olhas para mim sorrindo, O mundo a minha volta já não mais existe, Pois foi só para mim que tu sorriste.

Foge toda a maldade. Sou só um menino.

Corro pros teus e me esqueço tudo.

Me deixo envolver nesse teu abraço. É só alegria já não tem mais cansaço.

Esqueço as palavras. Sou menino mudo.

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