Coletânea de Termos - TCC - DAU PUC Rio - 2017

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Notas sobre a emergência de espacialidades contemporâneas

COLETÂNEA DE TERMOS

Organizada por Mariana Netto como parte do Trabalho de Conclusão de Curso do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio.

2017.1


COLETÂNEA DE TERMOS


A coletânea segue o desenvolvimento desta pesquisa na medida em que cada conceito ou termo é problematizado a partir de colocações, de comentários, de sugestões e de questionamentos dos diversos autores estudados e, não necessariamente definições encerradas. É importante observar que muitos conceitos se transformam ao longo do tempo, ganham novos significados, perdem outros, são incorporados por outros campos do conhecimento, e assim evoluem. Por isso, a intenção não é que ele se torne um produto acabado, porque sempre haverá a ressignificação de termos enquanto a linguagem se mantiver fluida, mas uma ferramenta de ideias, que favoreça a incitação de questões relacionadas ao tema e contribua para atingir os objetivos deste trabalho. Aqui, a coletânea encontra-se organizada em ordem alfabética para facilitar a procura pela letra inicial dos termos explorados. Mas entende-se que a escolha deles se deu a partir da relevância de suas definições, significados ou até das problematizações proporcionadas por seus usos em diferentes contextos. Ou seja, ainda que a escolha dos autores estudados tenha sido, inicialmente, arbitrária, deixando de fora vários outros, o processo de desenvolvimento da pesquisa foi selecionando os tópicos de maior interesse e os conceitos mais representativos.


“Por exemplo, grande parte do que ainda vivemos como ‘local’ (um prédio de escritórios, uma casa ou uma instituição aqui perto, em nosso bairro ou lá no centro) na verdade ainda é algo que eu consideraria um ‘microambiente com amplitude global’, na medida em que é basicamente operado via internet” (SASSEN apud SYKES, 2013, p. 138).


--- Amplitude ---

Nesta pesquisa, apesar do termo amplitude ser usado especificamente pela socióloga Saskia Sassen em relação às cidades globais, aqui usarei da liberdade poética a que essa coletânea se propõe para associar amplitude à campo ampliado. Mesmo sendo conceitos bastante distintos, é possível colocar em questão o por quê de Saskia Sassen (2001) e Rosalind Krauss (1979) se utilizarem da figura do ampliar, do se estender para embasar seus argumentos. Ainda que elas descrevam áreas diferentes do conhecimento, à sociologia e à arte respectivamente, é notadamente semelhante a imagem que tanto a amplitude global quanto o campo ampliado têm: não é mais aceitável permanecer dentro dos limites físicos ou dos limites de uma disciplina, é preciso ir além, se expandir, se ampliar. Imagem que certamente tem a ligação direta com a infinita expansão do virtual, que só tende a crescer.


“O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado à concretização efetiva ou formal. A árvore está virtualmente presente na semente. Em termos rigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real, mas ao atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes” (LÉVY, 1996, p. 15).


--- Atual ---

Esse é um conceito trabalhado pelo filósofo Pierre Lévy, em seu texto seminal O que é o virtual? (1996). Segundo sua definição, o que caracteriza um estado atual é a concretização de um estado virtual, ou seja, a materialização do virtual ou ainda a resolução de um problema. No seu exemplo, a semente é o manifestação atual da árvore, no sentido de que é o que aparece ou se mostra fisicamente, enquanto a ideia de árvore é seu estado virtual. No momento em que a semente se transformar, suas características físicas serão reconhecíveis a de uma árvore e esse estado será sua atualização. Para construir o entendimento desse termo, levemos em consideração o fato de que atual e virtual são duas faces da mesma moeda, que estão em constante alternância, por isso nesta pesquisa, o atual será interpretado como a face concreta do virtual e a atualização, o processo de concretude da virtualização.


“A atualização aprece então como a solução de um problema, uma solução que não estava contida previamente no enunciado. [...] A atualização é criação, invenção de uma forma a partir de uma configuração dinâmica de forças e de finalidades” (LÉVY, 1996, p. 16).


--- Atualização ---

A atualização nada mais é do que o processo pelo qual o virtual passa para o estado atual, de acordo com a definição de Pierre Lévy (1996). Durante esse processo ocorre o que pode-se entender como a transformção da matéria graças a uma latência intrínseca a um objeto, um ser, ou um problema qualquer. Esse processo, diferentemente da realização não é estável e muito menos tem a garantia de um resultado único e imutável. Ao contrário, faz parte da lógica de atualização a incerteza e a imprevisibilidade.


“Arquitetura líquida significa, sobretudo, um sistema de acontecimentos em que o espaço e o tempo estão simultaneamente presentes como categorias abertas, múltiplas, não redutivas, organizadoras desta abertura e multiplicidade não apenas de um desejo de hierarquizar e lhes impor uma ordem, mas como composição de forças criativas, como arte” (SOLÀ-MORALES, 2003, p.130).


--- Arquitetura líquida ---

Partindo da definição de Ignasi de Solà-Morales (2003), a liquidez a que ele se refere não é a materilidade líquida em si, apesar de edifícios como o Blur Building, projetado pelo Diller Scofidio + Renfro, se utilizarem da água no estado gasoso para criar um efeito de instabilidade. A essência dessa arquitetura será entendida aqui como uma arquitetura de caráter mutável, nãoestagnado, dinâmico, que depende do tempo e da duração para se completar. Para este trabalho a imagem da liquidez que SolàMorales traz para a arquitetura, também retrata a dissolução entre virtual e físico que é o tema abordado aqui.


“O campo ampliado é portanto gerado pela problematização do conjunto de oposições entre as quais está suspensa a categoria modernista escultura” (KRAUSS, 1979, p. 135). “A ampliação do campo que caracteriza este território do pós-modernismo possui dois aspectos […]. Um deles diz respeito à prática dos próprios artistas; o outro, à questão do meio de expressão. Em ambos, as ligações das condições do modernismo sofreram uma ruptura logicamente determinada. […] Portanto, o campo estabelece tanto um conjunto ampliado, porém finito, de posições relacionadas para determinado artista ocupar e explorar, como uma organização de trabalho que não é ditada pelas condições de determinado meio de expressão” (KRAUSS, 1979, p. 136). “Aqui talvez seja útil retornar à primeira exploração do ‘campo ampliado’ da escultura por Rosalind Krauss, em 1979. Nesse artigo pioneiro, Krauss estabeleceu um diagrama de relações e distinções que pela primeira vez colocou a ‘escultura’ dos anos 1960 em relação com outras artes não escultóricas - o paisagismo e a arquitetura” (VIDLER apud SYKES, 2013, p. 246). “Em termos que fazem lembrar o campo da escultura analisado por Krauss, podemos encontrar combinações de arquitetura e paisagem, arquitetura e biologia, arquitetura e programa, arquitetura e arquitetura, produzindo novas versões de ‘não paisagem’ ou ‘não escultura’, que são, contudo, não exatamente arquitetura. Ou, pelo menos, ‘não exatamente arquitetura’ tal como temos experimentado a arquitetura até hoje” (VIDLER, apud SYKES, 2013, p. 250).


--- Campo ampliado ---

Aqui, a importância de incluir esse termo na coletânea se dá por causa da direta crítica aos modelos de trabalho durante o modernismo, que parecem de alguma maneira permanecerem embutidos nos currículos acadêmicos atuais da arquitetura, e da sugestão de um novo campo de trabalho para a escultura, propostas por Rosalind Krauss. Ainda que ela, em A escultura no campo ampliado (1979), tenha lançado referências à arquitetura como não-paisagem em seu texto, sabemos que seu foco foi a escultura. No entanto, baseado na primeira versão do conceito, Anthony Vidler propõe a expansão do campo da arquitetura a partir de quatro premissas definidoras das relações entre arquitetura e paisagem, e biologia, e programa e a própria arquitetura. A partir dessas duas leituras, a questão que surge é: será possível ampliar ainda mais essas relações com a inclusão da virtualidade na prática projetual dos arquitetos e dos urbanistas? Portanto, mais importante do que definir esse conceito, são as perguntas que emergem a partir de pensamentos em um campo ampliado.


“Pensador das implicações tecnológicas nas civilizações, René Berger (1995:77), em linha direta com McLuhan, trata desde os anos de 1970 de nossos processos intelectivos ligados aos incrementos das tecnologias de telecomunicação como a construção de uma tecnocultura. Pierre Lévy (1999), herdeiro intelectual de McLuhan e Berger, escreve da cultura contemporânea, que se transforma pela sua imbricação com tecnologias computacionais constitutivas de redes globais, como sendo a cibercultura” (DUARTE, 2002, p. 230).


--- Cibercultura ---

Usando do termo de Lévy (1999), a própria decomposição da palavra já dá pistas de seu significado: uma cultura moldada e influenciada pelo ciber. Istoé, uma série de padrões de comportamento e paradigmas culturais que tem como principal ingrediente formador, a tecnologia digital, que deu origem à internet, aos computadores, aos dispositivos móveis de comunicação e informação e, atualmente, contribui para novas formas de percepção e interação com os outros e com o ambiente. O destaque desse termo está na sua capacidade de agregar gerações dentro de suas alçadas.


“A cibercidade é a cidade da cibercultura” (LEMOS, 2000). A cibercidade é a cidade contemporânea e todas as cidades contemporâneas estão se transformando em cibercidades. Podemos entender por cibercidades as cidades nas quais a infraestrutura de telecomunicações e tecnologias digitais já é uma realidade” (LEMOS, 2004, p. 20). “A cidade e as cibercidades devem ser vistas como formas espaço-temporal que se constróem pelo movimento: transporte e comunicação. No processo de virtualização das cidades, deve acontecer, para que as cibercidades possam ser assim chamadas, formas de transporte e comunicação, onde os percursos de pessoas pelo espaço informativo a partir de trocas comunicacionais possa se inserir em trocas de informação entre elas. Cidade e circuitos eletrônicos mantêm assim uma analogia que vai além da mera metáfora: ambas fazem circular (transporte) informação pelos mapeamentos de objetos e instrumentos provocando situações de comunicação” (LEMOS, 2000). “Não se trata da emergência de uma nova cidade, ou da destruição das velhas formas urbanas, mas de reconhecer a instauração de uma nova dinâmica de reconfiguração que faz com que o espaço e as práticas sociais das cidades sejam reconfiguradas com a emergências das novas tecnologias de comunicações e das redes telemáticas” (LEMOS, 2004, p. 20).


--- Cibercidades ---

Segundo a definição do professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, André Lemos, cibercidades é apenas um novo termo para o que tem sido o processo de desenvolvimento das cidades desde o final do século XIX, como consequência do gradual crescimento de interações entre pessoas em áreas geograficamente distantes e o aumento da trocas de informações e dados via redes mundiais de comunicação e transporte. Nesse sentido, é interessante considerar que o fator ciber é um acréscimo às dinâmicas convencionais da cidade, que são capazes de alterar os espaços de lugares através de espaços de fluxos.


“A constituição do ciberespaço vai além da estrutura material,” – linhas telefônicas físicas, de cobre ou de fibra óptica, satélites e ondas de rádio – “envolvendo as pessoas que se conectam nessa rede e a dinamizam, enviando, recebendo, transformando e reenviando informações – também incrementando as tecnologias e as linguagens que constituem o sistema informacional. [...] Pierre Lévy (1999) resume os três princípios básicos do ciberespaço: a interconexão, a criação de comunidades virtuais e a inteligência coletiva” (DUARTE, 2002, p. 231). “Assim como o desenvolvimento tecnológico da luz elétrica transformou as concepções espaciais, o mesmo vem acontecendo com a infiltração do ciberespaço e do mundo virtual nos espaços cotidianos” (DUARTE, 2002, p. 237). “A arquitetura do ciberespaço não desenha objetos, mas os princípios que geram esses objetos e suas mutações potenciais” (DUARTE, 2002, p. 239). “Há um ciberespaço em escala global integrado cada vez mais ao cotidiano físico das pessoas, suas instituições e cidades. Onde estão os arquitetos desse ciberespaço?” (DUARTE, 2002, p. 240). “Seus elementos são nômades, dispersos, e a pertinência de sua posição geográfica decresceu muito” (LÉVY, 1996, p. 19). “Na ‘era da ciência’, muitos de nós nos acostumamos tanto a pensar o espaço como algo puramente físico que pode nos ser difícil aceitar o ciberespaço como um ‘espaço’ genuíno” (WERTHEIM, 2001, pp. 168-169). “Parte significativa do que pensamos como ciberespaço, embora não tudo, não teria sentido algum se excluíssemos o mundo fora do ciberespaço” (SASSEN apud SYKES, 2013, p. 137).


--- Ciberespaço ---

Com base nas leituras de Pierre Lévy, em O que é o virtual? (1996), de Fábio Duarte, em Crise das matrizes espaciais (2002), e de Margareth Wertheim, em Uma história do espaço: de Dante à Internet (2001), o conceito de ciberespaço pode estar desatualizado, já que se tratam de referências publicadas há mais de quinze anos, contudo o manteremos nesta coletânea para efeito de construção do discurso sobre o tema ao longo do tempo. Nas passagens citadas, os autores discorrem acerca das características do ciberespaço, termo que ganhou notoriedade a partir do livro Neuromancer (1984), de William Gibson. No romance do gênero ciberpunk, o autor descreve minuciosamente o que seria esse novo espaço cibernético e suas descrições colaboram para desenvolver um imaginário do conceito que vai além da literatura. Aqui, o ciberespaço ganha uma conotação de espaço fluído, em constante movimento, sem posição ou lugar fixo, sem materialidade, mas não menos real e pode ser entendido como semelhante ao espaço virtual.


“Falar de cidades digitais como uma dimensão suplementar às cidades reais é tentar a impossível separação entre sociedade e tecnologia. Ora, elas são interdependentes e se formam reciprocamente. Nesse sentido, o projeto 10_dencies [do grupo Knowbotic (1997)] parece ser uma das mais inquietantes e profícuas investigações intelectuais, tecnológicas e artísticas sobre a interface entre o mundo material e digital” (DUARTE, 2002, p. 252).


--- Cidade digital ---

As cidades são o palco das manifestações e experimentações dos seres humanos; elas abrigam e registram marcas do tempo no espaço físico. Com a tecnologia não poderia ser diferente, já que se trata de mais uma invenção humana. Por isso, neste trabalho falar de cidade é também falar de cidade digital, porque ela é tão vulnerável às tecnologias como nós somos individualmente.


“A Cidade Genérica é a cidade libertada da clausura do centro, do espartilho da identidade. [...] é a cidade sem história. [...] É superficial” (KOOLHAAS, 2010, p. 35). “A Cidade Genérica está sedada, normalmente observada de uma posição sedentária. [...] A Cidade Genérica é o que resta depois de grandes setores da vida urbana terem passado para o ciberespaço” (KOOLHAAS, 2010, p. 37). “A Cidade Genérica é fractal, uma repetição infindável do mesmo módulo estrutural simples” (KOOLHAAS, 2010, p. 38). “A Cidade Genérica é rigorosamente multirracial [...] mas também multicultural. [...] A Cidade Genérica é sempre fundada por pessoas em trânsito, determinadas a seguir adiante. Isto explica a insubstancialidade das suas fundações [...] em última instância, todos a caminho de outro lugar [...]” (KOOLHAAS, 2010, p. 41). “Em vez de recordações específicas, as associações de ideias que a Cidade Genérica mobiliza são recordações gerais, recordações das recordações [...] um déjà vu que nunca acaba, uma recordação genérica” (KOOLHAAS, 2010, p. 52). “A Cidade Genérica [...] não é melhorada, antes abandonada. [...] não tem estratos. [...] A sua arqueologia será portanto a prova de seu esquecimento progressivo, a documentação da sua evaporação” (KOOLHAAS, 2010, p. 63).


--- Cidade genérica ---

Esse conceito foi proposto pelo arquiteto holandês Rem Koolhaas, em 1994 e, publicado no ano seguinte, no livro S, M, L, XL, em parceria com Bruce Mau. Por isso, nesta coletânea vou me ater às suas definições. O curioso da produção teórica de Koolhaas é o tom irônico que acompanha suas ideias, o que faz da leitura de seus textos um ato necessariamente atento, seguido de algumas releituras. Por isso, para efeito desta pesquisa, vamos considerar o termo cidade genérica como o conjunto de características mencionadas acima usados para falar da cidade contemporânea, contaminada pelas dinâmicas da virtualidade.


“É precisamente por causa da digitalização que se podem alcançar a dispersão mundial e simultânea das operações (sejam fábricas, escritórios, sejam serviços) e a integração dos sistemas. E é precisamente essa combinação que aumenta a importância das funções centrais. As cidades globais são lugares estratégicos para a combinação de recursos necessários para a produção de tais funções” (SASSEN apud SYKES, 2013, p. 139). “A cidade global é precisamente a síntese dessas duas escalas – o novo e o velho. Ela supera e neutraliza hierarquias de escala anteriores e funciona como uma materialidade situada e extremamente complexa, de amplitude global” (SASSEN apud SYKES, 2013, p. 141). “A origem do conceito de cidade global está diretamente relacionada aos impactos causados sobre as metrópoles do Primeiro Mundo pelo processo de globalização da economia, desencadeado a partir do final dos anos 70. [...] Se, por um lado, as metrópoles pareciam caminhar para um futuro incerto, por outro, readquiriam importância estratégica como locais destinados ao setor terciário, acompanhando a mudança de direção da economia mundial. Não se tratava, portanto, da perda de sua centralidade econômica, mas de sua ressignificação no interior do sistema produtivo internacional. Essas metrópoles assim ressignificadas se passou a chamar de cidade global (Sassen, 1998; Levy, 1997; Marques e Torres, 1997)” (CARVALHO, 2000, p. 71). “Seria, portanto, ‘global’ a ‘cidade’ que se configurasse como ‘nó’ ou ‘ponto nodal’ entre a economia nacional e o mercado mundial, congregando em seu território um grande número das principais empresas transnacionais; cujas atividades econômicas se concentrassem no setor de serviços especializados e de alta tecnologia, em detrimento das atividades industriais; quando, por consequência, o mercado de trabalho fosse polarizado gerando novas desigualdades sociais e uma forma de segregação urbana dualizada (Levy, 1997;Véras, 1997; Marques e Torres, 1997)” (CARVALHO, 2000, p. 72).


--- Cidade global ---

Assim como cidade genérica, cidade global é um outro termo para caracterizar as cidades sob os efeitos da globalização, oriundo, dessa vez, da sociologia e, não da arquitetura. Nesse caso, é a socióloga Saskia Sassen que sugere o conceito com base em aspectos econômicos, políticos e sociais. Justamente por ter origens e finalidades distintas, é que para esta pesquisa cabe incluir ambos os conceitos como forma de expandir a discussão em torno do estado atual das cidades contemporâneas. Assim, cidade global será entendida como um lugar físico ou um ponto geograficamente localizado no mapa, onde as escalas locais e globais convergem.


“Essas organizações de pessoas e grupos por interesses independentes de sua localização geográfica e inclusão forçada em um território geopolítico são chamadas comunidades virtuais, e têm como principal avesso à construção de uma inteligência coletiva a tendência de se criar comunidades de iguais, levando portanto à estabilidade, segmentação e fechamento às diferenças, tão próprias à organização social. [...] Desse modo, criam-se territórios informacionais que, teoricamente, apenas transferem uma estabilidade geopolítica à outra, que, se tem uma liberdade geográfica, não tem sua recíproca ideológica” (DUARTE, 2002, p. 232). “Uma comunidade virtual pode, por exemplo, organizar-se sobre uma base de afinidade por intermédio de sistemas de comunicação telemáticos. Seus membros estão reunidos pelos mesmos núcleos de interesses, pelos mesmo problemas: a geografia, contingente, não é uma mais num um ponto de partida, nem uma coerção. [...] Ela vive sem lugar de referencia estável: em toda parte onde se encontrem seus membros móveis... ou em parte alguma” (LÉVY, 1996, p. 20).


--- Comunidade virtual ---

Assim como o conceito de comunidade aparece como principal valor a ser alcançado em qualquer bairro ou intervenção local, trazendo pessoas juntas em prol de um objetivo comum, com a comunidade virtual não é de todo diferente. Em geral, o termo comunidade é bastante usado em discursos arquitetônicos e urbnísticos, mas não tanto o de comunidade virtual. O fato é que esse tipo específico de comunidade, com suas vantagens e desvantagens, já está se tornando até mais presente na nossa sociedade do que as comunidades físicas. O que levanta a questão sobre como arquitetos estão lidando com isso.


“As linhas de fuga promovem a passagem do território à desterritorialização, como uma passagem do finito ao infinito. Assim, ainda que apenas potencialmente, um território está sempre em movimento de desterritorialização, tendendo a passar a outros agenciamentos, embora o novo agenciamento possa, posteriormente, efetuar um reterritorialização” (SCHULZ, 2008, p. 59). “A multiplicação contemporânea dos espaços faz de nós, nômades de um novo estilo: em vez de seguirmos linhas de errância e de migração dentro de uma extensão dada, saltamos de uma rede a outra, de um sistema de proximidade ao seguinte” (LÉVY, 1996, p. 23).


--- Desterritorialização ---

Embora conceituado por Deleuze e Guattari, desterritorialização é um termo que foi entendido e apropriado por diversos autores de outros campos do conhecimento, além da filosofia. No presente trabalho, esse conceito será interpretado como uma das consequências da inserção do espaço virtual no espaço físico e acarreta do mesmo processo de territorialização, associado à transgressão de fronteiras.


“Virtual e digital não são sinônimos, embora o termo virtual seja bastante usado para qualquer coisa digital. Virtual não é necessariamente digital, embora possa ser. E o digital, na maioria das vezes, não é virtual” (BALTAZAR, 2005, p. 2). “Contudo, o digital facilita a arquitetura virtual por permitir a flexibilidade, a lógica de rede, a integração e abertura do sistema, a emergência do ambiente em tempo real, além do estabelecimento de continuidade entre projeto e uso” (BALTAZAR, 2005, p. 6). “A imaginação, a memória, o conhecimento, a religião são vetores da virtualização que nos fizeram abandonar a presença muito antes da informatização e das redes digitais” (LÉVY, 1996, p. 20). “A digitalização afeta todas as áreas da arquitetura [...]. Todavia, o impacto da digitalização se estende aos conceitos de espaço, lugar e materialidade – influenciando o tipo, as características e a organização do projeto. [...] Esse tipo de questionamento leva à ideia de que a digitalização negará o sentido convencional de arquitetura e urbanismo” (SYKES, 2013, p. 135). “A digitalização traz consigo uma amplificação daquelas capacidades que possibilitam a liquefação daquilo que não é líquido. Com isso, eleva a mobilidade do que usualmente pensamos como imóvel ou pouco móvel. Em seu extremo essa liquefação desmaterializa o objeto. Depois de desmaterializado, ele se torna hípermóvel – circulação instantânea por redes digitais com amplitude global. É importante ressaltar que a hipermobilidade que um objeto ganha com a desmaterialização é apenas um momento de uma condição mais complexa” (SASSEN apud SYKES, p. 139).


--- Digital ---

A tecnologia que permitiu a substituição do analógico para o digital é bastante complexa e envolve inúmeras áreas do conhecimento, incluindo a engenharia, a matemática, a química e outras. Mas para a finalidade desta pesquisa o importante é pensar no digital como um mecanismo comandado por uma programação criada por nós seres humanos. Assim como o analógico acelerou os processos manuais, o digital aumentou ainda mais a velocidade de processamento de dados e informações, permitindo que essa tecnologia se espalhasse rapidamente e se tornasse onipresente no nosso cotidiano. Esse caráter ubíquo do digital é interessante para se pensar na influência que exerce sobre as nossas experiências de contato com o espaço.


“Disjunções estão contidas, por exemplo, nas relações homem/ objeto, objeto/eventos, eventos/espaço” (NESBITT, 2006, p. 188). “Embora não se deva entender a noção de disjunção como um conceito arquitetônico, seus efeitos se imprimem no local, no edifício, e mesmo no programa, de acordo com a lógica deslocalizadora que rege a obra. Para definir disjunção, para além do seu sentido nos dicionários, temos de insistir na ideia de limites e de interrupção” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 189). “A disjunção também pode ser constituída por vestígios de um evento, de um programa e pode levar a novos conceitos, pois um de seus objetivos é compreender um novo conceito de cidade, de arquitetura. [...] O conceito de disjunção é incompatível com uma visão estática, autônoma e estrutural da arquitetura. Mas não é contrário à autonomia ou à estrutura: apenas implica operações mecânicas constantes que produzem sistematicamente a dissociação (Derrida designaria essas operações de différance) no espaço e no tempo, em que um elemento arquitetônico somente funciona por meio da colisão com um elemento programático, como movimento de corpos ou coisas do tipo. Dessa maneira, a disjunção se torna uma ferramenta sistemática e teórica para a produção da arquitetura” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 191)


--- Disjunção ---

Como um termo cunhado por Bernard Tschumi, disjunção possui uma conotação bastante explorada pelo arquiteto e tem conexão direta com o fazer arquitetônico, no sentido de evidenciar a interrelação entre homens (arquitetos e também usuários dos espaços criados por eles), objetos, eventos e espaços. Para fins desta coletânea, devo notar que esse termo tem alguma semelhança com o que chamo de ruído no terceiro capítulo sobre a comunicação e interação entre nós arquitetos e o mundo. Talvez esse caminho da disjunção seja uma possibilidade de atuação para a arquitetura contemporânea.


“1. [Patologia] Posição ou situação anormal de um órgão. 2. Local imaginário, circunstância hipotética, em que se vive situações desesperadoras, com excesso de opressão ou de perda; antiutopia. 3. Quaisquer demonstrações ou definições de uma associação social futura, definida por circunstâncias de vida intoleráveis, cujo propósito seria analisar de maneira crítica as características da sociedade atual; além de ridicularizar utopias, chamando atenção para seus males; antiutopia” (DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS).


--- Distopia ---

Utilizando da mesma tática que usei para utopia, fragmentando esse termo, percebe-se que o prefixo ‘dis’ é uma contraposição à palavra utopia. Em geral, é utilizado para caracterizar gêneros literários e cinematográficos no que concerne à produções que inicialmente parecem se situar em lugares e sociedades perfeitas, mas que escondem falhas. O alerta de que não há perfeição ou cenário ideal é a essência desse termo.


“O segundo impacto [sobre a arquitetura, o urbanismo e a cidade] consiste na sobreposição complexa entre digital (e global) e não digital, que traz consigo desestabilizações das hierarquias de escalas anteriores e reescalonamentos muitas vezes bastante acentuados” (SASSEN apud SYKES, 2013, p. 138).


--- Escala ---

Em um mundo de continua expansão virtual, graças ao avanço das tecnologias digitais, a transição de escalas é quase instatânea, na medida em que em um segundo se pode estar fisicamente em uma sala de aula, e no segundo seguinte, virtualmente, em um parque no Japão. Nesse sentido, o termo escala, que muitas vezes é banalizado por arquitetos, é de crucial importância na contemporaneidade. Não basta saber lidar com a escala do edifício, da rua e da cidade, é preciso ter em mente as influências globais que atuam sobre um determinado lugar ou conjunto de pessoas do local.


“O primeiro impacto [sobre a arquitetura, o urbanismo e a cidade], portanto, consiste num tipo particular de ambiente construído – um sistema de comunicação convencional, uma cidade, em essência, um tipo particular de espacialidade – que abarca e fomenta a nova dinâmica digital” (SASSEN apud SYKES, 2013, pp. 137-138).


--- Espacialidade(s) ---

Esse termo é dos mais difíceis desta pesquisa, justamente por ser a coluna vertebral, que inclusive constitui o título do trabalho. No entanto, em um tentativa de explorar a emergência de tais espacialidades e a conclusão de que não há conclusão definitiva, levam a crer que atualmente a possibilidade mais correta é nos aproximarmos desse termo no plural, em vez do singular. Pois não há uma única espacialidade emergente, mas uma variedade de espacialidades surgindo que diferenciam-se pelos pontos de vista dos quais são possíveis apreender as dinâmicas espaciais da contemporaneidade contaminadas pela ubiquidade das TIC.


“[...] o espaço é construído na relação com três partes: os objetos, as ações e os seres humanos – que agem diretamente sobre os objetos ou significam (atribuem signos e significados) ações e objetos.” (DUARTE, 2002, p. 48) “Tem-se, portanto, que o espaço pode ser conceituado de maneira sintética, mas sua polivalência se dá desde sua apreensão, diferenciando-se vários sistemas espaciais segundo as características de grupos culturais, indivíduos e/ou num mesmo grupo ou indivíduo, a partir de quais dos sistemas pretende-se apreender e compreender” (DUARTE, 2002, pp. 58-59). “O sentido do espaço só existe a partir da experiência do ‘eu’; portanto, o sentido do espaço da arquitetura não está no interior da abstração do espaço, no interior da arquitetura, na relação utilitária entre o cheio e o vazio, e tampouco nas entranhas das paredes. Qualquer sentido que se possa atribuir está fora dele, muito além de sua superfície. Está no interior de quem o vivencia, está nas pessoas que nele se deslocam constantemente. Curiosamente transportamos o sentido do espaço para qualquer lugar que formos” (FUÃO, 2004). “O espaço no papel, por definição, é imaginário: é uma imagem” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 581). “[...] o espaço não é simplesmente a projeção tridimensional de uma representação mental, mas é algo que se ouve e no qual se age. E é o olho que enquadra – a janela, a porta, o ritual efêmero da passagem [...]” (TSCHUMI apud nesbitt, 2006, p. 181).


--- Espaço ---

Talvez antes mesmo de espacialidades, que variam de acordo com diferentes percepções, o termo espaço seja o mais enigmático de todos. A ideia de “receptáculo” derivada de khora talvez seja o mais próximo que conseguimos chegar de uma definição de espaço. Ainda assim, sem pretender chegar a uma definição exclusiva, mas ao levantamento de questões, o interessante desse termo seja sua independência de qualquer elemento, inclusive de nós seres humanos, para existir. E ao mesmo tempo, de ser a matéria prima bruta para a arquitetura, tanto do ponto de vista material quanto teórico, tornando-o um dos mais instigantes termos desta coletânea e também, difícil de explicar.


“O espaços de fluxos não permeia toda a esfera da experiência humana na sociedade em rede” (CASTELLS, 1999, p. 512). “As relações entre o espaço de fluxos e o espaço de lugares, entre globalização e localização simultâneas não implicam em um resultado determinado” (CASTELLS, 1999, p. 517). “A tendência predominante é para um um horizonte de espaço de fluxos aistórico em rede, visando impor sua lógica nos lugares segmentados e espalhados, cada vez menos relacionados uns com os outros, cada vez menos capazes de compartilhar códigos culturais” (CASTELLS, 1999, pp. 517-518). “Espaços de movimento – corredores, escadas, rampas, passagens, soleiras; é aí que começa a articulação entre o espaço dos sentidos e o espaço da sociedade, as danças e os gestos que combinam a representação do espaço e o espaço de representação” (TSCHUMI apus NESBITT, 2006, p. 181). “O espaço de fluxos complexifica o espaço de lugar” (LEMOS, 2004, p. 21). “O espaço-lixo descreve-se com frequência como um espaco de fluxos, mas este é um termo pouco adequado; os fluxos dependem de um movimento disciplinado, de corpos que são coesos” (KOOLHAAS, 2010, p. 82).


--- Espaço de fluxos ---

Considerando o conceito unhado por Manuel Castells no final do século passado, poderíamos supor que ele já sofreu algum tipo de atualização. Mas o interessante do termo espaço de fluxos é que ele se mantém atual nos dias de hoje, mesmo que tenha sido proposto no começo do processo de disseminação da internet, dos computadores pessoais e dos celulares. Em uma aproximação com o termo espaços de movimento, de Tschumi, percebo certa atemporalidade em suas definições que permitem que sejam aplicadas para situações atuais acerca da fluidez e da velocidade de conexão entre espaços.


“Se o espaço-lixo são os resíduos humanos que conspurcam o universo, o espaço-lixo é o resíduo que a Humanidade deixa sobre o planeta. O produto construído [...] da modernização não é a arquitetura moderna, mas antes o espaço-lixo. O espaço-lixo é o que resta depois da modernizacão seguir o seu curso, ou mais concretamente o que se coagula enquanto a modernização está em marcha, o seu resíduo” (KOOLHAAS, 2010, p. 69). “A continuidade é a essência do espaço-lixo; este aproveita qualquer invento que permita a expansão, revela uma infra-estrutura ininterrupta: escadas rolantes, ar condicionado, aspersores, portas corta-fogo, cortinas de ar quente... É sempre interior e tão extenso que raramente se vislumbram limites; fomenta por todos os meios a desorientação (os espelhos, os brilhos, o eco)... O espaço-lixo é selado, mantém-se unido não pela estrutura mas pela pele, como uma bolha” (KOOLHAAS, 2010, pp. 70-71). “Os arquitetos nunca conseguiram explicar o espaço; o espaço-lixo é o nosso castigo pelas suas mistificações” (KOOLHAAS, 2010, p. 72). “Como não se pode captar, o espaço-lixo não se pode recordar. É exuberante mas não memorável, com um protetor de ecrã; a sua recusa em formar-se garante um amnséia instantânea” (KOOLHAAS, 2010, p. 74). “O espaço-lixo conhece todas as nossas emoções, todos os nossos desejos. É o interior do Big Brother. Antecipa as sensações das pessoas” (KOOLHAAS, 2010, p. 92).


--- Espaço-lixo (junkspace) ---

No texto homônimo, publicado originalmente em 2001, Rem Koolhaas consegue caracterizar o espaço através da metáfora do lixo com uma série de elementos e imagens em torno do que ele denomina espaço-lixo: os resíduos humanos deixados no planeta, os espelhos como reflexos que não permitem brechas ou intervalos, apenas continuidade, o consequente processo de esquecimento e condução de sensações provocados nos seus habitantes. Esses são alguns desses elementos e configuramse como a realidade com a qual os arquitetos têm de lidar atualmente. Seria esse o tipo de espaço da contemporaneidade, segundo ele. Então, qual o tipo de espacialidade geradas por esse mesmo espaço-lixo?


“Essa categoria estética e freudiana [estranhamente familiar] coloca em primeiro plano o corpo e o sujeito em relação à experiência vivida da arquitetura e da cidade. [...] O estranhamente familiar provoca sensações assustadoras, a ideia do duplo, o medo da mutilação e outros horrores.Vidler observa que um tema usual no estranhamente familiar é a ideia de corpo humano em fragmentos. [...] Esse estranhamente familiar é, portanto, o lado horripilante do sublime, o medo de ser privado da integridade do corpo” (SYKES, 2013, p. 617). “Associado por Freud à pulsão de morte, ao medo de castração e ao desejo impossível de retornar ao útero materno, o uncanny tem sido interpretado como um elemento dominante da alienação e do distanciamento no mundo moderno, com uma espacialidade correspondente que abrange todos os aspectos da vida urbana.” (VIDLER apud SYKES, 2013, p. 620). “Como um conceito, o estranhamente familiar encontrou o seu lugar metafórico, como era de se esperar, na arquitetura: primeiro na casa – mal-assombrada ou não –, que pretende proporcionar máxima segurança ao mesmo tempo em que se abre à invasão secreta do terror; e depois, na metrópole, onde o que antes era íntimo e confinado entre muros, a ratificação da comunidade [...], tornou-se estranho em função das incursões espaciais da modernidade. [...] É claro que em nenhum desses casos o uncanny é uma propriedade do espaço em si, nem pode ser provocado por uma conformação espacial peculiar. Em sua dimensão estética, o estranhamente familiar é uma representação de um estado mental de projeção que justamente elimina as fronteiras do real e do irreal a fim de provocar uma ambiguidade perturbadora, um deslizamento entre vigília e sonho” (VIDLER apud SYKES, 2013, pp. 620-621).


--- Estranho familiar (uncanny) ---

Curiosamente esse termo têm origem na psicologia e parte de uma categoria estética explorada pela primeira vez por Sigmund Freud, em 1919 e trazida para a arquitetura por Anthony Vidler somente em 1990. Antes tarde do que nunca, essa busca por outros campos mostra a interdepêndencia entre disciplinas que se complementam. No caso do estranho familiar, abordado por Vidler, a relação com a casa como sendo o lugar de maior familiaridade possível é muito potente. Mas esse conceito também pode ser levado para os espaços da cidade que se tornam familiares graças às tecnologias digitais. Elas antecipam sensações e geram expectativas de familiaridade, que quando contrariadas e expõem o seu oposto, o estranho, o estrangeiro, levam ao medo no seu aspecto mais anterior, que é o medo da morte, da fragmentação do corpo.


“Central em sua proposição da arquitetura ‘como evento’ é a ideia de que os corpos constroem o espaço por meio do movimento. Por exemplo, os espetáculos e as festividades, que reúnem um grande número de pessoas, criam visivelmente uma mudança na condição espacial das ruas da cidade” (NESBITT, 2006, p. 178). “Os corpos não somente se movem para seu interior, mas produzem espaços por meio e através de seus movimentos. Movimentos – de dança, esporte, guerra – são a intromissão dos eventos nos espaços arquitetônicos. [...] No limite esses eventos se transformam em cenários ou programas, esvaziados de implicações morais ou funcionais, independentes porém inseparáveis dos espaços que os encerram. [...] Eventos, desenhos, textos, expandem as fronteiras de construções socialmente justificáveis” (TSCHUMI apud nesbitt, 2006, p. 181). “Para [Pierre] Lévy, existem duas ordens para as coisas: uma da substância, em que estão situados o potencial e o real, e uma do evento, onde estão situados o virtual e o atual. [...] No cotidiano, podemos dizer que sempre que usamos um espaço estamos ativando a ordem do evento, ou seja, estamos atualizando o espaço. E, quando projetamos, estamos trabalhando geralmente apenas com a ordem da substância, potencializando e realizando espaços. O problema é que a arquitetura projeta a substância representando nesta uma gama restrita de usos (atualizações) previstos. Ou seja, o projeto arquitetônico não se ocupa de projetar o evento em si, não lida com o virtual a ser atualizado quando do uso, embora tome o evento como referência para representá-lo, quase como inspiração para a substância. O que acontece geralmente é que a ordem do evento é considerada como uma camada separada que pode ser sobreposta aos objetos e espaços no mundo quando do uso, perdendo de vista que toda a virtualidade a ser atualizada é intrínseca aos próprios objetos e espaços - isto é, substância e evento são continuidades intrínsecas às coisas, não são excludentes nem anunciam rupturas” (BALTAZAR, 2005, p. 2).


--- Evento ---

Intimamente relacionado à noção de corpo e, mais especificamente, corpo em movimento, esse termo bastante explorado por Bernard Tschumi tem reverberação no espaço e consequentemente na construção e percepção de espacialidades. E independe de ser um evento causado por um único indivíduo ou por um grupo grande de pessoas. O evento cria dinâmicas específicas e imprevisíveis no espaço, que pode modificar sua configuração espacial temporaria ou permanentemente, em especial no que diz respeito às diferentes percepções dessa configuração espacial. Assim, como um fator de imprevisibilidade, o evento vai na contramão do que a tecnologia digital tenta controlar a todo custo, que é prever e antecipar situações, lugares e expectativas. E desse modo, se constitui, a meu ver, como uma das mais ricas oportunidades que a arquitetura têm para trabalhar o espaço e suas diversas espacialidades.


“17. Fractal – Termo criado em 1975 por Benoit Mandelbrot, para descrever uma classe de formas caracterizada pela irregularidade mas que, ao mesmo tempo, evocam um padrão regular. Os fractais têm diversas particularidades, como por exemplo, o fato de qualquer seção de um fractal, quando ampliado, ter as mesmas características do todo. Atualmente, são usados em computação gráfica para a criação de texturas, superfícies e paisagens com aparência extremamente realista [...]” (COSTA apud LÉVY, 1999, p. 253). “No conjunto de Mandelbrot, vemos ainda outra propriedade-chave dos fractais, a da autossimilaridade. Se você der um zoom no conjunto, não saberá ao certo qual o nível de ampliação porque você vai ver apenas mais conjuntos de Mandelbrot” (CRILLY, 2017, p. 103). “As fronteiras nítidas dão lugar a uma fractalização das repartições” (LÉVY, 1996, p. 25).


--- Fractal ---

Ainda que esse termo tenha uma complexidade embutida em sua significação, para fins desta pesquisa usaremos o conceito de fractal para nos referir a padrões de repetição sem escala definida, em que as percepções de perto, longe, grande, pequeno, desaparecem.


“Da mesma forma, quando a arquitetura é equiparada à linguagem, ela somente pode ser lida como uma série de fragmentos, que compõem uma realidade arquitetônica. [...] Os fragmentos da arquitetura (pedaços de parede, de salas, de ruas, de ideias) são tudo o que realmente vemos. [...] Esses fragmentos são como inícios sem fins. [...] Há sempre uma cisão entre fragmentos reais e fragmentos virtuais, entre memória e fantasia. [...] Essas cisões não têm nenhuma outra razão de ser senão a de passagem de um fragmento para outro. São mais dispositivos de transmissão do que sinais. São rastros, coisas intermediárias. [...] O que conta não é o choque entre esses fragmentos contraditórios, mas o movimento entre eles. E esse movimento invisível não é nem parte da linguagem nem da estrutura (linguagem e estrutura são palavras específicas que se referem a um modo de leitura da arquitetura que não se aplica inteiramente ao contexto do prazer); não é mais do que uma relação constante e móvel que se dá dentro da própria linguagem” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 583).


--- Fragmento ---

Assim como a fragmentação do corpo é relacionada à experiência do estranho familiar, que tem na interação entre indivíduos e o mundo seu ponto de partida; os fragmentos de arquitetura dos quais Bernard Tschumi se utiliza também tem ligação direta entre o espaço experimentado em partes pelos indivíduos que o vivenciam. Nesse sentido, a fragmentação da arquitetura vem da percepção restrita pelos nosso sentidos, que não são capazes de experienciar o todo, somente partes, fragmentos materiais. Aqui coloca-se em questão também como esses fragmentos se dão na experiência virtual do espaço e não me refiro à apreensão mental, porque nessa sim, conseguimos compreender o todo, mas na viviência do ciberespaço. Será que a ubiquidade de dados gera uma falsa sensação de entendimento do todo, enquanto na verdade, estamos de fato vivendo partes conectadas desse todo?


“As fronteiras nítidas dão lugar a uma fractalização das repartições” (LÉVY, 1996, p. 25) “Por isolarem as forças ameaçadoras da ordem, as fronteiras demarcariam uma identidade territorial para a cidade” (SCHULZ, 2008, p. 57). “As formas urbanas se insinuam porque as fronteiras e as linhas divisórias estão em constante movimento, estabelecendo configurações provisórias no tempo” (SCHULZ, 2008, p. 58).


--- Fronteira ---

Semelhante à noção de limiar, barreira e limite, as fronteiras implicam em uma tensão de dois lados, em um constante ceder e tomar de volta. O movimento é a própria essência da fronteira, nunca é a estabilidade. Aqui a questão é a diluição das fronteiras, especialmente, entre o material e o virtual, o espaço concreto e o ciebrespaço. Seriam essas fronteiras enfraquecidas ou, ao contrário, reforçadas em ocasião da exaltação das tecnologias digitais?


“Através das interfaces que dão acesso ao mundo virtual, essas experiências podem ser assimiladas às sensoriais ‘reais’, requalificando nossa apreensão de fenômenos e espaços” (DUARTE, 2002, p. 236). “Os diálogos entre territórios materiais e computacionais, que se contaminam e se interpenetram, são feitos através das interfaces. Assim, Siegfried Zielinski (1995) vê as interfaces não como a película limítrofe entre pretendidas especificidades de cada mundo (sistema de objetos e seus signos), mas como instrumentos e modelos conceituais com os quais se pode operar através desses universos” (DUARTE, 2002, p. 245).


--- Interface ---

Neste trabalho, o termo interface ganha a conotação de meio material que faz a conexão com o meio virtual, na maioria dos casos, através das tecnologias digitais, e permite a interpenetração do espaço concreto com o ciberespaço. Computadores, celulares, smartphones, tablets, fones de ouvido são alguns exemplos de interfaces comumente utilizadas hoje em dia, na escala do indivíduo, mas existem interfaces maiores na escala da arquitetura e da cidade, muito usadas em propagandas e estratégias comerciais de marketing, como painéis eletrônicos e de touchscreen, televisores e telões, óculos de imersão em realidade virtual e outros.


“[...] a primeira [inteligência artificial] refere-se ao incremento de processamento da máquina, enquanto a segunda [inteligência coletiva] responde às possíveis alterações cognitivas dos seres humanos. E, mais que isso, essas alterações originam-se e se propagam coletivamente, dependendo da e implicando na organização de um corpo social” (DUARTE, 2002, p. 231).


--- Inteligência artificial ---

Diretamente conectado ao desenvolvimento tecnológico, esse termo tem uma conotação mais prática do que conceitual, no entanto, o impacto que a inteligência artificial tem demonstrado ter nos últimos tempos, em especial, através da evolução da Internet das Coisas, prova que a essa é uma revolução sem volta. A inteligência artificial veio para ficar e está cada vez mais presente no nosso dia a dia, mesmo que não percebamos claramente aonde. Ou talvez seja porque tenhamos naturalizado demais sua presença.


“[...] a primeira [inteligência artificial] refere-se ao incremento de processamento da máquina, enquanto a segunda [inteligência coletiva] responde às possíveis alterações cognitivas dos seres humanos. E, mais que isso, essas alterações originam-se e se propagam coletivamente, dependendo da e implicando na organização de um corpo social” (DUARTE, 2002, p. 231). “A inteligência coletiva refere-se ao envolvimento de pessoas na dinamização e construção ativa e constante do ambiente tecnológico informacional, onde se pode ‘não só trocar informações, mas verdadeiramente pensar juntos, pôr em comum nossas memórias e projetos para produzir um cérebro cooperativo’ (Lévy, 1998:96). Tem o ciberespaço como o meio diferencial, mas não exclusivo, de novos processos cognitivos, sociais e afetivos” (DUARTE, 2002, p. 231). “Esse exemplo [do atentado às Torres Gêmeas, em Nova York e o terrorismo] é fruto do mesmo substrato cognitivo descrito por Pierre Lévy como a inteligência coletiva. Todavia, se nas proposições de Lévy para a sociedade da cibercultura a inteligência coletiva parece ter invariavelmente um caráter missionário de expiação de erros ou deslizes culturais acumulados, na verdade, ela assinala uma mudança transversal nas estruturas cognitivas contemporâneas, sem trazer nenhuma necessária implicação moral. As transformações, a crise, valem para todos, atingem toda a sociedade” (DUARTE, 2002, p. 233).


--- Inteligência coletiva ---

A partir da elaboração do termo por Pierre Lévy, a inteligência coletiva é consequência do impacto da inteligência artificial nos nossos processos cognitivos. Ela cria uma rede de conhecimentos sem limites, que contribui para o desenvolvimento de relações e a construção de dinâmicas virtuais, alimentada por indivíduos conectados a essa rede.


“24. Internet – O nome Internet vem de internetworking (ligação entre redes). Embora seja geralmente pensada como sendo uma rede, a Internet na verdade é o conjunto de todas as redes e gateways que usam protocolos TCP/IP. Nota-se que a Internet é o conjunto de meios físicos (linhas digitais de alta capacidade, computadores, roteadores etc.) e programas (protocolo TCP/ IP) usados para o transporte da informação. A Web (WWW) é apenas um dos diversos serviços disponíveis através da Internet, e as duas palavras não significam a mesma coisa. Fazendo uma comparação simplificada, a Internet seria equivalente à rede telefônica, com seus cabos, sistemas de discagem e encaminhamento de chamadas. A Web seria similar a usar um telefone para comunicações de voz, embora o mesmo sistema também possa ser usado para transmissões de fax ou dados” (COSTA apud LÉVY, 1999, p. 255).


--- Internet ---

Ainda que pareça óbvio o significado de internet, assim como os conceitos de rede e de espaço, explorados no primeiro capítulo, seu uso se tornou displicente e frouxo, e muitas vezes até reduzido. Como Carlos Irineu da Costa aponta em seu próprio glossário, no final do livro Cibercultura (LÉVY, 1999), aqui reproduzido, Internet refere-se à todas as redes informacionais que dividem o mesmo protocolo de funcionamento, incluindo os aparatos físicos e os virtuais, isto é, hardware e software. Para esta pesquisa, esse conceito aparece neste glossário, como forma de esclarecer seu significado geral, esquecido por alguns e desconhecido pela maioria, portanto usaremos a mesma definição de Costa.


“De fato, o conceito de limites está diretamente relacionado com a própria definição da arquitetura. Que significa ‘definir’ senão ‘determinar a fronteira ou os limites de’, assim como ‘estabelecer a natureza essencial de’?1 1. “Definir”, Oxford English Dictionary” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 174). “Os limites da arquitetura são variáveis: cada década possui os seus temas ideais e os seus próprios modismos confusos. Mas cada uma dessas mudanças e digressões periódicas suscita uma mesma questão: será que existem temas recorrentes, constantes, especificamente arquitetônicas ou, ainda que permanentemente em pesquisa, uma arquitetura de limites?” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 179). “As regras de interação e integração sociais mostravam e sustentavam os limites espaciais: construído versus natural, terrestre versus marítimo, público versus privado.Tais linhas, conceituais ou materiais, simbolizavam relações de poder, expressavam a luta e a distribuição do poder no espaço civilizado. [...] O jogo entre limites e transgressões parece ser regulado por uma dependência mútua. O limite não existiria se fosse absolutamente intransponível, e a transgressão seria inútil caso atravessasse um limite apenas ilusório e nebuloso. A transgressão leva o limite até seu próprio limite, mas não é uma violência nem uma vitória sobre o limite, é a intensa experiência do limite. Transgredir é traçar uma linha veloz capaz de fazer o limite emergir, de tornar o limite visível. O momento de transgressão expõe, portanto, a fronteira transgredida” (SCHULZ, 2008, p. 57). “Os limites não são mais dados [no virtual]. Os lugares e tempos se misturam” (LÉVY, 1996, p. 25).


--- Limites ---

A ideia de limites é inicialmente abstrata, mas que tem no espaço concreto um dos modos da manifestação de suas principais características. Contudo, não é somente materializada no espaço físico que os limites interessam à arquitetura, como aponta Bernard Tschumi. A quebra dos limites conceituais da arquitetura ajudam a construir conhecimento teórico à disciplina. E como bem coloca Sônia Hilf Schulz, a transgressão desses limites rompem e expõem a própria essência dos limites, que é a fricção de opostos, colocados lado a lado em choque.


“29. Link – Frequentemente traduzido como ‘vínculo’, um link é uma conexão entre dois elementos em sua estrutura de dados. Os links permitem a navegação dentro de um documento hipertextual (ou hipermídia). Na Internet, um link é qualquer elemento de uma página da Web que possa ser clicado com o mouse, fazendo com que o navegador passe a exibir uma nova tela, documento, figura, etc.” (COSTA apud LÉVY, 1999, pp. 255-256).


--- Link ---

Assim como com o termo internet, me apropriei da definição de link de Carlos Irineu Costa. Apesar dele se restringir a uma explicação puramente relacionada à tecnóloga da informação, aqui, usaremos com um significado mais amplo. O interessante desse termo é sua possível associação com a palavra vínculo, que remete a tantas significações. Uma das que logo me vem à cabeça, é de conotação fenomenológica, do vínculo da existência com o lugar. E isso me faz pensar sobre a ironia da utilização desse conceito para o mundo cibernético, onde não há especificidade, não há diferenciação de lugar, apenas um espaço homogêneo.


“O lugar é uma porção do espaço significado, ou seja, a cujos fixos e fluxos são atribuídos signos e valores que refletem a cultura de uma pessoa ou grupo. [...] O lugar marca uma posição no espaço, é certo, mas sobretudo uma posição cultural, na qual o espírito e o corpo se encontram, onde o ser se realiza” (DUARTE, 2002, p. 65). “Sem dúvida, a grande maioria das pessoas nas sociedades tradicionais, bem como nas desenvolvidas vive em lugares e, portanto, percebe seu espaço com base no lugar. Um lugar é um local cuja forma, função e significação são independentes dentras das fronteiras da contiguidade física” (CASTELLS, 1999, p. 512). “O lugar antropológico tem origem na noção sociológica de lugar, associada por Mauss à cultura localizada no tempo e no espaço” (SILVANO, 2007, p. 79).


--- Lugar ---

Em geral, lugar se diferencia de espaço pelas suas características identitárias, suas especificidades locias, que dependem de suas manifestações físicas, culturais e coletivas. Não há apenas um lugar, mas lugares, no plural, assim como espacialidades. No entanto, lugares e espacialidade não são o mesmo. Me parece que para se referir a lugares, há que se ter uma convergência de valores, percepções comuns, regras estabelecidas e convencionadas em grupo, em sociedade. Enquanto as espacialidades têm maior liberdade.


“O mundo ‘moderno’ das territorialidades contínuas/contíguas regidas pelo princípio da exclusividade (...) estaria cedendo lugar hoje ao mundo das múltiplas territorialidades ativadas de acordo com os interesses, o momento e o lugar em que nos encontramos (Haesbaert, 1997: 44)” (HAESBAERT, 2016, p. 337). “O que entendemos por multiterritorialidade é, assim, antes de tudo, a forma dominante, contemporânea ou ‘pós-moderna’, da reterritorialização, a que muitos autores, equivocadamente, denominam desterritorialização” (HAESBAERT, 2016, p. 338). “A esta reterritorialização complexa, em rede e com fortes conotações rizomáticas, ou seja, não-hierárquicas, é que damos o nome de multiterritorialidade” (HAESBAERT, 2016, p. 343).


--- Multiterritorialidades ---

Multiterritorialidades ou múltiplas territorialidades, como frisa o autor desse termo, o geógrafo brasileiro Rogério Haesbaert, é a coexistência de territórios diversos concentrados em pontos contíguos. Essa percepção é extremamente relevante para a emergência de espacialidades contemporâneas na medida em que aceita e adota a possibilidade de convergência e convivência de realidades diferentes em um mesmo espaço. Assim, a noção de multiterritorialidades pode ser aplicada a esse trabalha como uma das possibilidades de se enxergar o mundo contemporâneo contaminado pelas TIC.


“Se um lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não pode se definir nem como identitário, nem como relacional, nem como histórico definirá um não lugar. A hipótese aqui defendida é a de que a supermodernidade é produtora de não lugares” (AUGÉ, 2012, p. 73). “O lugar e o não lugar são, antes, polaridades fugídias: o primeiro nunca é completamente apagado e o segundo nunca se realiza totalmente” (AUGÉ, 2012, p. 74). “O não-lugar será então um lugar que não é relacional, não é identitário e não é histórico. Materializa-se nas auto-estradas, nos aeroportos e nas grandes superfícies. O viajante - não o passeante de Benjamin e Baudelaire, que Augé classifica de moderno, e que, ao contrário do viajante ‘sobremoderno’, articula o espaço antigo e o espaço moderno num todo produtor de sentido - é a figura humana dessa nova configuraçnao espacial” (SILVANO, 2007, p. 81).


--- Não-lugar ---

A partir do termo cunhado pelo antropólogo Marc Augé, aqui se percebe uma semelhança com os conceitos de cidade genérica, bigness ou grandeza, e de junkspace ou espaço-lixo. O interessante é que o primeiro lançou o termo não-lugar, originalmente em 1992, apenas dois anos antes de Koolhaas publicar seus textos explicitando as noçnoes de cidade genérica e do problema da grandeza em arquitetura. Com exceção de junkspace, escrito em 2001, ambos os autores lançaram ideias complementares em diferentes disciplinas, tendo como base o contexto da década de 1990, o que leva a crer que esse período foi crucial para o surgimento de questões espaciais importantes. Talvez pudésemos fazer uma relação de que a cidade genérica é produtora desses não-lugares, que poderiam também receber o nome de espaços-lixo, devido à complexidade e falta de sentido que a grandeza gerou espacialmente.


“Aqui, cabe introduzir uma distinção capital entre possível e virtual, que Gilles Deleuze trouxe à luz em Différence et répétition. O possível já está todo construído, mas permanece no limbo” (LÉVY, 1996, p. 15). “O possível se realizará sem que nada mude em sua determinação nem em sua natureza. É um real fantasmático, latente. [...] O possível é exatamente como o real: só lhe falta a existência.” (LÉVY, 1996, p. 16).


--- Possível ---

Partindo da definição de Pierre Lévy em sua investigação sobre o que é o virtual, o possível aparece com aquilo que já está determinado, mas que falta concretude física. A esse conjunto de possibilidades predeterminadas só resta a realização. O possível já existe teoricamente, mas não fisicamente.


“Levada ao extremo, o prazer do espaço inclina-se para a poética do inconsciente, para o limite da loucura. [...] Levadas ao extremo, essas manipulações tendem para uma poética de signos congelados, desvinculados da realidade e voltados para o prazer mental, gélido, sutil. [...] Nem o prazer do espaço nem o prazer da geometria são (por si sós) o prazer da arquitetura” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 576). “Diferentemente da necessidade da pura construção, a desnecessidade da arquitetura é indissociável de suas teorias, histórias e outros precedentes. Esses vínculos enriquecem o prazer” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 579). “O prazer da arquitetura contém (e dilui) simultaneamente os constructos mentais e a sensualidade. Nem o espaço nem os conceitos, por si sós, são eróticos, mas a confluência entre ambos. [...] O prazer máximo da arquitetura está naquele momento impossível em que um ato arquitetônico, levado ao excesso, revela ao mesmo tempo os vestígios da razão e a experiência imediata do espaço” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 580). “A arquitetura do prazer está onde o conceito e a experiência coincidem abruptamente, onde os fragmentos da arquitetura colidem e se fundem em deleite, onde a cultura da arquitetura é eternamente desconstruída e as regras são transgredidas” (TSCHUMI apud NESBITT, 2006, p. 581).


--- Prazer da arquitetura ---

Seguindo o texto de Bernard Tschumi acerca do prazer da arquitetura, o arquiteto explora a sensação de prazer às noções de inconsciente e da loucura, o que é absolutamente subjetivo. Ou seja, aqui Tschumi aborda a influência que a arquitetura, não só construída, mas também seu lado teórico, exerce sobre a capacidade individual do sujeito de sentir prazer intelectual e sensorial, a partir da conjunção do conhecimento abstrato e da experiência física. A confluência desses dois aspectos faz da arquitetura algo prazeroso e maravilhoso que extrapola os limites da percepção puramente material e contribui para a elevação da própria arquitetura em si diante e ao redor do sujeito.


“O virtual e o atual são dois modos do real, pois se a ‘árvore está na essência do grão, então a virtualidade da árvore é bastante real (sem que seja, ainda, atual)’” (DUARTE, 2002, p. 235). “A realização de um possível não é uma criação, no sentido pleno do termo, pois a criação implica também a produção inovadora de uma ideia ou de uma forma. [...] A diferença entre real e possível é puramente lógica” (LÉVY, 1996, p. 16). “As coisas só têm limites claros no real” (LÉVY, 1996, p. 25).


--- Real ---

Assim como com espaço e espacialidade, o termo real também é dos mais difíceis de se explicar. Por isso, usando a definição de Pierre Lévy como base, o real é aquilo que responde ao possível, é aquilo que garante concretudo a uma possibilidade já predeterminada, já configurada previamente. Não há a criação de algo novo, mas apenas a materialização de uma existência.


“[...] a Realidade Aumentada é interativa e ocorre em tempo real, concebida em três dimensões, seu processamento combina elementos virtuais com o ambiente físico” (DELAQUA / ARCHDAILY, 2016).


--- Realidade aumentada ---

Em contraponto à realidade virtual, a realidade aumentada expande a forma de interação entre virtual e físico na medida em que permite a sobreposição da camada virtual sobre o espaço físico. Com novas camadas de leitura do espaço concreto, a realidade aumentada amplia as possibilidades de enxergar o espaço, gerando assim a emergência de novas espacialidades contemporâneas.


“Tanto a Máscara com Espelhos de Clark quanto o helmetset de Sutherland podem ser considerados como primitivos da realidade virtual. Se, por um lado, como no caso de Sutherland, espectadores experienciam uma reprodução, por outro, como no caso de Clark, espectadores são partes vivas necessárias para completar a obra temporariamente, dando seqü.ncia a ela. Pode-se dizer que nos sistemas de realidade virtual, como o de Sutherland, o foco volta-se para a substância, ou seja, para o potencial digital pré-programado a ser realizado, enquanto a obra de Clark tem como cerne o virtual a ser atualizado pelo espectador. Assim, o sistema de Sutherland, apesar da tecnologia digital, não pode ser considerado virtual no sentido exposto acima, sendo na verdade apenas reprodução digital de uma possível realidade, enquanto a obra de Clark prenuncia uma realidade virtual de fato virtual, ainda que sem usar tecnologia digital” (BALTAZAR, 2005, p.p 3-4). “‘A realidade virtual corrompe, a realidade absoluta corrompe absolutamente.’ Roy Ascott, Prêmio Ars electronica 1995” (LÉVY, 1996, p. 11). “Já a Realidade Virtual é um meio de experiência sensorial que ocorre através de um sistema operacional no qual o usuário consegue chegar muito próximo da sensação de veracidade de algum ambiente ou situação” (DELAQUA / ARCHDAILY, 2016).


--- Realidade virtual ---

A realidade virtual depende ainda de aparatos tecnológicos ou interfaces que transportem o usuário para dentro desse espaço, mas como coloca Ana Paula Baltazar, nem sempre tecnologias digitais são de fato virtuais. Independente de ser atingida via digital ou não, a realidade virtual implica em uma total imersão que retira do espectador qualquer referência de onde seu corpo físico se encontra naquele momento. A imersão é mental e uma nova realidade é experienciada, embora muitas das vezes, referenciais geográficos existentes no mundo sejam usadas como base para a criação de realidades virtuais.


“As redes, enquanto ‘linhas conectadas e não superfícies’, se estendem por quase todo lugar, ‘e se expandem tanto no tempo quanto no espaço, sem preencher o tempo e o espaço (Stengers, 1983)’ (Latour, 1991: 160)” (HAESBAERT, 2016, p. 283). “De acordo com Milton Santos, atualmente, os arranjos espaciais se dão não somente por figuras feitas por pontos contínuos e contíguos, mas também por descontinuidades. É um espaço feito também de segmentações e partições que sugerem pelo menos dois recortes: 1. Horizontalidades, que seriam a extensão de pontos que se agregam sem descontinuidade e que estão ligadas, preferencialmente, ao territorial; 2.Verticalidades, que seriam pontos separados no espaço que asseguram o funcionamento global da sociedade e da economia e que estão ligados, preferencialmente, ao funcional. O espaço atual seria composto por estes dois recortes - dois arranjos e duas segmentações -, inseparavelmente” (BUCCI, 2005, pp. 38-39). “Cada vez mais, as pessoas organizam seu significado não em torno do que fazem, mas com base no que elas são ou acreditam que são. Enquanto isso, as redes globais de intercâmbios instrumentais conectam e desconectam indivíduos, grupos, regiões e até países, de acordo com sua pertinência na realização dos objetivos processados na rede, em um fluxo contínuo de decisões estratégicas. Segue-se uma divisão fundamental entre o instrumentalismo universal abstrato e as identidades particularistas historicamente enraizadas. Nossas sociedades estão cada vez maiz estruturadas em uma oposição bipolar entre a Rede e o Ser.” (CASTELLS, 1999, p. 41).


--- Rede ---

Enquanto rede é um dos termos mais abrangentes desta coletânea e recebeu diversas conotações ao longo da História, como vimos no primeiro capítulo, sua exploração aqui não pretende ser definidora - como é, na verdade, como todos os termos aqui trabalhados. O que talvez seja o mais interessante de ser enfatizado com relação a esse termo é a figura da horizontalidade que ele imprime. Palavras como expansão, extensão, ampliação, ajudam a visualizar o alcance dessa rede. E é justamente esse alcance sem limites que se interpenetrou através das TIC que é capaz de alterar nossa percepção espacial.


“[...] um território está sempre em movimento de desterritorialização, tendendo a passar a outros agenciamentos, embora o novo agenciamento possa, posteriormente, efetuar um reterritorialização” (SCHULZ, 2008, p. 59). “Segue-se sua reterritorialização, agora informacional, em que dados são organizados em modelos, que podem ser manipulados para a reconstrução de processos naturais, ou sujeitos à simulações que podem visar conhecer o espaço antártico sob condições futuras ou hipotéticas. Portanto, as respostas que os cientistas buscam na Antártida não vêm diretamente da natureza, mas de simulações que ocorrem em seu correlato território informacional” (DUARTE, 2002, p. 246).


--- Reterritorialização ---

Como parte do movimento de territorialização em conjunção com o de desterritorialização, a reterritorialização pode ser entendida como um retorno. Não que esse retorno seja obrigatório, mas como um movimento dinâmico, sem pausas, o processo de territorialização traz implícito nele o de reterritorialização. Ainda que não se saiba qual foi o ponto de partida ou o de chegada, sabe-se que em algum momento houve um início e um final, que pela própria lógica do movimento talvez nunca sejam estáticos e muito menos definitivos; o que era o início torna-se chegada, o que era destino transformase em percurso. E nesse balé entre ir e vir, que ocorre a reterritorialização.


“O rizoma funciona através de encontros e agenciamentos, de uma verdadeira cartografia das multiplicidades. O rizoma é a cartografia, o mapa das multiplicidades. Enquanto o modelo da árvore-raíz é ‘decalque’, reprodução ao infinito, o rizoma-canal é ‘mapa’, ‘voltado para uma experimentação ancorada no real’, aberto, desmontável, reversível, sujeito a modificações permanentes, sempre com múltiplas entradas, ao contrário do decalque, que ‘volta sem ao mesmo’ (Deleuze e Guattari, 1995a: 22)’” (HAESBAERT, 2016, p. 113). “As multiplicidades são a prórpia realidade, e não supõem nenhuma unidade, não entram em nenhuma totalidade e tampouco remetem a um sujeito. As subjetivações, as totalizações, as unificações são, ao contrário, processos que se produzem e aparecem nas multiplicidades. Os princípios característicos das multiplicidades concernem a seus elementos, que são singularidades; a suas relações, que são devires; a seus acontecimentos, que são hecceidades (quer dizer, individuações sem sujeito); a seus espaços-tempos, que são espaços e tempos livres; a seu modelo de realização, que é o rizoma (por oposição ao modelo da árvore); a eu plano de composição, que constitui platôs (zonas de intensidade contínua); aos vetores que as atravessam, e que constituem territórios e graus de desterritorialização” (OLIVEIRA apud DELEUZE E GUATTARI, 2011, p. 1O).


--- Rizoma ---

Como um modelo de realização, segundo a definição dos filósofos Deleuze e Guattari, o rizoma não segue hierarquia alguma, ou seja, não há uma ordenação para a sucessão de realizações. Nesse sentido, a conotação própria do rizoma abastece a figura de expansão da rede.


“44. Site – Um conjunto de páginas da Web que façam parte do mesmo URL ou ‘endereço’. A ideia de site está relacionada à ideia de ‘local’, o que na verdade é um tópico complexo em se tratando de um espaço virtual criado por uma rede distribuída que lida com hiperdocumentos. Creio que a maneira mais simples de entender ‘site’ é pensar que um site corresponde a um hiperdocumento, com todas suas imagens, vínculos e referências, mesmo que esse hiperdocumento possa ter, potencialmente, o tamanho e a complexidade de uma grande enciclopédia” (COSTA apud LÉVY, 1999, p. 258).


--- Site ---

Seguindo a mesma lógica do conceito de link, site é uma palavra que, em inglês, pode denotar tanto um conjunto de páginas online, quanto, no vocabulário arquitetônico, um local, um terreno. E é justamente essa contraditória via de mão dupla que torna o termo site tão interessante. Mais uma vez, há a sugestão de perguntas em torno de seus significados e aplicações, como por exemplo: pode haver de fato um lugar específico na imensidão de dados que compõem o ciberespaço, a ponto de emergir a possibilidade de uma fenomenologia do espaço virtual? Ou ainda, se site se refere tanto ao mundo concreto quanto ao mundo virtual, poderá haver uma proximidade maior do que a imaginada até então entre eles? Questões como essas são provocadoras para este trabalho e ajudam a problematizar o tema abordado.


“Redes constituem a nova morfologia social de nossas sociedades e a difusão da lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura” (CASTELLS, 1999, p. 565). “Os processos de transfromação social sintetizados no tipo idela de sociedade em rede ultrapassam a esfera da relações sociais e técnicas de produção: afetam a cultura e o ppoder de forma profunda. As expressões culturais são retiradas da história e da geografia e tornam-se predominantemente mediadas pelas redes de comunicação eletrônica que interagem com o público e por meio dele em uma diversidade de códigos e valores, por fim incluídos em um hipertexto audiovisual digitalizado” (CASTELLS, 1999, p. 572).


--- Sociedade em rede ---

Da mesma forma que Zygmunt Bauman cria um termo (modernidade líquida) para concentrar as características do mundo em que estamos vivendo, a partir de suas observações e sob o viés da sociologia ou Marc Augé, do ponto de vsta antropológico em relação à supermodernidade; Manuel Castells também o faz, denominando sociedade em rede, o perfil de sociedade originado pelas conexões em rede, possibilitadas pela internet e pela rede de telecomunicações espalhadas ao redor do planeta.


“A territorialização, como sugeriram Deleuze e Guattari, é um processo que também inclui as inevitáveis desestabilizações do território (2002: 116). Essa operação é realizada em três etapas. A primeira é a marcação de um ponto frágil e incerto no caos [...] A segunda etapa é o traçado de uma circunferência em torno do ponto central, para delimitar e organizar um espaço em que serão inseridos os componentes diferenciados da estrutura planejada. Embora provisória, a fronteira afasta a vulnerabilidade à desordem, isolando as forças caóticas, desagregadoras da composição. Na terceira etapa, a fronteira é aberta, permitindo movimentos de desterritorialização através de linhas de errância e de fuga, que rompem os limites e escapam em busca de novos agenciamentos possíveis com outros territórios” (SCHULZ, 2008, p. 58). “A territorialização é o ato do ritmo tornado expressivo, ou um dos componentes do meio tornados qualitativos. As qualidades expressivas são passagens que se deslocam dos componentes do meio para os componentes do território. A qualidade, ou propriedade, permanece funcional e transitória enquanto está vinculada a uma ação, porém adquire expressividade quando ganha constância temporal e alcance espacial, convertendo-se em uma marca territorial, uma marca territorializante, uma assinatura. Logo, não uma medida, mas um ritmo faz no território uma marca dimensional” (SCHULZ, 2008, p. 60). “Assim, territorializar-se significa também, hoje, construir e/ ou controlar fluxos/redes e criar referenciais simbólicos num espaço de movimento, no e pelo movimento” (HAESBAERT, 2016, p. 280).


--- Territorialização ---

O processo de territorialização é constantemente acompanhado pela instabilidade do movimento, assim como é com a desterritorialização e a reteriitorialização. Desse modo, a constituição de um território não implica necessariamente em uma ação com começo, meio e fim, que marca para sempre e de forma estática as características de determinado lugar. Ao contrário, o próprio ato de territorializar explicita o ritmo do movimento em si. Territorialização é movimentação e dinamização, é um mover-se ininterruptaemente.


“Marcos Novak considera que, através dos ciclos de invenções nos transportes e nas comunicações, o papel da arquitetura tem sido apenas o de abrigar os equipamentos tecnológicos, sofrendo poucas transformações formais. Trabalhando com o ciberespaço, vê a possibilidade de transformações radicais na arquitetura, que deixaria de ser passiva e imóvel para poder ser transmitida via redes de comunicação, tornar-se fluxos, tomando formas próprias ao mundo informacional eletrônico” (DUARTE, 2002, p. 238). “A obra de Marcos Novak está inteiramente construída no universo informacional, acessível através de máquinas/interfaces, e indica um paradoxo entre as afirmações de [Stephen] Perrella e [Giulio Carlo] Argan: se a obra virtual é uma manipulação do substrato informacional, por que ele mantém em seus projetos a aparência de objetos arquitetônicos?” (DUARTE, 2002, p. 240). “Novak (1998: 22) quer destacar, entretanto, que esses projetos não deveriam ser encarados de modo literal, mas como antecipação de uma ‘cidade virtual transurbana’ e que as megaestruturas de Constant são hoje, a infraestrutura global da internet, rede de telefonia celular, e órbitas de satélites. É a partir dessa infraestrutura, que é constitutiva do ciberespaço, que Novak propõe a sua Babilônia sofT” (DUARTE, 2002, p. 241).


--- Transarquitetura ---

Esse termo, cunhado pelo arquiteto Marcos Novak, inaugura o que ele chamou de Transarquitetura. Isto é, uma nova fase para a produção arquitetônica a partir do surgimento do ciberespaço. Essa transmutação da arquitetura seria alimentada e possibilitada pelas tecnologias digitais de modo a torná-la menos passiva e menos imóvel. Em seus projetos experimentais, ele investiga e testa os limites da arquitetura, o que abre novas possibilidades para o pensar, o fazer e o realizar da arquitetura nos dias de hoje.


“1. Local ou situação ideais onde tudo é perfeito, harmônico e feliz; refere-se especialmente a um tipo de sociedade com uma situação econômica e social ideal. 2. Que está no âmbito do irrealizável; que tende a não se realizar; quimera, sonho; fantasia. 3. Local em que tudo acontece de maneira perfeita ou ideal. 4. Situações determinadas em que os indivíduos estão em estado pleno de felicidade e harmonia. 5. [Política] P.ext. Qualquer situação imaginativa que, remetendo ao que é ideal e priorizando a qualidade de vida, garante uma sociedade mais justa e com políticas públicas igualitárias” (DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS).


--- Utopia ---

Devido ao prefixo de negação ‘u’ antes de ‘topia’, que quer dizer, tópos ou lugar, a conotação de utopia designa aquilo que é a negação do lugar, ou seja, poderia ser interpretado como um não-lugar, mas não no mesmo sentido que Marc Augé define não-lugar. Como esse termo teve origem na literatura, a liberdade poética de Thomas More permite entender utopia como um lugar inalcançavel, inatingível, talvez até irreal, mas que guarda em si uma esperança de algum dia alcançar esse lugar idealizado


“A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus, força, potência. [...] Na filosofia escolástica, é virtual o que existe em potência e não em ato. [...] O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado à concretização efetiva ou formal. A árvore está virtualmente presente na semente. Em termos rigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real, mas ao atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes” (LÉVY, 1996, p. 15). “Portanto, quando se trata do virtual, dizer imagem implica necessariamente dizer modelo, o que transforma as noções de representação, abrindo novas possibilidades de exploração estética e também de compreensão de mundo, já que, ao representá-lo , na verdade o que se faz é construir seu modelo cognitivo” (DUARTE, 2002, p. 236).


--- Virtual ---

Um dos conceitos mais nebulosos tratados nesse trabalho, o virtual, é levantado por diversos autores de maneira direta ou indireta. Para efeito dessa coletânea, o termo será problematizado, principalmente, através do entendimento do conceito pelo filósofo Pierre Lévy, em seu O que é o virtual? (1996). Nesse trabalho, virtual ganha a conotação de uma potência do vir a ser do estado de uma coisa, situação ou lugar, possibilitando assim novas concepções espaciais e novas experiências do espaço. Dessa maneira, o virtual e, por consequência, o processo de virtualização provocam por si só a quebra da rigidez dos limites e das fronteiras, considerando sua constante mutação, ou melhor dizendo, atualização. Por isso, quando o conceito de virtual for mencionado sozinho ou para caracterizar o espaço, ele será interpretado como um estado em questão, em problematização, instável, não-fixo, mutável, fluído.


“A virtualização pode ser definida como o movimento inverso da atualização. [...] Consiste em uma passagem do atual ao virtual, em uma ‘elevação à potência’ da entidade considerada” (LÉVY, 1996, p. 17). “A virtualização não é uma desrealização (a transformação de realidades num conjunto de possíveis), mas uma mutação de identidade, um deslocamento do centro de gravidade ontológico do objeto considerado: em vez de se definir principalmente por sua atualidade (uma ‘solução’), a entidade passa a encontrar sua consistência essencial no campo problemático” (LÉVY, 1996, pp. 17-18). “Virtualizar uma entidade qualquer consiste em descobrir uma questão geral à qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa interrogação e em redefinir a atualidade de partida como resposta a uma questão particular. [...] A virtualização é um dos principais vetores da criação de realidade” (LÉVY, 1996, p. 18). “Os limites não são mais dados. Os lugares e tempos se misturam. [...] As fronteiras nítidas dão lugar a uma fractalização das repartições. [...] São as próprias noções de privado e de público que são questionadas. [...] As coisas só têm limites claros no real. [...] A virtualização, passagem à problemática, deslocamento do ser para a questão, é algo necessariamente põe em causa a identidade clássica, pensamento apoiado em definições, determinações, exclusões, inclusões e terceiros excluídos. Por isso, a virtualização é sempre heterogênese, devir outro, processo de acolhimento da alteridade” (LÉVY, 1996, p. 25).


--- Virtualização ---

Eaquanto a atualização é o processo de passagem do estado de virtual para o atual; a virtualização é a transformação do atual em virtual, segundo os conceitos de Pierr Lévy (1996). Ou seja, a virtualizacão é a lógica inversa da atualização, que permite que uma determinada solução formal seja colocada num estado de questionamento, de problemas, de dúvidas e não mais de soluções. Através da virtualização se atinge o dinamismo e a imprevisibilidade do virtual.


“...”


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