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O TERRITÓRIO NEGRO:

SEDE PARA O NÚCLEO DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS (NEAB) DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA - PR MATEUS DA SILVA FRAGA

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MATEUS DA SILVA FRAGA

O TERRITÓRIO NEGRO: SEDE PARA O NÚCLEO DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS (NEAB) DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA PR Trabalho Final de Graduação Interdisciplinar apresentado ao Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. Orientador: Prof. Dr. Antonio Carlos Zani Coorientador: Prof. Dr. Manfreide Henrique Martinez

Londrina 2018 3


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MATEUS DA SILVA FRAGA

O TERRITÓRIO NEGRO: SEDE PARA O NÚCLEO DE ESTUDOS AFRO-BRASILEIROS (NEAB) DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA PR

Trabalho Final de Graduação Interdisciplinar apresentado ao Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________ Prof. Dr. Componente da Banca Universidade Estadual de Londrina

___________________________________ Prof. Dr. Componente da Banca Universidade Estadual de Londrina

___________________________________ Prof. Dr. Componente da Banca Universidade Estadual de Londrina

Londrina, _____de ___________de _____. 5


DEDICATÓRIA À minha avó: Dona Maria Madalena, mulher negra brasileira que, com sua força, simplicidade e generosidade, me empoderou para a conclusão desta etapa. 6


AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os amigos, familiares e professores que contribuíram com pequenos gestos para a construção deste trabalho. E também ao designer londrinense, Willian Santiago por colorir meu volume teórico com as suas ilustrações.

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FRAGA, Mateus da Silva. O Território Negro: Sede para o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) da Universidade Estadual de Londrina - PR. 2018. Número total de folhas (110). Trabalho Final de Graduação Interdisciplinar (Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2018.

RESUMO

Em busca da valorização cultural afro-brasileira, já que existem dificuldades de reconhecimento da contribuição dos negros africanos na formação cultural do país, o projeto para uma nova sede do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros propõe um edifício que traga visibilidade para o órgão na Universidade Estadual de Londrina e que atenda às necessidades requeridas pelos usuários. A ideia é incorporar manifestações culturais e religiosas de matriz africana de Londrina para o campus universitário, visando as trocas culturais e o combate ao racismo. Fundamentado nos estudos realizados por Raquel Rolnik e Maria Nilza da Silva, nos quais abordam a situação dos territórios negros na cidade, nas capitais do Brasil (São Paulo e Rio de Janeiro) e em Londrina, respectivamente, auxiliarão na justificativa do conceito e partido arquitetônico. Diante dos pressupostos visa-se como resultado do trabalho final de graduação, através da Arquitetura e do Urbanismo, a discussão da inserção do negro na universidade e a preservação da identidade afro-brasileira. Palavras-chave: Arquitetura e Urbanismo. Cultura Afro-Brasileira. Londrina. Negro.

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FRAGA, Mateus da Silva. The Black Territory: The center of Afro-Brazilian Studies (NEAB) of the State University of Londrina - PR. 2018. Total number of sheets (110). Final Work of Interdisciplinary Graduation (Architecture and Urbanism) - State University of Londrina, Londrina, 2018.

ABSTRACT

In search of the Afro-Brazilian cultural valorization, since there are difficulties of recognition of the contribution of the black Africans in the cultural formation of the country. The project for a new center for Afro-Brazilian Studies proposes a building that brings visibility to the organ at the State University of Londrina and that meets the needs required by the users. The idea is to incorporate cultural and religious manifestations from the African matrix of Londrina to the academic community, aiming at cultural exchanges and the fight against racism. Based on the studies carried out by Raquel Rolnik and Maria Nilza da Silva, in which they deal with the situation of the black territories in the city, in the capitals of Brazil (São Paulo and Rio de Janeiro) and in Londrina respectively, will assist in the justification of the concept and architectural party. Given the assumptions, it is expected as a result of the final graduation work, through Architecture and Urbanism, the discussion of the black’s insertion in the university and the preservation of Afro-Brazilian identity. Keywords: Architecture and Urbanism. Culture. Afro-Brazilian. Londrina. black.

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 12 2 DISCUSSÃO TEÓRICA 17 2.1 O NEGRO E A CIDADE 17 2.2 O NEGRO EM LONDRINA 21 2.3 TERRITÓRIOS NEGROS 25 3 O NÚCLEO E AFINS 30 3.1 NEAB 30 3.2 NEAB NA UEL 31 3.3 AFRICANIDADES EM LONDRINA 34 4

AVALIAÇÃO PÓS-OCUPAÇÃO DAS EDIFICAÇÕES – APO

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5 ESTUDOS DE CASOS 41 5.1 RESIDÊNCIA DO NOVO ARTISTA NO SENEGAL 41 5.2 CENTRO DE OPORTUNIDADES PARA MULHERES (COM) 48 5.3 CASA DO BENIN 53 5.4 DIRETRIZES COLETADAS DOS ESTUDOS 58 6 EM BUSCA DO TERRITÓRIO 59 6.1 O ESPAÇO 62 7 DIRETRIZES PROJETUAIS 68 7.1 O PROGRAMA 68 7.2 POTENCIALIDADES DA UEL 68 7.3 PRÉ-DIMENSIONAMENTO 72 7.4 ORGANOGRAMA E FLUXOGRAMA 73 8 MEMORIAL 78 8.1 CONCEITO 78 8.2 PARTIDO 81 8.3 DISTRUBUIÇÃO DO PROGRAMA 89 8.4 ESTRUTURA E MATERIAIS 92 8.5 PERSPECTIVAS 92

9 REFERÊNCIAS 94 APÊNDICES 102 APÊNDICE A – Entrevista sobre o Samba da Madrugada 103 APÊNDICE B – Pranchas Finais 105

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1 INTRODUÇÃO

Ninguém ouviu Um soluçar de dor No canto do Brasil Um lamento triste Sempre ecoou Desde que o índio guerreiro Foi pro cativeiro E de lá cantou Negro entoou Um canto de revolta pelos ares No Quilombo dos Palmares Onde se refugiou Fora a luta dos Inconfidentes Pela quebra das correntes Nada adiantou E de guerra em paz De paz em guerra Todo o povo dessa terra Quando pode cantar Canta de dor E ecoa noite e dia É ensurdecedor Ai, mas que agonia O canto do trabalhador Esse canto que devia Ser um canto de alegria Soa apenas Como um soluçar de dor

Canto das Três Raças - Clara Nunes

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O presente Trabalho Final de Graduação Interdisciplinar tem como proposta o projeto arquitetônico de um novo Edifício para o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) da Universidade Estadual de Londrina (UEL) - PR, buscando suprir as demandas levantadas pela coordenadora, usuários e comunidade acadêmica. O projeto surge uma vez que a antiga sede (sala 125 no Centro de Letras e Ciências Humanas) e a atual (casa de madeira em frente ao calçadão) possuem um espaço totalmente limitado, sem possibilidades de todas as atividades do núcleo ocorrerem nas suas próprias instalações (realização de aulas, palestras, reuniões, exposições). Os pretos e pardos autodeclarados no ano de 2016, segundo o IBGE somavam 54,9% na participação da população brasileira (8,2% de pretos e 46,7% de pardos), mais que a metade da população brasileira. Já em Londrina, segundo SILVA (2012), atualmente os negros representam mais de ¼ (25%) do total da população, contingente mais vulnerável, pois a maior parte habita as periferias da cidade. Esta maioria encontra-se nas regiões mais pobres e periféricas tanto na zona norte como na zona sul. Sendo assim, o projeto também servirá como uma oportunidade para a população negra ocupar a universidade, contribuindo para a diminuição das desigualdades e, sobretudo, possibilitando a criação de estratégias para o combate ao racismo e às desigualdades raciais. 14

Beneficiado pelo sistema de cotas raciais, é fundamental para o autor o reconhecimento dos costumes de sua ancestralidade, para criação e amadurecimento de sua identidade. A escolha do tema abordado pelo autor foi motivada também pela vontade de produzir mais trabalhos acadêmicos discutindo as questões raciais (história e cultura afro-brasileira) na Arquitetura e Urbanismo. O objetivo geral é fazer um resgate dos valores da cultura e arte africana, criando espaços de manifestações culturais, para incentivo ao reconhecimento da própria identidade negra e empoderamento diante da sociedade. O edifício buscará trazer identidade arquitetônica no campus, referenciando-se na arquitetura vernacular e contemporânea da África Negra e no Brasil. Para o desenvolvimento do caderno teórico, foi realizado primeiramente um breve estudo para entender o lugar do negro ao longo dos séculos no Brasil, desde a diáspora africana até os dias atuais. Estudos da arquiteta Raquel Rolnik e da socióloga Maria Nilza da Silva contribuem para o trabalho, abordando a perspectiva na história do negro nas capitais (São Paulo e Rio de Janeiro) e em Londrina, respectivamente, assim como o conceito de território, que será abordado em capítulos mais adiante. O terceiro capítulo explica historicamente a importância do surgimento do Núcleo de Estudos Afro-Brasilei-


ros – NEAB, tanto em abrangência nacional, quanto local/regional. Este contém um breve levantamento sobre atividades de origens afro-brasileiras em Londrina, a fim de propor a ocupação no projeto elaborado. O próximo capítulo é destinado aos dados coletados pelo trabalho realizado na disciplina de Avaliação Pós-Ocupação das Edificações (APO) - 5ARQ098. Foi analisado o antigo espaço do núcleo no CLCH através de entrevistas, questionários e tabulações, resultando em diretrizes para o desenvolvimento deste trabalho. No quinto, estuda-se os correlatos para diretrizes funcionais e estéticas, como: setorização, estrutura, materiais, dimensões, fluxos, acessos e volumetria. Foram estes: Residência do Novo Artista no Senegal de Toshiko Mori; Centro de Oportunidades para Mulheres de Sharon Davis Design e a Casa do Benin, obra da arquiteta Lina Bo Bardi. O sexto capítulo explica a metodologia e o conceito utilizado para a escolha do terreno. Todas as áreas descartadas foram justificadas, chegando até o terreno para a proposta projetual contendo as análises gráficas do seu entorno imediato (vias, trajetória do sol, ventilação, vistas, topografia, gabarito das edificações). O sétimo é destinado para as diretrizes projetuais através do programa de necessidades, o pré-dimensionamento com as áreas estimadas respectivas de cada ambiente bem como as

potencialidades espaciais da Universidade Estadual de Londrina. E por fim, o oitavo capítulo contém o memorial explicativo e justificativo do trabalho: conceito e partido arquitetônico, volumetria, disposição do programa e estruturas/materiais, incorporando elementos afro-brasileiros propostos por Lina Bo Bardi em seus projetos.

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2 DISCUSSÃO TEÓRICA

2.1 O NEGRO E A CIDADE

Para a compreensão do presente trabalho é importante saber a origem do povo brasileiro. Segundo Weimer (2005), a formação básica da população brasileira é triíbrida: os responsáveis pela cultura brasileira são resultado da miscigenação são das etnias: “negra” (ou “africana”), “indígena” (ou “ameríndia”) e “branca” (ou “europeia”, ou “ibérica” ou “portuguesa”), como explica em seu livro Arquitetura popular brasileira. Logo, possuímos vários costumes provindos dessas etnias. Porém a única cultura que está sempre valorizada é a branca, inferiorizando as outras etnias. Weimer (2005) diz também que “apesar do fato de a maioria dos brasileiros ter em suas veias sangue africano, parecia que a escravidão havia apagado qualquer vínculo de sua arquitetura com suas origens no continente negro” (WEIMER, 2005), ou seja, ao longo da História do Brasil toda a cultura africana passa por um “esvaziamento”. Para evitar o esquecimento precisa-se conhecer a história do negro. Portanto neste capítulo estuda-se de forma breve a trajetória do negro na cidade, com base nos estudos de Raquel Rolnik e Maria Nilza da Silva, pois os desdobramentos da escravidão e os padrões tradicionalistas ainda perduram nas sociedades, mantendo constantemente a discriminação e a exclusão do segmento populacional negro (SOUZA, 2013).

“Na África, africanos, no Brasil, escravos” (FILHO, 2013) Essa conversão explica a diáspora africana, processo de dispersão dos negros na África entre os séculos XV e XIX, no qual ocorre a desterritorialização da África e criação de novos territórios no Brasil. Inicia-se uma história marcada por hostilização e preconceito. O processo de imigração dos negros ocorreu não só fisicamente, mas também culturalmente. Com mais de 4 milhões de pessoas trazidas ao longo dos três séculos, vários vieram de lugares diferentes com suas crenças, tradições e vários dialetos, deixando nossa cultura mais complexa e rica ao desembarcarem no Brasil. Os negros foram designados para escravidão, instrumento de dominação de um senhor para seu escravo, destituído de qualquer forma de liberdade. Montesquieu diz que “a escravidão propriamente dita é o estabelecimento de um direito que torna um homem completamente dependente de outro, que é o senhor absoluto da sua vida” (MONTESQUIEU, 1973, p.221 apud FILHO, 2013, p.26).

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Figura 1 – Escravos trabalhando - Marc Ferrez

Fonte: Instituto Moreira Sales. Disponível em: <https://blogdoims.com.br/escravos-de-marc-ferrez-por-lilia-moritz-schwarcz/>. Acesso em: nov. 2018.

Em meados do séc. XIX o negro era escravo, liberto ou quilombola. Os escravos habitavam as senzalas das casas rurais senhoriais e eram responsáveis pelos serviços domésticos, na área rural e engenhos de açúcar. Moravam em lugares desenhados pelos senhores brancos, sem iluminação e ventilação natural, sem mobília, voltados para um pátio ou corredor no qual pudessem vigiá-los. Mas o lugar em que tinha violência e vigília começou a se tornar um espaço em comunidade, por sua ancestralidade africana. De acordo com Rolnik (1989): Arrancado do lugar de origem e despossuído de qualquer bem ou arte

fato, era o escravo portador – nem mesmo proprietário – apenas de seu corpo. Era através dele que, na senzala, o escravo afirmava e celebrava sua ligação comunitária; foi através dele, também, que a memória coleti va pôde ser transmitida, ritualizada. Foi assim que o pátio da senzala, símbolo de segregação e controle, transformou-se em terreiro, lugar de celebração das formas de ligação da comunidade. (ROLNIK, 1989, p. 2)

Nas cidades os escravos domésticos trabalhavam nas casas grandes, e misturavam-se com os escravos de ganho – alugados por seus senhores por hora ou dia, tinham a perspectiva de ter sua carta de alforria – e os libertos – aqueles que encontravam brechas na legislação que regulava a escravidão. Intensificados pela ação abolicionista, os libertos aumentavam o seu número; a maioria trabalhava em ofícios como sapateiros, barbeiros, lavadeiras, cirurgiões, quitanda e cangalha (vendedores de rua). A cidade era uma opção para os escravos fugidos das fazendas, conseguindo o anonimato em relação aos outros negros na zona urbana (ROLNIK, 1989). 18


Figura 2 – 1899 - Criança em cima da babá negra

Com a chegada do processo abolicionista e a crise da escravidão no siste-

Fonte:

Ensinar

História.

Disponível

em:

<http://www.ensinarhistoriajoelza.com.br/ wp-content/uploads/2018/05/05F2_bab%C3%A1-Petr%C3%B3polis-RJ-c.-1899.jpg>. Acesso em: maio 2018.

A foto acima (figura 2) retrata uma babá negra carregando uma criança branca em suas costas. Apesar do registro ter ocorrido após a abolição, os costumes da escravidão ainda não haviam terminados completamente. Ou será que estes acontecem até hoje? Outros espaços para os escravos evadidos eram os quilombos, que simbolizavam a liberdade do corpo negro em relação a submissão do homem branco. Existiam os quilombos nas áreas rurais, mas também os urbanos no quais ficavam nas periferias.

ma da cafeicultura, principalmente na cidade de São Paulo, por exemplo, os senhores necessitaram buscar alternativas de mão-de-obra, optando por contratação de imigrantes italianos financiados por São Paulo num primeiro momento, e logo em seguida foi espontânea a vinda de mais imigrantes. A opção pela troca do escravo negro pelo imigrante branco livre foi um meio de embranquecer a população através da miscigenação, sendo que os negros poderiam trazer a bestialidade da escravidão. Os negros não escolhidos e libertos não tiveram nenhuma política de integração social, continuando excluídos (ROLNIK, 1989). Desse modo, Diwan (2007) diz sobre a Teoria Eugenista, que surge na tentativa de comprovar em ordem biológica, política e genética a supremacia racial branca, dizendo que para a evolução e melhoria da espécie humana a cor branca deveria prevalecer. 19


Com a entrada dos europeus, vieram também as ideias anarquistas e culturas distintas. A elite brasileira, patriota e disciplinar, apostou nesse projeto de raça e de incremento econômico às lavouras de café. Mais de setecentos mil negros escravos foram alforriados e deixados de lado, sem nenhum tipo de reconhecimento por séculos de trabalho forçado. Os imigrantes europeus não carregavam o estigma preconceituoso de que eram preguiçosos, sujos e indisciplinados tal como os negros e os mulatos. (DIWAN, 2007, p. 117) Figura 3 – Fábrica de bonecas no séc. XX. Reprodução da teoria eugenista

Fonte: Cameralabs. Disponível em: <http://cameralabs.org/media/lab16/post/02-16/12/fotografii-fabrik-kukol_5.jpg>. Acesso em: maio 2018.

Na literatura, vários escritos expressavam perspectivas racistas. A obra Casa Grande & Senzala de Gilberto Freyre, publicado de 1933 no Brasil, defende uma visão romantizada, em que o processo de mestiçagem do negro com o branco ocorreu de forma harmônica. Segundo o autor, a cultura brasileira era extraordinária, pois existia a contribuição de vários povos no cotidiano brasileiro, diferentemente dos conflitos étnicos-raciais acontecendo em outros países. O Brasilestaria situado em uma “democracia racial” (SILVA, 2006). Com o aumento da densidade populacional e embranquecimento da população, as cidades começaram a seguir o padrão do capitalismo, onde o centro urbano destinava-se para quem tivesse poder na sociedade:

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A face urbana desse processo é uma espécie de projeto de “limpeza” da cidade, baseado na construção de um modelo urbanístico e de sua imposição através da intervenção de um poder municipal recém-criado. Um dos principais alvos de intervenção foram, nas duas cidades, justamente os territórios negros. A violência dessa transformação foi maior no Rio de Janeiro, não só porque a cidade era maior e mais importante, mas sobretudo porque, na virada do século, era ainda uma cidade muito negra. Em São Paulo, desde logo se configurou um padrão de segregação urbana marcado por uma espécie de zoneamento social: os ricos abandonaram a contigüidade dos sobrados do Centro da cidade para desenhar um espaço de privacidade e exclusividade burguesas. Assim, novos loteamentos foram surgindo em áreas de antigas chácaras, abrigando palacetes neoclássicos circundados por muros e jardins. (ROLNIK, 1989, p.6)

Os negros que habitavam os casarões velhos do centro da cidade foram “jogados” para outras regiões da cidade por causa do domínio de classes, pois eles precisavam dar lugar ao “trabalho de melhoramento da capital”. Deste modo, até hoje o negro encontra-se desfavorecido socialmente em relação aos brancos. O contingente negro ainda está nas periferias das cidades e junto aos territórios culturais negros, ou seja, o processo de desterritorialização do negro ocorreu em vários momentos: desde o deslocamento de sua Mãe-África para as senzalas nas casas senhoriais, até o seu deslocamento do centro para as margens das cidades. 2.2 O NEGRO EM LONDRINA Fundada em 1934, a cidade de Londrina é considerada umas das maiores cidades do estado do Paraná, por sua influência e importância como eixo integrador entre o Sudeste e Sul do Brasil, sendo referência social, cultural, econômica, financeira e administrativa no norte paranaense (SILVA, 2014). A população negra é muito pouco estudada, pois se dá mais valor à presença dos brancos e imigrantes. A cidade foi urbanizada no contexto social, seguindo a História do Negro no Brasil mencionada no capítulo anterior, em que os negros se localizam nas margens das cidades com um modo de olhar estigmatizado e preconceituoso. Junto com essas regiões está a história e cultura do negro. Percebe-se que a cidade do norte paranaense muito valoriza como contribuidores da formação da cidade os povos europeus e orientais, confirmando a teoria do branqueamento (eugenista) e a dificuldade de reconhecimento de outras etnias e culturas como formadoras da identidade municipal. O negro atuou economicamente como mão-de-obra nas lavouras de café (SILVA, 2014).

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O fluxo imigratório dos negros na cidade de Londrina se deu entre as décadas de 1940 e 1980. Internamente os negros migraram para a cidade por questões econômicas. Côrtes (ano) frisa que a década de 50 foi um “boom” no crescimento populacional, por causa da imigração interna no estado do Paraná, principalmente no norte do estado, um aumento de 70% entre 1940 e 1950. As pessoas, em sua maioria, saíram do Nordeste e zonas lestes do Brasil (principalmente Minas Gerais e Espírito Santo), por fatores de expulsão, provenientes de agentes de mudança e estagnação, com o objetivo de ascensão econômica e social, trabalhando em várias ocupações (meeiros, lavradores, trabalhadores rurais, ensacadores de café, entre outros) (PANTA, 2015). Hoje, os negros são 1/4 da população total da cidade de Londrina e situam-se nas periferias da cidade, e são os que mais têm vulnerabilidade econômica, sofrendo preconceito, desemprego, violência, discriminação e racismo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, em 2001 a população negra na cidade era 21,74% do total e em 2010 passou para 26,06%. O contingente populacional de cor parda é de 110.305 e os da cor preta de 21.791 pessoas, que somam 26% do total de 506.701 habitantes. (SILVA; PANTA, 2014)

A formação urbanística, por ser mais nova, escapa da tipologia de cidade formada no século XIX; a cidade se torna mais inclusiva referente ao século passado citando os negros e imigrantes. Porém, a ocupação da população do sul e sudeste ocorreu de forma embranquecedora, por causa da introdução tardia do trabalho escravo nas regiões e a entrada considerável de imigrantes europeus. (PANTA, 2014). Sobre isso, Hasenbalg (2005) discorre: [...] como resultado de mais de três séculos de escravidão, à época da abolição a grande maioria da população afro-brasileira permanecia, em grande parte, fora da região onde uma sociedade urbana e industrial estava em formação. A dinâmica demográfica após a abolição reforçou o padrão já estabelecido de distribuição racial [...]. Nesses sessenta anos ocorreu um leve aumento da proporção da população não-branca no Brasil subdesenvolvido. Esse mesmo período testemunhou uma tendência oposta mais rápida no aumento proporcional dos brancos no Sudeste. [...]. A tendência para a polarização geográfica ou segregação geográfica dos dois grupos raciais – que, junto com os mecanismos de discriminação, está na base da estrutura das desigualdades raciais existentes – relacionava-se às características dos movimentos de migração internacional e interna, que tiveram lugar a partir do século passado. Tais processos demográficos, longe de serem puramente espontâneos, foram condicionados por políticas públicas específicas. A esse respeito, a promoção oficial da migração europeia para atender à falta de mãode-obra no Sudeste (e especificamente em São Paulo) é de particular importância. (HASENBALG, 2005, p. 156-157)

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Para a manutenção de sua estadia, as famílias negras e pobres que chegavam em Londrina iniciaram invasões e ocupações em terrenos de origem pública ou privada nos aglomerados subnormais (assentamentos irregulares). O mapa a seguir (figura 4) mostra a atual situação da população negra na região urbana, concentrando-se mais ao norte e sul da cidade, ou seja, regiões periféricas pobres e estigmatizadas, reflexo da ocupação histórica dos imigrantes negros. Panta (2015) afirma que: É importante ressaltar que no maior assentamento urbano de Londrina, o Jd. União da Vitória, iniciado em 1985, o negro está presente em mais de 35% da área e, nas ocupações precárias mais recentes, essa tendência persiste. No Jd. São Marcos, por exemplo, assentamento urbano iniciado em 1997, o negro também ocupa mais de 35% do lugar. Nos territórios mais consolidados e de maior prestígio social a presença negra é ínfima. (PANTA, 2015, p. 61)

Figura 4 – Distribuição da população negra na cidade de Londrina (Região Urbana) 2010

Fonte: Silva e Panta (2014).

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2.3 TERRITÓRIOS NEGROS O território é um conceito vasto interpretado em diversos aspectos e utilizado em vários campos da ciência: Urbanismo, Geografia, Sociologia, entre outros. Para Claude Raffestin (1993) é fundamental distinguir a diferença entre espaço e território. O espaço não pode ser alterado, por questões sociais, econômicas, políticas e culturais. Já o território surge a partir do espaço, promovendo alterações abstratas: “ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator ‘territorializa’ o espaço (RAFFESTIN, 1993, p. 143). Para entender a formação dos territórios também é essencial compreender como a teoria eugenista interferiu através do processo de “embranquecimento”, por meio de várias constantes: mistura de costumes brancos por povos de origem negra, ou pelo clareamento da população através da miscigenação da imigração de outras etnias, ou políticas para a promoção deste processo (GHIRELLO, 2018). Deste modo, o território consiste em lugares onde os corpos negros estão (ou estiveram) presentes em sua formação, ou também onde manifesta-se a cultura de matriz-africana. Segundo Rolnik (1989), a formação dos territórios negros não pode ser comparada como nos Estados Unidos, em que a separação racial e territorial ficou nítida, formando os “guetos” urbanos, seja por afrodescendentes, latinos ou asiáticos. Diferentemente no Brasil, que aconteceu de forma mais heterogênea,

porque esses territórios não foram unicamente formados por negros; os quilombos também acolhiam pessoas pobres de outros grupos raciais. Também há diferenças em suas formações quanto a questão espacial: enquanto nos Estados Unidos são formados por bairros inteiros, no Brasil os territórios negros são pontuais como: praças, ruas, construções (ROLNIK,1989). Nas cidades, os territórios negros são transformados em um único corpo através de sua ancestralidade africana. Já que as comunidades negras não eram acolhidas pelo o contexto social, nesses espaços eles criaram ligações de suas raízes simbolizando um lar ideal imaginário, África. Estes espaços podem ser divididos em 4 acontecimentos: lazer, moradia, trabalho e religião, de acordo com a proposta de análise de Ghirello (2018) seguindo os estudos de Rolnik (1989).

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Figura 5 – Festa do Bonfim (1946-1962) - Pierre Verger Dentre os territórios surgidos a partir dos territórios de lazer está o footing (pontos de encontro), onde homens e mulheres cruzavam vários caminhos a fim de encontrar parceiros amorosos nos lugares públicos (ROLNIK, 1989). Hoje podem ser classificados como os terreiros e escolas de samba, terreiros de jongo, campos de futebol, salões de baile, bailes funk, bares, hip-hop e quintais de pagodes.

Fonte: Pierre Verger. Disponível em: <http://culturadigital.br/construindoosom/files/2010/ 05/314542.jpg>. Acesso em: nov. 2018.

Figura 6 – Moças na Janela, 1950, Salvador Aos territórios da moradia estão os cortiços e porões que ficavam escondidos, formados por negros libertos em bairros pobres próximos aos seus trabalhos, restando a atividade doméstica nos casarões nos centros das cidades. Com o processo higienista das cidades, eles foram expulsos e houve a criação das periferias, composta por uma população negra de baixa renda (ROLNIK, 1989).

Fonte: Pierre Verger. Disponível em: <https://colecaopirellimasp.art.br/autores/33/obra/152>. Acesso em: nov. 2018

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Figura 7 – Danças de candomblé (1946-1962) Os territórios das religiões de matriz africana são os terreiros de candomblé, umbanda e quimbandas. Os negros também formavam rodas em frente às igrejas para batucar em prol das irmandades negras, como Santa Ifigênia, Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, exemplos do processo de embranquecimento cultural na religião, associando santos negros para catequizá-los (OLIVEIRA, 2006).

Fonte: Pierre Verger. Disponível em: <https://cdn.traveler.es/uploads/images/thumbs/ 201307/ pierre_verger_c_fundacao_pierre_verger_4011_630x631.jpg>. Acesso em: nov. 2018.

Figura 8 – Baiana E, por fim, os territórios ligados ao trabalho eram as ruas da cidade ocupadas por escravos libertos e de ganhos durante o processo abolição. Estes vendiam ambulantemente manufaturas de origem cultural africana (ROLNIK, 1989), além de outros produtos como hortaliças, verduras, laticínios e frutas, muitas vezes cultivadas nos próprios terreiros das senzalas e quilombos e levados para as cidades. Logo após a abolição vários continuaram a comercializar seus produtos criando quitandas, barracas e cangalhas (GHIRELLO, 2018). Fonte: Pierre Verger. Disponível em: <https://i.pinimg.com/564x/f0/ce/1c/f0ce1c9aae824 bd639b0a263eb0e267d.jpg> Acesso em: nov. 2018

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Estes territórios sempre foram alvo principal das reformas urbanas, marcados pela marginalização e estigmatização através da segregação racial do espaço urbano da cidade, discriminação e dominação branca. Rolnik (1989) menciona que: O estigma foi formulado a partir de um discurso etnocêntrico e de uma prática repressiva; do olhar vigilante do senhor na senzala ao pânico do sanitarista em visita ao cortiço; do registro esquadrinhador do planejador urbano à violência das viaturas policiais nas vilas e favelas. (ROLNIK, p. 15, 1989)

Para exemplificar os territórios de resistência negra na cidade de Londrina, Jamile Carla Baptista (2015), em sua dissertação de mestrado, fez o mapeamento dos terreiros de matriz africana na cidade. Notou-se que estes espaços não estão localizados nas áreas centrais: Pode-se destacar que o fato de não se conseguir encontrar nenhum terreiro de candomblé na região central da cidade deve ao que já foi explicitado em capítulos anteriores. É renegado qualquer tipo de culto dessas religiões no centro das cidades, onde se encontram apenas religiões que não estejam ligadas às religiões de matriz africana. A essas religiões é deixado como local de culto a periferia, na qual elas tentam interagir de maneira positiva com o espaço e com a comunidade. (BAPTISTA, 2015, p.70)

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3 O NÚCLEO E AFINS 3.1 NEAB Na década de 50 do século XX iniciaram-se os estudos referente realidade racial no Brasil, impulsionada pela intolerância gerada na Segunda Guerra Mundial. A entidade internacional United Nation Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas - UNESCO), decide financiar o Projeto Unesco, no qual realizava estudos a fim de entender se o processo de mestiçagem de raças acontecia de forma harmônica e sem preconceitos. Estes configuraram importantes contribuições para as análises raciais na academia (REZENDE; PEREIRA, 2015). Sendo assim, o NEAB surgiu nas unidades de ensino superior no ano de 1959 através do CEAO (Centro de Estudos Afro-Orientais) da UFBA, visando o combate ao racismo e a luta por um país mais igualitário. Após este acontecimento outras IES (Instituto de Ensino Superior) inseriram o núcleo em seus campi. Como reflexo da militância do movimento negro, que desde a década de 30 denunciava as práticas relacionadas ao racismo e o mito da democracia racial – mostrando que a cor da pele e características fenotípicas são indicadores de discriminação racial e indicador de classes – aliou-se aos compromissos do governo federal, impulsionando a criação da lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira em todas as escolas públicas e particulares do ensino fundamental até o ensino médio, além de instituir o Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, homenagem a morte de Zumbi do Quilombo dos Palmares. A respeito da implantação dos NEABs nas universidades, pode destacar: [...] três fatores que serviram como pano de fundo para os NEABs do início do século XXI: (1) a implantação e implementação da lei 10639/03, (2) os programas de ações afirmativas e (3) a emergência do negro como beneficiário das políticas educacionais e a chegada de um novo alunado no ensino superior. Essas medidas têm modificado as práticas educativas nos diferentes níveis de ensino transformando currículos, práticas escolares, criando campanhas e ações contra o racismo e de combate à desigualdade, enfim colocando o debate nas ruas, envolvendo a todos. Neste contexto de reconhecimento da diversidade e de combate às práticas racistas, os NEABs são vistos como o parceiro privilegiado na proposição, no debate e na tomada de decisão em direção às medidas de inclusão. (REZENDE; PEREIRA, 2015, p.10)

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3.2 NEAB NA UEL Na Universidade Estadual de Londrina o órgão foi inaugurado em 1985, como o Núcleo de Estudos Afro-Asiáticos (NEAA) pelo professor da comunicação Eduardo Judas Barros. Localizava-se ao lado dos bancos, atual ARI (Assessoria de Relações Internacionais). Em 2006, o NEAB logrou para o CTU (Centro de Tecnologia e Urbanismo), e desde então ocorreram nove mudanças de sua sede; hoje em dia ele situa-se no CLCH (Centro de Letras e Ciências Humanas) há 2 anos. O núcleo é muito importante para a universidade, pois várias atividades de pesquisa, ensino e extensão são desenvolvidas como: pesquisas relacionadas à população afro-brasileira e os africanos; atuação como extensão promovendo aulas e cursos de formação continuada para os professores de escolas da rede básica de ensino; participações e publicações em convênios nacionais e internacionais com universidades e congressos. Projetos como o PROPE (Programa de Apoio ao Acesso e Permanência) e o LEAFRO (Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros) visam o ingresso à universidade para estudantes de escolas públicas das periferias da região metropolitana de Londrina, e são vinculados ao NEAB. Existem estudantes bolsistas em projetos vinculados ao próprio núcleo coordenados por vários professores da UEL. O NEAB atua com papel fundamental na manutenção das ações afirmativas da Universidade Estadual de Londrina e participação na avaliação do ingresso de estudante pelo sistema de cotas.

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Atualmente uma nova sede está sendo construída na UEL em frente ao calçadão, por meio da montagem de uma casa histórica típica londrinense em madeira doada para UEL no ano de 2008. Por meio de contribuições voluntárias, a casa está na etapa de finalização. A nova sede chama-se Casa Dona Vilma: Yá Mukumby. A homenageada com o nome da casa do NEAB foi importante militante do movimento negro londrinense, lutando para a desconstrução do racismo e da discriminação racial, tal como Marielle Franco, deputada e militante a favor da desmarginalização do povo preto. Ambas são um reflexo do fortalecimento e resistência do movimento negro brasileiro nas últimas décadas. Porém, elas não estão mais entre nós, ambas vítimas do genocídio negro. Figura 9 – Marielle Franco, presente!

Figura 10 – Dona Vilma - Yá Mukumby, presente!

Fonte: Agência Noticia das Favelas. Disponível em: <https://www.anf.org.br/ent revista-marielle-franco/>. Acesso em: set. 2018.

Fonte: Milton Dória. Acervo pessoal. Disponível em: <http://www.uel.br/ neab/pages/ arquivos/Livro_dona_vilma_final_13_11%5B2%5D.pdf> Acesso em: set. 2018.

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3.3 AFRICANIDADES EM LONDRINA O cenário cultural londrinense possui vários grupos com a vertente afro-brasileira. Dentre estes estão: Maracatu Semente de Angola, Pisada da Jurema, Samba da Madrugada, entre outros. Procura-se aqui relatar as manifestações existentes no município como diretriz e contextualização projetual, propondo a ocupação destas nas novas instalações do projeto. O Maracatu Semente de Angola, oriundos do grupo de percussão Lata foi fundado em 2010 sendo apadrinhado pela Nação Maracatu Porto Rico, Recife-PE e pela líder do movimento negro Dona Vilma Yá Mukumby. Responsável por disseminar a expressão popular, o ritmo simboliza as tradições de coroar os reis e rainhas da África. A tradição é um segmento profano do candomblé, pois ocupam lugares não sagrados como os espaços da cidade (ruas), mas com a religiosidade e energia dos orixás que acompanham. O grupo, além de apresentações, realiza oficinas formativas através de toques percussivos, danças, confecção de instrumentos e debates sobre a cultura afro-brasileira, ofertadas para a população em geral, inclusive crianças e adolescentes. Figura 11 – Grupo de Maracatu Semente de Angola nas ruas de Luiz de Sá

Fonte: Fabio Alcover. Disponível em: <https://www.bonde.com.br/img/bondenews/ 2016/05/ img_1_72_8119.jpg> Acesso em: set. 2018.

Formado em Londrina em 2013, o grupo Pisada da Jurema traz para a população londrinense algumas práticas culturais de matriz africana, como o jongo, recriando as tradições rítmicas orais. Por meio do giro das saias, dança de pés no chão e a música de raiz o grupo, formado unicamente por mulheres, carrega a brasilidade em seus corpos. Carregado por africanos do grupo etnolinguístico banto para a costa do Sudeste na primeira metade do século XIX, a manifestação integra canto, dança circular e bateção de tambores, ocupando as senzalas de cana-de-açúcar e de café (CARDOSO, 2018 apud MARUON, 2013, p. 25). 34


Figura 12 – Pisada da Jurema no calçadão de Londrina

Fonte: Festival de Dança de Londrina. Disponível em: <http://www.festivaldedancadelondrina. art.br/ 2015/fotos/no-giro-das-saias-pisada-da-jurema> Acesso em: set. 2018

A cultura do samba brasileiro já existia no país antes do século XIX, com sua origem nas práticas culturais dos povos da região centro-sul da África. A imensa variedade de cantos e danças, instrumentos e ritmos foram trazidos pelos negros por conta do trabalho escravo. As festas nas casas das tias baianas foram fundamentais para a resistência do samba e o batuque ali ecoava. Estas festas acontecem atualmente, sendo símbolo da preservação de nossa cultura. O Samba da Madrugada é uma importante manifestação negra de Londrina, e Soares (2018) explica a festa: O samba da madrugada tem 4 anos de duração. E primeiramente era uma festa despretensiosa que em sua origem aconteceu porque meus pais vieram do Rio para Londrina. [...] realizamos a primeira edição. Contando com mais de 600 participantes. [...] Hoje em dia, acredito que viramos a maior referência do samba na cidade e acredito que é uma forma de difundir ainda mais a nossa cultura negra, exaltando compositores, intérpretes e cantores negros. (SOARES, 2018).

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Figura 13 – Samba da Madrugada

Fonte: Sympla. Disponível em: <https://images.sympla.com.br/5aec9ea53a6e0.jpg>. Acesso em: set. 2018

A cultura do samba brasileiro já existia no país antes do século XIX, com sua origem nas práticas culturais dos povos da região centro-sul da África. A imensa variedade de cantos e danças, instrumentos e ritmos foram trazidos pelos negros por conta do trabalho escravo. As festas nas casas das tias baianas foram fundamentais para a resistência do samba e o batuque ali ecoava. Estas festas acontecem atualmente, sendo símbolo da preservação de nossa cultura. O Samba da Madrugada é uma importante manifestação negra de Londrina, e Soares (2018) explica a festa:

4 AVALIAÇÃO PÓS-OCUPAÇÃO DAS EDIFICAÇÕES – APO Para melhor entendimento do tema e espaço do núcleo, foi realizado o trabalho da disciplina Avaliação Pós-Ocupação das Edificações (5ARQ098) do 5° ano de Arquitetura e Urbanismo na antiga sede do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) no CLCH, sala 125. O trabalho teve como objetivo principal a aplicação dos conceitos e procedimentos metodológicos, a fim de incorporar no projeto aspectos mais interessantes e relevantes dos resultados. Ajudará também no dimensionamento do programa, localização do terreno de acordo com a necessidade de acesso, entre outras decisões. As metodologias utilizadas foram as de observação (ponto de vista do especialista) - walkthrough e as entrevistas/questionários (ponto de vista do usuário). Com o walkthrough, metodologia em que o técnico detecta os elemen36


tos mais essenciais através da observação, fez-se registros através de fotos, imagens, croquis e textos explicativos. A entrevista foi feita com a coordenadora do NEAB de forma estruturada, ou seja, todas as perguntas já estavam pré-formuladas e selecionadas. Já os questionários foram desenvolvidos em dois grupos específicos. Um tipo de questionário foi aplicado na comunidade acadêmica (31 questionários respondidos) para descobrir a relevância do NEAB na UEL, e outro foi aplicado no próprio núcleo (21 questionários respondidos) para desenvolvimento do trabalho. O relatório desenvolvido na disciplina de Avaliação Pós-Ocupacional foi fundamental para a percepção do autor referente ao ambiente construído do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros, detectando as possíveis diretrizes para o seu projeto de TFGI. Entre elas estão: Ventilação: De acordo com os gráficos e vivência no espaço do NEAB, percebe-se a falta de ventilação. Apesar das aberturas serem favoráveis para a melhor ventilação do ambiente (leste à oeste), o tamanho das aberturas não aproveita ao máximo as passagens dos ventos. A esquadria voltada à leste possui um peitoril menor, ou seja, a janela possui uma área maior para permitir que os ventos percorram. Já as janelas voltadas a oeste (entrada) não possuem a mesma área, dificultando a ventilação cruzada. Ao longo do walkthrough percebeu-se que a maioria das janelas estavam fechadas impossibilitando a circulação dos ventos, ou seja, precisa também da conscientização dos usuários para abrirem as janelas. Uma boa solução para a falta de ventilação seria o mesmo tipo de esquadria para ambas paredes (oeste e leste), aumentando o nível e velocidade dos ventos, evitando o uso do ar-condicionado. Ruídos Externos: Um dos problemas apontados na entrevista e resultados dos questionários são ruídos externos, elencado como o 4° pior aspecto pelo questionário aplicado no NEAB (figura 14). Por sua localização ser em cima de vários centros acadêmicos do CLCH, no qual ocorrem atividades de convivência e interação entre os alunos, sempre geram barulhos. Visto que o núcleo possui atividades que exigem silêncio e concentração, como leituras, reuniões e atendimentos ao público, os ruídos atrapalham diretamente as atividades. Nota-se que a sala no qual foi escolhida o NEAB está mal posicionada, e que a sala escolhida poderia ser mais distante dos centros acadêmicos do CLCH. Portanto, a melhor opção é o remanejamento da sala.

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Figura 14 – Questão 3

Fonte: o autor.

Visto que o núcleo possui atividades que exigem silêncio e concentração, como leituras, reuniões e atendimentos ao público, os ruídos atrapalham diretamente as atividades. Nota-se que a sala no qual foi escolhida o NEAB está mal posicionada, e que a sala escolhida poderia ser mais distante dos centros acadêmicos do CLCH. Portanto, a melhor opção é o remanejamento da sala. Falta de Espaços: Analisando as fotos, verificou-se que o núcleo abriga várias atividades em uma única sala, que poderiam ser trabalhadas de forma separada ao longo do ambiente (biblioteca, secretaria, sala de reuniões, recepção, depósito). Todos esses ambientes possuem caráter distintos: público e privado, mas todos estão no mesmo lugar, gerando fluxos conflituosos. Já na análise do gráfico abaixo (figura 15) nota-se a real necessidade de espaços para acontecer as atividades do núcleo, visto que todos os itens se encontram acima da média. Basicamente empatados, a área de convivência e a biblioteca são os lugares mais solicitados. A área de convivência é inexistente na atual sede do NEAB e a biblioteca é pequena. Uma diretriz projetual é ter outros espaços e salas individuais para que os fluxos não entrem em conflito. Gráficos questionando o interesse sobre a cultura afro-brasileira foi importante para a formulação dos espaços do projeto. Nota-se que todos os itens estão acima da média (5,5). De acordo com o gráfico abaixo (figura 16) o item mais votado foi a culinária. 38


Figura 15 – Questão 4

Fonte: o autor.

Figura 16 – Questão 5

Fonte: o autor.

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Iluminação Natural: Notou-se que o brise do prédio não faz um bom bloqueio do sol, pois a maioria das salas do centro possuem uma película no vidro para barrar a incidência solar. Pode-se ter um resultado eficiente durante a manhã, mas ao longo do dia a falta de iluminação à leste deixa a sala escura. Como diretriz pede-se por utilização de outros elementos flexíveis como cortinas e persianas, para que o ambiente fique mais iluminado durante o dia todo e use menos iluminação artificial. Comunicação Visual: No primeiro contato com o NEAB, através do Walkthrough notou-se a possibilidade de criar alguns meios de comunicação visual, como placas explicativas ou marcos referências para orientação do público em direção ao núcleo. Visibilidade do NEAB: A principal problemática é a visibilidade do NEAB na UEL. Segundo os dados, existem pessoas que ainda não conhecem o núcleo e seus programas como extensão para a população externa. Sua localização é a principal causa, pois está escondido em uma sala de aula. Portanto, é importante a realocação em um lugar que dê mais visibilidade para a comunidade universitária, pois o órgão merece um destaque maior na vida do campus. O gráfico a seguir (gráfico 4) mostra que entre os lugares mais frequentados da UEL estão o Restaurante Universitário e Calçadão, ou seja, são os lugares mais vistos e lembrados da universidade. Estes servem como justificativa para a escolha do terreno; próximo a estas áreas seria possível mais visibilidade para o núcleo. Figura 17 – Questão 7

Fonte: o autor.

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Portanto, a atual sede localizada sala do CLCH, de acordo com as análises, mostram que os aspectos arquitetônicos e espaciais necessitam melhoramento ou transformações mais incisivas, como a realocação do núcleo. A mudança para a nova sede neste ano, traz uma maior expressividade acadêmica, por causa da localização privilegiada (calçadão). Porém, existem ainda necessidades dos espaços solicitados supracitados, como o espaço de convivência, anfiteatro, salas de aulas e multimeios.

5 ESTUDOS DE CASOS 5.1 RESIDÊNCIA DO NOVO ARTISTA NO SENEGAL Inaugurada em março de 2015, foi projetado um novo centro cultural na vila rural em Sinthian de 1.050m², no sudeste do Senegal, pela arquiteta nova-iorquina Toshiko Mori. A obra é pensada para completar as clínicas existentes, jardim de infância e as escolas rurais. Pensado como residência de artistas locais e senegaleses, além de outros do mundo inteiro, como escultores, fotógrafos, pintores, escritores, coreógrafos, músicos e dançarinos, que são convidados para viver e ensinar culturas e acontecer intercâmbios, mostrando que existe arte também em outros lugares, assim como as capitais urbanas ocidentais.

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Figura 18 – Planta de Implantação

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa574e58ece792b000020-site-plan>. Acesso em: maio 2018, editado pelo autor.

Figura 19 – Planta Baixa - Pavimento Térreo

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa56de58ecee4f100001a-floor-plan> Acesso em: maio 2018, editado pelo autor.

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Com uma planta espelhada invertida, o centro possui dois núcleos com os mesmos programas. Os dois pátios centrados internos que se abrem para o céu possuem formato elipsoidal, atuando como forma simbólica no programa, revivendo a características dos tradicionais encontros das comunidades africanas como as rodas de dança – baterias e contação de histórias, direcionando a visão de um modo circular para um grupo de pessoas ou um único artista. Figura 20 – Pátio Interno - roda de dança

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa4dbe58ece792b00001d-sinthian_tma_7772-jpg> Acesso em: maio 2018.

Em torno dos pátios centrais ocorrem as outras atividades do Centro Cultural. Nas duas extremidades, há um núcleo para a hospedagem de artistas, em que se localiza o dormitório, banheiro e cozinha. Logo acima há uma área destinada a workshops, de forma flexíveis. No centro localiza-se o espaço de recolhimento, que marca as duas entradas principais, se distribuindo por todo o edifício. Com o intuito de valorizar a cultura esquecida desta parte da África Ocidental, o projeto recebe encontros para feiras, educação, danças, apresentações e reuniões. O layout proposto pela arquiteta se torna dinâmico para realizar estas atividades, de acordo com a necessidade do evento. Sendo assim, ela propõe quatro opções:

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Figura 21 – Diagramas das atividades

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com/786190/interview-with-toshiko-mori-rather-than-working-with-forms-we-work-with-forces/571d94ebe58ece73af00001f-interview-with-toshiko-mori-rather-than-working-with-forms-we-work-with-forces-photo>. Acesso em: maio 2018, editado pelo autor.

Analisando em questões de uso público x privado, percebeu-se que o espaço do edifício é majoritariamente público. Os acessos principais acontecem de modo transversal cruzando o projeto, e por meio do espaço de acolhimento, são direcionados para os pátios centrais. Os dormitórios destinados aos artistas são os únicos lugares de uso privado.

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Figura 22 – Público e Privado

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa56de58ecee4f100001a-floor-plan> Acesso em: maio 2018, editado pelo autor.

O edifício foi construído utilizando materiais e mão-de-obra locais. Basicamente, as paredes são feitas em tijolos de barro formados in-loco com participação da comunidade local, e o telhado tradicional ganha uma nova interpretação com o desenho orgânico de Mori. Com bambu de origem local, utiliza-se técnicas de amarração japonesa realizando uma troca de culturas. Já o sapê é cultivado na região, tornando a solução de baixo custo e sustentável.

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Figura 23 – Construção do telhado com mão-de-obra local

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa3fae58ece8129000022-process2-png>. Acesso em: maio 2018

Figura 24 – Elevações

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa566e58ece812900002b-elevation>. Acesso em: maio 2018.

O telhado inclinado recolhe aproximadamente 40% da água pluvial, destinada para uso doméstico dos moradores. Para resolver a ventilação natural, a arquiteta utiliza elementos vazados com os próprios tijolos, a fim de criar uma chaminé, fazendo com que o ar fresco entre e resfrie o ambiente e o ar quente saia pela soltura da estrutura do telhado. 46


Figura 25 – Detalhe de Ventilação Natural - Captação da Água Pluvial

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa570e58ece812900002c-section>. Acesso em: maio 2018.

Figura 26 – Vista Externa

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori/54ffa4aae58ece792b00001c-sinthian_tma_6410-jpg>. Acesso em: maio 2018.

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5.2 CENTRO DE OPORTUNIDADES PARA MULHERES (COM) Este projeto escolhido como correlato é um o Centro de Oportunidades para Mulheres em Kayonza, Ruanda, criado em 2013 e apoiado pela ONG global Women for Women International (WfWI). O espaço de 2 hectares tem como autora a arquiteta Sharon Davis. É um equipamento multiuso criado para enfrentar a pobreza e os efeitos do genocídio, capacitando as mulheres através da educação a descobrirem novas habilidades para a geração de empregos. O centro capacita mais de 300 mulheres por ano, mudando a vida de 28 mil mulheres na região. Figura 27 – Implantação - Zoneamento

Fonte: Detail. Disponível em: <https://www.detail-online.com/fileadmin/_migrated/pics/ womens_opportunity_centre_18_site_map_01.jpg> Acesso em: set. 2018, adaptado pelo autor

O programa de caráter multiuso reúne espaços em uma vila de pavilhões dispostos no terreno: serviços de alojamento e restaurante para turistas, aluguel de espaço para as organizações parceiras, armazenamento e espaço de trabalho para locação, espaço para eventos, fazenda de demonstração e mercado de varejo para pequenas empresas locais. O fluxo de pessoas é bem dinâmico por todo o terreno, e os caminhos que ligam os blocos promovem trocas de conversas e conhecimento entre as mulheres. 48


Figura 28 – Implantação - Acessos

Fonte: Detail. Disponível em: <https://www.detail-online.com/fileadmin/_migrated/pics/ womens_opportunity_centre_18_site_map_01.jpg> Acesso em: set. 2018, adaptado pelo autor

Analisando os acessos nota-se a hierarquia da circulação. Na via principal fica a entrada destinada ao público e para automóveis, ambas controladas por uma guarita. Logo por essa entrada chega-se na administração e recepção. No mesmo eixo existe a entrada para o mercado público. O acesso ao público também acontece por um lado entrando diretamente na sala de workshops, e no outro o acesso para o alojamento. Seguindo reto encontra-se um acesso para serviços atendendo a fazenda /horta comunitária e o restaurante.

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Figura 29 – Participação da comunidade na construção

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-123677/centro-de-oportunidade-para-mulheres-em-ruanda-slash-sharon-davis-design/51b06883b3fc4bbb7a0001f5-women-s-opportunity-center-in-rwanda-sharon-davis-design-photo>. Acesso em: set. 2018.

Conforme mostra a figura acima (figura 23), nota-se que os blocos atuam como uma referência de aldeia vernacular sendo ligadas por vários caminhos, fazendo com que o usuário percorra por todo o complexo como uma comunidade com segurança e na escala do pedestre. As formas circulares são desenhadas de acordo Palácio do histórico de King, no sul da Ruanda. Figura 30 – Vista noturna dos blocos

Fonte:

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AzureMagazine. Disponível em: <https://www.azuremagazine.com/article/womens-opportunity-center-in-rwanda/>. Acesso: em set. 2018.


Os materiais utilizados são padrões locais e sustentáveis. As paredes são feitas por tijolos de barro perfurados confeccionados pelas próprias usuárias do COM. Este elemento atua como refrigeração passiva e proteção solar, mantendo a privacidade de cada bloco. Nos edifícios como a administração os tijolos são rebocados e tem a ventilação por meio das esquadrias. Figura 31 – Esquema Iluminação e Ventilação Natural

Fonte: Detail. Disponível em: <https://www.detail-online.com/article/womens-opportunity-centre-in-rwanda-16614/>. Acesso em: set. 2018.

Os elementos vazados dos pavilhões realizados com os próprios tijolos retomam a solução arquitetônica tradicional. A incidência de luz acontece de modo difuso e suave, entrando aos poucos no Centro Cultural. Na imagem abaixo (figura 32) tem-se o exemplo da arquitetura tradicional de uma residência em Malawi. Figura 32 - Solução arquitetônica - ventilação (Malawi)

Fonte: African Vernacular Architecture Data Base. Disponível em: <http://www.africavernaculararchitecture.com/malawi/>. Acesso em: maio 2018.

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Figura 33 – Cortes - Cozinha

Fonte: World-Architects. Disponível em: <https://www.world-architects.com/en/architecture-news/reviews/women-s-opportunity-center>. Acesso em: set. 2018.

O projeto teve em sua concepção a preocupação sustentável. O complexo semi-rural possui banheiros de compostagem simples, que reduzem o consumo de água. Além disso, existem sistemas de purificação da água, geração de energia solar, combustível de biogás para cozinhar e produção de fertilizantes naturais para a suprir a demanda fazenda. O sistema de cobertura é realizado de forma simples e barata, e estruturas em ferro corrugado garantem o sombreamento e proteção da chuva. Aproveitando a sua inclinação, o telhado capta água pluvial, que pode ser armazenada e usada pelas 300 mulheres ao longo do ano. Figura 34 – Vista do complexo

Fonte: Archdaily. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-158650/centro-de-oportunidade-para-mulheres-slash-sharon-davis-design/524af572e8e44eff020003a4-women-s-opportunity-center-sharon-davis-design-photo>. Acesso em: maio 2018.

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5.3 CASA DO BENIN Neste correlato interpretou-se a abordagem estética da arquiteta Lina Bo Bardi ao restaurar um edifício, preocupando-se em manter a memória e identidade afro-brasileira. Situada na ladeira do Pelourinho em Salvador - Bahia, configurada por um sobrado de esquina, a obra recebe o nome de Casa do Benin (país berço da maior parte dos escravos levados para a Bahia). O escritório da arquiteta Lina Bo Bardi projetou um espaço para receber a exposição com objetos recolhidos por toda a região do Golfo do Benin (antigo Daomé) pelo o antropólogo-etnólogo francês e baiano por adoção Pierre Verger, para estreitar relações culturais entre Brasil e África. O edifício original pegou fogo em 1978. Sendo assim, a recuperação do edifício consistiu em incorporar uma linguagem moderna nas linhas clássicas de restauração estrutural, sem tirar a essência que ela impregna. Os vestígios da fachada foram totalmente respeitados, mas o interior possui novos elementos contemporâneos da arquitetura para fazer o restauro, como estruturas e paredes pré-fabricadas, lajes isostáticas modulares, placas duplas, corrugadas, na parede estrutural da fachada voltada ao Jardim do Benin. Figura 35 – Fachada Casa do Benin.

Fonte: Salvador, a Roma Negra - Vitruvius. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/ revistas/read/arquiteturismo/01.008/1368>. Acesso em: fev. 2018

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Figura 36 – Interior Casa do Benin

Fonte: Leonardo Finotti. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Casa_ do_ Benin_03.jpg>. Acesso em: fev. 2018.

No Interior, seu teto é recoberto por várias mantas e recortes de panos estampados remetendo ao bogolan, utilizados pelos os malinkes, que moravam em Mali. Estes eram confeccionados por tecelagem de algodão e tinham grafismos variados, pintados todos a mão com tinturas vegetal a base de raízes e folhas. O bogolan carrega uma simbologia e gramática tradicionais locais. Na releitura proposta por Lina, os tecidos coloridos e geométricos contrastam com os revestimentos propostos em sua intervenção. Figura 37 – Tecido pendente no interior

Figura 38 – Produção do bogolan.

Fonte: Leonardo Finotti. Disponível em: <http://www.leonardofinotti.com/projects/casa-do-benin/image/00515-170804-020> Acesso em: fev. 2018.

Fonte: Valérie Barkowski. Disponível em: <https://valeriebarkowski.com/wp-content/ uploads/2017/08/bogolan-african-textile-inspiration-painting-3.jpg>. Acesso em: fev. 2018.

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Os pilares de concreto (figura 39) na restauração são revestidos, trançados a mão com fibras de palmeiras e cocos, remetendo ao artesanato local (cestas africanas), aliviando também o peso do concreto no espaço, dando uma vontade de tocar, por ser um material áptico. Figura 39 – Pilares Museu do Benin

Fonte: WikiMedia. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Casa_do_ Benin_03.jpg>. Acesso em: fev. 2018.

No pátio interno localiza-se um edifício destinado a reuniões comunitárias e eventos. De planta elipsoidal, a obra remete à cabana primitiva africana de formas circulares, assim como a da cultura banto, originária de países como o Moçambique e da Angola, nos quais suas casas (cubatas) são com planta circular empregada pelos nômades que habitavam os países periféricos. As construções desta civilização eram feitas com paredes de palha e paua-pique e o acabamento era feito de modo grosseiro. Recobriam somente com o barro amassado puro ou misturado com esterco de vaca por suas qualidades inseticidas. Esteticamente poderiam ser esculpidos ou pintados (WEIMER, 2005). Esses acabamentos possuem tons terrosos e as cores puxam para o castanho, mas também eram utilizadas cores mais vivas, como o vermelho e azul.

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Figura 40 – Vila de cabanas primitivas africanas

Fonte: African Vernacular Architecture Data Base. Disponível em: <http://www.africavernaculararchitecture.com/benin/>. Acesso em: fev. 2018.

Assim como a figura 40 é perceptível a semelhança entre a cobertura primitiva com o restaurante do Benin, figura 41. Segundo Weimer (2005) “sua estrutura era montada no solo e, depois de devidamente contra ventada, era elevada e colocada sobre a parede. A vedação era feita com folhas de palmeiras ou, por vezes, de junco.” (WEIMER, 2005, p. 124). No restaurante nota-se que as paredes não tocam na estrutura da cobertura, deixando um espaço para ventilação e iluminação natural, e palha da cobertura é amarrada em ripas horizontais, medida contra possíveis ventanias. Figura 41 – Restaurante do Benin.

Fonte: Correio 24 horas. Disponível em: <https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/linabo-bardi-a-arquiteta-que-atrai-o-mundo-para-a-bahia-veja-obras/>. Acesso em: nov. 2018

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Uma única entrada sem nenhuma porta estabelece a relação de privado, e a arquitetura convida os povos a adentrar no espaço. Para segurar o contorno da abertura da porta, ela é totalmente queimada. O espaço se dá de modo integrado, sem divisões entre os ambientes, com a mesma entrada e saída, seguindo algumas tribos no sul da Angola. Figura 42 – Restaurante do Benin - Interior.

Fonte: Leonardo Finotti. Disponível em: <http://www.leonardofinotti.com/projects/casa-do-benin/image/00515-170804-017d>. Acesso em fev. 2018.

Segundo Weimer, a maioria dos escravos que vieram para o Brasil são provenientes de países como Angola, Guiné e a contracosta (Moçambique), países que são classificados como clima tropical, semelhante com o do Brasil. Desse modo, o paisagismo proposto no Jardim do Benin retoma algumas características da flora africana, caracterizada por florestas com vários tipos de palmeiras. As folhas da vegetação família Aracaceae (família das palmeiras e coqueiros), tem dupla finalidade: “fornecer sombra e material de cobertura e de vedação das paredes, [...] material tradicional na confecção do telhado.” (WEIMER, 2005, p.119). A arquiteta escolheu a vegetação no projeto, como vê-se em planta baixa, na figura 43. Figura 43 – Jardim do Benin - Planta Baixa (sem escala).

Fonte: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi. Disponível em: <http://www.institutobardi.com.br/obra_ lina.asp? Pagina=6&categoria=arquitetura> Acesso em: fev. 2018. 57


5.4 DIRETRIZES COLETADAS DOS ESTUDOS a) Residência do Novo Artista do Senegal: pátios centrais para a articulação do projeto; forma elipsoidal; ocupação dos pátios centrais com atividades flexíveis (feira, reunião, espaço para musicais, workshops, salas de aula, exposições; telhado tradicional africano; elementos vazados para a iluminação e ventilação. b) Centro de Oportunidades para Mulheres conceito de vila com vários pavilhões integradas por um caminho; fachada dos edifícios com tijolos entrelaçados; sinuosidade entre os caminhos. c) Casa do Benin interior - tecidos coloridos africanos, elementos que contrastam com os revestimentos; planta elipsoidal do restaurante - cabana primitiva; estrutura do madeiramento para o projeto; layout como ideia de comunidade; paisagismo tropical - palmeiras; diálogo entre a cultura africana e brasileira; diálogo entre os materiais utilizados.

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6 EM BUSCA DO TERRITÓRIO Após discussões e análises dos dados abordados no trabalho de APO, percebeu-se a importância na escolha do terreno para dar visibilidade ao Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros. A princípio realizou-se um levantamento de terrenos com as áreas disponíveis ao longo do campus universitário de acordo com as condicionantes estabelecidas que foram analisadas, como mostra o mapa (figura 44). De acordo com os estudos da Avaliação Pós-Ocupação, notou-se que o calçadão é o lugar mais frequentado no campus universitário, porque ele dá acesso basicamente a todos os departamentos. Considerou-se o novo calçadão sentido norte/sul, perpendicular ao existente, que ligará os principais pontos da Universidade Estadual de Londrina - Biblioteca Central, Restaurante Universitário e Reitoria (Setor Administrativo), de acordo com o Plano Diretor físico da Universidade de 2010-2015, elaborado pela Pró-Reitoria de Planejamento. Esses dois eixos possuem um grande potencial para a visibilidade buscada. A intenção sobre a escolha do terreno é justificada por conta da história dos territórios negros ao longo dos séculos no Brasil. Estes foram desterritorializados de seu lugar de origem (centros urbanos) e realocados nas margens da cidade, ou na formação das “novas cidades”, onde o lugar do negro estava nas periferias por causa das condições socioeconômicas. 59


Figura 44 – Mapa de Terrenos Analisados – UEL

Fonte: Plano Diretor de Desenvolvimento Físico de 2010-2015, editado pelo autor.

Desta forma, focalizou-se nos terrenos localizados na área central do campus universitário, ao longo dos dois calçadões. Descartou-se as possibilidades de implantação nas extremidades, negando a realidade das cidades onde os territórios negros estão atualmente, nas periferias. O terreno surgirá como forma de resistência da cultura afro-brasileira na universidade, retomando o lugar dos territórios negros (cortiços e terreiros), como nos séculos passados nos centros da cidade. Outra condicionante analisada foi o sistema viário. Em virtude do programa de necessidades, o restaurante possui um papel importante para o projeto, sendo realizados eventos para enaltecer a culinária afro-brasileira. Existe a necessidade da localização perto vias para tráfego de automóveis, facilitando o acesso da doca para carga e descarga dos alimentos.

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Figura 45 – Mapa Sistema Viário – UEL

Fonte: Plano Diretor de Desenvolvimento Físico de 2010-2015, editado pelo autor.

Entre os terrenos escolhidos para análise, estabeleceu-se uma numeração para cada um, explicando os terrenos descartados e o escolhido detalhadamente. O terreno de número 1, situado na mesma quadra que o Restaurante Universitário não foi escolhido por conta da sua proximidade com o edifício, visto que a área é destinada para expansão do mesmo, e também estacionamento. O terreno 2 está localizado em frente ao Restaurante Universitário, e foi descartado porque este já é destinado ao projeto da nova Biblioteca Central. O terreno 3 também foi descartado visto que está próximo ao SEBEC já ampliado. Portanto o terreno escolhido foi o de número 4.

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Figura 46 – Mapa Esquema - Análises dos Terrenos – UEL

Fonte: Plano Diretor de Desenvolvimento Físico de 2010-2015, editado pelo autor.

6.1 O ESPAÇO

A implantação escolhida para este projeto localiza-se na Zona T (Administrativo), possuindo grande potencial na malha universitária. O terreno incorpora a via de automóveis atual que será desativada, segundo o Plano Diretor Físico de 2010-2015, uma área residual. O local, além de ter uma melhor visibilidade ao NEAB por margear o futuro calçadão, estará próximo ao CLCH e ao Restaurante Universitário, respeitando o indicativo dos resultados da APO supramencionada no trabalho. Reforça-se com a escolha a necessidade de ter espaços negros nos centros urbanos, retomando a localização da população antes dos processos higienista e eugenista dos municípios no séc. XX, como Rolnik (1989) analisa na cidade do Rio de Janeiro:

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Grande parte dessa população preta e parda habitava os velhos casarões do Centro, aqui também recém-abandonados como moradia da classe dominante, que começara sua peregrinação em direção à privacidade e exclusividade da Zona Sul. Além de local predominante de moradia, era o Centro fonte de sobrevivência para ambulantes, quituteiras, pedintes, prostitutas, vendedoras etc. Era no Campo de Santana (hoje Praça da República) e nos pátios e avenidas dos cortiços, que se transformavam em terreiros de samba, jongo ou macumba, que o território negro do Rio de Janeiro se estruturava na virada do século. [...] – para que a cidade pudesse realmente assumir a imagem de bela, próspera e civilizada capital do país do futuro –, o espaço urbano central foi completamente remodelado, embelezado, ajardinado e europeizado, desenhado para uso e convívio exclusivo das “pessoas de bem”. (ROLNIK, 1989, p. 7-8)


Figura 47 – Vista do futuro calçadão para o terreno

Fonte: o autor.

Figura 48 – Croqui conceitual - escolha do terreno

Fonte: o autor.

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Figura 49 – Esquema Via de Acesso

Fonte: o autor.

O terreno escolhido terá bom atendimento do sistema viário universitário. A face leste fica voltada para o futuro calçadão, que configura o acesso principal de pedestres. A via desativada terá seu fluxo de automóveis e ônibus deslocado para uma nova via projetada de caráter secundário, em frente a Biblioteca Central e a Reitoria. Também como potencial existe a rotatória classificada como via estrutural para o acesso à carga e descarga. Figura 50 – Esquema Trajetória do Sol e Ventos Predominantes

Fonte: o autor.

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Quanto à orientação solar (figura 50), a fachada principal será em frente ao futuro calçadão que tem orientação leste, ou seja, incidência solar no período da manhã. Na orientação norte a massa arbórea da cota mais alta permite um melhor conforto térmico, impedindo a entrada direta de luz solar durante o dia nas proximidades. A oeste existe a preocupação com o sol de tarde, prevenindo com brises para barrar a incidência solar. Já o regime dos ventos predominantes é de leste e nordeste. Figura 51 – Esquema Curvas de Nível

Fonte: o autor.

O lugar situa-se entre as cotas mais altas do campus universitário, cota 600. Nestas encontram-se dois bosques com vegetação densa, podendo ser incorporada à edificação como extensão das atividades e contemplação. Como há árvores em torno da via, propõe-se a realocação destas para outros pontos da universidade, assim como a continuação de várias no projeto de acordo com partido arquitetônico.

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As matas possuem clareiras, que podem ser utilizadas para criar conexões entre a cota mais alta (600) e mais baixa (597), evitando a realocação de mais árvores. Figura 52 – Massa Arbórea do terreno e entorno

Fonte: o autor.

Figura 53 – Vista da clareira para a rua

Fonte: o autor.

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Figura 52 – Massa Arbórea do terreno e entorno

Fonte: o autor.

Outra análise realizada foi referente às alturas dos edifícios no entorno imediato. A maioria dos edifícios possuem uma tipologia térrea. Como o projeto parte do segmento de uma rua, a intenção é manter o projeto em escala adequada ao transeunte fazer o passeio arquitetônico.

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7 DIRETRIZES PROJETUAIS 7.1 O PROGRAMA O programa de necessidades para o projeto foi elaborado seguido pela ajuda da coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros, e de acordo com correlatos de centro culturais pesquisados, para subsídio do projeto. Deste modo o programa prévio estabeleceu-se da seguinte forma: a) Praça/pátio para realização de eventos culturais abertos; b) Área de exposição para obras de artes; c) Área de convivência para integração dos alunos e professores; d) Salas para aulas teóricas/expositivas e aplicação dos cursos continuados para professores da escola básica; e) Sala de Tecnologia e Internet; f) Sala de Áudio/Vídeo; g) Sala de Reuniões; h) Biblioteca para o acervo de livros e periódicos do NEAB; i) Anfiteatro para a realização de eventos com foyer; j) Área de Alimentação, com restaurante industrial para a realização de comidas típicas; k) Área administrativa com recepção, secretaria, e sala fechada para coordenadoria e gerência; l) Área de serviço, com copa/vestiários para os funcionários. m) Banheiros. n) Docas - Carga e Descarga - Estacionamento

7.2 POTENCIALIDADES - UEL Para que o projeto tenha uma harmonia estética e funcional, tentou-se compreender melhor o espaço do Campus Universitário identificando as potencialidades para que as características deste se mantenha no decorrer do tempo. Assim como disse Yamaki “preservar as vistas, o túnel verde do calçadão, os espaços livres e a harmonia do conjunto, é um desafio para a construção e manutenção do caráter do Campus.” (YAMAKI, 2008).

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Espaços Livres: Necessários, de certa forma, para preservar as características preexistentes do campus, assim como a topografia e a vegetação. Esses vazios garantem a qualidade espacial do local e os deslocamentos entre um bloco e outro, principalmente pelo calçadão, assegurando a interação entre pessoas de diferentes centros. Parte desses espaços livres são necessários para que a UEL possa ampliar seus centros quando necessário.

Figura 55 - Espaço Livre - SEBEC UEL

Fonte: Letícia Belone, 2017. Acervo pessoal.

Calçadão: o túnel de árvores que interliga o Centro de Ciências Biológicas (CCB) ao Centro de Esportes (CEFE) no sentido Leste-Oeste, passa como um eixo pelos centros de estudos e funciona como o principal meio de deslocamento de pedestres dentro do campus. Localizado no espigão do terreno, possui, quase no meio de seu comprimento, um cruzamento em T (ponto nodal) que fornece duas possibilidades: continuar em direção à oeste ou descer para sul. Nessa direção é possível visualizar o horizonte, onde o vazio dá lugar pouco a pouco a novos condomínios horizontais. Uma Perspectiva Grandiosa que relaciona o “aqui e além” produzindo sensação de imensidão e grandiosidade. Futuramente, o novo calçadão da universidade que ligará o centro de Centro de Ciências Exatas (CCE) até a nova Reitoria no eixo Norte-Sul, atuará também como uma possível potencialidade. Ao contrário do que vemos em alguns exemplos de ligações, no calçadão não encontramos um sistema hierárquico, ou seja, a padronização dos centros, seja nas texturas, seja na forma, o que faz com que nenhum assuma a posição de mais importante, garantindo unidade ao conjunto. 69


Figura 56 - Calçadão UEL

Fonte: Letícia Belone, 2017. Acervo pessoal.

Vistas: Conforme dito na análise da teoria da ligação, a UEL possui mais ligações visuais com seu entorno do que fortes ligações físicas. Estas vistas devem ser preservadas, por mais que sejam transformadas com o passar do tempo. É importante estabelecer relações com o entorno e, de algum modo, preservar as vistas existentes faz com que possamos observar as transformações. Figura 57 - Vistas UEL

Fonte: Letícia Belone, 2017. Acervo pessoal.

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Harmonia entre os centros: Como já mencionado anteriormente, a harmonia entre os centros de estudos garante certa unidade ao campus. Suas edificações de dois a três andares, com pilares e vigas de concreto, tijolinhos aparentes e esquadrias laranja zarcão conferem, de certa forma, identidade ao local. Figura 56 - texturas

Fonte: Letícia Belone, 2017. Acervo pessoal.

Blocos de madeira: Como forma de olhar para o contexto histórico de Londrina, no campus ainda existem as antigas edificações em madeira, com seus telhados cerâmicos marcantes. Ao fim do calçadão, mais a oeste do campus, localizam-se a Casa do Pioneiro, a Capela e a atual sede do NEAB, ambas em madeira que, assim como disse Yamaki (2008, pg.79) “resgatam a memória de uma Londrina que já foi considerada uma ‘cidade de madeira’”. A sede construída para o NEAB é também é feita com o mesmo material. Figura 57 - NEAB UEL

Fonte: o autor

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Pontos de Referência (marcos): Os marcos são tidos como um tipo de referência, que podem existir em diferentes escalas, sendo que na escala da cidade teriam uma certa distância entre si, servindo constantemente como símbolo de direção. Outros pontos marcantes são essencialmente locais, podendo ser avistados apenas em regiões restritas e com certa proximidade, como ocorre na UEL: Capela Ecumênica da UEL, Biblioteca Central, Painel de azulejos – Paisagem Pioneira e Restaurante Universitário. Sendo assim, o projeto usará o RU principalmente como referência por sua proximidade e, se possível, tornar-se um novo marco. Figura

60 – Capela Ecumênica - UEL

Fonte: Letícia Belone, 2017. Acervo pessoal.

7.3 PRÉ-DIMENSIONAMENTO O pré-dimensionamento estabelecido foi disposto para um universo populacional de 444 usuários e 12 funcionários, somando no total de 456 pessoas. Para melhor compreensão dos ambientes, a tabela a seguir (figura 61) foi organizada em 4 setores: cultural, acadêmico, administrativo e serviços.

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Figura 61 - Pré - Dimensionamento

Fonte: o autor.

7.4 ORGANOGRAMA E FLUXOGRAMA Através da análise do programa de necessidades, chegou-se em um organograma, mostrando hierarquicamente a importância dos ambientes e suas interdependências. Nota-se que a Convivência (eixo) é o ponto central do projeto e as outras atividades estão dispostas ao longo deste eixo:

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Figura 62 - Organograma

Fonte: o autor.

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Figura 63 - Fluxograma

Fonte: o autor.

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MEMORIAL 77


8 MEMORIAL 8.1 CONCEITO Desde a diáspora, os africanos passam por um processo de redefinição cultural, por estarem em um contexto diferente de sua raiz, precisando adaptar seus costumes e reinventar suas identidades e cultura. Através do símbolo da “mãe-terra”, existia uma relação de mistificação da África, criando ligações de origem que simbolizam um lar ideal imaginário. A identificação social entre negros e negras é local e global; a raça transforma-se em pertencimento, resistência e desprovimento. Portanto, é mais fácil os negros brasileiros se identificarem com os negros jamaicanos do que com os descendentes de europeus, apesar das diferenças culturais que cada negro carrega (NEGREIROS, 2010). Apesar das diferenças, elas são transformadas em um único território, o corpo negro. Figura 64 - Diáspora

Fonte: o autor

Sendo assim, os africanos formavam comunidades para expressar seus sentimentos, visto que não eram acolhidos no contexto da escravidão. Em busca da liberdade, fugindo dos preconceitos de raça, os quilombos são exemplos da coletividade africana por sua gênese. De acordo Ghirello (2018):

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A palavra quilombo tem origem, segundo Sommer, no dialeto no qual a palavra Kilombo se refere à cidade, capital, povoação ou aldeia. A autora aponta que a fuga para os quilombos era, no contexto do Brasil colônia, o modo mais efetivo de se opor à escravidão e que no quilombo brasileiro era uma adaptação do quilombo africano e uma negação à sociedade oficial e a à estrutura escravista, ainda que existissem trocas entre esta sociedade e estes quilombos. (SOMMER, 2005 apud GHIRELLO, 2018, p. 95)

Figura 65 – Quilombo “Buraco do Tatu”, Bahia

Fonte: Prestação de Contas - Terezinha da Paulina. Disponível em: <http://www.sudoestesp. com.br/file/colecao-imagens-periodo-colonial-bahia/671/>

Tradicionalmente, os africanos já possuem o modo de viver em aldeias, e os bantos (grupos etnolinguísticos da África) viviam em comunidades chamadas de kraal, traduzido como universalidade. Nestas comunidades moravam famílias poligâmicas em várias cubatas (cabanas primitivas africanas) com seu terreno cercado por tábuas, troncos, chapas zincadas ou cercas vivas (WEIMER, 2005). Baseados na explanação sobre os territórios negros no Brasil, propõe-se que o projeto atue e busque referências conceituais nesses lugares. Sendo assim, a nova sede para o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros concretizará a territorialidade negra no campus universitário. A ideia é que o conjunto arquitetônico não estimule a repressão racial na universidade, gerando identidade ao território, com o objetivo de criar um espaço afro-brasileiro de luta e resistência, onde as culturas possam ser transmitidas e disseminadas. Criando e recriando rotas na obra, aumentará a possibilidade de relações raciais e culturais entre as pessoas, com dinâmicas, lógicas e práticas diferentes. A aldeia atuará como componente de construção de singularidade negra que atravessa o tempo, tradição e espaço. 79


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8.2 PARTIDO A implantação desenvolve-se no sentido leste-oeste longitudinalmente. Os blocos se assemelham a uma aldeia vernacular e se distribuem no terreno com uma malha radial proveniente da floresta-mata ao lado do terreno como princípio compositivo. Figura 66 - Implantação 01

Fonte: o autor

A implantação do projeto faz referência ao candomblé afro-brasileiro, existindo dois tipos de espaço, o profano e o sagrado: um é qualificado como espaço urbano, com construções de uso público e privado (local de residência fixa ou temporária para filhos e pai-de-santo), e outro como mata-virgem, composta por árvores e fontes, fazendo referência a floresta africana, lugar sagrado para os cultos aos orixás, respectivamente (ROLNIK, 2003). As matas existentes na topografia foram incorporadas ao projeto, tornando-se espaços abertos para as pessoas experienciarem a natureza. Eventos e atividades internas podem expandir para essas áreas externas. Conceitualmente, as matas também representam o lugar de libertação e resistência dos mocambos (agrupamentos de negros fugidos) em memória do continente africano. Sendo assim, a arquitetura do projeto buscará uma continuidade da natureza sacralizada, morada dos deuses e ancestrais. Figura 66 - Implantação 02

Fonte: o autor

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Figura 67 - Diagrama Via Existente

Fonte: o autor

A via desativada no terreno dá lugar a caminhos, como os eixos retratados nas tranças-nagôs no período colonial e escravista. Através dos penteados trançados (figura 66), os escravos desenhavam e planejavam as rotas de fuga em suas cabeças para direcionar seus caminhos aos quilombos. Esses mapas na cabeça transmitiam o código somente para quem tinha o conhecimento, ou seja, a identidade/estética negra era utilizada como resistência ao sistema escravagista (SANTOS, 2017). Figura 68 - Croqui conceitual

Fonte: o autor

A partir do penteado tradicional de forma livre, transformou-se em linhas sinuosas no desenho do perímetro dos caminhos, ligando as edificações no sentido leste-oeste. Conceição Evaristo em seu poema, Para a Menina utiliza as tranças como um conector entre as questões históricas sobre os negros. 82


Para a menina Desmancho as tranças da menina e os meus dedos tremem medos nos caminhos repartidos de seus cabelos. Lavo o corpo da menina e as minhas mãos tropeçam dores nas marcas-lembranças de um chicote traiçoeiro. Visto a menina e aos meus olhos a cor de sua veste insiste e se confunde com o sangue que escorre do corpo-solo de um povo. Sonho os dias da menina e a vida surge grata descruzando as tranças e a veste surge farta justa e definida e o sangue se estanca passeando tranqüilo na veia de novos caminhos, esperança. (EVARISTO, 2008)

Figura 69 - Desenhos tranças Nagô

Fonte: Las Pretas. Disponível em: <http://laspretas.com.br/trancas-nago-as-trancas-de-raiz/>. Acesso em nov. 2018.

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Figura 70 - Diagrama - Novos Caminhos

Fonte: o autor

Os pavilhões seguem a modéstia das casas arquetípicas vernaculares africanas. Uma forma simples, em que a planta circular era utilizada nas edificações da cultura banto (as cubatas), casas de um único cômodo com cobertura cônica. O círc;ulo foi inspirado também nos tradicionais encontros das comunidades negras: rodas de contação de histórias, de samba, de fogueira, batuques, danças, capoeira, entre outros, direcionando o foco para um intérprete singular ou para um grupo de artistas. A gira de ogum, A gira de xangô.

Ciranda de roda De samba de roda da vida Que girou, que gira Na roda da saia rendada Da moça que dança a ciranda Ciranda da vida Que gira e faz girar a roda Da vida que gira (...) Roda Ciranda – Martinho da Vila

Figura 80 - Croqui conceitual

Fonte: o autor

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Figura 81 - Diagrama - Circularidade

Fonte: o autor

Cada edificação do conjunto possui elementos centrais. Aproveitando a vegetação existente, alguns blocos foram dispostos em volta de árvores, como é o caso dos pátios do banheiro e das salas de aula. Em frente a instalação sanitária encontra-se um Flamboyanzinho (Caesalpinia pulcherrima) e as salas de aula circundam um belo e frondoso abacateiro (Persea americana). As árvores fazem referência ao sentimento religioso que a vegetação tem nos terreiros de candomblé; são elementos estruturadores, geradores, organizadores da espacialidade, principalmente as árvores frutíferas, chamadas de arvores-pejis - santurario. Estas expressam orixás e divindades fixadas através do axé, constituindo a consagração da natureza e firmeza para o funcionamento da casa (OLIVEIRA, 2006). Já no restaurante foi plantada uma palmeira no pátio central, simbolizando uma das principais vegetações da África, utilizada como sombra nos quintais, mas também como cobertura e vedação nas estruturas das cabanas primitivas africanas. Na praça o elemento central é o pilar, um mastro de madeira, que sustenta a cobertura com estrutura em madeira e telhas cerâmicas, para remeter a arquitetura popular. Segundo os santuários iorubanos, o poste central é chamado de ixé, que simboliza a sustentação do céu na terra. Nas festas religiosas, as manifestações culturais e performáticas são realizadas em forma de roda, danças são executadas, histórias são contadas e fogueiras são acesas. O pilar central também está inserido nas tradições populares brasileiras, como o pau-de-fita e pau-de-sebo. São utilizados de diversas formas em folguedos (festas populares).

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O pau-de-sebo (figura 68) encontra-se presente em festas com atividade recreativa típica das festas juninas; um pau untado com banha animal é utilizado para a superação dos desafios em busca ao topo. Já o pau-de-fita (figura 67) é encontrado ao longo do Brasil: do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro até o Rio Grande do Norte; tiras de tecidos coloridas são envoltas no mastro central de acordo com os movimentos simplistas das danças que fazem a circum-ambulação. O elemento refere-se a árvore arquetípica que está presente em quase todas as religiões. Na tradição nórdica, uma árvore gigante (Yggdrasil) com galhos que se entrelaçam remete ao cosmo. Figura 82 - Pau-de-fita

Figura 83 - Pau-de-sebo

Fonte: Youtube - Witches British Traditional Beltane Ritual. Disponível em: <https://www. youtube.com/watch?v=_0Ij9A-jJAw>. Acesso em nov. 2018

Fonte: Wall Street International Magazine. Disponível em: <https://wsimag.com/pt/bemestar/24929-pau-de-sebo>. Acesso em nov. 2018

Figura 84 - Diagrama Centralidade

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Fonte: o autor


Os caminhos no projeto são elevados e materializados, a uma marquise com grande liberdade plástica que dinamiza ainda mais os espaços. O pedestre tem o domínio visual percorrendo o projeto por debaixo da cobertura, fazendo um passeio arquitetônico protegido do sol e da chuva. Criam-se trajetórias para outros destinos. Esta é um grande espaço público gerado por debaixo da marquise assemelha-se a um “hall-terreiro”, lugar reservado para apresentações especiais, exposições e lugar de estar. Nas antigas casas de culto do candomblé, o terreiro é um espaço extenso com chão de terra batida, “onde as galinhas ciscam, as crianças brincam, as mulheres socam pilão e dão comida aos animais domésticos” (OLIVEIRA, 2006, p. 207). Figura 85 - Diagrama União

Fonte: o autor

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8.3 DISTRIBUIÇÃO DO PROGRAMA O acesso principal do complexo arquitetônico se dá por meio da Administração. Este bloco contém atividades como Recepção, Sala de Reuniões, Administração, Biblioteca, Sala de Internet e Copa. Para entrar, cruza-se espelhos d’água, com forma que acompanha a curvatura da edificação e são forrados por pedregulhos e seixos rolados, além de ter plantas aquáticas. Esses elementos aquáticos simbolizam o território negro referente ao trabalho: rios, lagos e chafarizes, espaços públicos ocupados por lavadeiras, ponto de encontro das mulheres negras que compartilhavam assuntos, brigas e ajudas. A água traz vida, refresca e purifica o ambiente. No piso, seixos esparramam pelo chão, através do encrustamento da argamassa no período da construção do chão, assemelhando as folhas secas utilizadas nos ritos do candomblé. Composição no teto com tecidos contorcidos faz referência a dança vertiginosa e compulsiva das ondas da grande mãe do candomblé afro-brasileiro, a Iemanjá. Nos eventos que acontecerão no NEAB, propõe-se a dispersão das folhas secas odorantes das pitangueiras plantadas ao longo do terreno do projeto, em todo chão da marquise (hall-terreiro), para a defumação e purificação dos ambientes e pessoas. Nos pilares da grande marquise incorpora-se a alegria com elementos geométricos coloridos e vibrantes. Sendo assim, propõe-se a interpretação da exposição de Lina Bo Bardi: Caipiras, Capiaus (Pau-a-Pique), em 1984. Os “palitos” serão pintados de acordo com as estampas geométricas e étnicas dos tecidos tradicionais africanos, trabalhando o ornamento como identidade e autenticidade. Praticamente no meio da marquise encontra-se o bloco da instalação sanitária, com o auxílio de muxarabis nas janelas, que garantem uma boa ventilação cruzada. O bloco em frente à instalação sanitária é concebido por duas formas simétricas, contendo três salas de aula e uma sala de vídeo. O acesso para as atividades se configura por meio de uma rampa. O bloco foi aterrado na cota (+596) para permitir um bom pé-direito, já que a laje encosta no talude existente do terreno na mesma cota (+600) e cria-se um terraço jardim. Interiormente aproveitada, a vista é agradável em direção ao jardim, onde localiza-se o frondoso e gigante abacateiro.

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Para o acesso no terraço jardim, os usuários precisam ir em direção ao jardim do abacateiro e subir uma escada que acompanha o edifício, um elemento vertical que conecta a cota (+597) com a cota (+600). A laje tem uma inclinação suave que permite ao usuário sentar e/ou deitar-se, contemplando a paisagem circundante. Com a mata ao lado, as atividades podem se estender e ser incorporadas a outros espaços em meio a massa arbórea. A praça central é formada por um barracão com uso flexível. Várias apresentações populares e performáticas de Londrina e região acontecerão no NEAB. O espaço também é de convivência, com bancos em anel e com um “redário” para descanso e reuniões, fazendo com que alunos possam trocar ideias e discutir opiniões. Para seguir a tipologia da edificação, a caixa d’água segue o partido circular das edificações, marcando a paisagem com um elemento vertical. O acesso ao volume se dá por meio de um caminho oriundo da praça, dois pilares em “V” sustentando a laje fina. Aproveitando o térreo do bloco designa-se um depósito para guardar os materiais de oficina, cadeiras das palestras, instrumentos das apresentações musicais, entre outros. Seguindo os caminhos, a última edificação é o restaurante. O bloco é composto pela praça alimentação, cozinha e aos fundos estão os serviços (vestiários dos funcionários, depósitos, doca, copa dos funcionários). A fachada é semelhante com a Administração, possuindo também uma pele de vidro e tijolos vazados. Entre o elemento vazado e a esquadria, existe um espaço trabalhado com jardim de pedras para simbolizar o orixá guardião, Ogum. O layout das mesas em concretos e cadeiras girafas da arquiteta Lina Bo Bardi acompanham também a curvatura dos limites do projeto e estão dispostas no térreo (+596), mas também no tablado (+597,8); para subir a cota mais alta existe uma tímida escada vertiginosa, que converge para o jardim interno com uma palmeira por onde entra sol, chuva e vento. As cores da bandeira da África foram trabalhadas nas superfícies e aberturas (portas e janelas) contrastando com as cores naturais dos materiais. A cozinha em layout circular é trabalhada em equipamentos embutidos nas paredes, e no seu centro o fogão reúne as pessoas para a cocção das feijoadas, angus, pirões, vatapás etc. Ao lado da cozinha, encontram-se as áreas de serviços com Copa e Vestiários para os funcionários. A laje que abriga a área de serviço e a cozinha estende-se para abrigar a chegada dos veículos que transportam os alimentos e produtos que atendem as necessidades do núcleo. No final do complexo existe um passeio para o pedestre adentrar no projeto e vivenciar a espacialidade. A topografia do projeto não possui severas alterações, o conjunto edificado acompanha a inclinação suave do terreno já existente. Para a encaixar alguns blocos precisou-se fazer alterações nos taludes deslocando terra. 90


Figura 86 - Setorização

Fonte: o autor

Figura 87 - Fluxograma

Fonte: o autor

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8.4 ESTRUTURA E MATERIAIS

O conjunto se organiza com estrutura independentes de para cada edifício, com os eixos em radial. O sistema utilizado é de laje-viga-pilar; por conta da estética optou-se por usar a viga invertida. Aproveitou-se a configuração dos vãos para ser trabalhada a laje jardim. Já nas salas de aula, como utilizou-se o teto caminhável, utiliza-se o sistema de caixão perdido com laje alveolar pré-moldadas, com armadura protendida, que garantem um maior alcance de vãos, bom desempenho estrutural para uma laje de piso, além da simplicidade e rapidez na montagem. Os pilares são em concreto. A laje jardim ajuda na qualidade ambiental proporcionando melhor isolamento térmico e acústico para a edificação, além de ajudar na diminuição da temperatura dos espaços. Faz também referência ao telhado com cobertura vegetal utilizado nas cabanas primitivas africanas (palmeiras e coqueiros), dialogando ainda mais com os componentes naturais do entorno. Na marquise disposta ao longo da obra edificada, propõe-se a laje cogumelo protendida. Uma placa fina de 20 cm é apoiada diretamente sobre os pilares sem o uso de vigas. Este elemento estrutural tem suas extremidades apoiadas nas vigas de bordas dos pavilhões garantido estabilidade necessária.

Figura 88 - Praça Estrutura

Fonte: o autor

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Na praça, o grande telhado com 30% de inclinação possui uma estrutura de “alternativa hexadecágonal” com formato circular, possuindo 16 águas. O madeiramento é feito em forma radial com vigas em madeira laminada colada de 30 cm de altura, apoiadas nos pilares em concreto nas extremidade e no pilar-mastro em madeira roliça no centro. A cobertura é em telha de barro do tipo “colonial”, assentada sobre o engradeamento das ripas de madeira e telha translúcida no meio, marcando com a iluminação zenital o centro. A vedação vertical é feita com tijolos cerâmicos deitados maciços aparentes, retomando a arquitetura popular de terra. Algumas paredes externas da Administração e Restaurante são em tijolos comuns vazados, acompanhando a curvatura da obra, garantindo a proteção solar fazendo um desenho da trajetória do sol como uma peneira de luz, além de manter uma boa ventilação. A parede fica dentro de uma estrutura metálica com perfis ligando e travando os tijolos uns nos outros, e depois a estrutura é concretada. A permeabilidade visual também é garantida com as peles em vidro que circundam o edifício; são trabalhadas esquadrias do tipo-fixa e também maximar no superior para permitir a troca de ar entre o ambiente interno/externo. Adotou-se o trançado ripado de madeira, o muxarabi, nas Instalações Sanitárias, Cozinha e nos Serviço. Este permite uma boa iluminação e ventilação, além de permitir os sons, cheiros e sensações passarem mais facilmente. Todos os ambientes são bem ventilados por conta da disposição dos esquadrias ocorrerem em lugares paredes opostas. Já para estruturar a marquise da Entrada Principal, no bloco de entrada, as duas paredes-viga em concreto sustentam o balanço de seis metros existente.

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8.5 PERSPECTIVAS

PERSPECTIVA ENTRADA PRINCIPAL

PERSPECTIVA PRAÇA 94


PERSPECTIVA RESTAURANTE

PERSPECTIVA SALA DE AULA

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PERSPECTIVA LAJE JARDIM

PERSPECTIVA MARQUISE 96


PERSPECTIVA ADMINISTRAÇÃO

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9 REFERÊNCIAS AMORIM, José Carlos de Abreu. Pau de Fita: entre o sagrado e o profano. Diversidade Religiosa, v. 3, n. 1, 2013. ARCHDAILY. Centro de Oportunidade para Mulheres / Sharon Davis Design. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-158650/centro-de-oportunidade-para-mulheres-slash-sharon-davis-design>. Acesso em: 08 set. 2018. ARCHDAILY. Residência do Novo Artista em Senegal / Toshiko Mori. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/767885/residencia-do-novo-artista-em-senegal-toshiko-mori>. Acesso em: 17 maio 2018. ARCHITECT, Toshiko Mori. THREAD: Artists’ Residency and Cultural Center Sinthian, Senegal. Disponível em: <http://www.tmarch.com/2663>. Acesso em: 30 maio 2018. CAMPOS, Vera Felicidade de Almeida. Pau-de-sebo: Luta inglória. 2017. Disponível em: <https://wsimag.com/pt/bem-estar/24929-pau-de-sebo>. Acesso em: 01 nov. 2018. CARDOSO, Paulo César; SILVA JUNIOR, Antonio Ferreira da. O Jongo Como Caminho Para Novas Práxis Educacionais. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), v. 10, Ed. Esp., p. 465-482, jun. 2018. CARVALHO, Ana Paula Comin de. O “Planeta”: apontamentos sobre a invisibilidade dos negros no RS e seus reflexos no campo da cidadania. Revista Humanas - Cidadania e Políticas Públicas, Porto Alegre, v. 26/27, p. 179-191, 2005. CASA do Benin - na alma do edifício. AU - Arquitetura & Urbanismo, n. 18, p. 3039, São Paulo, jun./jul. 1988. DIWAN, Pietra. Raça pura: uma história da eugenia no Brasil e no mundo. São Paulo: Editora Contexto, 2007. EVARISTO, Conceição. Poemas da recordação e outros movimentos. Belo Horizonte-MG: Nandyala, 2008.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – Entrevista sobre o Samba da Madrugada Entrevista sobre o Samba da Madrugada - Michael Silva Soares, Londrina, 10 nov. 2018. 01. Há quantos anos existe o Samba da Madrugada? Como ocorreu sua criação? O samba da madrugada, tem 4 anos de duração. E primeiramente era uma festa despretensiosa que em sua origem aconteceu porque meus pais vieram do Rio para Londrina. E não tinha nada parecido (até então eu não conhecia o samba da padaria) e por isso que realizamos a primeira edição. Contando com mais de 600 participantes. 02. Qual a abrangência regional e municipal do Samba da Madrugada? Acreditamos ter representantes em todos os bairros de Londrina e de cidades vizinhas. 03. Existe um lugar fixo para acontecer as rodas de samba? O samba é itinerante até, porque o fluxo de gente acaba incomodando certos moradores, que não enxerga o evento com bons olhos. 04. Qual a importância do Samba Madrugada para a população londrinense? Hoje em dia, acredito que viramos a maior referência do samba na cidade e acredito que é uma forma de difundir ainda mais a nossa cultura negra, exaltando compositores, intérpretes e cantores negros. 05. Atualmente qual é o público alvo? Como um todo, nosso público virou heterogêneo, mas de um modo geral a festa é uma festa negra e da cultura negra, onde exaltamos entidades da umbanda e candomblé.

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APÊNDICE B - Pranchas Finais

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