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Irineu Gregnanin Pedron: “Aplicação da toxina botulínica em

Entre as modalidades terapêuticas para o manejo da paralisia facial reportaram-se técnicas pouco invasivas (fisioterapia e toxina botulínica) e as invasivas – intervenções cirúrgicas (enxertos, descompressões e anastomoses), preconizadas para os casos mais complexos. Contudo, na maioria das vezes, são necessárias mais de uma intervenção, e os seus resultados nem sempre são satisfatórios 4,7,15 . A reabilitação miofuncional vem sendo empregada por fonoaudiólogos e fisioterapeutas, objetivando restabelecer a função muscular debilitada, associada às modalidades cirúrgicas. Coadjuvantemente, a toxina botulínica vem sendo utilizada, favorecendo a reabilitação funcional e estética facial 4,8,9,11,13,14,16,18 .

O propósito deste trabalho é apresentar o caso de um paciente com paralisia facial idiopática, sendo submetido às aplicações de toxina botulínica tipo A, com o propósito de minimizar as sequelas funcionais e os danos estéticos ao paciente, favorecendo a qualidade de vida.

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Relato do caso

Paciente leucoderma do género masculino, de 43 anos, compareceu à clínica dentária particular com queixa de paralisia facial idiopática do lado esquerdo recorrente há 11 dias, ocasionado por herpes simples e stress, segundo anamnese.

O diagnóstico de paralisia facial idiopática foi realizado pela equipa médica da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Santa Luzia de Ribeirão Pires (São Paulo), após a realização da tomografia computadorizada (fig. 1), sendo excluídos diagnósticos que sugerissem possíveis eventos isquémicos, hemorrágicos, traumáticos ou tumores. Clinicamente, o paciente apresentou atenuação de linhas hipercinéticas (rugas) na região do músculo frontal e glabela durante a contração muscular (fig. 2); dificuldade na oclusão palpebral no lado esquerdo, com discreto prejuízo do reflexo de piscar (fig. 3); desvio de rima durante a contração do músculo orbicular da boca, bem como desvio contralateral ao sorrir (fig. 4) e no ato da sua contração (fig. 5); atenuação do sulco nasogeniano do lado esquerdo (fig. 6). O paciente reportou ainda a dificuldade de controlo motor ao ingerir líquidos, além de dislalia e disfonia.

Referente ao histórico, o paciente já havia apresentado um episódio de paralisia facial do lado esquerdo há 20 anos, sendo mais acentuado que o episódio atual. O paciente reportou ter sido causada por abuso alimentar (ingestão de carne e bebida alcoólica destilada), tendo apresentado melhora com massagem ocular (para lubrificação dos olhos) e fisioterapia (mascar gomas). O paciente reportou que a sua irmã já havia apresentado a paralisia facial idiopática aos 14 anos de idade.

No que respeita às condições sistémicas, foi relatada a hipertensão arterial e infeções recorrentes do vírus do herpes simples, além de ser etilista e apresentar obesidade mórbida (170 kg), sendo preparado à cirurgia bariátrica. Observaram- -se alterações de ordem emocional e psiquiátrica (depressão), com queixas de perda de emprego e situação financeira atual.

Sugeriu-se ao paciente as aplicações contralaterais de toxina botulínica tipo A, com o propósito de melhorar a estética facial e favorecer o controle funcional, reduzindo o desconfor

Fig. 2. Atenuação de linhas hipercinéticas na região do músculo frontal e glabela no lado esquerdo durante a contração muscular.

Fig. 3. Difi culdade na oclusão palpebral no lado esquerdo, com discreto prejuízo do refl exo de piscar.

Fig. 4. Desvio de rima durante a contração do músculo orbicular da boca e desvio contralateral ao sorrir.

Fig. 5. Desvio no ato da contração do músculo orbicular da boca.

to psicossocial. O paciente foi orientado que a toxina botulínica apresenta duração do efeito clínico variando de quatro a seis meses. Após o consentimento por escrito, realizaram-se imagens fotográficas da face, em repouso e durante as dinâmicas musculares. Por meio da análise clínica, fotográfica e anamnética, planearam-se aplicações em quatro pontos no lado direito da face, sendo dois pontos no músculo frontal e outros dois pontos no terço inferior da face (músculo elevador do lábio superior e risório), como pode observar-se na figura 7.

Previamente à aplicação da toxina botulínica, desinfetou-se a superfície da pele com álcool etílico a 70%, evitando-se a infeção local e removendo-se a oleosidade da mesma. Posteriormente aplicou-se anestésico local (Emla ® , Astra, São Paulo, Brasil), com o propósito de promover conforto durante o procedimento. Diluiu-se a toxina botulínica tipo A (Dysport ® , Ipsen Biopharm Ltd., Wrexham, Reino Unido) em 1,7 ml de solução salina, de acordo com as normas do fabricante, e injetaram-se duas unidades nos sítios determinados (fig. 8). Após a aplicação, aconselhou-se o paciente a não baixar a cabeça nas primeiras quatro horas e não realizar atividades físicas por 24 horas após o procedimento.

Decorridos 15 dias da aplicação, observou- -se melhora do aspeto geral da face e as suas funções (fonação, mastigação, deglutição), bem como se reportou melhora da inspiração pela narina direita, e maior conforto estético e psicossocial pelo paciente (figs. 9 a 13).

Discussão

A toxina botulínica tipo A promove bloqueio da libertação pré-sináptica de acetilcolina, causando a denervação temporária das placas motoras, reduzindo a ação muscular local. O lado acometido pela paralisia facial apresenta ausência de tónus muscular ipsilateral e, adicionalmente, a musculatura contralateral demonstra condições de hipercinesia antagonista, como pode observar-se no presente relato, pelas características clínicas apresentadas.

Nesta perpetiva, a toxina botulínica quando aplicada contralateralmente ao lado paralisado promove a redução das disfunções decorrentes da paralisia facial idiopática, além de contribuir para a estética facial, favorecendo a harmonia muscular entre os lados da face 4,7,15,19 .

A toxina botulínica foi preconizada ainda em casos de sincinesias, decorrentes da regeneração neural aberrante, ocasionada pela reinervação muscular adjacente à região alterada, durante o processo de reparação neural 5,8,11 . Esta condição gera contrações involuntárias da musculatura da mímica facial ao realizar movimento voluntário deste grupo muscular, associada ao tempo de recuperação da paralisia 18 . Tais alterações de movimentos não se observaram no presente relato.

Propuseram-se alguns sistemas de classificação de paralisia facial (House-Brackmann) e de sincinesias (Sunnybroock) para indicar a magnitude da alteração facial, além de auxiliar na eleição dos pontos de aplicação da toxina botulínica 5,8,11 . Entretanto, no presente relato utilizaram-se as tomadas fotográficas da face, em repouso e em dinâmica, permitindo analisar o grupo muscular acometido na paralisia facial e determinar os pontos de aplicação.

A posologia utilizada de duas unidades para cada ponto de aplicação está de acordo com estudos 4,11 , que determinaram doses mínimas da toxina botulínica para cada grupo muscular, com o propósito de não promover eventos adversos, como a paralisia à distância em relação aos pontos de aplicação. Não se observaram alterações, complicações ou eventos indesejados pela aplicação da toxina botulínica. Entretanto, vale a pena enaltecer que cada caso deve ser particularizado 7,8,19 .

Fig. 7. Planeamento para aplicações da toxina botulínica.

Fig. 8. Aplicação da toxina botulínica. Observa- -se a difi culdade de oclusão palpebral do lado esquerdo.

Fig. 9. Aspeto da melhora na região do músculo frontal após 15 dias da aplicação da toxina botulínica.

Fig. 10. Aspeto da melhora na região dos músculos da região da glabela.

Fig. 11. Melhora do perfi l da contração do músculo orbicular da boca, proporcionando maior conforto estético e psicossocial ao paciente.

Fig. 12. Balanceio estético após a aplicação na região dos músculos elevador do lábio superior e risório.

Conclusão

A aplicação da toxina botulínica tipo A demonstrou ser satisfatória em caso de paralisia facial idiopática. Decorridos 15 dias de sua aplicação, o paciente apresentou melhora funcional e estética do sistema estomatognático e mímica facial, além de minimizar os efeitos deletérios desta condição patológica e favorecer a autoestima e qualidade de vida do paciente.

Fig. 13. Atenuação do sulco nasogeniano do lado direito, sendo reportada melhora da inspiração pela narina direita .

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Germán Esparza Gómez

Médico estomatologista. Doutorado em Medicina e Cirurgia. Professor titular de Medicina Oral. Departamento de Medicina e Cirurgia Bucofacial. Faculdade de Odontologia, Universidade Complutense de Madrid (Espanha). medoral@infomed.es

de Medicina Oral

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