Pescar, não é só o ato de puxar a rede, fazer caça submarina ou jogar o anzol. Pescar é muito mais. É como filosofar, conversar com os amigos, passear com a família ou ler um bom livro. O peixe, no final das contas, é o que menos importa. As pescarias são todas vitoriosas com peixes, que haverão de virar uma bela moqueca, ou com as iscas, que, se voltarem, virarão "Sardinha ao Pescador Fracassado, Camarão Rejeitado ou Restolho de Manjuba" que também ficarão excelentes. Já disseram que ganhamos em dobro o tempo que gastamos pescando. Acho que o Super Pescador Deomar Bittencourt deveria ganhar pelo menos o triplo já que, além de pescar, nos brinda com suas ótimas crônicas, que vão muito além das pescarias, nos levam à viagens fantásticas vistas por um olhar inteligente e observador. Quem no mundo pensaria em pescar a bota perdida de Napoleão, ser enganado por um robalov de praga, achar um bacalhau desgarrado da Noruega nos canais de Amsterdam ou um kingfish com ISO, entre outras "viagens". Enfim, continue viajando física e mentalmente Deomar. Viajando e nos brindando deliciosamente com suas belas estórias.
César Augusto Guerra Pereira
ÍNDICE PESCARIA DE CALOURO...................................................................................... 02 LEMBRANÇAS DE MEU PAI..................................................................................03 LEMBRANÇAS DE UM VELHO MÉDICO..............................................................05 LEMBRANÇAS DE UM VELHO PESCADOR.......................................................06 PESCARIA EM REGÊNCIA....................................................................................07 PESCARIA À NOITE ...............................................................................................09 HISTÓRIA VERÍDICA DE UM PESCADOR ...........................................................11 PESCARIA EM ITAÚNAS.......................................................................................13 PESCARIA EM ALTO-MAR....................................................................................15 PESCARIA NA BAHIA - I .......................................................................................17 PESCARIA NA BAHIA - II ......................................................................................19 PESCARIA NOTURNA EM PIÚMA........................................................................22 PESCARIA EM GUARAPARI.................................................................................23 PESCARIA EM ITAOCA..........................................................................................25 PESCARIA DA VINGANÇA ...................................................................................27 PESCARIA NO CARNAVAL DE JACARAÍPE.......................................................29 PESCARIA NO CARNAVAL EM SANTA CRUZ - O TRIO ....................................31 PESCARIA EM ITAOCA - O PICNIC.......................................................................33 PESCARIA NO TUBARÃO......................................................................................35 CAMPEONATO DE PESCA EM CAMBURI...........................................................36 PESCARIA EM ITAÚNAS - A REVANCHE ...........................................................37 PESCARIA - MINHA PRIMEIRA VEZ ...................................................................39 PESCARIA - DESCOBERTA DE PESQUEIRO.................................................... 41 PESCARIA INÉDITA ...............................................................................................43 PESCARIA NA ROÇA .............................................................................................45 PESCARIA NOTURNA EM ITAÚNAS....................................................................47 PESCARIA EM LAGOA CONTAMINADA .............................................................49 PESCARIA EM NOVA VIÇOSA (BAHIA)..............................................................51
PESCARIA PROBLEMÁTICA................................................................................53 PESCARIA EM JACARAÍPE - INVERNO..............................................................55 PESCARIA EM CAMBURI - LEMBRANÇAS........................................................57 PESCARIA EM ITAPOÃ - LOVE..............................................................................59 PESCARIA EM PEDRA AZUL................................................................................61 PESCARIA NO RIO PIRAQUEAÇU........................................................................63 PESCARIA EM JACARAÍPE - SOS.......................................................................65 PESCARIA ENTRE IRMÃOS.................................................................................67 PESCARIA NO RIO CRICARÉ.................................................................................69 PESCARIA EM PRAGA..........................................................................................71 PESCARIA EM BERLIM.........................................................................................73 PESCARIA EM VIENA............................................................................................75 PESCARIA EM LONDRES.....................................................................................77 PESCARIA EM AMSTERDAM..............................................................................79 PESCARIA EM BRUGES.......................................................................................81 PESCARIA EM PARIS............................................................................................83
PESCARIA DE CALOURO Olhem vocês como pescaria é um negócio extremamente preocupante. Há uns trinta anos, estávamos em Jacaraípe e resolvemos dar uma linhada. Meu cunhado Ozair nunca tinha pescado e meio reticente acabou indo conosco. Emprestei uma vara, acoplada com uma carretilha Penn 2.0, linha 50 e mais de 300 metros de linha. Chegando ao pesqueiro, onde hoje miseravelmente os surfistas tomaram o ponto, nos preparamos para a batalha e foi aquela doideira. Há trinta anos ainda não tinha como hoje, esta poluição selvagem e nem estes pescadores que passam redes ilegais dia e noite, não permitindo a sobrevida nem de pequenos peixes. Mas na época era só jogar que a vara embodocava e toma geriquiti, pé de banco, barbudo, bagre, pequenos cações e era um depois do outro, algumas vezes dois ou até três de uma vez só. Ficamos ali curtindo aquela felicidade por horas. Por fim, resolvemos encerrar e fomos para casa limpar os peixes, porque o isopor já estava cheio deles. Já em casa foi aquela farra, peixe frito e cerveja a tarde toda. Divertimo-nos bastante e Ozair, que nunca tinha pescado já estava combinando de pescar em Itapoã no próximo domingo. Naquela época Itapoã, bairro de Vila Velha, na realidade era uma pequena Vila de pescadores e poucos caminhos levavam a praia. Combinação feita. No domingo, passamos bem cedinho na casa de Ozair para a nova pescaria.Tinha levado a vara reserva para emprestar, e qual não foi minha surpresa ao ver aquele sujeito grandão com um chapéu de mexicano, cheio de varas das mais modernas, com carretilhas e molinetes dos mais caros. Olha que me deu até vontade de refazer meu material mas, naquele dia a pescaria foi de muito peixe e muito papo sobre os materiais novos e futuras pescarias. Com isso, fico pensando se essas Casas de Materiais de Pesca chamassem pessoas que nunca pescaram para dar uma linhada e se tiverem sorte na primeira vez, calcule o que venderiam de material para os neófitos. Lucrariam muito. Exemplo típico: meu cunhado. Este futuro marketing é uma colher de chá deste pescador de praia Deomar Bittencourt. 2
LEMBRANÇAS DE MEU PAI Nasci no século passado, na cidade de São Manoel do Mutum, MG. Era cercada de fazendas produtivas que faziam parte do município. Muito gado, muito suíno, muitos cereais e seus proprietários tinham fama de fazendeiros abastados. Todo mundo era conhecido e amigo. Em todo o município era de praxe nas escolas cantar o Hino Nacional antes do início das aulas e outro Hino Patriótico ao encerrá-las. As crianças eram educadas, respeitavam e tomavam bênção aos adultos. Os políticos impunham respeito, pelo procedimento ou pelo número de "capangas" que comandavam... Minha cidade, apesar de aconchegante, tinha fama em todo o Estado e algumas vezes atravessando fronteiras, como cidade perigosa e brava. Os homens eram destemidos e corajosos, mas havia um problema: era generalizado o medo de assombração! Ninguém tinha coragem de passar defronte do cemitério das 23h30 à meianoite porque era o momento das almas penadas estarem em conferência. Na minha adolescência meu pai contou o seguinte fato: Na rua da máquina, tínhamos como vizinhos um casal de idosos. Seu Totonho, com 85 anos de idade e sua mulher Dona Xandoca, com 80 anos. O casal era um exemplo de harmonia, amor e convivência; mestres em aconselhar a todos que os procuravam. Certo dia, Seu Totonho comprou três ovos de gansa e levou para casa para a merenda. Na hora do café, Dona Xandoca levou os três ovos estrelados para a mesa; foi quando Seu Totonho sentenciou: "Vou comer dois porque comprei os ovos". Dona Xandoca protestou: "Como eu dois porque fritei". A discussão foi acirrada. Quando Seu Totonho, no auge da raiva gritou: "Hei de comer dois e"... caiu no chão perdendo os sentidos, ficando com o corpo rígido. Foi um Deus nos acuda. 3
A cidade toda tomou conhecimento do falecimento do velho amigo. O enterro foi o mais concorrido que se viu na região. Era de hábito conduzir o caixão com o defunto até a igreja para que o padre o benzesse e fizesse a oração de libertação da alma recomendando-a ao céu. A igreja estava superlotada. Quando o padre se dirigiu com os parâmentos para o início da cerimônia, Seu Chichico, professor da escola primária do outro lado do rio, pediu a palavra e fez um discurso enaltecendo as qualidades do falecido, deixando comovido todos os presentes. O padre então iniciou as orações, e ao aspergir a água benta gelada na face do morto... o defunto sentou no caixão e berrou a plenos pulmões:“Hei de comer dois”. Foi um corre-corre dos diabos. Até o padre, acostumado a lidar com defuntos, levantou a batina e mostrou que as pernas estavam em forma. Ao lado do caixão estava um grande amigo da família, Seu Daniel. Ele era cambota, tinha as pernas arqueadas, formando quase uma circunferência perfeita, ele não podia correr direito, mas gritava: "Ai meu Deus! Um sou eu que já me conto comido! Ai minha nossa senhora mãe de Deus. Um sou eu que já me conto comido!" Seu Totonho tinha tido um ataque cataléptico. Explicadas as circunstâncias, Seu Totonho, renovado e reforçado pela água benta, voltou para casa, com toda a mordomia e comeu tudo a que tinha direito. Deomar Bittencourt Pereira (1913 - 2002). 4
LEMBRANÇAS DE UM VELHO MÉDICO Nós antigamente, quando os partidos políticos discutiam problemas nacionais e deixavam as pendengas políticas para a hora da caça aos votos, quando as famílias podiam à noite, sentar do lado de fora com suas cadeiras nas calçadas para um amigável bate-papo, e as meninas brincavam de roda e os meninos de "picolê bate na bunda e vai escondê" ou de "barra manteiga bem tirada", clinicávamos numa Cidade do interior de Minas Gerais, pelo idos de 1946. Como quase todas as noites, ficávamos eu, um colega (médico afamado na região como bom clínico e cirurgicamente diziam ter as mãos abençoadas por Deus) e mais alguns vizinhos, conversando. Meu relógio marcava 20h30. A lua cheia começava a aparecer, como se tivesse saindo da terra, num descampado distante à nossa frente, linda, cheiona. Era ela a artista principal da nossa conversa, quando de repente dobra na esquina da rua, um caminhão com algumas pessoas na carroceria e três na boléia, parando à nossa frente. Da cabine, salta um senhor de meia idade, dirigindo-se a mim a ao meu colega, para que atendêssemos um rapaz que estava deitado no chão da carroceria, sobre um colchão. Ele fora baleado na região abdominal, necessitando de socorro urgente. Era um rapaz de 28 anos, branco, mais branco ainda pelo sangue perdido. Levamos o paciente para o Hospital. Providenciamos todos os itens necessários à intervenção cirúrgica. Correu tudo bem. Transferimos o operado para a UTI. Fizemos uma oração a Deus e aguardamos os acontecimentos. Foi um sucesso! Seis dias depois, ao chegar cedo ao serviço, encontrei o "branquelo" ajoelhado na capela do Hospital e perguntei: - Como é alemão; está agradecendo a Deus? - Ele respondeu: - Tô pedindo a Deus para sair logo daqui, pois quero acertar as contas com o cabra que me atucaiou... Dez dias depois o alemãozinho foi para casa com as recomendações para ter os cuidados necessários a quem tinha sofrido uma intervenção de alto risco. Três semanas depois do primeiro acontecimento às 21h estávamos reunidos no nosso ponto de sempre, fazendo uma apologia, agora, a Lua Nova, quando um caminhão dobra a esquina com algumas pessoas na carroceria e duas na boléia, parando à nossa frente, com um jovem de 30 anos baleado. Foi um filme clonado. Só que desta vez o protagonista era negro. Sem finalização trágica. A resistência e a imunidade natural do homem que trabalha a terra virgem costumam dar fama aos "Tratadô"... 5
Por questão de ética, os nomes da Cidade e dos protagonistas são fictícios.
LEMBRANÇAS DE UM VELHO PESCADOR O pescador amador é um sonhador por excelência. Quando está à beira-mar, num barranco de rio ou de lagoa, sua imaginação percorre caminhos, estradas, lugares nunca antes vistos, vividos ou imagináveis, sem desprender a atenção do caniço armado em expectativa. É um ser diferente de todo mundo. Não tem inveja, tem prazer em ajudar a todos que necessitam. Contempla todas as coisas que se encontram à sua volta, e agradece a Deus pela generosidade com que agraciou a humanidade. Nem todos compreendem que a natureza deve ser respeitada e a agridem por burrice, ignorância e ambição. Todo pescador amador, em qualquer modalidade de pesca, deve escolher um parceiro que tenha as mesmas ideias, os mesmos princípios e a mesma lealdade. É fácil escolher. O difícil é encontrá-lo. Quando encontrá-lo, conserve-o. Fui transferido para Vitória, 1952, trazendo comigo material de pesca de 1ª qualidade: varas de bambu japonês, gomos curtos, cortadas na minguante e preparadas por Sebastião, maquinista da Vale. Duas carretilhas e duas varas importadas dos Estados Unidos (verdadeiras jóias). Instalamos residência na Av. Rio Branco, na Praia do Canto. Por informações, soube que havia um bom pesqueiro na Curva da Bomba e no primeiro sábado, de manhãzinha, saí para pescar e conhecer o pesqueiro, levando uma vara de 7 ½ metros, muito bem preparada, distorcedor de aço na ponta e linha de aço inoxidável, anzol machudo na esperança de uma boa briga. Caminhava pela Av. Rio Branco com a vara de pesca, bolsa a tiracolo, chapéu grande de palha, quando vi mais ou menos a uns cem metros de distância, um cônsul azul, novinho em folha, voltei e parei. Ao passar ao lado do carro, o motorista perguntou: Vai pescar? Aproveite a carona que eu também vou. Nesse momento, conheci Pedro Sabino, o melhor sujeito do mundo. Homem educado e companheiro de todas as horas. Pescamos juntos durante 30 e poucos anos, sem falhas. Ensinamos a muita gente. Às vezes, em conversa com outros pescadores, dizíamos que se juntássemos as escamas dos peixes que nós dois tínhamos ferrado, dariam para calçar toda a Praia do Canto. Ao presente: jovens pescadores, se encontrarem em suas andanças "pescatórias" Décio Dessaune e Gildo Bourguignon, ouçam-lhes os ensinamentos; eles são craques mesmo! 6
PESCARIA EM REGÊNCIA Esta pescaria foi uma das mais perfeitas das praias do norte. Na sexta feira à noite, começamos a preparar o material porque iríamos dormir em barraca, na própria praia, que naquela época, nada mais tinha a não ser Mata Atlântica. Fui eu, meus cunhados Júlio, Zico e Ozair. O carro usado foi uma D-20, somente com um carrão deste que se podia ir tranquilo devido as péssimas estradas para a dita praia. No sábado, montamos a barraca de cinco lugares, uma capri de primeira categoria e após este ritual inicial fomos à luta. Cada um com até duas varas, uma pequena para berés e outra grande (5,10m) para aquele arremesso e grandes peixes. Tudo estava bonito.Tempo firme, maré perfeita e tudo nos conformes! A partir daí, começou o problema, nada de beliscada, e foi assim ao longo do dia, enchendo o saco, até que Zico e Júlio resolveram ir a pé até a Foz do Rio Doce para tentar em outro lugar. Ficamos eu e Ozair tranquilos e no mesmo lugar. Dito e feito, nem bem os dois saíram, minha vara embodocou e puxei um belo exemplar de pescada, em seguida, Ozair também pegou. Aí verificamos que os pés frios eram os dois marmanjos que tinham saído, porque logo em seguida pegamos mais pescadas, num total de três, cada um enorme. Outros peixes também começaram a dar as caras e fizemos uma pescaria ótima.Três horas depois, chegam Zico e Júlio, cansados, com as caras amuadas. Ficamos na nossa e perguntamos como foi lá, a resposta foi lacônica: "Uma verdadeira merda! Não deu nem uma beliscada". Aí, nós, com a maior cara de pau, falamos: "Dá uma olhadinha aí no isopor". Quando os debilóides olharam, só ouvíamos palavrões e aproveitamos o ensejo e demos aquela risada. Como era fim de tarde nos preparamos para dormir, num frio de vento do mar, cortando nossos casacos até a alma. Comemos sanduíches de sardinha, ovos cozidos e depois de um papo interminável vendo aquele céu cheio de estrelas, nos retiramos para nossa 7
barraca e dentro das possibilidades internas, dormimos ao som do mar e do frio cortante. Pela manhã bem cedo, iniciamos o mesmo ritual, só que agora, os dois fujões não arredaram pé e pra sorte de todo mundo as pescadas voltaram. O único lance na região que me lembrou outro parecido foi de garotos da vila local que chegaram e quiseram limpar os peixes. Deixamos, mas um deles ao escorregar o bagre, tentou pegá-lo no ar e pronto, o espinho enfiou em sua mão e por mais que fizéssemos não conseguíamos retirar. Cortamos o espinho do bagre e ele foi embora.
Algum tempo depois o garoto aparece sem o espinho e com o local chamuscado. Perguntamos como conseguiu retirar, ele falou que o pai dele era pescador, puxou com alicate e depois botou pólvora e acendeu o fogo. Esterilizou e cauterizou na hora. Pelo amor de Deus, me arrepiei todo. Depois deste incidente, já estávamos quase na hora de vir embora, demos uma gorjeta para os garotos e recolhendo o material voltamos para Vitória, cheios de peixes de primeira linha. Marcamos uma confraternização e foi aquela moquecada que até hoje deixa saudade. Do regente pescador, digo do pescador de regência, Deomar Bittencourt e cia. 8
PESCARIA À NOITE 20h. Mais uma vez pesca em Jacaraípe. Desta vez com testemunhas, porque qualquer estória se transforma em gozação. Eu e meu genro Casotti, fomos dar uma linhada e tentar pegar uns berés (pequenos peixes que transitam nas ondas). Preparamos as varas, aquele camarão de primeira e vapt, mandamos os ditos bem aconchegados nos anzóis lá no meio do marzão. A noite se mostrava ótima, maré vazando, uma ligeira brisa marinha, aquele céu estrelado e nós ali sentados, longe das dívidas, boletos, IR... Mas enfim, minha vara deu o primeiro sinal, leve puxada em trinado e eis que surge o primeiro beré. Um bagre de um palmo e dois dedos, como por norma não levo pra casa peixe menor que dois palmos, resolvi devolvê-lo ao mar. Joguei outra vez e quando me sento, meu genro pergunta meio apavorado se aquilo na vara dele era peixe. A vara tinha embodocado quase ao chão e balançava mais que rede de baiano. Tranquilo falei: Não, não é peixe não, é um avião e emendei em seguida: Corre lá garoto, que este é grande. Casotti em poucos minutos já exclamava, este molinete não vai aguentar. Olha o barulho. Aquilo arranhava mais que unha de gato em sofá de vinil. "Deomar a linha é tamanho 30 e vai arrebentar", dizia meu genro apavorado. "Se vira garoto", dizia eu. Não passou nem quinze minutos e eis que surge gloriosa, na onda levando até a areia, aquela arraia enorme. Neste tempo outros pescadores próximos foram chegando e torcendo. Após a retirada da bichona para a areia, um deles começou a contar vantagens. Esta arraia é fêmea e devemos soltar. Claro que iríamos soltar, porque quem está acostumado a pegar pampo e robalo, come arraia só na guerra. Mas aí o energúmeno continuou: "Aqui já peguei cação de 10 kilos e aos longos dos meus doze anos de pesca nesta praia esta arraia é café pequeno". Ele não só estava desmerecendo a luta árdua para puxar a arraia como também dando uma gozada nos nossos berés. Aí pensei com meus botões, acho que vou contar pra este babaca a pescaria que fiz semana passada em Itapoã, Vila Velha (fato verídico) em que pesquei 07 corvinas de 3.250 a 3.300kg cada uma, e pode parecer conta de mentiroso, mas 9
foram exatamente sete, e ainda ia complementar com outra pescaria no Rio Piraqueaçu, nesta estávamos embarcados num barquinho que mal cabiam quatro pessoas. Já tínhamos nos ferrado ao pararmos num pesqueiro, porque o meu sobrinho jogou a âncora na água, mas não viu que ela estava desamarrada. Pronto, perdemos a dita em aço inox e ficamos à deriva, foi neste momento que minha linha agarrou, parecia num tronco e segurou o barco que gradativamente veio ao ser puxada a linha, contra a correnteza, até ficar reta com o fundo. Puxei para soltar. Quando menos esperávamos, surgiu num verdadeiro redemoinho um caramuru que por baixo tinha uns dois metros. Quando aquilo se enovelou dava umas duas bolas de basquete. Ficamos apreensivos porque se o colocasse no barco, nós quatro teríamos que pular na água, mas meu sobrinho resolveu a questão. Pegou uma faca e foi se aproximando do monstro, pegou com cuidado a linha e quando pensei que enfiaria a faca no bicho, vapt cortou a linha. Aquela verdadeira peça de museu sumiu no rio escuro. Pena que não tínhamos uma máquina fotográfica para registrar, acho que iríamos para o Guinness Book. Enquanto estava pensando se contava ou não para o babaca, a minha vara beliscou de novo. Dei a fisgada e recolhi o peixe. Novamente tava lá, um bagre de um palmo e dois dedos. Assim não é possível pensei, este vai morrer para não encher meu saco de novo. Novamente preparei os camarões e mandei os ditos bem agarradinhos nos anzóis atrás de uma peça maior. Não esperei muito tempo, e outra beliscada, nova recolhida e novo bagre de um palmo e dois dedos. Aí que fui ver que estava num verdadeiro cardume destes bagres. Aquele morreu de azar e este ia para o mesmo caminho, o bagre é um peixe chato de pegar porque tem três ferrões e se bobear, leva uma ferroada que dói pra cachorro. Mas, contando da arraia, a devolvemos ao mar, os pescadores foram voltando ao seus lugares e ficamos eu e meu genro novamente tranquilos, pegando nossos berezinhos por mais um montão de tempo e curtimos muito aquela pescaria pelos entretenimentos que ocorreram ao longo da jornada. Isto que dá uma bela noite de sono e papo pra muito tempo, relembrando do babaca, da arraia e dos comentários naqueles minutos que antecederam a arraia. Boa noite que agora é hora de dormir e sonhar com aquele peixe... 10
HISTÓRIA VERÍDICA DE UM PESCADOR Acordei às 03h me virando para lá e para cá, calor insuportável e mesmo com o ventilador em cima não aguento e me levanto. O que fazer às três da madrugada em Jacaraípe. Saio na varanda e ouvindo o barulho do mar, resolvo pescar, mesmo sabendo do perigo neste balneário tão aprazível de Serra. Arrumo meus apetrechos, pego aquele camarão do lameirão maravilhoso para o pescador, o fincador e rapidamente atravessando a rua, já me acho na areia da praia. Preparo a vara (5.10m), coloco aquela "parada" de três anzóis e aquele camarão enorme, e mando lá no meio do oceano com aquela desenvoltura de anos de labuta. Sento na minha cadeira de alumínio e apreciando aquela brisa marinha me foco nas estrelas, apreciando aquele céu maravilhoso, onde a ponta da vara brilha com sua luminescência característica. Ao vagar a vista pela praia, vejo de longe dois rapazes se aproximando e no mesmo instante, a ponta da vara embodoca e começa a balançar loucamente. Dou um pulo e sinto aquela adrenalina, que só os pescadores de grandes peixes sentem no ato da batida. Sinto que era uma verdadeira fera, seguro com força, dou a fisgada de praxe e começo a me preparar para puxar o bicho, quando escuto "Perdeu, perdeu". Obviamente não era comigo, que o dito cujo estava bem fisgado, mas olhei para o lado e tava lá um trinta oitão apontado para mim e os dois, agora meliantes, chegando. Aí meu chapa, não ia deixar aquele peixão por um mero assalto e falei: "Ô negão, corta essa, não tá vendo o peixão que fisguei, guenta um pouco que já atendo vocês". "Porra nenhuma, velhote, passa logo o relógio, anel, cordão e todo dinheiro que tiver aí". Fiquei numa sinuca. O peixe puxava para valer e ainda tinha que argumentar com os bandidos, aí me veio uma saída drástica para um pescador. Já que estava sem relógio, sem dinheiro e a aliança era de quando casei (73kg) e agora com 96kg não saía nem com azeite, ofereci ao meliante puxar o peixe enquanto ficava olhando e o outro me vigiando. O miserável olhou, pensou e topou. Resultado: ficou doidão. Puxava suando e gritando "Este é grande, este é grande porra". Fiquei ali do lado babando aquela luta, mas não tinha escolha, pelo menos fiquei dando piruadas. Devagar, recolha 11
agora, anda um pouco pra frente, puxe agora e assim por diante. O outro com o revólver, já tinha guardado o mesmo no bolso e não tirava os olhos da água, esperando ver o monstro. Pouco tempo passa e de repente a água começou a vibrar e apareceu aquele bicho prateado correndo de um lado para o outro. Nós três ali estávamos vidrados naquela dança arrepiante, e logo, logo, surge aquele Pampo enorme que calculei por baixo uns 4 kg. Já na areia, olhei para os assaltantes e ficamos nos encarando, resolvi com dor no coração ceder aquele magnífico exemplar marinho para os dois debilóides. Aceitaram na hora, até me agradeceram e foram embora felizes da vida, enquanto eu fiquei ali parado, pasmo, vendo aquele peixão branco ao luar se balançando na mão dos pilantras. Recolhi o material, porque outro igual aquele que esperei por anos, tão cedo apareceria de novo. Fui para casa, tomei aquela água açucarada e esperei o dia clarear, porque dormir, nem pensar! Ao contar o acontecido, ninguém acreditou, falei do tamanho do Pampo e foi aquela gozação. Acho que vou colocar na internet e pedir aos meliantes, que pelo menos mandem a fotografia do dito, que acho que tiraram, para não ser considerada mais uma história de pescador. Portanto, meliantes me ajudem a mostrar a veracidade deste fato, que agradecerei imensamente. Do pescador, totalmente chateado, psico e puto da vida Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM ITAÚNAS Itaúnas, pequena Vila bucólica no Norte do Espírito Santo, quase fronteira com a Bahia. Suas dunas de areias brancas são famosas em todo o Brasil e até no exterior. Fui com minha esposa Laci, carregado de material de pesca para, se possível dar uma linhada. Ficamos hospedados numa pousada chamada Estalagem Vila Tânia, de um amigão meu. Na pousada, já instalados fui, como é de praxe, bebericar aquela cerveja gelada, conhecer novos amigos e bater aquele papo agradável, que só se encontra nestes lugares. Estávamos todos felizes por poder desfrutar de ambiente tão acolhedor. No meio do papo um sujeito bonachão, gorducho, rindo à toa, jogava papo fora com uma facilidade incrível e sem querer querendo, falou da quantidade absurda de peixes que estava dando na Praia de Itaúnas e disse que era só jogar e puxar. Fiquei calado e nem falei que fui ali para pescar, mas me interessei pelo assunto, disfarcei, saí de fininho e fui preparar meu material. Como já era quase noite, fui preparar meus sandubas de queijo, porque de presunto me dá caganeira, meu embornal completo com água e os outros itens requeridos pra muitas horas de praia. Cedinho, às 5 horas da matina me mandei antes que os outros percebessem e fui pescar em Itaúnas. Subi aquelas dunas com toda aquela tralha, fincador, camarão, varas (duas), bolsa a tiracolo, cadeira, etc. Cheguei praticamente morto ao outro lado daquele deserto (quase 1km). Fui logo me preparando para encaçapar os cardumes. Joguei minha primeira linhada, sentei-me na cadeira de alumínio e esperei com o coração aos pulos, nem sei se foi pelo cansaço da caminhada ou se pela adrenalina do futuro peixão. O sol chegou forte e já estava a mais de hora pescando, jogava, puxava e nada, nem uma puxadinha. Quando estava já torrado no mormaço e já dando quase 1h da tarde, pensei melhor no que o desgraçado do gordão tinha dito e aí descobri a sacanagem, é jogar e puxar, só que peixe que é bom, nada. Fiquei psico e apesar da raiva dei uma risadinha, mas pensei, vou fuder aquele viado. 13
Voltei toda a caminhada de novo, pesando muito mais pelo desgaste físico de jogar e puxar pra mais de cem vezes. Botei tudo no carro e voltei chateado, mas quando atravessava o pontilhão para entrar na Vila, vi um pescador saindo de um barquinho de madeira cheio de peixes. Parei bem próximo do dito e perguntei quanto queria pelos peixes. Ele olhou para mim, olhou o carro e tascou sem medo: "R$ 100,00". Nem titubeei, tirei duas notas novas de R$50,00 e falei: "São meus". Ele olhou cabreiro as notas novas, me olhou de novo, balançou os ombros e me liberou: "Pode levar, moço". Cheguei à pousada e a turma já tinha se preparado para me gozar, quando comecei a tirar os peixes de dentro do porta-malas. Fiz como se fosse a coisa mais normal do mundo, ficaram com cara de besta e chegando devagarzinho e sem falar nada, admiraram as peças. Pedi ao Cezinha para pedir aos seus cozinheiros para prepararem a moqueca que hoje era por minha conta. Vai dar peixe assim lá nos infernos pessoal, é só jogar e puxar, falei todo besta. Foi aquela farra, peixe pra cá, piada pra lá e fomos dormir satisfeitos. No outro dia cedinho, fiquei de butuca e vi o tal gorducho pegando suas varas e tralhas e se encaminhando para o carro e se mandou, em seguida, bem devagarzinho para não acordar ninguém. Pensei comigo, vai desgraçado, hoje quem vai se fuder é você. Gordão do que jeito que está, para passar as dunas de Itaúnas e depois voltar vai se rebentar todo, portanto, minha vingança será maligna. Voltei a dormir e esperar o resultado mais tranquilo. A tarde, lá pelas 14h, nós na piscina vimos quando o carro dele chegou. Ele saltou, parecia um camarão de tão vermelho que estava, foi até o porta-malas e tirou aquela fileira de peixes todos grandes. Pronto, fiquei na dúvida, mas pelo óbvio, os pescadores de Itaúnas é que estão ficando ricos, e lembrando do meu caso, dei boas risadas sozinho. A partir de agora, vou falar a todos os pescadores que quiserem um bom pesqueiro, para ir pra Itaúnas, é só jogar e puxar. Deste pescador especialista, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM ALTO-MAR Qual pescador neste mundão de Deus, que não sonha um dia em pescar em alto-mar, onde os peixes em nossos sonhos são enormes. Pois bem, fui convidado por meu cunhado Ozair, que tinha um barco de pesca pó, pó, pó, para satisfazer este meu incrível sonho de pegar dourados, cações... com mais de 10kg. Na sexta-feira, preparei meu material de pesca, próprio para grandes peixes, sandubas dos mais variados, latinhas de cerveja, refrigerantes e água mineral.A noite parecia que não acabava nunca. As quatro da matina fui juntamente com meu cunhado Zico (também convidado), para pegar o barco na curva de Camburi. Como diziam que pescar em alto-mar dava muita náusea, e como somos precavidos, eu e Zico engolimos um comprimido de Dramin e agora estávamos preparados para o que der e vier. Subimos naquele barco fedendo a peixe podre e lá fomos nós ao encontro dos grandes exemplares marinhos. A viagem até ao pesqueiro durou umas três horas e meia. Enquanto o barco cortava as ondas até chegar ao ponto certo, dormi sob o efeito do medicamento e do suave balançar da embarcação. Ao chegarmos, foi aquela baderna: "Levanta aí que chegamos, acorda pessoal". Olha, quando olhei aquele marzão, me deu até um frio na espinha, procurei terra e só conseguia ver o teto do Convento lá ao longe e mais nada. Senti um ligeiro enjoo e ao falar para o pescador que nos levou, ele com sua sapiência marítima, me mandou ficar olhando para um ponto fixo no horizonte que aquilo passava. Olhei para o Convento de novo e até rezei pra Nossa Senhora, mas com o balançar do barco eu via e não via, via e não via, aquilo foi me mareando e de repente à beira do barco, senti aquela vontade de vomitar e veio com força. Acredito que mandei na primeira golfada um jorro de quase três metros, parecendo com aquela água que sai das mangueiras dos bombeiros ao apagarem grandes incêndios. Achei que com aquela golfada tinha melhorado, quando veio uma segunda mais forte ainda, achei que ia morrer. 15
Deitei no fundo do barco e me senti um pouco melhor. O pessoal começou a me gozar, foi quando olhei de soslaio pro Zico e ele tava falando desconexo: "Gozado, não posso me sentar que me dá um soluço, ic ic" e toma vomitado. Ele deitou também e ficamos lá quase mortos. Mas não me dei por vencido e já que não podia pescar sentado nem em pé, comecei a pescar deitado. Minha sorte é que não peguei nada, porque senão teria que me levantar e lá viria vômito de novo. Quanto ao Zico, sentava e toma soluço, ic ic vrummmmm, lá vai vômito. O pior foi algumas horas depois, ainda estava verde, desidratado e zonzo, mas estava ali firme, deitado no convés morrendo a míngua, mas firme, que nem um tronco com cupim, os miseráveis começaram a comer meus sandubas, me ofereciam e ainda falavam que com manjuba crua era melhor, nestas horas meu estômago revirava. Estes debilóides pegaram uma grande quantidade de baicús arara grandões, às minhas custas, porque meu material estomacal trouxe a superfície centenas destes peixes famintos que estavam ali à disposição dos energúmenos. Só sei que no dia seguinte, quando deram ordem para voltar, já era de tarde, e não sei ainda como não tinha morrido. Dei graças a Deus e com o barco andando me aliviou aquela sensação horrível. Quando chegamos, parecia que tinha sido semanas de viagem, descemos no cais e pensei: "Consegui. Ficar de pé foi uma sensação maravilhosa". Voltamos pra casa, sabe Deus como e ao chegarmos, em vez de morenos pelo sol do dia, estávamos verdes. E assim fiquei por quase uma semana e o pior é que não conseguia ficar de pé direito, ficava balançando de um lado pro outro como se tivesse bêbado. Depois desta experiência, nunca mais me arrisquei pescar em alto-mar. Fico na minha praia mesmo, e sonho apenas que um dia, aquele peixão enorme que sonhei, chegue até a beirada para poder fisgá-lo. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA NA BAHIA - I "Vamos lá pessoal, enfiem logo as malas nos carros. Casotti, não esqueça as varas", falava eu todo eufórico; já antevendo um futuro glorioso no ramo da pescaria. Aproveitando o ensejo, vi com o Zico se já está tudo pronto. Éramos seis carros, minha família e filhos casados, a família do Zico e seus filhos casados e um casal de amigos. Estava enfim tudo pronto. Fizemos o sinal da cruz e nos mandamos para Prado na Bahia. Uma viagem razoável por causa das péssimas condições das estradas, principalmente na Bahia, o que nos atrasou em muito o tempo programado para chegarmos. Chegamos à noitinha, passamos por Prado e seguimos o caminho indicado para a maravilhosa pousada, pelo menos via internet. Algum tempo depois chegamos ao lugar, mas o que vimos foi um casarão no meio da mata. Só podia ser ali, porque não havia nada mais em torno. Resolvemos então parar e checar in loco nosso receio. Dito e feito, era naquele casarão fantasmagórico a tal "maravilhosa" pousada. Verificamos que só nós éramos os hóspedes. Cheguei a pensar naqueles filmes americanos de terror, mas como não tínhamos alternativa, fomos ver os quartos. O primeiro grito, e lá vem minha filha apavorada: "Naquele quarto não fico, está cheio de taruíras". Fizemos o contato com o gerente e foi a primeira mudança, logo depois minha sobrinha veio reclamando que o quarto dela era um verdadeiro formigueiro, onde centenas de formigas passeavam pelo ambiente. Mais uma troca feita. Nós, os mais velhos, resolvemos matar as baratas e espantarmos algumas pererecas dos banheiros. Após o caos ser resolvido, fomos pedir um lanche, quando ficamos sabendo que só serviam café da manhã, fomos dormir à base de biscoitos e alguns aperitivos que sobraram da viagem. No outro dia pela manhã, depois de uma noite preocupados com os insetos, fomos tomar café e nos prepararmos para aquela tão sonhada pescaria. O café até que não foi tão ruim assim, bolos, queijos, presuntos, pãezinhos... De barriga cheia, fomos eu e Zico perguntar ao gerente se vendiam camarão ali na área. Ele nos disse que na Vila adiante poderíamos encontrar, porque a Vila é de pescadores e blá, blá, blá... Agradecemos, pegamos o carro, as varas, o escambau e nos mandamos atrás da talVila. 17
Depois de quase meia hora, já desistindo, vimos na descida da estrada, próximo ao mar uma pequena Vila, que obviamente era a tal e fomos para lá. Andamos devagarzinho dentro da localidade onde a maioria das casas era de pessoas humildes, mas mesmo assim não víamos ninguém. No final da rua encontramos um sujeito esquisito, com cabelo rastafari e perguntamos ao mesmo onde podíamos comprar camarão. Ele olhou pra gente com os olhos meio vidrados e falou meio enrolado: "Cramarão moço, tem certeza que querem caramarão?" "Claro meu chapa", disse eu, mas não estou vendo ninguém aqui para nos vender. Olhou-nos de novo e mandou esperar, ele entrou na única casa boa daquele lugarejo e depois de algum tempo me surge o dito com dois sujeitos mal encarados cabeludos e fedendo a bodum (cheiro podre de sovaco). "Aí moço, ceis querem camarão de qual qualidade?" Achei a pergunta besta, mas falei que era para pescar. Um olhou pro outro, nos olharam de soslaio e um deles falou: "É pra pescar?" Olha, o Zé Pedro vai com ocêis até a peixaria. Quando ele entrou no carro, a vontade que tive foi de sair, aquele cheiro de bodum empesteou o carro todo. "É aqui", falou ele saindo do carro. Estranhamos, mas ao perguntar por camarão ao moço na barraca escrito "Peiche Frescu" ele nos disse que só à tarde, quando chegassem os barcos. Mesmo assim não desistimos, na barraca vendia quitutes aos possíveis banhistas, conversamos com o dono e ele nos cedeu uma pequena porção de camarões já fedendo. Agradecemos e até que enfim fomos procurar um local para pescar. Sem conhecer as paragens, lá fomos nós. Escolhemos um ponto naquelas falésias ao longo da estrada, e como não conhecíamos o ambiente, no ponto escolhido acabamos perdendo várias "paradas" com anzóis. Pra não dizer que não pescamos nada, fisgamos dois berés pequenos. Voltamos para a pousada e ao contarmos o lance com os caras esquisitos, o filho do Zico, Capitão de polícia nos deu um esporro e falou que na região "camarão" é bucha de maconha. Quase que nós, sem querer, entramos no mercado das drogas. Mas acho que com bucha de maconha no anzol, pegaríamos muito mais que aqueles dois berés com camarão podre. Isto que aconteceu foi só o início de uma série de infortúnios que contaremos em outra oportunidade.
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PESCARIA NA BAHIA - II Lá vamos nós de novo, desta vez nos programamos para um passeio de barco. Verificamos as possibilidades locais e achamos mais interessante um passeio de Corumbau para Curumuxatiba. Tomamos aquele café da manhã e colocamos os carros na estrada. Depois de certo tempo, chegamos a uma pequena Vila, chamada de Corumbau sabe Deus o por quê. Achamos o caminho da praia, e lá estava aquele barco antigo e que tinha sido adaptado para turistas incautos como nós. Ficamos receosos porque estávamos em doze pessoas e achamos que aquele barco era pequeno para todos nós. Mas o pescador nos convenceu que era seguro, que nunca teve problema, tinha rádio de comunicação, salva-vidas... Como no local não tinha outra opção resolvemos arriscar. Para pegar o barco, tínhamos que pegar um barquinho de alumínio (barco salva-vidas) que mal dava quatro pessoas. Fomos carregados aos poucos para o "barcão" e neste ficamos mais cabreiros ainda. Como tudo era festa, seja o que Deus quiser. O pescador ligou o motor, logo vimos que era daqueles antigos: pó, pó, pó, dirigindo por um canal de pedras nos levou para o alto-mar. Depois de certo tempo balançando ao sabor das ondas (algumas mulheres já estavam vomitando) chegamos a um lugar que o pseudo capitão nos informou que era ótimo para mergulho. Ao longe conseguíamos ver uma tênue linha de terra, portanto a quilômetros da praia. Eu e Casotti colocamos máscaras, respiradores e mergulhamos. Foi aquela surpresa, não se enxergava nem um centímetro à frente do nariz.Voltamos para a superfície e reclamamos com o pseudo que não se via nada e ele com a maior cara de pau respondeu que talvez fosse a época, que no verão era bem melhor, e não disse mais nada. Em seguida foi ligar o motor para continuarmos a viagem. Mero engano, o motor não pegava de jeito nenhum e com aquele balanço, já surgiam baiacus incentivados pelos alimentos dados tão gentilmente pelas mulheres à beira do barco. Não se via viva alma naquele oceano e o pseudo para dizer que tinha rádio, pegou aquele trambolho e iniciou a ladainha: "Alô, câmbio, pseudo falando. Alô câmbio" e nada. Câmbio e desligo, porra. 19
Resolveu abrir o porão para tentar consertar, não conseguiu nada, o tempo passava e ficamos apreensivos. Casotti tão entendido em vários motores (geladeira, liquidificador, ferro elétrico e também de carro) resolveu dar uma olhada e se apavorou.Tudo era na base da improvisação, em alguns setores do motor eram puxados por barbantes, cordas, etc. Foi assim mesmo, direto no arranque ou ignição, sei lá, tirou aquilo e começou a mexer. Verificou que faltava contato entre uma peça e outra. Foi resolvido com um pedaço de arruela da carretilha de Zico que tinha estourado no currico que ele tentou fazer no caminho até ali. Casotti então adaptou esta peça e conseguiu o milagre de ligar o motor. Foi aquele alívio, ficamos na dúvida se deveríamos continuar ou voltar. Resolvemos, já que estávamos ali, continuar. Tempo depois, avistamos Curumuxatiba, demos graças a Deus e ao parar o barco em frente a Vila, tivemos que ir a nado para a praia enquanto as mulheres se espremiam no barco de alumínio. A Vila não tinha energia e passeando pelo local atrás de um restaurante, paramos num boteco e um moleque foi buscar as bebidas na única geladeira à querosene no local. Em pouco tempo esquecemos as agruras e bebemos cerveja e refrigerante gelados. No pátio do bar tinha uma carcaça de tubarão que tinham pegado semanas atrás, e o pior da estória é que foi no lugar que mergulhamos. Olhei pro Casotti e pensamos "Que filho da puta do pseudo". Mas, acabamos almoçando peixe frito e batatas. Após o lauto almoço, voltamos para o destino. Olhamos da praia aquele barquinho, mas como não tinha jeito lá fomos nós de novo. Desta vez o debilóide resolveu ir mais perto da Costa e quando ia tudo bem, o barco dá um solavanco e o pseudo diz que podia ter sido uma rede de pesca dos pescadores locais. Aos solavancos conseguimos nos desvencilhar da rede. Minutos depois minha esposa Laci e minha filha Gisele começaram a sentir o convés quente. Falamos com o pseudo e este quando foi verificar, levantando a tampa do porão, subiu aquela fumaceira e foi o caos. Na gritaria de "fogo", minha filha quis se jogar no mar e foi contida pelo meu sobrinho capitão, que berrou para pegarem os salva-vidas. O pseudo pediu para eu ficar comandando o barco. Como estava fora da cabine enfiei a mão pela janelinha e mantive o leme numa única direção, minha filha gritava para eu virar pra praia, mas o pseudo mandou ir reto que ali tinha muitas pedras ao redor. Ficamos naquele impasse, uma fumaceira doida, o pessoal meio apavorado querendo pular, 20
fora a gritaria e eu ainda levando o leme com uma mão só. De repente a fumaça diminui e o pseudo apareceu com a cara toda enfumaçada do porão dizendo que foi a borracha que jogava água para fora, que tinha derretido e pegado fogo. Grande tranquilidade, só matando um cara desse. Não podíamos parar senão o barco ia encher de água pelo buraco do ladrão e com isto, seguimos adiante. Enfim surge o tal do canal de pedras e chegamos à praia salvadora. Foi aquela sensação de estarmos salvos que nos deixou enfim mais tranquilos. Acho que nestas praias paradisíacas da Bahia, deveria ter uma fiscalização rigorosa da embarcação desses pilantras que utilizam turistas incautos, verdadeiras bestas quadradas como nós, que se sujeitam a passear em barcos sem nenhuma segurança ou condição. Se fosse um país ou estado sério isso nunca teria acontecido. Após estes reveses, o pescador de praia Deomar Bittencourt deu tchau a Bahia.
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PESCARIA NOTURNA EM PIÚMA Há alguns anos resolvi, com minha esposa Laci, levar nossos netos Tadeu (8) e João Paulo (5) para passar um fim de semana em Piúma. Como aquelas regiões são muito piscosas, resolvi levar a vara e as tralhas que acompanham. Chegamos à tarde, à noite resolvi pescar numa pedra próxima a saída do rio, onde segundo os pescadores locais costuma dar muito robalo. Fui a pé por ser bem perto de onde estávamos e, comecei a pescar com aquela sensação de uma grande pescaria. Com pouco tempo, já iniciaram as puxadinhas, indicando que tinha alguma coisa na área. A luz no local não era tão boa, porque o poste mais próximo ficava a uns 50 metros, mas dava pro gasto. Em nova beliscada, dei a fisgada característica e senti a vibração de um peixe agarrado. O pouco tempo que levei para tirá-lo já serviu para desestressar a semana, e por azar lá veio um bagre de um pouco mais que um palmo. Para quem esperava um robalo, foi uma ducha fria, mas como era o primeiro e a pescaria nem bem tinha começado, continuei a tentar. Nova puxada, desta vez mais forte, nova luta e novo bagre. Por infelicidade, este, na hora de ser tirado do anzol, escorregou e ao tentar pegá-lo fui direto ao espinho lateral do mesmo e aquilo dá um furo e uma dor que só quem sentiu é que sabe. Ajeitei o mais que pude o ferimento, lavei com aquela água salgada, sabe Deus se limpa, e após enxugar, apertando bem o local, senti uma melhora e resolvi continuar a pescar. Aquilo me deixou acabrunhado e continuou a doer por bastante tempo. O pior foi que a nova puxada só vinha bagres e todos pequenos, o que me deixou psico e com o maior cuidado para tirá-los para não acontecer o acidente de novo. Lá pelas tantas resolvi ir embora, quando surgiu na última puxada uma galhada, que me fez lembrar uma pescaria feita por meu pai, ao ver de perto a galhada, percebi que a mesma estava se balançando e pude verificar que se tratava de uma lagosta que sozinha devia pesar mais de quilo. Fiquei grato pela pesca, mas sofri durante todo o fim de semana, com a dorzinha bagral em minha mão. Chegando a pousada, descartei os bagres, mas pedi ao cozinheiro para preparar aquela lagosta, que além de estar maravilhosa, foi feita, acredito eu, por um chef de cozinha francês porque deu pra sentir aquele gosto de crustáceo marinho de primeira qualidade. Portanto, a pescaria não foi toda perdida e o fim de semana valeu pela galhada. Do pescador agora de pedra, Deomar Bittencourt. 22
PESCARIA EM GUARAPARI Guarapari, conhecida mundialmente como praia das areias monazíticas (radioativas), para nós capixabas é apenas a Cidade Saúde. Antigamente paraíso dos velhos reumáticos, hoje causa outro tipo de reumatismo, o das morenas em seus biquínis cavados e dos rapazes sarados incluindo neste grupo, este pescador. Para se ter idéia da importância destas areias, foi palco na Segunda Guerra Mundial de tentativa dos alemães para transformarem sua irradiação em bomba atômica, sabe Deus como. Fui juntamente com meu cunhado e familiares, passar um fim de semana neste aprazível balneário. À noite, aquele churrasco regado a cerveja e é bom informar que na segunda latinha já tô chamando urubu de meu louro e contando as mesmas piadas de décadas, mas no grau cervejético do momento, caímos na gargalhada. O que foi bom é que marcamos para o dia seguinte, à tarde com maré cheia, uma senhora pescaria na praia, ao lado da Praia Areia Preta. Domingo aquela farra, almoço caprichado, uma moqueca de cação, camarão e de sobremesa pudim de leite condensado que só minha mulher sabe fazer. Após a comidaiada, preparamos as tralhas pesqueiras e lá fomos nós para o lugar combinado. Chegando lá, encontramos um pequeno espaço de areia por causa da maré cheia e ali nos preparamos para fazer uma limpeza nos peixes locais. Preparei a vara famosa (5,10m) e com aquela classe de anos de experiência, coloquei a parada de três anzóis, aquele camarão, do lameirão já nosso conhecido, e me preparei para o lançamento, vapt, lá vai a dita parada naquele marzão azul de Guarapari. Não precisou de muito tempo para pegarmos alguns berezinhos, que não dariam para satisfazer nem uma criança, apenas três berés de um palmo e dois dedos cada. Já estávamos desistindo, algumas horas depois, quando minha vara começou devagarzinho a embodocar, sem puxada, trinado ou qualquer semelhança a peixes que estávamos acostumados. Fiquei apreensivo porque embodocava cada vez mais. Comecei a recolher e o peso era fantástico, achei no momento que a linha não fosse aguentar, mas pescador cabreiro, fui puxando devagar e 23
aquele negócio esquisito foi gradativamente se aproximando. Depois de aproximadamente uns 20 minutos, apareceu dentro d’água uma mancha enorme, que cada vez se avolumava mais, achei que tinha pegado uma nova espécie de peixe pela largura do monstro. A partir daí a adrenalina se eleva, e principalmente porque uma onda salvadora juntamente com a puxada na hora certa, trouxe à praia aquele bonito exemplar de tartaruga, por sinal, uma senhora tartaruga. Pensei com meus botões, se tiver alguns fiscais do Ibama, tô preso. Meu cunhado Zico, não é o jogador, mas aquele cozinheiro dos pernis de porco, quibes e outros quitutes, correu e me ajudou a tirar da água aquela belíssima espécie de quelônio. Viramos a dita de pernas pro ar e ao procurarmos o anzol na boca da dita, verificamos para nosso espanto que a mesma tinha se enganchado com as patas nos anzóis. Retiramos os anzóis com cuidado, procuramos alguns fotógrafos no local para registrar o fato, mas, mais uma vez nada. Resolvemos então desvirá-la e vimos aquela beleza marinha se mandar pouco a pouco para o mar, calma e tranquila, voltar ao seu mundo marinho. Recolhemos nossas varas, conversamos que no passado daria uma bela sopa de tartaruga, mas nos sentimos mais felizes pelo desfecho daquela pesca. Guarapari pra mim virou sinônimo de tartaruga, e toda vez que pesco nas proximidades penso em pegá-la de novo, talvez meus netos tenham esta chance, porque que eu saiba, estas danadas vivem bem mais que nós, simples mortais. Estas lembranças me enchem de saudade e só de relembrar estes momentos, percebo como é bom viver neste mundo maravilhoso. 24
PESCARIA EM ITAOCA Saímos de Guarapari cedo, eu e meus cunhados Ozair e Zico. Fomos pescar entre Itaoca e Itapemirim. Praia maravilhosa por não ter nenhuma alma e é um verdadeiro paraíso para nós, pescadores. Nesta praia que deve ter uns 7km de comprimento, bem no meio dela, se encontra umas dez casuarinas que algum santo plantou há décadas e que dá uma ótima sombra.
Depois de tirarmos as bugigangas pesqueiras, nos encaminhamos para o local de arremesso a uns 50 metros. Preparamos o material, aquelas paradas brilhando de novas com aqueles camarões vg e lá vai a primeira jogada. Enquanto arrumava a segunda vara, a primeira arriou dando o sinal de uma ótima pescaria. Dei aquela fisgada característica e senti o bicho preso. Pouco depois chegava à beira d'água um peixe parecido com chicharro que os pescadores locais chamam de "vento-sul". Ali então começou a verdadeira guerra, era jogar e puxar e lá vinha um, dois ou até três de uma vez só. Um turista passando no momento, me viu colocar um camarão no anzol e perguntou: "Uai, cêis não pescam com minhoca não?". Olhei pro mineirinho e em respeito a meu pai, mineiro macho de São Manoel de Mutum, quebrei o galho do roceiro e expliquei como se pesca em praia. O show continuava. Era eu, Ozair e Zico só pegando e enchendo o isopor. Lá 25
pelas tantas, um caminhão com centenas de farofeiros parou exatamente no nosso pesqueiro, aproveitando a sombra benfazeja. Tomamos até um susto de tanta gente que descia do dito. Maior surpresa ainda foi quando aquela multidão de gente partiu pra cima da gente, e eu meio receoso, me abaixei e peguei disfarçadamente uma faca. Passaram que nem furacão e se dirigiram para a água de roupa e tudo. Alguns entraram e outros ficaram correndo que nem cabritos em frente as nossas linhas. Na mesma hora chamamos os debilóides para saírem dali que era perigoso, tinha anzóis, etc. Afinal, estávamos pescando desde cedo ali e blá-blá-blá... Não adiantou nada, nos olhavam sorrindo com cara de aparvalhados, mas não saíam da frente de jeito nenhum. Uma praia de mais de 7km, os energúmenos resolveram ficar exatamente no nosso ponto, não nos deixando alternativa. Para não matar ninguém, saímos do local. Recolhemos nossas linhas com cuidado e com os últimos exemplares ainda rebolando nos anzóis, o que ocasionou um verdadeiro frenesi neles, fomos embora esperando que da próxima vez, aqueles energúmenos fossem tomar banho no meio dos infernos. Colocamos as tralhas no carro, esperando retornar em breve nos despedimos com o dedo central em riste para os aparvalhados, que ainda davam adeus com aquelas caras de besta que só estes simplórios têm. Deste pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA DA VINGANÇA Maio de 2003. Estava eu tranquilamente levando minha esposa Laci ao dentista na Praia do Canto, quando o sinal da Rua João da Cruz com a Avenida Rio Branco fechou. Estava bem atrás de um carro, já quase em cima da faixa de pedestre, quando o carro da frente foi, e eu vi que não daria pra mim, parei o carro, infelizmente, em cima da faixa. Aproveitei e pedi a Laci para saltar, que o dentista ficava bem próximo da esquina. Quando ia sair de novo, um senhor que passava falou que o guardinha estava me multando. Dei a volta no quarteirão e fui conversar com o dito e explicar o acontecido. O desgraçado não quis nem saber e falou que eu era um perigo para os pedestres e que a multa não seria retirada. Fiquei psico e depois de discutir com o multador, que é só para isto que servem, resolvi ir embora. Maio de 2004. Combinei com Zico uma pescaria na antiga Praia do Cemitério, na Barra do Jucu. Saímos no domingo bem cedo e ao chegarmos nos deparamos com uma praia maravilhosa. Aquele mar limpo, ondas médias e o sol num céu claro, mostrando que seria um excelente dia para a pesca. Realmente naquele lugar, próximo das pedras, o sargo e o dentão apareciam com frequência. Dito e feito... Começamos em pouco tempo a tirar belos espécimes destes peixes. Depois de certo tempo, demos uma parada para comer uns sandubas e deixamos as varas armadas para qualquer eventualidade. Minha vara de repente, começou a embodocar, mas sem nenhuma puxada. Estranhei e fui ver o que era. Ao dar a fisgada, senti um peso enorme nela e comecei a recolher a linha. Aquilo demorou um tempão. Já estava achando que seria ou um peixe enorme ou um monte de algas agarradas no anzol. Pouco tempo depois, saiu da água, nem uma coisa nem outra, mas um cachorro morto agarrado na "parada". Puxei o bicho com cuidado e ao colocá-lo na areia tomamos até um susto, quando saiu de dentro da carcaça uns dez siris, corremos e pegamos os ditos e colocamos numa sacola de plástico. Aquilo 27
fedia que nem carniça podre. Puxamos o animal mais pra cima e enterramos ali mesmo na praia.
Ficamos pensando o que faríamos com os siris, que tinham comido aquela carniça que nem urubu. Resolvemos depois deste episódio, ir embora, carregando os peixes e a sacola de siris. Qual não foi minha surpresa ao irmos para o carro, ao me deparar com aquele guardinha que me multou. Percebi que ele não me reconheceu. Estava o mesmo com uma senhora que devia ser sua mãe e a namoradinha de mãos dada. Na mesma hora peguei a sacola dos siris necrófagos e perguntei se eles não queriam uns siris que pescamos na área. Na mesma hora o multador aceitou e agradecendo foram embora. Pegamos o carro e nos mandamos. Espero que os siris deem apenas uma diarréia braba e que no futuro quando ele multar, se ele ler esta crônica, sua barriga ronque de medo de no futuro ganhar outra sacola sabe Deus com o quê. Do pescador multado e vingado, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA NO CARNAVAL DE JACARAÍPE Terça-feira, último dia de carnaval. Em Jacaraípe, pra quem não conhece, tem um bloco chamado "As Ratazanas" que empolga todas as noites os foliões locais e até de outros países. Pena que com a invasão de áreas próxima a lagoa neste bairro, chegou alguns marginais que empesteiam a localidade. No passeio deste bloco pela avenida beira-mar, pelo menos, a tranquilidade acontece, não só pelos foliões com suas famílias, como também pelo brilhante trabalho da polícia. Carnaval maravilhoso, mas dei um azar danado. Minhas duas bicicletas novinhas compradas no natal, mesmo com correntes nas rodas traseiras, foram levadas por estes marginais da área, mas com mandinga muito forte, espero que tenham hemorróidas daquelas bravas. Fora este pequeno problema, resolvi na manhã de quarta-feira, cedinho, bem cedo mesmo, pescar em frente de casa. Preparei como sempre dois camarões gigantes e arrisquei numa igaratéia um pedaço de manjuba. Joguei com aquela técnica lá no meio do oceano e enquanto voltava para colocar a vara no fincador, quase caí pela potência da puxada. A vara embodocou pra valer, e começou a cantar o molinete dando linha pro danado. Recuperei-me, agora com adrenalina a mil, segurei a vara com força e senti toda a musculatura do meu corpo, e haja musculatura, fazendo aquela força para aguentar o rojão.Tomei até um susto quando uns oito foliões, vindo do final da farra, chegaram e começaram a torcer. Aquilo me incentivou e mesmo perdendo linha me preparei para o embate com aquele peixe incrível. Mas aos oito se juntou um bloco e começou aquele ti-ti-ti e tome samba: "Pega, pega o peixão, que este pescador é o bão" e tome também tamborim, pandeiro e surdo. Com o samba comendo solto, cheguei a ensaiar uns passinhos e quase caí com nova carga do peixão. Percebi que o peixe não entendia nada de samba e dei duro para não perdê-lo. Mas o pessoal em volta da vara, foi aumentando significadamente e tome mais samba "Puxe, puxe que o peixe é grandão, mas nosso pescador não é mole não".Tum, tum, tum e por aí vai, tome samba. 29
O peixe nem quis saber, me fazia suar e com aquela cantoria da turma sambando na praia parecia que eu estava com a batuta (vara). Já ia mais de hora e a multidão só aumentava e toma samba: "Este cara é o bom, vamos ajudar a pegar, porque se ele perder todos nós vamos chorar. Hu, hu, hu o peixe vai tomar no cu",Tum, tum, tum o tamborim repicava e eu ali no centro do bloco, suava em bicas, mas já percebíamos a uns 50 metros a água revolta, sendo arremessada para cima pela cauda do dito. A maré estava vazando e já dava pra ver a enorme sombra dentro d'água. O bicho realmente era enorme. Alguns foliões começaram a gritar: "Vamos ajudar que o bicho vai pegar". Olhei aqueles foliões, a maioria estava bêbada e pensei tô ferrado, vão acabar me atrapalhando. Dito e feito, há uns dez metros da areia com a maré baixa, o peixe já aparecia em toda sua plenitude, foi nessa hora que uns cinco foliões caindo de bêbados, entraram água. Meu Deus é agora que a vaca vai pro brejo. Mas por incrível que pareça, os doidos partiram pra cima do peixe e pularam nele. Tentaram agarrá-lo, mas dois foram logos jogados a escanteio, mas os outros seguraram pela cabeça e com muito esforço conseguiram tira-lo d'água. Agora dava pra ver que era um grande cação.Trouxeram para a areia e foi aquela farra, logo em seguida, mais samba: "Pegou, aquele peixão, com ajuda dos bêbados, senão, não pegava não" Tum, tum, tum. Os tamborins acompanhavam a cantoria e ao chegar perto do bicho fiquei impressionado com o tamanho, devia ter um metro e vinte e pesar uns cinquenta quilos, por baixo. Toma fotos, toma samba, aí agarrei o cação com toda minha força e levantei o dito, quase morrendo do esforço e resolvi pedir silêncio, foi aquele silêncio de arrepiar, e tasquei a fala: "Pessoal, este peixe me deu a maior carga de adrenalina da minha vida e para agradecer a luta insana que o bicho teve pela sua vida, vou soltá-lo que ele merece.Aí foi aquela ovação, tamborim repicando e o pessoal gritando: "Solta, solta, solta". Levei o cação aos trambolhos até a água a ao colocá-lo nela, parece que senti que ele me olhou agradecido e pouco a pouco, foi indo até que numa última rabanada, sumiu no marzão. Lá vem samba de novo "Viva o pescador que o peixão soltou, hipe, hipe, hurra",Tum, tum, tum, aí não tive dúvida, parti para o meio da galera e caí do samba... 30
PESCARIA NO CARNAVAL EM SANTA CRUZ - O TRIO Domingo de carnaval, aquela farra, muita cerveja, churrasco na grelha, esperávamos passar o bloco "As Ratazanas", em Jacaraípe. Nesta passagem, muitas risadas pelas fantasias das mais variadas facetas usadas pelos foliões. Aquilo demorava horas porque tinha a volta do trio pela mesma rua da praia, e como o presidente da escola era meu sobrinho, sua mãe e sua avó ficavam ali assistindo. O trio parava em frente de casa e além de tocar várias marchinhas e sambas pra nós, ainda homenageavam a DonaVirgínia e Dona Lola, ali presente.
Depois da rasgação de seda, se mandava e pronto o carnaval acabava na área, mas o churrasco continuava até tarde. Foi numa hora desta que combinamos uma pescaria em Santa Cruz, que até bem pouco tempo atrás para se chegar ao outro lado do rio usavam-se barcaças, que cabiam em média 8 a 10 carros. Hoje, conta com uma moderna ponte que nos levou mais rápido ao pesqueiro. Este, fica na realidade em frente a Polícia Rodoviária Estadual, em plena terra dos chamados "Índios Guaranis" que vivem de vendas de bugigangas tais como pequenos arcos e flechas e outros apetrechos manuais. 31
Bem, chegando ao nosso pesqueiro bem cedinho e, como sempre, preparamos o material, demos aquela olhada no ambiente, escolhemos o melhor local e pronto, é só preparar "as paradas" e mandar ver. A pescaria estava realmente fraca, pescamos pequenos berés, e quando muito, uma corvina talvez de meio quilo. Lá pelas tantas, como estava o tempo deixando cair uma pequena garoa, resolvemos que se não melhorasse iríamos embora. A chuva na realidade apertou, e quando fui recolher a vara vi aquela beliscadinha bem pequena, não me preocupei e continuei indo pra vara, quando a puxada foi um pouco mais forte, parti pra fisgada e foi aí que a vara embodocou de vez e começou a zunir. Parecia um violão tocando com o vento com a linha esticada. Segurei o peixe e senti mais uma vez que era grande. A turma que já estava se preparando para ir embora, voltou a preparar novas jogadas incentivados pela minha possível performance. A luta foi brava, o peixe puxava e eu recolhia, ficamos assim um bom tempo até que o bicho se aproximou da beirada. Era um belo espécime de peixe, e meu cunhado sem pestanejar, fincou o bicheiro (vara com ponta de anzol grande para estas eventualidades) no dito. Qual não foi nossa surpresa em ver que aquele peixe tinha engolido um médio e o médio tinha engolido um pequenininho, portanto um TRIO num mesmo anzol. Resolvi contar este acontecimento histórico, porque fisgar três peixes na mesma hora em um só anzol, só eu mesmo. Algumas fotos foram feitas por alguns índios que estavam assistindo, e depois, é lógico que como único pescador que deu sorte, resolvi parar e chamar a turma pra ir embora, afinal de contas já tinha feito o que queria. O pessoal ficou meio psico, mas acabou aceitando porque a chuva já estava virando toró. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM ITAOCA - O PICNIC A melhor coisa da pescaria é a confraternização. Desta vez resolvemos sair de Guarapari, onde estávamos hospedados na casa de meu cunhado Ozair, para pescar em Itaoca. Éramos, eu, minha esposa Laci, minha filha Gisele, meu genro Casotti, Zico e sua esposa Ivane e Ozair e a esposa Dalva. Na noite anterior passamos várias horas preparando os quitutes para a pesca com picnic. Bem cedo, como sempre, sou o primeiro a acordar, fiz aquela bagunça na preparação do café da manhã e acordei meio mundo. Depois das verificações finais, em três carros nos dirigimos rumo a Itaoca, pesqueiro maravilhoso e fomos para aquelas casuarinas famosas. O tempo não contava, tínhamos todo o tempo do mundo. Preparamos em primeiro lugar, as barracas, carregamos os isopores cheios de comida, sucos e refrigerantes, éramos uns verdadeiros farofeiros, mas, com a característica principal: pescadores. Foi aquela vibração ao iniciarmos a jogatina de "paradas" carregadas de camarões naquele mar azul e próprio para uma grande pesca. O primeiro azar veio com minha esposa Laci que ao jogar a "parada", infelizmente não estava bem presa, e esta foi embora pelo céu afora caindo lá nas profundezas. Mas, pescador que se preza tem sempre uma série de outras reservas, e pronto lá estava ela mandando ver de novo. 33
Aí foi tudo festa, a peixarada beliscava toda hora e estávamos enchendo o embornal de belos espécimes. Foi aí que aconteceu aquilo que todo pescador conta e os caras que não entendem nada de pescaria, não acreditam. Minha esposa sentiu uma puxada e mais que depressa deu a fisgada e começou a puxar. Mas de repente, a vara embodocou e ficou aquela luta que todo pescador adora, vara encurvada, linha vai e volta e toma adrenalina. Laci já estava para pedir arrego, quando o peixe diminuiu a força e veio pouco a pouco aflorar na praia. Qual não foi nossa surpresa que na sua "parada" tinha dois belos giriquitis e, além disso, tinha agarrada, aquela "parada" perdida no começo da pescaria, com mais três barbudos dos grandes. Foi aquela gozação, fiquei mais eufórico porque recuperei aquela "parada" feita no capricho. Daí pra frente, tudo foi festa, comida, refrigerantes, papo furado... Bem mais tarde, já na hora de ir embora, sempre tem um que espera mais um pouquinho porque acha que aquele teba vai bater. Esperamos em vão o retardatário e por mais que se diga que é a última chance e não vai bater nada, aí é que todo mundo se engana. A vara do Zico, tinha que ser ele, que não tinha pego nada e tentava a última cartada, deu aquela puxada própria de grandes cações, ou seja, várias marradas seguidas. Voltamos todos pra ver o desgramado sortudo. Depois de uma luta aguerrida puxou um cação de três quilos, setecentos e cinquenta gramas, bem pesado. Esta cagada no final da pescaria gerou um problema, porque toda vez que vamos pescar, tem sempre um miserável que fica ali mais uma meia hora, retardando todos naquela vã esperança que vai bater aquele bicho. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA NO TUBARÃO Parece errado, mas foi no Porto do Tubarão. Jurei que nunca mais ia pescar de barco, pelo sufoco que já tinha passado em outra pescaria, onde por sinal emagreci seis quilos num dia, mas meu cunhado insistiu tanto que acabei indo. Quando se é pescador é igual mulher grávida, esquece da dor do primeiro filho e vai pro segundo, e lá fui eu. Neste dia a pescaria prometia, pegamos o barco no Canal de Camburi e seguimos tranquilo até em frente ao Porto do Tubarão, ali em pouco tempo começaram a surgir baiacus em média de 3,150kg, estava tudo indo às mil maravilhas. Pescava eu com uma vara de bambu reforçada, trabalhada por meu pai, emérito pescador e com uma senhora carretilha acoplada à mesma. Como tudo acontece quando menos se espera, lá foi a ponta da vara pro fundo com uma violência que quase me jogou n'água. Segurei o bicho me equilibrando no barco, mas a força que ele fazia pra baixo era tanto que a bela vara de bambu explodiu no meio e só ficou a linha agarrada no pedaço balançando. Meu cunhado, calmo e tranquilo, falou: "Deixe comigo". Pensei que ele sabia lidar com uma situação dessa e quando eu vi o que ele fez, não deu tempo nem de gritar. O debilóide enrolou a linha na mão e foi puxar. Aí meu filho, só Deus. O danado do peixe, que agora já supunha que pesava uns 100kg, deu aquela arrancada. E só vi meu cunhado gritando, seu corpo indo pra dentro d'água e ele se agarrando no barco, tentando soltar a linha, mas a sequela deixada nesta arrancada quase arranca os dedos do dito. Conseguiu se livrar da linha, mas esfolou a mão toda. Nesta puxada o bicho nem quis saber e foi carregando linha e eu nervoso, com a vara quebrada e sem condições de segurar o bicho dei aquela apertada no carretel, a linha zuniu e logo depois partiu. Minha pescaria acabou ali, sem vara, sem linha e com a carretilha pegando fogo de tão quente. Voltamos depois desta confusão para o Canal de Camburi e pelo menos pegamos antes do sinistro, uma grande quantidade de baiacus e este peixe quando bem limpo é o melhor filé de peixe do mar, mas se não souber, não arrisque a limpar, que o veneno de um baiacu mata até 300 pessoas adultas. Foi uma experiência espetacular, mas meu cunhado passou a semana com a mão enfaixada, e acredito que nunca mais fará uma asneira como aquela de novo. Portanto, pescadores de plantão, se estiverem numa situação parecida, deixe o pau rolar, mas nunca segurem a linha com a mão que as consequências poderão ser trágicas. Do pescador de praia, agora embarcado, Deomar Bittencourt. 35
CAMPEONATO DE PESCA EM CAMBURI Um dos maiores eventos de pescaria no Espírito Santo foi quando meu pai era o presidente do clube de pesca. Sua paixão pela pesca era igual a sua paixão pela profissão de médico. Trabalhava durante a semana, mas no fim desta, a . pescaria era sagrada. Ele resolveu nesta época realizar um campeonato de pesca em Camburi. Como foi o primeiro realizado, algumas dificuldades foram aparecendo, mas à medida que vinham, dava um jeito. Sei que no dia do evento, com equipes até de outros estados, estávamos lá, com aquela disposição e pensando logicamente em ganhar aquele primeiro troféu de pescaria do nosso estado e em nossa . praia. Sábado e domingo das 6 da manhã às 12h, o campeonato foi encerrado às 12h do domingo. Os peixes eram catalogados por tamanho, peso (sempre maior que um palmo, menor não valia pontuação), quantidade de peixes e pronto era só somar e tinha o campeão. No sábado, como todos os outros pescadores, foi uma pescaria de berés. O que valeu foi a quantidade porque o tamanho eram todos pequenos. No domingo que iríamos decidir a questão. Eu estava entre os primeiros colocados por ter pegado uns oito peixinhos, mas o que eu queria . era um grandão. Nem deu para pensar quando a vara embodocou e lá dentro d'água, vi o bicho se remexendo fora dela.Vi que era um grande baiacu arara. Fiquei com medo dele cortar a linha, mas como estava com suportes de aço no anzol, aguentou as mordidas do dito. Trouxe aquele belo exemplar para a praia e já me considerava o vencedor. Todo mundo que passava falava "o seu até agora é o maior." Era 8h30 da manhã e até às 11h30 só dava meu peixe, nisto um banhista passou e falou que lá embaixo, um velhote tinha pegado um cação de quase seis quilos. Puxa, fiquei psico, e só não xinguei mais o cara porque já não conhecia . mais palavrão pro dito cujo. Nisso a buzina toca encerrando o torneio. Recolhemos as varas, pegamos as tralhas, os peixes anotados pela equipe vizinha e fomos para a Ponte da Passagem que a entrega de prêmios seria no Posto do Celso, meu cunhado e um dos organizadores do torneio. Chegando lá, quis saber quem foi o debilóide que tinha me levado o troféu na última hora, e qual não foi minha surpresa de ver que tinha sido meu pai, que com aquele seu sorriso maroto, falou que eu ainda era imberbe em pescaria, mas que com o tempo ele ia me . dar mais algumas dicas. Não falei nada dos palavrões e tive que humildemente reconhecer o mestre. Agora já não está com a gente, mas continuo usando "suas paradas" geniais e tenho certeza que de onde estiver torce por um peixão em nossas varas. Do pescador sentimental e de praia, Deomar Bittencourt. 36 34
PESCARIA EM ITAÚNAS - A REVANCHE 26 de fevereiro de 2011, esta data vai ficar na história. Saímos de Vitória um dia antes para passarmos o fim de semana em Itaúnas. Já estávamos com tudo preparado. Pousada do Cezinha "Estalagem Vila Tânia", saímos cedinho no sábado para pescar na extensão de Itaúnas, mais propriamente Riacho Doce. Fica há mais ou menos doze quilômetros de onde estávamos. Tomamos nosso café, ajeitamos o material e lá fomos nós, eu e meu genro Casotti. Após uns 50 minutos naquela estrada no meio dos eucaliptos, começamos a sentir que tínhamos errado o caminho, mais adiante uma placa indicativa de "Costa Dourada - Bahia", resolvemos voltar do meio do caminho e tentar na volta acertar. Achamos algumas placas velhas que nos deram a luz de Riacho Doce e só ficamos mais tranquilos quando começamos ler placas do Celsão, tais como "Sorria, você está sendo filmado", "Comida horrível, cuidado"... Depois de muito penar e atrasar nossa pescaria em mais de hora, chegamos. O caminho, para quem conhece o local, é bem difícil porque sobe um morro de areia íngreme e depois de atravessar este caminho no meio da mata, anda mais um bocado e finalmente chega à praia. Pois bem, azar pouco é bobagem, estávamos chegando ao cume do morro, já iniciando a descida quando demos de cara com um bando de porcos do mato. Os javalis ficaram nos encarando, eu e Casotti ficamos paralisados. Colocamos as varas na frente dos bichos e como fui lutador de Kung fu, dei o berro característico de Bruce Lee, que acho que foi ouvido até em Itaúnas. Pronto, os porcos selvagens dispararam para o meio do mato, apavorados e meu genro com o susto, já disparava para o carro. Aí berrei, agora como gente, sem tá cagado e meu genro parou olhou pra trás e muito cabreiro foi voltando e nos mandamos morro abaixo em direção a praia, onde pelo menos me pareceu ter a respiração voltado de novo.
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Com muito custo, ainda tremíamos um pouco, ajeitamos o material e sempre olhando pra trás, fomos pouco a pouco voltando ao normal e rindo da situação, sabe Deus como. Ao fisgar o primeiro pampinho, o susto foi embora e começamos a pegar berés típicos daquela praia, e lá do céu um gavião enorme passeava dando piados agudos. Quando resolvemos ir embora, aí que aconteceu uma coisa que ninguém acredita. Ainda bem que tenho meu genro de testemunha apesar de mais uma vez esquecermos a maldita máquina fotográfica. Na recolhida final, minha vara embodocou, dei a fisgada e comecei a puxar um belo espécime de peixe, que vi se tratar de um robalo pelo pulo que deu fora d’água. Fiquei tenso, e para não perdê-lo usei todos os truques de um bom pescador. Ao tirar o dito d’água e arrastá-lo pela areia, quase caí duro de susto quando o gavião num voo rasante grampeou as garras no robalo e resolveu me roubar o dito, alçando voo instantaneamente, com o peixe em suas garras. A chumbada subiu vertiginosamente e fiquei com o pássaro no ar tentando levar o peixe e eu segurando com força da areia com a vara envergada e o bicho preso no ar. O gavião parecia um beija-flor, parado batendo as asas e eu segurando, puxando a linha e naquela luta nos encaramos. O desfecho final foi que fiquei com a boca do robalo presa no anzol e o peixão foi-se embora nas garras do pássaro balançando no ar, e ainda ouvi do desgraçado do gavião aquele piado de deboche. Calculei que seria difícil, muito difícil o pessoal acreditar, mas levei a boca como prova, para mostrar que não estava mentindo e sempre na narrativa perguntava ao meu genro "È mentira, Casotti? Não foi verdade?". O importante é que da próxima vez que for pescar nesta região, vou armado para comer javali à pururuca e gavião ao molho pardo.
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PESCARIA - MINHA PRIMEIRA VEZ Na década de 1970 teve uma propaganda famosa que usou esta fala "Minha primeira vez", pois bem para esta pescaria vou utilizar a mesma porque foi realmente minha primeira vez. Recém-casado com Laci, morena bonita de corpo escultural, com 18 aninhos e eu já com meus 28 anos, pedi arrego naquele domingo e com meu cunhado Júlio, garoto de 15 anos, fui pescar próximo de casa, em Jacaraípe. Como sempre, utilizamos uma série de mandingas para a pescaria dar certo. Naquele dia utilizei a mesma roupa que tinha me dado sorte da última vez, cueca branca, bermuda xadrez, camiseta preta, sandália japonesa azul e um boné amarelo. Estava perfeito, figurino digno para andar nas ruas de Paris. Chegamos ao pesqueiro, preparamos as tralhas e começamos a tentar a sorte naquele marzão azul maravilhoso. Como sempre os berés são sempre bemvindos, mas estava a fim de um grande peixe. Preparei num anzol aquele corrupto e caprichei na linha transparente para segurá-lo, no outro anzol coloquei aquela amenjoa que me custou uma nota (parece ostra, só que é mais dura), mesmo esquema do outro e por fim um senhor camarão no último anzol. Falei para o meu cunhado: "É hoje que vou pegar aquele teba", e mandei ver. . A chumbada sumiu naquele oceano, finquei a vara no fincador e sentei para esperar. Aquilo foi realmente maravilhoso. Minha antiga vara cinza de 4,8m estava parada, um leve balançado da brisa marinha e, pelo material que coloquei, era só esperar pra ver. Dito e feito, de repente a vara arriou e balançava que nem doida. Corri para a "bicha" e ferrei o peixe que se atrevia a me enfrentar. Olha, ninguém consegue falar qual é a sensação de um peixão na linha. Só sentindo para entender o porquê da adrenalina ficar a mil. Meu coração batia descompassado e a taquicardia era normal para o momento. Só vi quando aquela peça larga e branca passou correndo, voando na realidade, no meio da 39
onda me fazendo suar de emoção. Puxei com calma, loucura aquele exemplar magnífico! Ao chegar à areia, depois de um embate violento e duradouro, arrastei-o para terra firme e o desgraçado se soltou na beiradinha e ficou se debatendo. Corri com a vara na mão para segurá-lo, mas meu cunhado foi mais rápido e deu um chute no dito que o mandou para fora da onda que chegava.
Apavorado por quase ter perdido o peixe, ainda dei um brigueiro no meu cunhado para não machucá-lo que era um belo exemplar de pampo. Foi "minha primeira vez" em Jacaraípe que peguei um bicho daquele. Como sabia que outro ia ser difícil, e realmente só aconteceu muitos anos depois, encerramos a pescaria com os berés pescados e levamos o pampo ainda vivo pra casa. Foi aquela festa, moqueca para umas 20 pessoas e com a melhor iguaria do mar, que é o pampo, carne branquinha, quase não tem espinha, só a central, cerveja gelada, muito papo e aquele pudim de leite condensado de sobremesa. Foi um domingo pra ficar na história. Depois é lógico, voltei a minha performance como marido e hoje com a filharada e os netos pescamos nas costas carregadas de peixes do Espírito Santo. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt. 40
PESCARIA - DESCOBERTA DE PESQUEIRO Há uns 30 anos pescando com meu pai e meu cunhado Celso, lá pras bandas de Nova Almeida, vimos que como os peixes estavam difíceis de aparecer resolvemos andar mais um pouco e quem sabe descobrir novo pesqueiro. Paramos numa pequena praia, logo depois de uma curva no fim da Praia Grande, e ficamos sabendo que era chamada Praia do Califa. Perguntei a um velhote sentado numa pequena pedra ao nosso lado, ele disse o porquê daquele nome, perguntei se naquela praia dava peixe, o velho respondeu de forma difícil de entender (ele não tinha dentadura) que a praia não dava peixe e tinha o nome de califa, porque um tal de Sadan há muito tempo passou por ali e acampou no local com seu harém. Encaramos o velho e pensamos, é totalmente doido. Mas à medida que o tempo passou não tivemos nem uma puxada de peixe e se isto era verdade a outra estória também podia ser. Nos mandamos dali pra outro ponto bem mais pra frente. Depois da Praia dos Padres, também não sabíamos o porquê desse nome, chegamos a um local ermo em que deixamos o carro no meio do mato e atravessamos um riozinho, que pelo barulho das ondas o mar estava próximo. Realmente achamos um verdadeiro paraíso, escondido, limpo e bem promissor. Iniciamos a preparação das varas e nem bem jogamos, lá veio a primeira puxada. Dali pra frente foi só alegria, era um peixão depois de outro. Fizemos uma verdadeira lavagem na área e depois de algumas horas pescando, com mais de 40 peixes grandes e médios pescados fomos embora, jurando que não falaríamos pra ninguém daquele pesqueiro e já combinando para o próximo domingo retornar para nova limpeza na área. Foi a semana que passou mais devagar das nossas vidas. Enfim, o domingo chegou. Saímos cedinho de Vitória e escondendo o jogo de outros colegas pescadores partimos pro pesqueiro secreto. Qual não foi nossa surpresa ao chegar lá, não tinha nem lugar para estacionar. Aquilo estava cheio de pescadores, e todos já estavam há algumas horas no local. Olhamos um para o 41
outro e aí vieram as falas: "Bem, só contei pro Pedro, eu lá sabia que ele ia falar para os colegas dele?" falou meu pai. Em seguida meu cunhado disse: "Comigo não foi diferente, falei lá no posto para alguns amigos e ainda caí na besteira de mostrar alguns peixes". Não deu outra, tivemos que pedir licença para passar, e fomos pescar lá no canto e ainda demos azar que era próximo das pedras e como tinha agarrador perdemos muitas "paradas". Olhando para aquela praia linda e maravilhosa do domingo passado, dava até saudade. Tinha pra mais de 50 pescadores, parecia campeonato. Aí que verificamos que descoberta de pesqueiro bom, é coisa altamente secreta, não se deve contar nem pra mulher. Achar outro neste litoral vai ser difícil.
Convenhamos, não tinha outro jeito, algum dia alguém ia saber, pelo menos ficamos famosos na época pela descoberta. Hoje, tudo foi terraplanado, um bairro seco e de casas simples, surgiu no local. Procuro ainda há 30 anos outro pesqueiro igual aquele, mas acho que pelo andar da carruagem e com a idade chegando, vai ficando difícil. Quem sabe ouvirei de outro pescador sobre alguma praia secreta e possa dar o troco. Se vocês souberem de alguma praia cheia de peixe, podem contar, não falarei pra ninguém, eu juro. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA INÉDITA Na década de 1980, mais precisamente em 1984, fui com minha família passar um fim de semana em Guriri, São Mateus. Ficamos numa pousada bem aconchegante em frente ao mar e para não perder o costume levei meu material de pesca. Mas, naquele sábado, resolvi pescar no rio que corta a região. Contratei um barquinho de alumínio e com Milton, o barqueiro e me aventurei rio acima. Pedi ao mesmo que me levasse para um pesqueiro virgem, ele ficou meio cabreiro e falou que era difícil encontrar virgem no lugar, disfarcei e pedi um buraco que tivesse muito peixe. Aí deu um sorriso quase sem dentes e falou: "Pode deixar doutor, sei de um bão". Depois de quase uma hora andando naquele barquinho, apoitamos num braço do rio, em que só se via floresta de um lado e do outro e algumas árvores de manguezal para completar o quadro. Pensei, é aqui neste lugar ermo, que vou faturar peixões. Não deu outra, nem bem mandei a isca e lá veio aquela puxada característica de robalo. Logo em seguida o mesmo saltou fora d'água mostrando um tamanho lindo e maravilhoso. Dentro do barco estava difícil manejar o danado, pedi para o Seu Milton para encontrar um pequeno pedaço de areia que ficaria mais fácil para eu tirar o danado. Logo estava eu em terra firme, agora com mais tranquilidade puxando o dito cujo. Em pouco tempo trouxe aquele belo exemplar para a areia, aí que aconteceu o problemão. Ao puxar o mesmo, ele fez muita quizumba na água chamando atenção de outros predadores, mas para aquele, eu não estava preparado. Em plena areia com o peixe se debatendo, sai um jacaré de um metro e meio de dentro d'água e corre pro meu peixe e o abocanha. Tomei aquele susto, mas senti uma vibração louca pra pegar também o jacaré. Ele puxou o peixe pra dentro d'água e se enrolou na hora pra se soltar. Ainda bem que minha "parada" tinha distorcedor e aguentou o embate. Segurei com força e ferrei o bicho. Seu Milton, apavorado, queria ir embora com o barco, tive que berrar para me esperar, foi quando passou uns dez a doze preás debaixo da minha perna correndo pro rio, todas apavoradas. Meu coração ficou aos pulos e segurando a vara pulei no barco e mandei Seu Milton sair logo dali que o negócio tava 43
ficando russo. Nem bem nos afastamos da beirada, apareceu aquele animal enorme e espetacular em sua beleza animalesca. Uma onça do tamanho de um boi. A danada ficou nos olhando e eu ali ainda lutando com o jacaré na linha estava todo arrepiado, principalmente porque o danado se dirigia para o pedaço de terra que estava a onça. Não deu outra, ao ver aquele jacaré se debatendo na beirada, a onça deu um bote, o agarrou e puxou para a terra. Pronto, me senti o primeiro pescador do mundo a pegar uma onça no anzol com um jacaré como isca. Foi por pouco tempo, ela deu umas cabeçadas com o bicho na boca e se mandou pro mato. A vara ficou frouxa, pensei: quebrou tudo, mas ao puxar a linha, percebi mais uma vez que a "parada" estava intacta, com uma pequena boca de peixe agarrada ao anzol. E o anzol que tinha se agarrado no jacaré estava retinho, ou seja, se abriu com a puxada da onça. Seu Milton de preto, estava branco e com voz rouca falou: "Vão borá, seu dotô, acho que obrei e estou todo cagado". Como tentei falar e não saiu nada, balancei a cabeça como dando ordem pra irmos. Ao chegarmos ao local em que peguei o barco, saí meio de lado, peguei minhas coisas, botei no carro e ao querer falar tchau pro cara, não saiu nada, aí só levantei o dedo e me mandei. Ao chegar à pousada, corri pro quarto, e entrei logo no banho porque também estava todo cagado e não queria que ninguém visse. No banho experimentei falar ba, ba, ba pra ver que não estava mudo, aí fiquei mais tranquilo ouvindo minha voz de novo. Desci e fui encontrar minha mulher no salão de jogos, a turma toda estava lá. "E aí pegou alguma coisa?", era a pergunta de praxe. Tentei articular as palavras certas pro pessoal entender o que aconteceu e disse: "Rapaz, peguei um robalo, que foi engolido por um jacaré e que foi agarrado por uma onça" e fiquei ali esperando pra ver. Aí meu filho, foi aquela gozação: "Conta outra" e toma gargalhadas. Percebi que não tinha como os miseráveis acreditarem na estória, me dei por satisfeito e acabei rindo com a turma. Até hoje tava com este acontecimento na garganta, mas até que enfim vou dormir tranquilo, contei no papel pra vocês. Do pescador, agora limpo da cagada, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA NA ROÇA 1973. Dois meses antes de meu casamento com Laci, resolvi ir conhecer seus avós maternos que moravam lá no interior de Barra de São Francisco. A viagem de Vitória até lá, é em torno de 4h. Quando chegamos, paramos na casa de sua tia Verônica na cidade de Barra de São Francisco, onde almoçamos e depois seguimos mais para o interior até a fazenda em que moravam os nonos. Foi aquela surpresa para os velhos, que além de ficarem muito felizes com nossa chegada, nos ofereceram aquele cafezinho que só na roça tem. Passamos uma tarde agradável naquele ambiente calmo do interior e à noitinha voltamos para dormir na casa da tia Verônica, já na cidade. Pela manhã fui convidado a conhecer o sítio deles, que na verdade, pelo tamanho estava mais para uma fazenda. Perto da Sede, a uns 200 metros passava um rio que pelo papo dava muitos cascudos e outros peixes de rio. Empolguei-me e falei das minhas "qualidades" enquanto pescador. A tia Verônica na mesma hora me arranjou vara de bambu preparada para o rio, com fio de aço e anzol. Mandou o caseiro arranjar umas minhocas e depois, lá fui eu. Passei pela porteira, caminhei um pouco e logo cheguei ao pesqueiro. Ali, longe das preocupações mundanas me concentrei nas possíveis beliscadas. Não demorou muito e veio uma puxada que me deixou besta, aquilo afundou a ponta da vara que chegou a enfiar no rio. Briguei com o bicho e logo em seguida puxo um lindo cascudo, mostrando que realmente era um bom pesqueiro para aquele tipo de peixe. No passar do tempo aquilo foi se repetindo e eu ficando eufórico por pegar tantos peixes. Chegou uma hora que senti um calafrio na espinha ouvindo atrás de mim umas fungadas fortes, olhei pra trás e me deparo com um touro balançando a cabeça e batendo com a pata dianteira no chão levantando aquela poeira. Olhei para um lado, olhei para o outro e não vi alternativa a não ser o rio e o pior é que tinha acabado de ferrar outro cascudo ou piau sei lá, e aí o touro partiu pra cima de mim. Na hora nem pensei, joguei a vara no chão, tirei minha camisa vermelha a toda 45
velocidade e rezando para dar certo banquei o toureiro. Botei a camisa a minha direita e esperei o monstro chegar. Aquilo no momento foi minha salvação. O touro passou raspando em mim, carregou minha camisa no chifre e caiu dentro d’água. Pensei na vara indo pro rio, corri e ainda puxei o peixe que nem doido e ao olhar para o touro o mesmo se virou e começou a sair d’água vindo em minha direção. Larguei o peixe pra lá e corri como nos velhos tempos de colégio, mas senti que o danado estava ganhando terreno. Se eu fosse pela porteira a uns 200 metros ele me pegaria com certeza, resolvi ir para o lado da cerca a uns 50 metros de onde estávamos, mas percebi que a mesma tinha uns 1.20m de altura. Apavorado com o touro logo atrás, me lembrei que no colégio nos meus bons tempos, saltava 1.40m e pensei, ainda consigo. A cerca foi chegando, o touro também e na última hora me mandei pro ar. Antes, eu pulava de costas e passava uma perna depois a outra, só que não tava no colégio e nem tinha 15 anos, resultado: passei raspando na cerca, minhas costas ficou toda arranhada e minha bermuda, por azar, agarrou no arame farpado e deu aquele rasgão e só senti o bafo do touro chegando, me torci e caí do outro lado com o touro parando a uns 10cm da minha cara. Deitado ali no chão todo ferrado, me pareceu que o desgraçado olhando pra mim levantou dos dois lados da boca, aquela beiçola, dando um sorriso maroto. Fiquei psico e quando ele saiu se balançado, virei para o desgraçado e gritei: "Te joguei n'água sua besta". Parece que ele entendeu e partiu de volta, com o intuito de quebrar tudo, quando ouvi aquela voz feminina gritar: "Malhado". O bicho parou na hora. Tia Verônica chegou correndo, passou a mão através da cerca na cabeça do bicho e falou que ele era bonzinho, era só chamar pelo nome que ele se derretia todo. A vontade que tive foi de dar um cacete naquele touro. Voltei para a Sede da fazenda, me limparam as feridas, passaram aquele merthiolate, que só faltei pular de tanto arder e logo em seguida trouxeram os peixes, e o pessoal me gozando pela corrida. Nunca mais voltei ao lugar e agora 38 anos depois resolvi contar esse acontecimento que já o tinha guardado pra sempre na minha memória. Do pescador de mar, Deomar Bittencourt. 46
PESCARIA NOTURNA EM ITAÚNAS 01 de abril, sexta-feira. Fomos em 34 adultos e algumas crianças para a Pousada do Cezinha (EstalagemVila Tânia) nos divertir no fim de semana e, para os meus irmãos incrédulos, mostrar que realmente pesco e confirmo as minhas crônicas. A viagem foi aquela farra, muitas guloseimas e algumas garrafas de vinho e latinhas de cerveja, fora os refrigerantes. Paramos em Ibiraçu, onde comemos aqueles pastéis famosos com caldo de cana. Ao seguirmos viagem nosso chefão, resolveu colocar no vídeo um rock metaleiro da pesada, cantado por dois velhos barbudos americanos, que encheram nosso saco e nos deixaram surdos até a entrada da estrada de chão para Itaúnas. Demos graças a Deus quando chegamos. Fomos recepcionados com uma nova festa, com direito a macarrão à bolonhesa, caldo verde, caldo de feijão... Fomos dormir depois das 2h da manhã. Mas antes de dormir marquei com Leão e Hamilton a hora em que iríamos nos consagrar na pescaria, às 8h logo depois do café da manhã. Dito e feito saímos no horário e fomos para Riacho Doce, onde nossas pescarias foram sempre maravilhosas e queria mostrar para quem não acreditava nos peixões pescados a realidade dos fatos, ao vivo e em cores. Pois bem, chegamos lá às 9h e ficamos até às 14h, e só o Hamilton quem pegou dois berés. Não pegamos nada além de termos ficado vermelhos que nem camarão, naquele sol a pino. Mas também a maré estava de ressaca e puxando para a esquerda com força, era jogar e recolher a linha na praia. Resolvemos voltar, chegamos na hora do churrasco, foi aquela gozação. Falei obviamente que a pescaria tinha que ser com aquela maré noturna. Só que à noite, nem Leão nem Hamilton toparam e tive que ir sozinho. O lugar dava medo não só de almas penadas como também de animais selvagens. Mesmo assim fui sozinho. Chegando lá preparei o material com uma lanterna de luz led e joguei a "parada" para o marzão, olhando sempre pra trás com medo que algum bicho 47
aparecesse. Dava medo mesmo, eu sozinho ali com o matagal atrás de mim, o marzão pela frente e tudo escuro. Não quis nem saber e logo em seguida, senti uma puxada daquelas que estava esperando. Dei a fisgada e comecei a tirar um peixe que deveria ser grande, pela força que fazia. Não demorou muito e puxei um belo cação que se balançava na areia focalizado pela minha lanterna, nisso apareceu uma luz que vinha de cima, tomei um susto porque logo em seguida o peixe sumiu do anzol. Olhei pra cima e vi um enorme disco, há uns 30 metros de onde eu estava, com luzes girando embaixo e de repente ele sumiu. Fiquei apavorado e por pouco não fui embora. Pensei que os alienígenas queriam o meu peixe, senão tinha sido carregado também, assim preparei nova "parada" e mandei ver, olhando agora pra cima com medo daquele ovni. Tinha mesmo sumido, quando em seguida nova puxada e um peixe ainda maior que o primeiro fisgou. Comecei a trabalhar o dito, e depois de certo tempo surgiu na areia um, que pelo tamanho e estilo só podia ser um pampo enorme, e quase no mesmo instante, a luz surgiu de novo e meu pampo sumiu, olhei pra cima e as luzes lá estavam. O desgraçado do disco tinha ficado invisível e novamente roubou meu peixe. Aí vi que não tinha jeito, preparei depressa meu material e já ia embora quando a luz surgiu a minha frente e apareceu como mágica uma pequena panela de barro com postas de peixes. Liguei a lanterna e vi que era uma autêntica moqueca capixaba. Nem pensei direito, mas esses caras me quebraram o galho com meu peixe. Olhei pra cima e aí sim vi o disco sumir no espaço numa velocidade espantosa. Não quis nem saber, peguei o garfo que estava na panela, sentei ali na praia com a lanterna acesa e comi aquela moqueca que só minha mulher sabe fazer. Deliciei-me, mas como ia contar pra turma o acontecido? Resolvi então levar a panela de barro como prova. Ao chegar à pousada o pessoal já estava a fim de me gozar, quando contei o acontecido... pronto foi pior a emenda que o soneto. Não acreditaram e partiram pra cima de mim. Espero que meus amigos alienígenas mandem um e-mail para os incrédulos, para sentirem na carne, a minha verdade dos fatos. Do pescador de ovnis, digo, de praia Deomar Bittencourt. 48
PESCARIA EM LAGOA CONTAMINADA Esquistossomose, doença extremamente perigosa e dependendo da infestação, é mortal. Fiquei sabendo que em rios, lagos ou qualquer manancial de água doce em que tiver cercárias deste verme, elas penetram pela pele e causam a doença. Como sou meio psico com estas situações fiquei com medo de ir pescar nesta lagoa, em Jacaraípe, mas o pessoal estava comentando que o robalo estava dando mais que chuchu na cerca. Resolvi me preparar para esta pesca arriscada. Chegamos ao local, nos aprontamos para a festa do robalo. Preparamos o material e logo no começo sentimos que seria uma grande pescaria. Minha vara embodocou e quase que fui puxado pra dentro da lagoa, minha sorte foi que a bota que levei não me deixou molhar e com muito esforço, saí do perigo da água contaminada e consegui puxar aquele belo exemplar. Mas por vias das dúvidas, resolvi pescar embarcado, um pescador local, me emprestou com a maior gentileza, por R$ 50,00 paus o seu barquinho. Meus colegas preferiram pescar no local, com eles não tinha este negócio de doença não. Não quis discutir e me mandei para o meio do lago. Escolhi um grotão bem longe da turma, onde as beiradas eram só mata e manguezal. Pois bem, ali me senti tremendamente satisfeito, só eu e o lago. Ao jogar a "parada" senti que o lugar era bem fundo, melhor assim, pensei. Pouco tempo depois, minha vara começou a envergar, mas sem a puxada característica de peixe. Fiquei intrigado e comecei a recolher a linha. Qual não foi minha surpresa quando me apareceu na beira do barco uma espécie de lagarto com quase um metro até a cauda. Tinha uma cabeça oval e pequenos dentes ao longo de uma gengiva proeminente. Fiquei com medo de colocar aquilo "sei lá o quê" no barco, mas verifiquei que era meio inofensivo pela sua forma de agir, se balançando devagar e soltando um som como se estivesse chorando. Peguei e coloquei com o maior cuidado no barco e tirei o anzol que tinha agarrado em suas patas.
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Enquanto olhava pro dito, uma sombra gigante que se aproximava do barco, me chamou atenção. De repente surgiu uma cabeça enorme em cima de um pescoço de mais de metro. Fiquei branco de medo, e calculando o tamanho do monstro pelo balançar do rabo devia ter uns 10 metros. Aquilo me olhou bem de perto, senti aquele bafo de peixe podre e quando ele abriu a bocarra, contei umas centenas de dentes serrilhados, como de tubarão. Na mesma hora peguei o agora lagartinho e fiz menção de entregá-lo o que acalmou o monstro. Coloquei devagarzinho na água e vi, para minha alegria, aquele belo exemplar de monstro do Lago Ness mergulhar com seu filhote. Fiquei pensando no turismo deste Lago Ness onde nunca foi visto um monstro, mas só boatos, e eu ali ao vivo e a cores vi um belo espécime, calculado erradamente como já extinto, mergulhando na minha frente. Me mandei pro local onde meus amigos pescavam e ainda assustado contei o ocorrido. Além da gozação ainda me queriam levar pro hospício. Por isso que turismo não vai pra frente na nossa terra. Desisti de insistir no caso, mas iria voltar outras vezes para tentar tirar fotos do espécime para comprovar minha versão. Uma pena, mas os irlandeses conseguiram por marketing contar melhor uma estória irreal enquanto minha estória real passa para o esquecimento. Um absurdo! Mas o futuro, depois desta crônica será bem espetacular para Jacaraípe. Do pescador, agora paleontólogo, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM NOVA VIÇOSA (BAHIA) Quatro dias de folga, que beleza! Resolvemos conhecer uma pequena cidade na Bahia, conhecida como Nova Viçosa. Todas as pessoas que conversamos sobre o lugar, nos deram dicas de que lá, os peixes são enormes e ainda completavam dizendo que é uma das maiores praias piscosas do Brasil. Não deu outra, preparei meu material com o maior capricho e na quinta-feira com a mulher, filha, genro e neta, dirigimos para o merecido descanso. Saímos às 8h e chegamos cinco horas depois. Aos principiantes e profissionais em estradas do Brasil, ao sairmos do ES, entramos na maior quantidade de buracos que já vi na minha vida numa estrada federal. Deparamo-nos com três acidentes, causados pelos buracos. Um deles, o pai estava ao telefone e o filho abriu o porta-malas para pegar alguma coisa, o que resultou num carro todo amassado, caído num barranco; pouco antes vimos o buraco em que ele caiu, por pouco não caímos também! Uma cratera de mais de metro de largura e uns 40cm de profundidade. Um absurdo! A partir daí andamos mais devagar e ainda antes de entrar na estrada para Mucuri e Nova Viçosa, nos deparamos com mais dois acidentes por causa destes buracos. Realmente a BR 101 na Bahia é de dar pena! Ao entrarmos no trecho para a nossa folga, melhorou um pouco e pouco tempo depois, chegamos! A pousada era de nome pomposo "Cheiro de mar", pousada agradável e o fundo da mesma saía na praia, por sinal bem comprida. Água quente e excelente para banho e ótima para pescar. Nem bem nos enquadramos na recepção, parti para o quarto, mudei de roupa e me mandei junto com meu genro para pegar aqueles peixões tão decantados pelos "conhecedores" das praias do Brasil. Preparamos as varas e começamos a batalha. Primeira puxada veio quase em seguida da "parada" bater na água. Ainda falei para o Casotti: "É hoje que vamos lavar a égua!". Dei a fisgada e lá vem o primeiro, para a nossa surpresa, um "roncador", menor que um palmo. Para início estava bom, joguei o bicho na água e fui para o próximo! Era jogar, puxar, fisgar e trazer. Depois de 15 "roncadores" menores que um palmo, percebi que naquela praia só dava roncador e tudo pequeno, portanto dei a última jogada e aí sim veio um peixe diferente, um "bagre" também de menos que um palmo. Foi uma ducha fria. Resolvemos guardar as tralhas e tomar banho, que era mais saudável que
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pescar. Na sexta-feira, resolvemos perguntar aonde era um pesqueiro bom aos moradores locais e nos disseram que perto da foz do rio dava muito peixe. Partimos então para o pesqueiro e lá, nos deparamos com muitas pedras para conter o rio, mesmo assim arriscamos umas jogadas. Aconteceu o que prevíamos, ou seja, perdemos algumas "paradas" naquelas pedras e mais uma vez pegamos dois "roncadores" menores que os outros. Jogamos os dois na água e vi que NovaViçosa é terra de "roncador", não sei se é por causa do clima ou sei lá o porquê na Bahia, até peixe ronca. Ainda bem que enquanto estávamos quebrando a cara naquele pesqueirinho horrível, passou um pescador local e nos convidou para pescar na boca dos três rios (Peruíbe e mais dois que não me lembro) que se juntam na foz. Cobrou-nos um pequeno valor e lá fomos nós. Agora era outra conversa, barco grande, feito em Piúma/ES e lá fomos nós. Depois de uns 20 minutos de barco, chegamos ao lugar que disse o velho pescador ser o melhor local para pescada e robalos da área. 10h da manhã e com nova esperança, iniciamos a pesca agora embarcada. Não passou muito tempo e Casotti pegou seu primeiro peixe, um bagre de uns 8cm. Aquilo foi uma péssima impressão do que viria pela frente. Dito e feito! Ficamos lá até às 14h com o sol quente em cima da gente e não tinha como se esconder do calor. Pedimos então ao ilustre pescador que nos levasse de volta e realmente sentimos que Nova viçosa era só para mineiros, por sinal todos que conhecemos na pousada eram de Minas Gerais. Para pescaria... lugar extremamente problemático. Mas na praia deu pra ver o porquê da falta de peixe, pescadores locais em canoas, jogam redes de manhã e de tarde com extensão de pelo menos uns 500 metros de uma ponta a outra, isto várias vezes ao dia e várias canoas ao mesmo tempo. Não sobra nada pra quem quer ter o prazer de pescar na praia. Fomos ver o conteúdo dessas redes e ficamos abismados com a pouca quantidade de peixes e a maioria pequena. Os roncadores que sobram são aqueles que escapam dos buracos da rede e são estes que nós pescamos. Uma lástima! Da próxima vez vamos para as praias do Espírito Santo que aqui o peixe é maior e tem mais fiscalização nas praias para acabar com estas matanças exageradas das redes de pesca da Bahia. Do pescador de praia, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA PROBLEMÁTICA Dia de pescar, não sei quem inventou que tem que ser no fim de semana. Para modificar esse sistema, resolvi pescar na quarta-feira pela manhã porque de tarde tenho que trabalhar como todo bom brasileiro aposentado. O resultado foi incrível! Dia 04 de maio, passei para comprar camarão numa peixaria em Jacaraípe e fiquei sabendo que estamos no defeso (época que não se pode pescar camarão), resultado: fiquei sem isca. Mas, para não perder a pescaria fui mais longe, até Nova Almeida, mas também não teve jeito, não tinha camarão! Já meio desesperado, resolvi comprar outra isca, e a única que tinha era manjuba (sardinha). Não deu outra, comprei meio quilo e me mandei, já atrasado, para a praia situada do outro lado de Santa Cruz, na entrada em frente a Polícia Rodoviária Federal. Preparei as manjubas nas igaratéias porque no anzol comum soltariam logo, e mandei ver. Não esperei muito tempo e a vara embodocou. Depois de mais de 20 minutos, puxo pra areia uma bonita arraia, que me deu um trabalhão para tirá-la. Como estava sozinho, coloquei-a no rio de novo. Arraia eu respeito e não gosto de levar, por isso a minha fraqueza com este peixe maravilhoso. Preparei nova "parada" e mandei mais uma vez lá no meio da embocadura do Rio Piraqueaçu. Nova embodocada, e desta vez depois de muito puxar, veio um bagre que há muito tempo eu não via. Este, eu levo principalmente para dar aos meus amigos, porque até hoje, não sei porquê, nunca comi. Aí fiquei pensando, camarão pra quê? Em duas jogadas faturei dois peixes enormes num período bem pequeno, portanto a tal da manjuba estava sendo um grande negócio. Enquanto pensava, a vara deu aquele tremelique próprio de peixe, parecia até um pequeno exemplar, quando a mesma embodocou, saiu do fincador e se não sou esperto de correr para pegá-la, iria rio adentro. Segurei firme, dei a fisgada e fiquei até receoso com o bicho que tinha agarrado. A vara envergou de vez e tive que segurar com força. Linha tinha, mas o carretel estava cantado com a saída da mesma. Fiquei preocupado de apertar mais ainda e a linha partir. Segurei firme e tentei 53
recolher um pouco, mas quanto mais eu puxava, mais o peixe corria. Fiquei com o coração aos pulos, deveria ser o maior exemplar que já tinha pegado na minha vida. Pouco a pouco fui ficando mais preocupado porque o danado não vinha de jeito nenhum e só puxava linha. Depois de uns 30 minutos de luta, o carretel começou a aparecer dando por terminado os meus 260 metros de linha que tinha no dito. Aí meu filho; apenas confiei na qualidade do nylon e esperei que o bicho cansasse, mas pensei errado. A linha acabou e comecei a briga apenas como se fosse uma vara de bambu em rio sem molinete. Ficamos ali um bom tempo na briga e lá longe no rio, vi a superfície formar marolas. O peixe estava dando tudo que podia. Aguentei mais um pouco até ouvir o estalido da linha se partindo. Nylon 0,40 com potência para peixe grande e foi como o barbante, não aguentou a luta. Perdi não só todo o nylon do molinete, como fiquei chateado com a perda daquela fera. O sujeito que me disser agora que camarão que é o fino da pesca vai ouvir poucas e boas porque a manjuba me deixou com adrenalina a 1.000, e mostrou que é uma excelente isca. Juntei minhas tralhas, carreguei o bagre e ao passar em frente a polícia, fui parado pelos ditos, e ao contar minha sina, deram um sorriso matreiro, mas deixei o bagre como pequena prova de meu infortúnio e fui mostrar os documentos, logo fui liberado. Ao chegar à subida da ponte, dei uma olhada para o rio e vi um peixão se debatendo na margem. Parei o carro de qualquer jeito, desci correndo a encosta da ponte e ainda tive tempo, de com um pau, puxar o emaranhado de linha presa nos galhos da margem e retirei o miserável de um robalo cansado de quase 15 quilos. Além de recuperar a linha, que obviamente enrolei e joguei o bolo fora, carreguei aquele monstro ladeira acima, e o único problema foram uns índios locais que disseram que aquele local era proibido pescar. Olhei com cara de poucos amigos para os silvícolas, botei o robalo no carro e fazendo o sinal característico de dedo pra cima me mandei. Do pescador, agora com manjuba, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM JACARAÍPE - INVERNO Falar em inverno no Brasil, principalmente no Espírito Santo é até gozação. Apenas um pequeno vislumbre dele nas nossas montanhas que chega aos 8 graus, durante poucos dias e quase se morre de frio. Nas praias, aí sim que o inverno vira brincadeira, 25 a 30 graus são o mínimo que se consegue chegar, a não ser à noite com vento sul que baixa um pouco estas temperaturas. Pois bem, no último sábado, dia 16/07/2011, fui dar uma pescada na praia de Jacaraípe, em frente a uma castanheira que virou meu point de pesca, por ter neste lugar feito algumas pescarias bem interessantes. Mas, neste sábado a água estava gelada devido a alguma corrente fria vinda não sei de onde, que avisava uma pescaria sem grandes surpresas, apenas lavar o camarão e se desestressar, peixe que é bom, só com muita sorte. Mesmo assim, fui arriscar. Preparei o dito material com camarão especial e lancei como de costume, lá no meio dos infernos, esperei o que todo pescador espera, aquela puxada. Fiquei um tempinho até que vi uma pequena puxadinha, não liguei muito, mas fiquei de butuca esperando alguma coisa mais forte. Novamente, nova puxadinha, fui me aproximando da vara e quando estava bem próximo, nova puxada. Aí meu filho, dei o bote e tentei fisgar o dito cujo. Senti, pelo peso na linha, que não tinha me dado bem; dito e feito, minha parada veio mas, sem os três anzóis. Pensei logo: "Filho da mãe de baiacu". Preparei outra "parada" e desta vez fiquei mais esperto. Fiquei com a vara na mão e quando senti aquela puxadinha dei a fisgada na hora. Foi aquilo que esperava. A vara embodocou e, logo apareceu na superfície lá longe um teba de um baiacu arara, conhecido também como baiano, dando pulos e se mostrando aquele batalhador.
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Puxei sem parar, para o miserável não cortar a linha e trouxe um belo exemplar de uns dois quilos e trezentas gramas. Aquilo roncava forte e mordia o tempo todo. Os pescadores que estavam próximos chegaram e ficaram apreciando o baiacu e um deles se ofereceu para limpar. Agradeci e entreguei o baiano para a devida limpeza feita pelo profissional, porque se não souber limpar é morte certa. Qual não foi a surpresa do pescador quando ao limpar a barrigada encontrou meus três anzóis no bucho do baiano e mais uma igaratéia de outro pescador que apreciava a limpeza. Foi aquela gozação, mas no fundo gostei de reaver meus anzóis. Continuando a pesca, o papo era: estando a água gelada, os baiacus chegam em cardumes e foi realmente o que aconteceu, pegamos um total de dezessete baiacus araras, todos quase do mesmo tamanho do primeiro e foi aquela farra! Se pensar que o filé de baiacu é uma iguaria em qualquer lugar do mundo, me dei muito bem.Voltei para casa, andando porque o lugar é bem em frente da mesma e passei pela festa do meu vizinho festejando o aniversário da filha, para mostrar o que era pescar. Sei que ficaram doidos com a quantidade e como também tinha pescador na área, praticamente encerrei a churrascada porque todo mundo se mandou com suas varas para o pesqueiro de inverno. Mas se deram mal, o cardume que tinha, praticamente o liquidei e o que sobrou se mandou para outras paragens. Do pescador de baianos, digo baiacus, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM CAMBURI - LEMBRANÇAS Quantas lembranças! Retorno minha mente ao ano de 1958, onde com meu pai, médico e emérito pescador, fui pela primeira vez no carro recém comprado por ele, pescar em Camburi. Dr. Deomar, como era conhecido, chamado de Dondeco pelos conhecidos de infância, nunca cobrou uma consulta médica e sempre atendia aos seus pacientes de táxi, por não possuir carro próprio. Quando fiz 15 anos, por uma Lei Federal, médicos podiam agora comprar carros financiados e o velho comprou um fusca de cor verde, não tinha escolha sobre a cor, e neste carro, fomos inaugurar a primeira pescaria no dito. Foi aquela apoteose! Como não existiam as pontes de Camburi e nem a Ayrton Senna, passávamos pela Ponte da Passagem e por estradinhas de barro e areia chegava-se àquela praia deserta e maravilhosa chamada Camburi. Os senhores não tem a menor ideia do que era aquilo. Em toda a orla, pequenos pés de coqueirinho, em que arrancávamos o molho e ficávamos mastigando os coquinhos que eram uma delícia. Voltando a falar sobre o principal: a pesca, nem se fala! Pescadores antigos, que ainda lembram daquela época devem ter recordações memoráveis dos peixes de então. Era comum pegarmos cações rola-rola, cações manteiga, arraias, corvinas, enchovas, pampos, giriquitis enormes, barbudos de quilo e inúmeros outros, que se for citar eu ficaria um tempão dando nomes aos bois, digo aos peixes. Pois bem, nesta pesca me lembro perfeitamente que meu pai, com a sorte que Deus lhe deu, ferrou uma arraia, posteriormente pesada no posto da passagem com míseros 80 quilos. Foi até difícil colocá-la no fusca. Se não me falha a memória, neste dia ferrei muitos cações, em média de 1 a 3 quilos cada. Era uma maravilha esta praia. Era! Com a vinda da Vale para a Ponta de Pirahem como era chamado o lugar, iniciou-se uma revolução na área, e tudo modificou. Começou o bairro Jardim 57
da Penha a ser construído, logo depois Jardim Camburi. Vitória em peso começou a mudar para este lado, e hoje centenas de ruas asfaltadas, sinais, ciclovias, casas, apartamentos, comércios generalizados, etc., deixaram pra trás todo aquele paraíso bucólico que existia, onde as matas e a vegetação própria de praias cobriam tudo. Hoje nada mais existe. Uma pena! Apenas o mar continua no mesmo lugar, mas os peixes, só com muita sorte. Pois bem, foi nesse clima de recordação, que eu agora com meus 68 anos dirigi-me a esta praia com o intuito de recordar o passado. Meu material de pesca ainda tinha algumas coisas antigas, como o velho fincador doado por meu pai, de saudosa recordação, e as velhas "paradas" ainda sendo feitas do mesmo jeito, com três anzóis, algumas cores para chamar a atenção dos peixes e muita, mas muita, esperança mesmo. Com a isca própria para grandes peixes arrisquei mais uma vez. Olhando para um lado e para outro tentava lembrar como era bonita a natureza antiga do lugar, fechando meus olhos, já necessitando de lentes para ver a vida, antevia a época da minha infância e essas recordações me marejavam a vista deixando escorregar pequenas lágrimas, saudosas de minha vida passada. Estava eu nesta contemplação, quando rapidamente sou desperto por uma puxada que me fez voltar em segundos ao presente, ainda com os olhos embaçados, por puro hábito, dou a puxada e sinto com intenso euforismo uma luta épica entre peixe e pescador. Ao tentar ver o mesmo entre as ondas, apenas sinto sua força e com mais emoção ainda o vejo num relance, cortar pequenas ondas que se aproximavam da praia. Fiquei momentos perdidos em minha alegria por este momento, mas ao retirar aquele belo espécime de pampo daquelas águas não tão puras quanto no passado, com o coração cheio de alegria por recordar mais uma vez daquele peixe, tão a gosto do meu pai, o depositei novamente nas águas do meu passado, e com o coração cheio de alegria e tristeza, guardei vagarosamente meus apetrechos e me encaminhei para casa, onde graças aos céus ainda sou o paizão que sempre desejei. Do agora também velho pescador, Deomar Bittencourt. 58
PESCARIA EM ITAPOÃ - LOVE Domingo de sol, céu azul, sem vento, este é o dia para uma boa pescaria. Desta vez fui com minha esposa Laci e levei para dar sorte, minha sogra. Preparamos os materiais importantes, ou seja, água, refrigerantes e sandubas. Fomos pescar em Itapoã, na área em que não tem asfalto, perto dos guardas, indo pra Barra do Jucu. Chegando ao viaduto que vai para Araçás, retornei pra praia e entrei atrás do Motel Dunas. Procurei um local legal e iniciamos a preparação das tralhas. Após tudo resolvido, iniciamos a pesca. Não demorou muito e começamos a pegar peixes de tamanho razoáveis, sargo com mais de dois palmos e giriquitis enormes. Estávamos numa boa, quando um bando de moças chegou e foi aquele rebu. Posicionaram-se logo atrás da gente e começaram a se despir, despir mesmo, porque os biquínis tinham que ser vistos com lupa. Lógico que fiquei com os olhos na vara e nas laterais para qualquer peixão que aparecesse. Nisto, Laci ferrou um peixe e quando o tirou d'água foi aquele alvoroço. As "meninas" chegaram aos gritinhos fazendo uma série de perguntas: "Cê não tem medo não?" "Uau, que peixe bonitinho", "Olha, ele tá balançando", e por aí vai. Fiquei de butuca nas gatas e percebemos que todas eram gays e cada uma mais gostosa que a outra. Lógico que banquei o durão e fingi que estava olhando pro mar, ainda assim levei um senhor beliscão. Logo em seguida elas saíram correndo aos gritinhos e foram se molhar. Meu Deus, que pescaria! Minha sogra com cara de poucos amigos me olhava séria, e minha mulher falando: "Acho que já tá na hora de irmos". Aí engrossei: "Pô, não temos nem quatro horas que estamos pescando e já tá na hora? Vamos esperar mais um pouco que os peixes estão beliscando". "Beliscando é o cacete, isto aqui ta é cheio de piranha", falou minha mulher. Neste momento chegou outro pescador e me vendo, veio falar comigo, perguntou se eu ia ficar mais tempo, porque se fosse, aí ele pescaria ali, porque o lugar é muito perigoso. Bom, percebi que realmente naquele lugar estava chegando uns tipos esquisitos, e olhando minha mulher, falei com o cara que só 59
iríamos ficar mais meia hora. Mesmo assim o dito preparou seu material e ficou perto da gente, mas de butuca nos finalmente (finalmente = gays). Passado este tempo, nos preparamos para ir embora e as gays vieram nos dar adeus, com beijinhos e abraços. Falei então com a mulher: "Viu, até que são legais, cê não acha?". A olhada que ela me deu me deixou preocupado e não sabia se ia apanhar no carro ou em casa. Graças a Deus, a viagem foi mais de risadas do que de brigas. No outro domingo, chamei Zico meu cunhado para pescar, que tinha descoberto um pesqueiro jóia. Não falei nada do caso anterior para não alertálo. Chegando lá, preparamos aquela parafernália de pescador e começamos a pescar. Logo a primeira puxadinha nos deu aquele euforismo que viriam muitas outras. Mas o que não contávamos é que chegou um cara correndo e todo apavorado, mandou a gente se pirulitar dali que bandidos estavam fazendo arrastão na praia e logo iriam chegar. Aí que a coisa degringola, pegamos as varas e colocamos com camarão ainda nos anzóis, tudo dentro do carro tudo às pressas, e da forma mais rápida possível, saímos do local. Acabamos pescando num lugar aprazível embaixo da terceira ponte, na Enseada do Suá. Infelizmente peixe, nem pensar. Domingo azarado. Nunca mais pescamos para aquelas bandas, mas que dá peixe isto dá. Ultimamente pescador está com receio de pescar em qualquer praia pela falta de segurança e pelo aumento do número de marginais no Estado, mas vamos confiar na polícia que vem fazendo um trabalho sério nestes balneários, e que em futuro próximo, possamos pegar nossos peixes em paz e tranquilidade, para o stress sumir de vez das nossas vidas.
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PESCARIA EM PEDRA AZUL Neste fim de semana, 13/05/2011, resolvemos ir a Pedra Azul com as famílias e amigos para passarmos uns dias agradáveis. Esta localidade é um dos mais requisitados pontos turísticos do inverno aqui no Espírito Santo. Seu clima é o segundo melhor do mundo e nesta comunidade as pousadas são verdadeiras jóias, de beleza sem par e as residências são mansões maravilhosas, das que deixam os turistas embasbacados. Realmente foi um fim de semana espetacular. Na sexta, dia da nossa chegada na Pousada Aracê, tivemos uma noite de queijos e vinhos que rolou até altas horas com vinhos de todas as partes do mundo (Argentina, Chile, Espanha, Portugal, França, Alemanha e Brasil). Estávamos em dez casais e bebemos 22 garrafas. Uma odisséia. Divertimos-nos bastante, e nos recolhemos aos chalés para enfrentar o dia seguinte. Bem cedo, tomamos aquele café da manhã reforçado e resolvemos passear na "Rota do lagarto", pequenas estradas e trilhas que cercam a famosa pedra azul, onde tem um enorme lagarto de pedra, emoldurado segundo lenda local, por alienígenas devido ao seu tamanho descomunal. Eu e um grupo de cinco mulheres, minha esposa Laci, Angela, Margareth, Kátia e Jôse, subimos, ao lado da Pousada Recanto da Pedra, uma trilha de uns 900 metros que leva a casa de apoio, onde tem um guarda florestal que vigia a área. A subida realmente é fora de série, íngreme e passa no meio da mata conservada por lei, e aconteceu um fato digno de se contar. Como eu estava a fim de me exercitar, andei mais rápido e em breve me distanciei do mulheril, que vinha (novidade) conversando logo atrás. Pois bem, ao virar a curva na trilha, dei de cara com uma jaguatirica adulta e parei estático. A bicha me olhou, se abaixou e começou a balançar a ponta do rabo. Olhei apavorado procurando um pau ou uma vara, porque senti que ela ia atacar. Achei uma pedra parecida com um paralelepípedo e me abaixei para pegá-la. Foi o estopim do ataque, ela partiu pra cima de mim e só tive tempo de agarrar a pedra e com toda a força jogar no animal já ensaiando o bote. A pedrona atingiu bem no focinho da bicha que perdeu o equilíbrio e se estatelou no chão, rodando. Nessa hora, as mulheres viraram a curva e deram de cara com a jaguatirica. Aí foi aquele impasse, eu olhando para o animal, o animal olhando pra mim e virou 61
o olhar para as mulheres, nisto em uníssono as mulheres berraram. Foi um Deus nos acuda, a jaguatirica apavorada com os berros da mulherada se mandou para a mata. Após o susto resolvemos, mesmo com o acontecido, ir até a casa de apoio por estar bem próxima. Depois de nos acalmarmos e beber um copo d'água açucarada resolvemos, com a presença do guarda, voltar pela trilha até os carros e retornamos a nossa pousada. Que dia! Fizemos um churrasco e o papo quase o tempo todo foi sobre o acontecido. Mas com o passar do tempo, novos papos aconteceram e após ficarmos ouvindo o Cláudio dedilhar o violão, relaxamos e com voz de cantor famoso, nos deliciamos com o repertório de MPB do irmão. À tardinha ainda fomos ver os cavalos noruegueses dar aquele show e à noite, com a sobra do churrasco, fizemos com o famoso chef de cozinha da nossa loja, o Wladimir, um arroz de carreteiro digno do Guinness Book. Depois de papos, piadas e muita gargalhada, fomos dormir. Pra dizer a verdade, fui o único que não fui, resolvi bater um papo com o vigia sobre pescaria na área, e por coincidência o mesmo me informou que o lago da pousada não tinha peixe, mas há alguns anos colocaram filhotes de pacu no lago e todos morreram. Como não acredito nestas estórias, resolvi dar uma linhada. Perguntei se tinha uma vara pra eu pescar e o vigia com um sorriso matreiro foi buscar um antigo bambu com linha e um anzol já enferrujado. Ainda gozou: "Esta pesca eu quero ver". Como não tinha isca, peguei o que restou do arroz de carreteiro, um fiapo de carne, coloquei no anzol e sozinho, apenas com o vigia, pesquei à beira do lago. Conversando com o mesmo, tomei até um susto quando a vara embodocou. O vigia ficou pasmo quando o lago começou a vibrar com a luta do peixe, que aparecia e desaparecia, preso ao anzol. Lutei por um bom tempo e consegui retirar um pacu de uns seis quilos. Aquilo foi incrível, acho que era o único que sobreviveu naquele lago. Eu, agora satisfeito, peguei o peixão e dei para o vigia, e fui dormir realizado. Pela manhã, reunidos no café, contei a pesca que fiz e a turma não acreditou, fui então chamar o vigia pra mostrar o peixe e confirmar minha estória, mas o desgraçado já tinha ido embora e só ia voltar daqui a um mês. Ele tinha entrado em férias naquele dia. Não me preocupei porque dali a trinta dias o pessoal iria ouvir diretamente da boca de um vigia da roça, que não mente, a verdadeira estória do pacu. Do pescador de lago, Deomar Bittencourt. 62
PESCARIA NO RIO PIRAQUEAÇU Qual a pessoa que ainda não assistiu pela TV aquelas pescarias fenomenais em rios por este Brasil afora? Convenhamos que todo pescador tem que ter esta experiência para contar aos amigos. Pois bem, esta aconteceu comigo neste rio difícil de ser dito, mas lindo para se ver. Este rio tem sua foz em Santa Cruz, arredores de Nova Almeida, ao lado de Fundão. Eu, minha esposa Laci, meu cunhado Zico e sua esposa Ivane resolvemos pescar no dito cujo, com um barquinho de alumínio que cabia folgado quatro pessoas, e com um pequeno motor para impulsioná-lo. Preparamos no sábado à noite as iguarias (refrigerantes, água mineral, sandubas...), depois verificamos todo o material para uma pesca de alto nível e assim, fomos dormir tranquilos. No domingo bem cedo, acoplamos a carreta com o barco ao carro, e lá fomos nós. Saímos de Jacaraípe, onde estávamos de férias e após pouco tempo de estrada chegamos a Santa Cruz. Do lado da cidade o pesqueiro fica bem mais longe, por isso atravessamos a ponte e num lugar ermo embaixo dela (dizem que são terras dos índios locais) paramos e colocamos o barco no rio. "Cadê os coletes salva-vidas?", perguntou minha mulher. "Não precisa não, isto aqui é muito calmo, vai dar tudo certo, vamos lá", falou meu cunhado. Ajeitamos as coisas no barco, entramos balançando um pouco e seja o que Deus quiser, nos mandamos. Depois de um tranquilo passeio pelo rio, subindo contra a correnteza, olhando a beleza do manguezal dos dois lados do rio, chegamos a um lugar que parecia ideal. Próximo a uma pedreira e cheio de remansos, onde achamos então que estariam entocados os robalos ou as lutadoras tilápias. Preparamos as varas e começamos o que seria um verdadeiro show de pegar peixes. Aí conheci o estilo do meu cunhado. Depois de cinco minutos pescando, ele falou que o lugar não estava bom, vamos mudar. Ok. Recolhemos a linha e lá vamos nós de novo para outro buraco. Aí meu filho, o mesmo problema. 63
Na décima mudada, não aguentei e falei para ficarmos pelo menos meia hora no mesmo lugar, já tínhamos andado o rio quase todo, haja saco! Foi aí que Ivane pegou aquela corvina em pleno rio. Ficamos mais alegres e começamos finalmente a pegar alguma coisa. Isto já se tinha passado horas pescando. De repente, Zico resolve jogar mais perto da beira e "sua parada" engancha no alto de uma árvore costeira. Aquilo foi divertido, mas quando ele forçou para soltar a dita, ela veio que nem uma bala em direção da gente que tivemos que nos abaixar rapidamente, a chumbada passou zunindo pelas nossas cabeças. Pouco depois caiu o maior toró. Resolvemos então voltar e dar por encerrada a aventura. Quando estávamos próximo da saída, Zico resolveu passar embaixo da ponte e pescar do outro lado, mais perto da foz, aí que o pau quebrou. Ao passarmos embaixo da ponte cuja profundidade dá uns doze metros, as ondas começaram a entrar no barco e este ficou balançando perigosamente. Nossas mulheres nadam que nem chumbo e senti na hora que estávamos ferrados, a sorte foi que Zico conseguiu virar o barco pra voltar, e mesmo com a maré brigando com o rio nos deu a colher de chá de voltarmos, brancos, sem fala e vivos. Paramos no local da saída e sem falar nada tiramos o barco de dentro d'água, anexamos o reboque ao carro e saímos dali a 10 km até as coisas se acalmarem. A pescaria foi boa, mas o último lance nos deixou amuados. Paramos em Nova Almeida, comemos aquele pastel de camarão e como sobremesa, aqueles quindins famosos. Acabou então aquele sufoco, e o resto só foi alegria e muito papo. Valeu Piraqueaçu, só voltaremos agora com coletes no corpo, e nada de passar embaixo da ponte. Do pescador mais de praia de que qualquer outro lugar, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM JACARAÍPE - SOS Mês de maio, ótimo para pescar porque não é verão, poucas pessoas na praia e praticamente você é o dono do pedaço. Assim pode escolher o melhor lugar, preparar com calma as varas e pescar como todo pescador gosta. Tranquilo, sem preocupações, a não ser com os possíveis peixes. Numa desta, aconteceu um fato realmente interessante que passo a narrá-lo. Estava eu sossegado, pensando sabe Deus em quê, olhando para a ponta da vara esperando aquela tremida própria dos peixinhos, quando me aparece duas mocinhas que por incrível que pareça, naquela praia comprida e vazia, vieram tomar banho justamente ao meu lado. Tiraram suas saídas de praia e com aqueles biquínis atuais em corpos de jovens, foram as duas para dentro d'água. Fiquei na dúvida se olhava a vara ou me preocupava com as meninas. Enquanto estava em dúvida, a batida que esperava acontece. A vara embodoca e percebo se tratar de um baita peixe. Corro para a dita, dou a fisgada característica e começo a batalha. Foi espetacular a fisgada, porque o peixe, na mesma hora começou a puxar a linha. Tive que apertar um pouco a saída e a luta ficou empolgante. Ao olhar para o lado das meninas, vi uma coisa que me deixou preocupado. Uma delas estava sendo puxada para o fundo e a outra não conseguia voltar. Tive que escolher o peixe ou arriscar o salvamento. Estava de bermuda e camiseta, e nem pensei direito. Botei a vara no fincador e me mandei pra dentro d'água na tentativa de salvá-las. Em pouco tempo estava próximo da primeira e pegando no braço dela, já com alguma dificuldade a puxei para um lugar mais raso e a mandei voltar pra praia devagar para não escorregar e voltar para o fundo de novo. Aí me mandei atrás da outra, que pela cara, já estava engolindo água e sendo arrastada com mais facilidade por perda das forças. Nadei rápido, pequei pela mão e tentei segurá-la, mas já não dava pé. 65
Como já tinha tido esta experiência antes, nadei por trás da moça e pedi calma e agarrando-a consegui pouco a pouco chegar aonde dava pé e assim ficou um pouco mais fácil de tirá-la. Praticamente ela desfaleceu em meus braços e com muito esforço consegui trazê-la até mais perto da areia, sua colega, já descansada veio ajudar. Deitamos a moça na areia e infelizmente não precisei fazer respiração boca a boca porque ela logo acordou e deu uma vomitada. Pouco depois, já melhor, as duas não se cansaram de agradecer e eu tinha até me esquecido do peixe.
Quando lembro e olho para a vara, ela estava sendo arrastada pra dentro d'água e corri que nem doido e a peguei já indo pro beleléu. Segurei a dita com força e ainda consegui trazer um sargo de uns 3 quilos e trezentos gramas. Na realidade foi uma pescaria fora de série e quando penso nas meninas que quase morreram, acredito que graças a Deus, tem sempre um pescador num local certo na hora certa. Do pescador de meninas, digo sargo, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA ENTRE IRMÃOS 28 de julho de 2011, aniversário de 95 anos da minha mãe, Aurora Tamanini Bittencourt Pereira, conhecida desde pequena como Lola. Pois bem, nesta festa que é de poucos, estavam todos os familiares. Meu irmão veio do Rio de Janeiro com seus filhos e netos, minha irmã de Jacaraípe com seus filhos e netos e eu de Vitória com meus filhos e netos. Um total de apenas 22 descendentes, mas que valem por muito mais pela confusão e bagunça ao longo de quatro dias que durou a confraternização. Na quinta-feira então, cantamos os parabéns e ao longo da sexta, sábado e domingo foi àquela farra. Feijoada, churrasco, uma comidaiada que ninguém acredita. No sábado à tarde, chamei meu irmão para ir pescar comigo no meu pesqueiro de Jacaraípe e lá fomos nós. Emprestei minha melhor vara, porque anfitrião é pra estas coisas, uma "parada" novinha e aquele camarão caprichado para um baita peixe. Peguei meu material comum e fomos com aquela esperança. Lá chegando, preparamos as ditas varas e iniciamos uma pequena guerrinha para ver quem pegava mais, mas não falei que minha intenção era que ele ganhasse, porque afinal, é o filho caçula da minha mãe, apesar de estar com 65 anos, e ainda ter vindo de longe. Foi dito e feito, com aquela vara e aquele camarão, a sorte estava lançada, sua vara embodocou e o garoto ficou doido, foi chegando perto d'água e logo 67
depois pegou um bagre enorme, de uns dois quilos. Uma beleza de peixe, tirou uma porção de fotos, porque no Rio não tem chance de pescar e tinha que mostrar aos seus colegas cariocas sua maestria nas praias capixabas. A gozação começou e eu que tinha deixado o garoto com o melhor material para pescar, fingi que estava chateado só para eles ficarem satisfeitos. Aguentei a gozação e quando minha vara deu aquela embodocada, fingi que fisguei e fiz o que todo pescador não deve fazer para pegar um peixe, e deu certo. Perdi o bicho que devia ser bem maior que o dele, mas ainda aguentei a gozação e fingi novamente que estava psico e dei aquele presente ao brother. Não peguei merda nenhuma. O bagre que meu irmão pescou, devolveu ao mar e com toda a força que ele tinha, se mandou rapidamente para o fundão. Mais tarde, com aquele vento nordestão aumentando, ficou impossível pescar e resolvemos voltar para mostrar a proeza (encomendada) do meu irmão. Foi apenas um incremento ao clima de festa que estávamos participando. Infelizmente nem tudo dura para sempre e no domingo a turma do Rio foi embora deixando saudade e nós, que ficamos, voltamos à nossa vidinha calma de sempre e eu ansioso, esperando o próximo aniversário da minha mãe, aí sim, vou dar o troco porque dar colher de chá uma vez tudo bem, mas duas vezes num aguento não. Do pescador bonzinho, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA NO RIO CRICARÉ 1980. Meu cunhado Ozair me convidou para pescar num rio em São Mateus ES, chamado Rio Cricaré. O mesmo ficou sabendo que os robalos, principalmente à noite estavam em tão grande quantidade, que era só enfiar o braço no rio, fechar a mão e puxar belos espécimes. Ora, qual pescador ao saber de uma notícia dessa não iria correndo para comprovar e depois dar aquela gozada na turma que não foi. Pois bem, aceitei na hora e marcamos o fim de semana para a dita viagem. Ficamos hospedados na casa de um primo do Ozair, aproveitamos e preparamos as parafernálias pesqueiras, rezamos para a sexta-feira chegar logo. À tardinha nos mandamos despreocupados pelas belas rodovias do nosso Estado, principalmente a BR-101, que sabemos é uma das rodovias mais seguras do mundo. Foi aquele stress a viagem toda, ao chegarmos à casa do primo, demos graças a Deus por estarmos vivos, e preparando o material por antecipação fomos descansar para a batalha do outro dia. Sábado pela manhã saímos à caça de camarões vivos e sarapoas (pequeno peixe, próprio para pesca de robalo e outros) para fazer aquela pesca que sempre sonhamos. Com muita dificuldade encontramos perto da cidade um sítio que tinha ambas as iscas e pagando um preço salgado pela dúzia, só esperamos a noite chegar. À tarde fizemos churrasco, já comemorando a farra dos robalos e depois de muita carne regada à cerveja gelada, fomos tirar uma soneca para não dormir na pescaria tão sonhada. Enfim, a noite chegou e satisfeitos olhamos o material: varas, molinetes, carretilhas, camarões vivos, sarapoas vivas, o barco acoplado ao carro, remos, motor... e lá fomos nós. Ao chegarmos à beira do rio, procuramos um lugar para descer o barco, pulamos no mesmo e pronto, só ligar o motor e ir para o famoso ponto robalético daquele tal de Cricaré. 69
Lá chegando, apoitamos o barco e ao prepararmos nossas varas, começou um barulho estranho, como se fosse um enxame de abelhas. Mas verificamos que infelizmente não eram abelhas, mas bilhões de mosquitos que nos atacaram sem dó, nem piedade. Quase não podíamos preparar as iscas porque nossas mãos estavam ocupadas em espantar aqueles desgraçados. Ninguém teve a ideia de levar um repelente e com a agitação de nossas mãos quase que dávamos bordoadas em nós mesmos. Foi uma loucura! Mesmo assim, ainda conseguimos montar as iscas e, pescando que nem italianos, ou seja, balançando os braços o tempo todo, começamos a pegar uns robalinhos, logo em seguida. Aquilo nos deu ânimo, mas a luta com os pernilongos era terrível. Passamos algumas horas nesta batalha, pegando robalos e matando mosquitos. Até que enfim chegou a hora de ir embora, e a pescaria que se pensava ser a pescaria do século foi extremamente terrível. Recolhemos o barco, acoplamos o mesmo ao carro e voltamos para casa do primo. O que aconteceu em seguida, com a luz iluminando nossos rostos foi cômico. O primo Miltão, que não foi, caiu na gargalhada porque o desgraçado já sabia dos mosquitos e não falou nada, e para encerrar, ao olharmos no espelho e ver a cara um do outro, achamos que tínhamos pegado sarampo. Um bilhão de pequenas petéquias apareceram em nossos rostos. Aquela canseira que estávamos sentindo para tirar o barco e carregar as tralhas, é que tínhamos ficado com anemia pelo tanto de sangue que aquelas pragas nos sugaram. Mas, ao contarmos os vinte e poucos robalos de dois a cinco quilos cada, acho que valeu a pena. No domingo retornamos pra Vitória e com cara e braços de "sarampo" passamos quase a semana toda coçando. Realmente foi a pescaria do século, e até hoje só de pensar nela, começo a me coçar. Do pescador de coça e pesca, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM PRAGA Saímos de Berlim bem cedo e começamos a esperar as "péssimas" estradas da República Tcheca porque nossa guia falou que as estradas lá não eram tão boas. O resultado foi que ficamos impressionados, todas as estradas da Europa são verdadeiras pistas de corrida pela forma que são feitas e pela segurança que tem. Já na República Tcheca, ex-país comunista esperávamos uma estrada igual ao Brasil, pista única, buracos, falta de sinalização, guardas escondidos para só multar, ... Mas, a surpresa foi enorme. O único problema é que são feitas com blocos de concreto e a cada 10 metros existe um novo bloco, isto ocasiona uma caminhada com barulhos sonoros baixos, o que era o grande problema destas estradas. Convenhamos, pista dupla em ambos os lados ao longo de toda a viagem e este barulhinho ser o grande problema, pelo que vejo, não conhecem as BR's do Brasil. Passamos por algumas vilas antigas e por fim chegamos a Praga. Que cidade! É realmente espetacular! Todos os lugares que visitamos nos enchiam de prazer por ver como um povo que sofreu com guerras, perseguições, nazismo, comunismo e outras imposições ainda conseguiu se firmar e manter uma condição de vida e beleza inexplicável. Li um pouco sobre este país e fiquei impressionado com seu povo, suas lutas e seu destino, é realmente impressionante. A praça do povo nos dá uma sensação de bem-estar pela forma que está focada entre edifícios antigos, algumas igrejas com características da Idade Média, nos levando para um passado distante. A catedral é uma coisa fabulosa com seu relógio astrológico que é a principal chamada, onde uma multidão, inclusive eu, fica esperando a hora, porque de hora em hora, toca uma música e de duas janelas acima do mesmo, aparecem e passam os doze apóstolos em estátuas olhando a multidão, e um esqueleto externo que toca o sino de acordo com a hora. Fomos também à igreja do Menino Jesus de Praga, e nem preciso dizer que minha esposa se emocionou e chorou copiosas lágrimas de emoção neste belo Santuário Cristão. É realmente interessante! Passamos depois por uma entrada tipo castelo, que nos leva a Ponte Charles IV, um dos seus maiores reis do passado, que levou Praga a ser famosa na Europa da época, por suas obras grandiosas. Nesta ponte tem doze estátuas cristãs, cada uma mais espetacular que a outra, e em uma delas ao tocar o pé do santo, nos permite alcançar um, dos dois desejos, que sempre acontecerá: ou voltar a Praga ou ter sorte. Claro 71
que fiquei na fila para passar a mão, porque a ritualística envolve todos que por ali passam, já quanto ao que escolhi, é segredo. De cima desta ponte, vemos as diversas pontes que cortam o Rio Vitava e olhando o mesmo lembrei que deveria pescar para sentir o peixe Tcheco. Ainda fomos conhecer o Castelo de Praga, situado no alto da cidade, e a vista dos telhados, sem a contaminação comum em nossa cidade de Vitória, é uma coisa linda de se ver. Tudo vermelhinho, limpo, com suas características locais, tão diferentes das nossas. Ao descer para o Centro passamos pela casa de Franz Kafka, um dos seus mais famosos escritores, e tive o prazer de entrar na sua pequena casa e sentir seus eflúvios positivos ainda hoje. Mas, pelo andar da carruagem (por sinal tinha trens, bondes elétricos, carruagens a cavalo, bicicletas e por fim alguns carros nestas ruas de calçamento antigo e cheio de história) fui procurar uma área naquele riozão para pescar. Achei um lugar agradável, na sombra de uma grande árvore, sendo olhado por uma estátua em que o dito cujo segurava uma espada bem na entrada da ponte. Ali, joguei a isca e esperei. Não precisou de muito tempo e a vara embodocou. Aí meu filho foi só a técnica. Puxei um belo espécime de peixe de uns 3,750 quilos, mas na hora de pegá-lo, escorregou e caiu no rio de novo, o pessoal próximo bateu palmas para o peixe. Não fiquei nem um pouco nervoso, e novamente tentei. Logo em seguida, nova batida e desta vez caprichei. Puxei pouco depois um maior que o primeiro, mas novamente na hora de pegá-lo, se balançou e caiu no rio de novo, aí fiquei psico e os turistas começaram a me gozar. Claro que com minha classe segurei a barra e fiz nova tentativa. Dito e feito, nova puxada e lutei por um bom tempo o que atraiu mais turista. Logo, puxei um belo peixe com característica de robalo, e alguns nativos gritaram: "Robalov, robalov". Não dei bola e quando fui pegá-lo, o desgraçado se rebolou e lá foi ele pra dentro do rio. Aí que fui ver o porquê do nome daquela cidade pra nós pescadores. Uma verdadeira praga. Entrei no clima dos turistas e rindo falei em português, que ninguém entendia, para eles irem para aquele "local" que os senhores conhecem e resolvi parar por ali mesmo porque já tinha tido o gostinho dos peixes locais e deixaria para a próxima cidade, Viena o futuro peixe. Do praga do pescador, digo do pescador de Praga, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM BERLIM Despedimos-nos de Amsterdam já com saudade de suas características que dificilmente encontraremos em outros locais da Europa. Bem cedo, depois de um café pra lá de arrumado, nos dirigimos para St. Goar, onde subimos em um pequeno trem e fomos conhecer a Fortaleza de Rheinfels, a maior da Alemanha e ver seus famosos Relógios de Cuco. Embarcamos depois, já no Rio Reno, onde vimos o Rochedo de Lorelei, o ponto mais estreito do Rio Reno desde a Suíça até o Mar do Norte. Neste caminho fluvial, admiramos os castelos e vinhedos nas encostas do Rio Reno e povoados como Oberwesel com suas muralhas e as 18 torres fortificadas. Desembarcamos na encantadora Cidade de Bacharat, onde impera a arquitetura medieval com ruas pitorescas, onde túneis e subidas se complementam dando um ar bucólico a esta pequena cidade. Aí, eu, minha esposa Laci e meu grupo, tomamos um excelente chocolate quente com tortas alemães típicas da região e nos deliciamos com a culinária local. Após este coffee, fomos passear nas margens do Rio Reno e descobrimos uma coisa interessante em virtude daquela falta de mar na região. Centenas de troles ficam estacionados esperando o verão na localidade, para usufruir do banho de rio no local, é claro que por falta do mar que nos é tão perto e quase não damos ao mesmo, o valor que ele merece. O turismo no local se baseia então em conhecer a cidade de Bacharat, em homenagem ao deus Baco (deus do vinho), passeios pelas ruelas e fotos ao lado de um grande barril de vinho na entrada da cidade. Após esta visita de poucas horas, nos dirigimos a Frankfurt onde passaríamos a noite hospedados em ótimo hotel, para seguirmos pela manhã a Berlim, passando antes por Leipzig. Pequena, mas grande cidade, porque foi nela que aconteceram as famosas “reuniões secretas de segunda-feira” da maçonaria que viriam a acelerar a queda do Muro de Berlim. A cidade estava em festa com feiras, parque de diversão, turistas regionais e 73
internacionais, uma loucura. Após horas de prazer nesta cidade, continuamos nossa viagem até Berlim, cidade que conserva todo o encanto do passado com a modernidade do presente. Em Berlim fizemos nossa parada de praxe e depois de uma noite de descanso, fomos conhecer esta tão falada capital. Realmente é tudo de bom, conhecemos a Porta de Brademburgo, o Reichstag, a Igreja Comemorativa de Kaiser, o Fórum de Frederico II e o Museu de Pérgamo, onde o busto de Nefertiti se sobressai. Mais tarde conhecemos o local em que o Bunker de Hitler foi destruído e seu suicídio juntamente com todo seu estafe. O local para quem não tem guia com esta localização, não possui nenhuma indicação, o que nos foi colocado pela guia, para não termos neonazistas adorando o local. É uma pequena praça mal cuidada e sem maiores pretensões. Dali fomos a inúmeros outros locais e me chamou a atenção um restaurante às margens do Reno, pois na sua traseira havia diversas mesas e com um toque alemão de ser. Achei por bem visitá-lo, aproveitei o contexto para tentar dar uma pescadinha no local, que por sinal a especialidade da casa era peixe. Arranjei no local uma pequena vara com os apetrechos convencionais e fui fazer uma fezinha no famoso Reno. Já estava ali há uns vinte minutos e nada, resolvi parar e na última puxada, senti um peso estranho e aí o coração bateu mais forte. Fui puxando devagar para não perder o bicho, e qual não foi a minha surpresa e de muitos no local quando surge uma pistola Luger, do tempo da Segunda Guerra. Fiquei pasmo, mas acabei cedendo aos rogos do proprietário do restaurante, e a troquei por uma boa peixada, porque moqueca só capixaba. Após este lance incrível, esta pistola obviamente vai para algum lugar onde os alemães poderão mais uma vez se recordar do passado tão constante em Berlim. Também nesta cidade, fiquei impressionado com os dois paralelepípedos em paralelo que corta toda Berlim, ao perguntar o motivo, nossa guia nos informou que era onde passava o muro de Berlim, e ficará indelével para sempre, recordando uma época que esperamos não voltar jamais. Nesta cidade linda, limpa e maravilhosa passamos dias e horas que ficarão para sempre em nossas recordações. Enfim, no outro dia bem cedo, após aquele café caprichado, viajamos para Praga, na República Tcheca. Do pescador de pistola, digo, do Rio Reno Deomar Bittencourt. 74
PESCARIA EM VIENA Saímos da República Tcheca, mais precisamente de Praga e nos encaminhamos à Áustria, onde esperávamos conhecer Viena e seus salões magníficos, onde músicos como Mozart e a famosa família Strauss apresentaram sua arte, até hoje tão conhecida e admirada em todo mundo. Quando chegamos a Viena, nossa guia nos deu uma colher de chá e passeamos pelos mais bonitos recantos da cidade. Ficamos realmente impressionados, mais uma vez com os palácios, catedrais e toda a arquitetura antiga, mas nova para nós. Acostumados a um padrão de casas e edifícios aqui em nossa terra, que ao nos depararmos com estas construções de séculos atrás ficamos extasiados com esta beleza que ainda não perdeu suas características, principalmente pela manutenção e cuidado com que as autoridades dedicam aos mesmos. Num dos Castelos que o Antigo Reino da Áustria pertencia, foi realizado o famoso filme da década de 60, Sissi - A imperatriz. Mas, quando ficamos sabendo a verdadeira personalidade desta Rainha, perdemos o encantamento, por ser a mesma segundo nossa guia, uma imperatriz frívola, viciada em cocaína (na época tomava-se em cápsulas) e extremamente mundana. Acredito que todos os grandes personagens da história européia, pelo grande poder que tinham em mãos, foram totalmente abilolados e fizeram as maiores extravagâncias porque eles tudo podiam. Passando por este Castelo espetacular, fomos conhecer as maravilhas de Viena em que as praças colossais se sobressaem e de repente quando menos se espera em suas inúmeras pontes sobre o Danúbio a história passava sobre nossos pés.
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Por falar em Danúbio, me deixei levar em pensamento, pelas suas corredeiras e já antevendo uma futura pescaria, me empolguei com os possíveis peixes locais. Mas, ainda não tínhamos visto tudo, e à noite, fomos todos arrumados ao Teatro de Ópera de Viena ouvir valsas e a famosa ópera cantada por duas fabulosas figuras que nos deixaram encantados. Um tenor, rapaz novo, mas extremamente consciente de sua voz e uma senhorita que com sua voz harmoniosa, sozinha ou em conjunto nos deixaram emocionados.
A orquestra, como sempre, deixa para última valsa, a famosa "Danúbio Azul" e os espectadores batendo palma continuamente, sempre fazem o bis para Johan Strauss. Ao fim da apresentação fomos conhecer Viena à noite. Coisa linda de se ver, todas grandes atrações recebem luz indireta e ficam mais bonitas ainda. Chegamos ao hotel de madrugada e me preparei para, bem cedinho, conhecer o famoso Rio Danúbio. Não deu outra, tomei aquele café, consegui o material de pesca com a guia, me mandei para aquelas beiradas de pontes para arriscar uma jogada. Era domingo e a cidade se encontrava ainda dormindo, o que ficou melhor para mim por causa dos gozadores de minha última pesca, em Praga. Achei um local ótimo e no pequeno remanso formado, arrisquei. Dois guardas que passavam de bicicleta se aproximaram e já pensei que ia ser multado, mas me cumprimentaram sorrindo e esperaram pelo resultado. Não demorou muito e uma beliscadinha aconteceu, dei a fisgada de praxe e pronto, lá veio aquela briga doida, em que a técnica tinha que sobrepujar a força. Os guardas se aproximaram e admiraram o desempenho. Logo depois retiro um belo exemplar de um peixe azulado, que os guardas logo comentaram "Bluefish, Bluefish". Aí fiquei sabendo que este peixe já tinha sido considerado extinto naquele rio e que por causa do mesmo, Strauss deu o nome da valsa de "Danúbio Azul". Confortado por este fato histórico, encerrei minhas atividades pesqueiras na Europa, e dei o peixe para os guardas que fizeram questão de me acompanhar ao hotel. À tarde, com meu grupo de oito, fomos para o aeroporto local, onde embarcaríamos para Madrid e de lá para o Brasil. Já estava com saudade e mesmo com suas deficiências em quase todas as áreas eu não troco por nada. As belezas européias são espetaculares para serem vistas, mas impossíveis de serem moradas. Agradeci aos céus pela viagem maravilhosa e voltamos ao nosso mundo real em que graças a Deus, vivemos. Mesmo com nossa infraestrutura problemática ainda é o melhor lugar para se viver no mundo. Viva a liberdade, viva nossas praias e viva nossas belezas selvagens, incomparáveis no mundo. Do pescador do Danúbio, Deomar Bittencourt. 76
PESCARIA EM LONDRES Saímos de Paris às 07h da manhã. Dirigimos-nos para Calais para pegarmos um ferryboat e durante a viagem, que durou algumas horas, naquela estrada maravilhosa, pensei e quase chorei ao lembrar do Brasil. Mas foi de pena das nossas estradas, nesta da França, não se ouvia nenhum barulho de batidas em buracos, nenhum acidente ao longo de toda a jornada e aquela sensação de segurança numa estrada de várias pistas especiais.Tivemos que parar a cada duas horas em locais onde restaurantes, na realidade minisshopings nos davam cobertura, isto porque o motorista a cada duas horas tem que ter no mínimo quinze minutos para descansar. Nestes lugares, chamados pela nossa guia Cândida, de "pipistop", os banheiros eram pagos, mas eram de limpeza excelente, dava até gosto usá-los. Chegamos a Calais, pequena cidade onde iríamos pegar a barca que levaria o ônibus através do Canal da Mancha, com duração de no máximo quarenta e cinco minutos. Lembrei de Aracruz no tempo da barcaça que levava 06 carros com o maior cuidado. Este ferryboat leva em média 380 carros, não sei quantos caminhões e ônibus, uma loucura o tamanho da dita. Em seu interior, restaurantes, shoppings, cassinos, casas de câmbio... nos davam a impressão de que estávamos em alguma rua famosa, a não ser pela vista do mar ao redor em toda viagem. Chegamos finalmente a Dover, e continuamos até Londres, onde Cândida (fez jus ao nome), nos contava toda a história ao longo da jornada e na Europa atual a Segunda Guerra realmente deixou as marcas de sua passagem, porque em todos os cantos sempre aparecia alguma coisa em relação a ela. Hospedamo-nos em um hotel dos mais modernos, e saímos para conhecer alguns aspectos do local como todo turista gosta. Andamos bastante, entramos em bairros onde os Indianos dominavam os restaurantes. Ao virarmos esquinas, restaurantes chineses e por aí vai, até que resolvemos jantar num restaurante local e voltamos de barriga cheia para descansarmos, pois na manhã seguinte estavam programados vários passeios. Depois de um lauto café da manhã, fomos à guerra. Passeamos pela Oxford Stret, pelo Picadilly Circus, Catedral de São Paulo, coisa de doido pelo tamanho e beleza de suas estruturas, fomos ao Parlamento, onde tiramos fotos até não querer mais e na Torre do Relógio conhecido no mundo todo como Big Ben. 63 77
Nas proximidades fomos à abadia de Westminster onde houve o casamento real, é uma coisa fantástica, só vendo para crer nos detalhes em toda estrutura, suas imagens fixas nas paredes descomunais, é realmente incrível! Saímos dali e fomos conhecer a residência real, o palácio de Buckingham. Andamos horas dentro das possibilidades turísticas no mesmo, e fiquei extasiado com as armas do passado, espadas, floretes, cimitarras, armaduras, antigos bacamartes, garruchas, etc. Acabei me perdendo do grupo e tive que correr para achá-los. Foi um dia bem cheio, até que ao passarmos na volta por pontes, vimos uma das maiores rodas gigantes do mundo, e olhando aquele rio ali ao lado resolvi procurar um lugar para pescar. Saltei do ônibus da excursão e me dirigi a alguns garotos que pescavam tranquilamente no Rio Tamisa. Fui chegando de mansinho e o guarda próximo me olhou com olhar carrancudo. Como falei num inglês de estrangeiro, pedindo a possibilidade de pescar no local, ele foi mais agradável e até pediu que um dos garotos me emprestasse a vara, deu até uma piscadela de gozação, fingi que não vi e fui à luta. Neste período ainda comentei se por acaso o Tamisa ainda tinha peixe, ou era um braço do esgoto da cidade que nem o Rio Tietê, em São Paulo. O guarda ficou psico e falou que a rainha tinha mandado e o povo assim o fez, e transformaram o rio no mais limpo da Europa. Olhei para ele com cara de incrédulo e neste momento a vara embodoca. Tomei até um susto, o próprio guarda junto com as crianças se aproximaram, e naqueles minutos de luta com o peixe, senti aquela vibração que todo pescador sente ao pegar um peixão. Dito e feito, puxei para fora um grande exemplar de um peixe, que o guarda logo falou: "Kingfish, one Kingfish". Ao pegar o tal do Kingfish, verifiquei e fiquei embasbacado, porque na cauda do dito tinha uma plaqueta escrita "Rio Tamisa, ISO 14001".Vai ser limpo assim lá na casa do caralho. Dei o peixe para as crianças e agora já pensava na viagem seguinte para conhecer novas cidades e os principais rios europeus. Do pescador do Tamisa, Deomar Bittencourt.
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PESCARIA EM AMSTERDAM Holanda, principal dos países baixos, em que se bobear o mar passa por cima, mas convenhamos, que graças à sagacidade dos holandeses e a sua avançada tecnologia de diques e canais com grandes comportas, todas automatizadas, isto ainda vai demorar muito a acontecer. Fomos direto de Bruges para Amsterdam. Viagem tranquila e cheia de surpresas. Ao chegarmos a Amsterdam, fomos para um hotel ultramoderno próximo ao aeroporto, e de lá conhecedores dos caminhos europeus, fomos de trem até ao Centro, descendo na Estação Central, bem no Centro da loucura que é esta cidade. Aqui conhecemos o que a bicicleta representa para o europeu e principalmente para o holandês. Quase todo mundo a utiliza, juntamente com trens elétricos e outros meios de locomoção, tipo bicicletas-táxi, ônibus, carruagens e etc. Nesta cidade ficamos conhecendo dois tipos de vida que ocasionam dois tipos de turismo. O turismo sexual das ruas e avenidas no Bairro Vermelho é para prostitutas e gays que se expõe em janelas de vidros para os prováveis clientes. O lado ruim e trágico desta profissão sempre irá continuar, permanecendo o tráfico e a submissão forçada de muitas meninas (e outras nem tão jovens assim). Do outro lado do canal, o turismo de grandes lojas de marca, restaurantes famosos e uma vida totalmente ligada aos turistas com teatros e outras regalias européias. Felizmente o turismo sexual em Amsterdam vem sendo combatido pelos próprios moradores e políticos locais, e pelo que nos foi passado pela guia, o futuro deste tipo de turismo está fadado ao esquecimento e muito em breve somente relíquia deste infeliz procedimento estará no artesanato local. Após horas passeando pelo Centro desta cidade eclética, resolvemos passear de barco nos canais da cidade. Olha, quem não conhece os mesmos, se for sozinho se perde, é muito canal mesmo! Passamos até por um casamento que estava sendo realizado num destes barcos, e a maioria dos barcos que cruzamos, havia rapazes e moças com bebidas em profusão, uma loucura! Após o passeio, voltamos ao hotel porque no dia seguinte teríamos o passeio oficial do grupo, com a guia para nos levaria aos principais recantos desta 79
cidade. Bem cedo após um café reforçado, iniciamos nossa peregrinação aos principais pontos turísticos, sendo o primeiro um típico moinho holandês que tivemos a oportunidade de tirar várias fotos. E próximo ao mesmo, um dos inúmeros canais me chamou a atenção por ter em suas margens inúmeros pescadores, e ao lado dos mesmos uma enorme quantidade de patos na maior folga, nem se importando com os humanos tão próximos. Dirigi-me aos mesmos e naquele inglês arretado de colégio, dei a entender que queria dar uma pescada. Os nativos me olharam com ar de surpresa, riram dos meus trajes e me emprestaram assim mesmo. Grata surpresa tiveram os mesmos quando a vara embodocou. O pessoal do grupo veio correndo me dar força e os holandeses surpresos só me viam trabalhar o peixe. Qual não foi a surpresa de todo mundo quando tiro um senhor peixe, de uns cinco quilos, e com a aparência mais interessante que já vi. Nunca tinha visto um exemplar deste tipo, quando um holandês atônico gritou: "Bacalhau, bacalhau". Pelo amor de Deus, só eu mesmo para conseguir pegar nos canais de Amsterdam um bacalhau desgarrado da Noruega. Algumas fotos para a história e tchau, tchau, lá fomos nós atrás de outras aventuras. Depois de conhecer os inúmeros recantos locais, nos dirigimos ao hotel, onde depois daquele banho refrescante, fomos pensar no dia de amanhã em que entraríamos na Alemanha e já estava eu doido para pescar no Rio Reno. Do pescador de bacalhau em canais de Amsterdam, Deomar Bittencourt. 80
PESCARIA EM BRUGES Saímos de Londres, como sempre às 7h da manhã, e nos dirigimos para Folkestone, onde embarcaríamos num trem de alta velocidade "Le Shutlle" para a travessia do Canal da Mancha pelo Eurotúnel. O incrível é que o trem era tão grande que os ônibus e os caminhões entravam em seus vagões, com passageiros e tudo e em apenas 40 minutos atravessávamos o Canal e seguimos pelas estradas da França, em direção a Bélgica. As estradas da Bélgica e Holanda são consideradas as melhores da Europa, verdadeiras obras de arte e não cobram pedágios. Fomos então para Bruges, cidade medieval no nordeste da Bélgica e desde a Idade Média já era famosa pela lã que produzia em esfera internacional, tendo como principal parceiro a Inglaterra. Era uma cidade rica e poderosa, e por canais era contatada ao mar. No século XV, perdeu este acesso e ficou isolada deste meio de transporte. Foi aos poucos definhando e somente algumas décadas atrás foi redescoberta para o turismo, principalmente por ter mantido suas características medievais, e hoje é uma das mais visitadas em toda a Europa, vivendo não só do turismo como também das vendas do artesanato local, principalmente suas "rendas de bilros" famosas em toda região. Em seus pitorescos canais, os barcos abarrotados de turistas passeiam dia e noite, apreciando toda a arquitetura medieval, onde igrejas, castelos, ruelas e mil outras formas de vida surgem a cada instante, deixando nós, turistas, encantados. Foi num destes canais que resolvi, graças a minha vibrante alma de pescador arriscar uma pescadinha e pasmem os senhores, os nativos não têm tempo para essa diversão. Arranjei a duras penas vara e os complementos, e numa beirada próximo ao Campanário de Bruges (Patrimônio da Humanidade) fiz a jogada de sempre. Alguns turistas me olharam com ar de surpresa, um pescador ali! Nem acreditaram.
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Mas, com minha tranquilidade de sempre continuei preocupado com a vara. Não demorou muito e senti uma beliscadinha, e mais que depressa ferrei o bicho. Foi uma loucura total, a vara embodocava de tal maneira que parecia que ia quebrar, e eu ali com adrenalina a mil, segurando o dito cujo. Demorei um bom tempo para tirar o peixe do rio, e com a quantidade de turistas em volta, ficou até difícil puxar o bicho. Quando o coloquei na grama, foi um susto geral, o peixe tinha uma bocarra enorme, cheia de dentes finos e grandes, o corpo de coloração escura com várias barbatanas ao longo do mesmo e soltava guinchos altos que nos deixaram arrepiados. Um turista cheio de salamaleques ficou olhando o peixe de perto e disse tratar-se de um peixe da idade da pedra, de nome Tertulico Paço-arquense, sabe Deus o que é isto. Aquele peixe foi a sensação do dia em Bruges, e de turista virei ídolo local com direito a fotos pelos turistas, convite das autoridades para almoço... Tive que dar centenas de autógrafos e saí em milhares de fotos ao lado do peixe, que foi sumariamente levado pelas autoridades para um museu local, possivelmente para ser empalhado e ser perpetuado, por incrível que pareça, com minha foto ao lado. Acredito que pelo menos em Bruges, vou ser reconhecido como pescador, já que santo de casa não faz milagres. Do famoso pescador de Bruges, Deomar Bittencourt.
DE OM
A R
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PESCARIA EM PARIS Louvre. Este nome não é por acaso, foi colocado por um sacerdote que sabia formas de feitiço para ser um dos nomes mais conhecidos do mundo. Quem vai a Paris, se não conhecer o Museu do Louvre não conheceu a história da França. No seu interior, a gente sente até um arrepio, não só pelas obras maravilhosas que ali contém, mas pela imponência do local. Quem conhece um pouco a história da França, se emociona. Pois bem, tudo isso eu senti neste lugar fantástico. Após a visita que durou poucas horas, porque para conhecer todas as pinturas, estátuas, trabalhos em cerâmica, trabalhos artísticos de modo geral e ficando trinta segundos na frente de cada uma destas belezas, levaria trinta anos para percorrer todo o Louvre. É uma coisa fantástica! Saímos dali energizados e fomos percorrer as outras belezas e edificações de Paris. O famoso Rei Sol, Luiz XIV, no seu apogeu quis transformar seu reinado em algo que o mundo todo admirasse e conseguiu pois séculos depois, na Avenida Champs Elysée, ainda é possível ter a sensação de estarmos passando pela Avenida em que Napoleão percorreu com todo seu esplendor, e por onde os nazistas, em sua efêmera glória, também por ali passaram e hoje, milhares de turistas são aqueles que têm este privilégio, principalmente à noite pelo apelido de Paris, como a Cidade Luz. Passeamos em suas pontes, sobre o Rio Sena, que me deixou com água na boca para uma pescaria. Mas cada coisa no seu tempo. Infelizmente um dos mais poéticos recantos de Paris, sua famosa Torre Eiffel, atualmente está cercada de todos os lados pela invasão africana onde imigrantes vendem de forma insistente aos turistas, torres em miniatura que se acendem e outras bugigangas que atazanam a maioria dos turistas que desejariam apenas estar em contato com aquela obra fenomenal e não mais conseguem. Se formos pelo outro lado da ponte para a vermos por trás, aparecem centenas de pessoas que se dizem mudas também querendo vender bugigangas ou pedir auxílio para a mudez. Incrível, este lugar perdeu 83
aquela graça que existia em tempos idos. O Rio Sena continuava passando tranquilo por debaixo de pontes famosas e numa destas, verifiquei a possibilidade de dar uma jogada e sentir os peixes europeus. Achei um restaurante em que o fundo do mesmo dava para o rio, e chegando ao local, dei uma olhada e perguntei ao garçom se poderia dar uma pescada ali atrás. O garçom me olhou com cara de gozador, foi até uma pequena casinha nos fundos e me cedeu uma vara com linha e anzol. Pedi a isca e ele, olhando para um lado e outro, trouxe um pequeno crustáceo e me deu. Pensei em se tratar de um escargot, que ele tirou de algum prato sofisticado, mas não quis nem saber, mandei o dito cujo para dentro do rio. Um senhor bem apessoado que estava a tomar um café, se aproximou e foi admirar meu desempenho. Não demorou muito e senti um peso estranho na vara e comecei a puxar, como a vara envergava, aquilo trouxe mais gente para ver o peixe, aí tive que usar toda técnica para recolher o bicho, qual não foi minha surpresa ao puxar uma bota, daquelas antigas, com a bainha próxima ao joelho virada. Todo mundo riu, mas o senhor se aproximou e pediu para ver de perto aquela bota. Eu vi que ele olhou com ar de entendido em peças antigas e de repente ele desmaiou. Assustado, tentei reanimá-lo e juntou novos personagens à situação e fiquei preocupado pensando que o velho ia morrer, agradeci quando o mesmo abriu os olhos e num inglês afrancesado me falou que aquela era a bota de Napoleão que faltava no Museu do Louvre. Com mais calma, ele contou que quando Napoleão chegou das vitórias no Egito, foi recebido como um grande imperador, mas ao atravessar a ponte, seu cavalo branco se assustou com a multidão e ao empinar fez Napoleão na tentativa de se equilibrar, perder uma bota, que caiu no Rio Sena. A outra, Napoleão tirou e deu para seu ajudante de ordens levar, e foi a célebre entrada de Napoleão em Paris descalço, montado no seu corcel branco. Agora a segunda bota ali estava, e ele como um dos mais abnegados servidores do Louvre me ofereceu € 20.000,00 pela descoberta. É lógico que não aceitei, mas doei a bota para o Museu, afinal de contas a bota era de Napoleão, e que ele doasse esse dinheiro para um Asilo de Idosos.Achando que já tinha pegado o mais famoso "peixe" do Sena, parti para minhas outras andanças pensando indo agora ao Palácio de Versalhes. Do pescador de botas, digo do Sena, Deomar Bittencourt. 84
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