Scientific Research Program - Report

Page 1

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO COORDENADORIA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E INTEGRAÇÃO ACADÊMICA PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA E EM DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E INOVAÇÃO

MAYRA ALVES ZANIN

RELATÓRIO FINAL

INICIAÇÃO CIENTÍFICA: PIBIC CNPq ( ), PIBIC CNPq Ações Afirmativas ( ), PIBIC UFPR TN ( ), PIBIC Fundação Araucária ( ), PIBIC Voluntária ( X ), Jovens Talentos ( ), PIBIC EM ( ). INICIAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E INOVAÇÃO: PIBITI CNPq ( ), PIBITI UFPR TN ( ), PIBITI Funttel ou PIBITI Voluntária ( ). (De 01/08/2017 a 31/07/2018)

Plano e projeto na cidade contemporânea: análise da transformação territorial na Linha Verde, Curitiba – Setor Sul – Setor Especial LV, período 2011-2016

Relatório apresentado à Coordenadoria de Iniciação Científica e Integração Acadêmica da Universidade Federal Paraná por ocasião da conclusão das atividades de Iniciação Científica ou Iniciação em desenvolvimento tecnológico e Inovação - Edital 2017/2018. Nome da orientadora: Profª. Letícia Nerone Gadens Departamento de Arquitetura e Urbanismo Título do Projeto: Plano e projeto na cidade contemporânea: estudo a partir da relação entre uso e ocupação do solo e transporte coletivo à luz da experiência de Curitiba BANPESQ/THALES: 2016023651

CURITIBA 2018


1.TÍTULO Plano e projeto na cidade contemporânea: análise da transformação territorial na Linha Verde, Curitiba – Setor Sul – Setor Especial LV, período 2011-2016. 2. ALTERAÇÕES REALIZADAS NO PLANO DE TRABALHO SUBMETIDO

2.1 TÍTULO OBJETO DE ESTUDO A alteração do título da pesquisa foi necessária devido à adequação a nomenclatura da área objeto de estudo, definida nos documentos oficiais do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) como “Setor Especial – LV” e não “Setor Estrutural - LV”, conforme anteriormente apresentado.

2.2 CRITÉRIOS DE AVALIÇÃO Ao longo do desenvolvimento da pesquisa foram necessárias alterações nos critérios de avaliação do processo de transformação urbana. Inicialmente, os critérios referiam-se à compacidade, densidade, usos mistos, diversidade e a estrutura de mobilidade do sistema BRT. No entanto, em razão do aprofundamento do marco teórico que discute indicadores de avaliação da forma urbana voltadas à sustentabilidade, verificou-se que os “usos mistos” poderiam ser incorporados como uma componente da avaliação da “diversidade”. Além disso, constatou-se a indisponibilidade, em órgãos oficiais, de dados que seriam necessários para a avaliação da “estrutura de mobilidade do sistema BRT”, o que resultaria na necessidade de medições de campo, incompatíveis com o cronograma do Plano de Trabalho que orientou o desenvolvimento da pesquisa. Assim, optou-se pela avaliação dos indicadores de compacidade, diversidade e densidade, de modo a possibilitar maior aprofundamento e consolidação dos dados e análises decorrentes.

3. RESUMO O presente trabalho tem por objetivo identificar, interpretar e analisar as transformações morfológicas resultantes da implantação da Operação Urbana Consorciada Linha Verde – Setor Sul, a partir de critérios que influenciam a sustentabilidade na medida em que podem levar a uma maior eficácia na gestão do solo urbano. A OUC – LV é um importante eixo estruturante que secciona a cidade de Curitiba de Norte a Sul. Assim, esta pesquisa visa interpretar o desenho urbano resultante da proposição do instrumento urbanístico, neste caso a Operação Urbana Consorciada. Por fim, objetiva uma síntese analítica, identificando o resultado do projeto urbano enquanto mecanismo de transformação territorial, de modo a contribuir com as discussões da pesquisa na qual este relatório insere-se, intitulada: Plano e projeto na cidade contemporânea: estudo a partir da relação entre uso e ocupação do solo coletivo à luz da experiência de Curitiba. A pesquisa volta-se a análise dos Setores Especiais situados no Setor Sul da OUC-LV no período

2


de 2011, quando a OUC – LV foi legalmente criada, até 2016, ano de disponibilidade mais recente dos dados necessários para a pesquisa. A justificativa desse recorte espacial e temporal se dá devido ao seu papel estratégico no desenvolvimento da cidade e da Região Metropolitana de Curitiba, juntamente com seu potencial de transformação urbana e integração metropolitana. Nesse sentido, a pesquisa orientou-se com base em duas perguntas: Quais foram os resultados morfológicos decorrentes do processo de transformação da Linha Verde? Esses resultados refletem padrões urbanos alinhados a construção de espaços urbanos mais sustentáveis e inclusivos socialmente? Essa pesquisa foi realizada em quatro etapas. Inicialmente estruturou-se a fundamentação teórica conceitual acerca de Grandes Projetos Urbanos (GPUs) e do instrumento Operação Urbana Consorciada (OUC). Na sequência, realizou-se a caracterização da OUC LV – Setor Sul durante o período de 2011 a 2016. Em seguida, analisou-se o processo de transformação a partir dos critérios de compacidade, densidade e diversidade. Por fim, procedeuse a discussão dos resultados parciais encontrados, com ênfase na relação sistêmica plano e projeto. 4. INTRODUÇÃO Na

década

de

1970,

com

a

emergência

do

neoliberalismo

e

seus

ideais

descentralizadores, o Planejamento Estratégico se apresentou como uma alternativa ao planejamento tradicional (LUNGO, 2004). Com ideias voltadas para o market oriented1 e market friendly,2 os Grandes Projetos Urbanos (GPUs) se tornaram um dos principais instrumentos do Planejamento Estratégico para a realização de transformações urbanas. Os GPUs são entendidos como projetos de grandes intervenções, que promovem o crescimento econômico e a competitividade da cidade, por meio de parcerias público privadas, na qual o Estado abre exceções na legislação em uma determinada área em troca de contrapartidas. (VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012). Nesse sentido, os GPUs caracterizam-se por projetos de distintas tipologias, conteúdos programáticos, escalas, articulações de agentes, o que resulta em certa complexidade para sua viabilização. Assim, são intervenções que apresentam potencial de transformação da realidade existente, (ULTRAMARI, 2006; VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012) que precisam ir além de reformas de infraestrutura, pois devem envolver no seu processo os diversos aspectos da dinâmica urbana e especialmente a participação dos atores que são diretamente afetados por essas transformações. (LUNGO, 2004) Ao longo do tempo, os GPUs têm sido estudados e criticados por diversos autores. Para Alvim, Abascal e Moraes (2011), a maneira como ocorre o processo pode ser benéfico para a cidade e sua população, ou, por outro lado, pode acirrar a privatização da cidade e do solo. Por exemplo, se o projeto não se articular com seu contexto de maneira global, os impactos podem

1 2

Orientado pelo e para o mercado. Amigável ao mercado

3


causar processos de elitização, gentrificação e especulação, casos que normalmente ocorrem quando o Estado tende a favorecer os interesses do mercado em detrimento de outros atores envolvidos. (LUNGO, 2004). No Brasil, a viabilização dos GPUs foi concebida a partir de instrumentos urbanísticos, tais como as Operações Urbanas Consorciadas (OUCs), que tiveram suas primeiras experiências, ainda concebida como Operação Urbana a partir da década de 1990 em São Paulo. Porém, as OUCs somente foram incorporadas em um marco regulatório nacional com a aprovação do Estatuto da Cidade3, em 2001. Os projetos passaram então a incorporar o termo Consorciado, devido à ênfase dada na associação entre Estado e setor privado. Nesse momento, o instrumento se tornou uma alternativa para o financiamento público e para o enfrentamento dos conflitos territoriais (MALERONKA, 2010). De acordo com o Estatuto da Cidade, a OUC é um instrumento urbanístico que: [...] “coordenadas pelo Poder Público municipal com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.” (BRASIL, 2001. p.30).

Também são previstas medidas como a modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupação do solo, bem como a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente (BRASIL, 2001). Em quase duas décadas de aplicação do instrumento, verifica-se que há necessidade de maior aprofundamento com relação à avaliação de suas consequências sobre o território. As experiências precedentes centraram-se no equacionamento financeiro, não atentando para os resultados morfológicos e para a dimensão urbanística das operações (MALERONKA, 2010). Complementarmente, Ultramari (2007) afirma que há necessidade das discussões sobre os GPUs irem além dos custos financeiros, pois seus impactos acabam gerando mudanças físicas sociais, ambientais e econômicas nos locais em que se inserem. Para Portas (2003), a realidade urbana da América Latina deve ser dirigida pela busca de uma sociedade mais igualitária e democrática. Nesse sentindo, se faz de extrema importância os estudos sobre como os GPUs tem contribuído ou não no combate à desigualdade social e econômica nos locais em que se encontram, tendo em vista seu potencial de profunda transformação, o que acaba redefinindo as funções das cidades. (LUNGO, 2004). Esse relatório, portanto, em um sentido mais amplo, busca contribuir com as discussões da pesquisa na qual está inserido, intitulada: Plano e projeto na cidade contemporânea: estudo a partir da relação entre uso e ocupação do solo coletivo à luz da experiência de Curitiba. Esta 3

Lei nº. 10.257, de 10 de julho de 2011: Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal e estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.

4


pesquisa visa discutir a associação de instrumentos de plano e projeto urbano, com vistas a refletir sobre a construção de espaços urbanos mais sustentáveis e inclusivos. Tendo em vista o exposto, esse estudo busca, a partir da observação empírica de um caso concreto, identificar, analisar e interpretar os resultados morfológicos decorrentes da implantação da Operação Urbana Consorciada Linha Verde, situada em Curitiba – Paraná, observando critérios que avaliam seu alinhamento a práticas urbanas sustentáveis, na medida em que podem conduzir a uma maior eficácia na gestão do solo urbano, transformando a realidade preexistente. A Linha Verde é um eixo estruturante que secciona a cidade de Curitiba no sentido nortesul e possui papel estratégico no desenvolvimento da cidade e da Região Metropolitana de Curitiba, por sua localização, extensão, e promoção de integração urbana e metropolitana, além de apresentar potencial de transformação. Nesse sentido, a pesquisa orientou-se com base em duas perguntas:

a) Quais foram os resultados morfológicos decorrentes do processo de transformação da Linha Verde?

b) Esses resultados refletem padrões urbanos alinhados a construção de espaços urbanos mais sustentáveis e inclusivos socialmente? Essa pesquisa foi realizada em quatro etapas. Inicialmente realizou-se a fundamentação teórica conceitual acerca dos GPUs e do instrumento da Operação Urbana Consorciada; na sequência, a caracterização da OUC LV – Setor Sul, no período de 2011 a 2016. Em seguida, analisou-se o processo de transformação a partir dos critérios de compacidade, densidade e diversidade. Por fim, procedeu-se a discussão dos resultados encontrados, com ênfase na relação sistêmica entre plano e projeto. 5. REVISÃO DA LITERATURA A partir da década de 1970, com a expansão dos ideais neoliberais, o planejamento tradicional, que era fortemente marcado pela presença do Estado, caiu em esgotamento. As novas ideias políticas, juntamente com correntes descentralizadoras, o ganho de poder do mercado em detrimento do Estado e o processo de globalização deram início a uma nova concepção de planejamento (LUNGO, 2004). Em resposta a essas transformações, o denominado planejamento estratégico, surgiu como uma alternativa para o planejamento urbano tradicional. A partir daí, aos poucos as cidades se tornariam mais competitivas e flexíveis por meio de ações voltadas para o market oriented e market friendly, estratégias favoráveis ao mercado e a globalização (VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012). Assim, o planejamento estratégico tinha como um de seus principais instrumentos de gestão urbana, os Grandes Projetos Urbanos (GPUs), cuja concepção, conduzida pelo setor privado, o torna “a expressão mais clara da visão neoliberal da gestão urbana” (LUNGO, 2004, p. 38). A parceria público-privada é uma das principais características dos GPUs, na qual o Estado,

5


agora não mais regulador, mas sim facilitador, produz exceções, renúncias ou incentivos fiscais e urbanísticos

para

atrair

o

investimento

do

setor

privado,

sobretudo

o

do

setor

imobiliário. (VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012). Precedendo esse contexto, Portas (2003) afirma que os projetos urbanos, na década de 1960, se referem a projetos unitários de arquitetura. Todavia, a partir da década de 1970, essas intervenções passaram a ser entendidas como resposta às contradições existentes entre os projetos arquitetônicos e os planos urbanos, os quais não respondiam às necessidades urbanas da época. Nessa perspectiva, Lungo (2004) afirma que: “[...] o projeto urbano passa a ser entendido como uma atuação pública sobre um segmento da cidade, porém articulada a uma visão global da mesma e dos problemas econômicos e sociais. Passa competir com os planos urbanos por ser mais atrativo para os investidores privados ao especificar propostas especiais e incluir, além de aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais e exigir o acordo entre múltiplos atores”. (LUNGO, 2004, p.17).

A partir dos anos 1990, os projetos urbanos passaram a apresentar escalas maiores e substituíram as antigas práticas do planejamento tradicional, de domínio exclusivo do Estado. Além de promoverem o crescimento econômico e a competitividade, também passaram a incentivar o investimento do setor privado (VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012). Todavia, essa parceria que inicialmente parecia uma grande vantagem, uma vez que o Estado já não possui recursos para investimento em obras públicas, tornou-o refém dos interesses dos investidores, pois não há investimento sem a obtenção de lucros. Nesse sentido, é imprescindível apontar a importância da localização dos projetos urbanos, uma vez que o “lugar” se torna o ponto central da circulação de capital (LUNGO, 2004). Os GPUs também se caracterizam pela grande diversidade de tipologias e de escalas de intervenções, que acabam se relacionando diretamente com a lógica até o momento apresentada, pois os projetos vão desde a construção de novos sistemas de infraestrutura e de transporte público à recuperação de grandes áreas com potencial de uso urbano, o que garante certa complexidade a sua viabilização (ULTRAMARI, 2006). Todavia, para Lungo (2004), os GPUs devem ser mais do que apenas melhoramentos da infraestrutura e de bairros. Segundo o autor, projetos dessa natureza devem considerar diversos aspectos presentes na dinâmica urbana, tais como viabilidade, moradia, valores patrimoniais, tempo de desenvolvimento, interesses sociais, econômicos e ambientais.

Nesse contexto,

segundo Del Rio (2000), a confiança no processo e no lugar é vital para a construção ativa e intensa de uma nova imagem e para a atração de novos usuários e investimentos.

6


Nesse sentido, a multiplicidade de interesses e a conciliação de atores, que essas intervenções abrangem, se tornam um aspecto crítico na implantação dos GPUs, os quais possuem um grande poder de transformação com impactos considerados positivos ou deletérios. Autores com visão crítica sobre o tema afirmam que os GPUs podem causar impactos que acirram os processos de elitização, gentrificação, especulação e apropriação individual da valorização da terra, caso não se articule com o seu contexto de maneira global e não levem em consideração os interesses de todos os atores envolvidos. “Assim, para diversos analistas críticos, os grandes projetos têm sido apenas construções monumentais, impulsionadas na maioria dos casos pela iniciativa governamental, destinados a direcionar a empresas os benefícios da recuperação do entorno urbano onde se constroem os projetos”. (LUNGO, 2004 p.20)

Por outro lado, a captura de investimento por meio do setor privado não necessariamente implica na submissão das decisões do Poder Público à lógica do mercado (MALERONKA, 2010). Para Alvim, Abascal e Moraes (2011), dependendo de como ocorre à condução dos processos, a privatização do solo e da cidade pode ser acirrada ou, por outro lado, a essência pública da gestão urbana pode ser recuperada e a população beneficiada. Como exemplo, pode-se citar, a realização dos Jogos Olímpicos de 1992, em Barcelona, na Espanha, em que os investimentos advindos do setor privado impulsionaram projetos urbanísticos para a revitalização e requalificação dos espaços públicos da cidade, tornando-a um dos polos culturais e econômicos na Europa. (DEL RIO, 2000). Na América Latina, os GPUs se caracterizam de maneira um pouco distinta dos projetos realizados na Europa e nos Estados Unidos, tanto pela gestão da terra, quanto pelo contexto econômico, ambiental e social que depende da heterogeneidade dos interesses presentes na cidade e sua lógica de atuação (LUNGO, 2004). Nesse sentido, em meados dos anos 1980, enquanto a maioria dos projetos nos Estados Unidos se referia à construção de infraestrutura, os países da América Latina, diante da tensão das finanças que inviabilizaram a manutenção dos serviços existentes, passou a utilizar os projetos para realizar renovações urbanas necessárias à cidade (LUNGO, 2004). No Brasil, alguns instrumentos urbanísticos têm sido associados à viabilização de GPUs, tais como as Operações Urbanas Consorciadas (OUCs), que consistem no objeto de análise dessa pesquisa. Seu conceito passou a ser discutido em meados da década de 1970, porém as operações urbanas só surgiram na década de 1990 em São Paulo, como um importante processo que viabilizou a implantação de GPUs por meio do investimento do capital privado. Nesse processo, o Estado flexibilizou a legislação ao propor parâmetros específicos para uma determinada área da cidade em troca de contrapartidas dos investidores, que seriam beneficiados com os projetos. (MALERONKA, 2010).

7


Essa concepção estava apoiada em ideias que surgiram na década de 1970, a partir das teorias do solo criado. Seu conceito baseia-se no entendimento de que “a criação do solo é a criação de áreas adicionais de piso utilizável não apoiadas diretamente sobre o solo” (MOREIRA, AMBROSIS, FILHO, 1975 apud MALERONKA, 2010, p.4)4. Assim, a partir dessa ideia surgiu o conceito de Coeficiente de Aproveitamento único, que consiste na utilização gratuita permitida aos terrenos urbanos, concedido a todos os proprietários de um lote. O Coeficiente de aproveitamento único é um conceito que fundamenta o instrumento da Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC) para permitir que o Estado defina determinadas áreas da cidade na qual o proprietário, perante o pagamento de uma contrapartida, possa construir no seu terreno acima desse coeficiente. Esse instrumento fundamenta-se na ideia de que o direito de construção acima do coeficiente único é um benefício concedido pelo Estado. Assim, “os proprietários que se beneficiarem com a utilização do potencial construtivo e, pois, da infraestrutura urbana, deverão devolver parte da riqueza gerada à coletividade.” (SANTORO; CYMBALISTA, 2008 p. 88 apud NETO; MOREIRA 2013. p.04)5. Essa lógica é um dos principais instrumentos que acabou permitindo a associação público-privada, uma das questões que sustentam a implementação das OUCs (MALERONKA; FURTADO, 2013). No entanto, as Operações Urbanas somente foram definidas em marco regulatório nacional com a aprovação do Estatuto da Cidade6, em 2001, quando passaram a se configurar como Operações Urbanas Consorciadas, caracterizadas pelo reforço da parceria público-privada e gestão compartilhada. Até então, experiências de operações precedentes, implantadas em São Paulo, se afastaram da sua concepção original e acabaram se limitando a uma negociação de compra e venda desvinculadas de um projeto claro de transformação do território (MALERONKA, 2010). Mesmo assim, o Estatuto da Cidade parte da experiência paulistana e define a OUC como: “[...] o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas, estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental [...]” (BRASIL, 2001, art. 32.)

O Estatuto da Cidade teve grande importância ao reforçar a parceria público-privada e ao introduzir novos processos às operações urbanas, tais como a obrigatoriedade da gestão compartilhada entre o Estado e a sociedade civil e a utilização do Certificado de Potencial 4

MOREIRA, Antônio Claudio Moreira Lima e; AMBROSIS, Clementina de; FILHO, Dalmo do Valle Nogueira; AZEVEDO NETTO, Domingo Theodoro de. O solo criado. Estudo sobre o uso do solo que conceitua e fornece elementos às administrações municipais para o controle e melhor aproveitamento do solo. São Paulo, CEPAM, 1975. 5 SANTORO, Paula., CYMBALISTA, Renato, (2004). Introdução à expressão “gestão social da valorização da terra”. In: SANTORO, P. (org.). Gestão social da valorização da terra. São Paulo, Instituto Polis. 6 Lei federal de n.º 10.257 de 2001. Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal que tratam da política de desenvolvimento urbano e da função social da propriedade.

8


Adicional de Construção – CEPACs7, novo instrumento de captação financeira, que aperfeiçoou a cobrança das contrapartidas e permitiu a antecipação dos recursos a serem aplicados no projeto. Além disso, deixou-se em aberto o uso de novos elementos como itens de negociação, tais como a regularização de edificações em desacordo com a legislação e a alteração do zoneamento (MALERONKA, 2010). A partir de então, segundo Maleronka (2010), com a disseminação da operação urbana consorciada (OUC) pelo país, o instrumento passou a ser uma alternativa de financiamento público para o enfrentamento dos conflitos territoriais. Assim, se faz necessário que os objetivos da OUC sejam direcionados à realização de ações urbanísticas associadas a todas as dimensões do desenvolvimento sustentável de maneira equilibrada, seguindo ainda as diretrizes propostas para o ordenamento territorial definida pelo Plano Diretor· (SOTTO, 2015). Todavia, práticas recentes de aplicação do instrumento no Brasil têm demonstrado resultados controversos. Para alguns autores como Nobre (s.d.), os projetos acabam tendo um resultado apenas imobiliário, sem uma real melhoria do local da intervenção. Por serem, na maioria dos casos, realizados em locais aonde já existe interesse do mercado, acabam concentrando renda e agravando a segregação sócio espacial. Para Maleronka (2010), as experiências precedentes demonstram que há uma aplicação parcial do instrumento por meio da concentração de esforços voltados à resolução das questões financeiras, em detrimento das questões urbanísticas e de projeto, as quais ao serem ignoradas acarretam um desequilíbrio urbano. Nesse sentido, em quase duas décadas de aplicação da OUC, verifica-se que há necessidade de maior aprofundamento com relação à avaliação de suas consequências sobre o território. As experiências centraram-se no equacionamento financeiro, não atentando para os resultados morfológicos e para a dimensão urbanística das operações. Corroborando com essa premissa, Ultramari (2006) argumenta que, especialmente em relação aos GPUs, há a necessidade das discussões irem além dos custos financeiros, pois seus impactos acabam gerando mudanças físicas e de processos sociais, ambientais e econômicos, podendo causar rupturas nos mais diversos níveis das dinâmicas da cidade em que estão inseridos. Nesse sentido, essa pesquisa fundamenta-se na análise dos resultados morfológicos decorrentes da implantação de GPUs, observando critérios que avaliam seu alinhamento a práticas urbanas sustentáveis, como modo de aumentar a eficácia da gestão do solo e transformar a realidade preexistente. Alguns desses critérios são recorrentes na literatura, avaliando quais formas urbanas seriam mais sustentáveis e promoveria, por consequência, maior eficiência na gestão do solo urbano (JABAREEN, 2006), tema este de fundamental relevância para a reversão dos quadros de CEPAC – Certificados de Potencial Adicional de Construção: títulos imobiliários a serem emitidos pelo município, funcionando como mecanismo de venda de contrapartida relativa à outorga onerosa do direito de construir (NETO; MOREIRA 2013). 7

9


desigualdade sócio espaciais na América Latina (LUNGO, 2004) e no Brasil (VAINER; OLIVEIRA; JUNIOR, 2012). O primeiro deles, denominado compacidade, corresponde a um indicador ambiental e se refere à continuidade e conectividade do tecido urbano ao tentar alcançar máxima eficiência dos recursos naturais, reduzindo o consumo do solo. (RUEDA, s.d.). A densidade, um dos parâmetros mais relevantes no desenho urbano, representa a relação de uma quantidade de pessoas para uma determinada área (ACIOLY; DAVIDSON, 1998). Sua importância se dá em razão da estreita relação com o transporte e a compacidade, uma vez que uma cidade pouco densa aumenta a área necessária para demandas de uso do solo e de atendimento do transporte. Por outro lado, uma cidade muito densa pode esgotar os recursos naturais e os sistemas de transporte (JABAREEN, 2006). Por fim, a diversidade se torna importante, pois, a sua ausência, incentiva às pessoas a utilizarem seus automóveis para seus deslocamentos. Segundo Jacobs (1961) quanto mais diversa é uma área, mais pessoas se encontram caminhando ao seu redor. Assim, a diversidade é vital para a qualidade do espaço urbano. Todos esses critérios possuem impacto na forma urbana, e, consequentemente, influenciam na sustentabilidade dos Grandes Projetos Urbanos, na medida em que podem permitir maior eficácia na gestão do solo urbano e maior distribuição dos benefícios dos processos potenciais de transformação, promovidos por GPUs.

6. MATERIAIS E MÉTODOS A presente pesquisa tem por objetivo analisar o processo de transformação da Linha Verde em Curitiba, identificando seus resultados morfológicos. A Linha Verde é a primeira e única Operação Urbana Consorciada de Curitiba e possui um papel estratégico na escala urbana e metropolitana. Esse estudo volta-se a análise dos Setores Especiais da Linha Verde, definidos na OUC, situados no Setor Sul da operação, que consistem em áreas de impacto imediato da via, e que atuam como articulação entre as áreas definidas como pólos, caracterizadas pela concentração de estações de transporte público, importantes cruzamentos viários e ligações entre bairros e eixos estruturais. O estudo abrange o período de cinco anos, a partir de 2011 quando a OUC foi aprovada pela Lei nº 13.909/20118, até 2016, ano mais recente de coleta dos dados, e estrutura-se a partir da observação empírica de um caso concreto, cuja verificação visa contribuir para a construção, no conjunto da pesquisa, de um referencial teórico brasileiro sobre o tema. Dessa forma, os procedimentos e técnicas foram metodologicamente estruturados em quatro fases principais: a) Fundamentação teórico-conceitual acerca do tema; 8

Aprova a Operação Urbana Consorciada Linha Verde. Estabelece diretrizes urbanísticas para a área de influência da atual Linha Verde, desde o bairro Atuba até os bairros Cidade Industrial de Curitiba - CIC e Tatuquara criam incentivos por meio de instrumentos de política urbana para sua implantação, institui o grupo gestor, a comissão executiva e dá outras providências. (CURITIBA, 2011)

10


b) Caracterização do recorte físico e temporal; c) Identificação e análise do processo de transformação territorial do objeto de estudo; d) Discussão dos resultados encontrados com ênfase na relação sistêmica plano e projeto. A revisão da literatura envolveu a leitura de artigos científicos, livros, trabalhos acadêmicos, entre outros, a respeito da conceituação e discussões sobre Grandes Projetos Urbanos, morfologia urbana e instrumentos urbanísticos como a Operação Urbana Consorciada (OUC), outorga onerosa do direito de construir (OODC) e zoneamento. Em paralelo com o referencial teórico, realizou-se a caracterização da área objeto de estudo por meio de leitura documentos oficiais, artigos científicos, mapas temáticos e informações institucionais e legais a respeito da inserção urbana do projeto, características da área de intervenção, concepção e intervenções propostas. O processo de análise espacial e temporal ocorreu de forma exploratória, descritiva e analítica a partir dos critérios de observação definidos para a pesquisa – compacidade, densidade e diversidade - que avaliam os resultados morfológicos de uma intervenção sob a perspectiva de práticas urbanas mais sustentáveis, conforme mencionado anteriormente na seção 4. A análise da compacidade se deu por meio da análise da proporção de lotes ocupados e vazios e verificação da estrutura fundiária, na área objeto de estudo. O critério de densidade foi analisado por meio da verificação da proporção de lotes destinados a uso residencial e avaliação da dinâmica construtiva, verificando os Certificados de Vistoria e Conclusão de Obras – CVCOs emitidos. As análises foram estruturadas por meio de gráficos e mapas evolutivos da densidade demográfica, densidade líquida de uso residencial, de forma comparativa entre Curitiba, Linha Verde e Setor Sul da operação. O critério de diversidade foi avaliado a partir de mapas evolutivos apresentando a proporção entre as atividades de comércio, serviço e residências. Todos os mapas e gráficos foram elaborados a partir da utilização de shapes9 da Base Cadastral de Curitiba e dados oficiais fornecidos pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba – IPPUC, juntamente com dados do censo de 2010, fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. A pesquisa se realizou com o suporte do Laboratório de Habitação e Urbanismo (LAHURB) no campus Centro Politécnico da UFPR. Todo o desenvolvimento da pesquisa contou a utilização de um computador e o auxílio do software QGis e do Google Maps para a organização e análise das informações, resultando na elaboração de mapas e gráficos.

9

O “shape” é um tipo de arquivo digital que representa uma feição ou elemento gráfico, seja ela em formato de ponto, linha ou polígono e que contém uma referência espacial (coordenadas geográficas) de qualquer que seja o elemento mapeado. Na pesquisa é utilizado para a criação de mapas temáticos comparativos e evolutivos a respeito do objeto de estudo. (SEMACE, 2018)

11


7. RESULTADOS E DISCUSSÃO A Operação Urbana Consorciada Linha Verde (OUC-LV) é a primeira experiência de utilização do instrumento em Curitiba. Criada pela Lei Municipal n.º 13.909 em 19 de dezembro de 2011, estabelece diretrizes urbanísticas para as áreas adjacentes à antiga BR-116, no trecho inserido no município de Curitiba, entre a região do Atuba, ao Norte e o Contorno Leste ao Sul, conforme ilustra a Figura 1 (FIPE, 2012).

Figura 1: Inserção urbana e setorização da OUC-LV na Região Metropolitana de Curitiba Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2016)

Construída em 1950, a Rodovia Federal BR-116, atualmente denominada BR-476, constitui o principal eixo rodoviário do país ao conectá-lo longitudinalmente. (NETO; MOREIRA, 2013). Em Curitiba, a rodovia dividia a cidade em duas porções, leste e oeste, em um trecho de aproximadamente 30 km de extensão. Na época, seu traçado passava a leste e distante da área urbanizada. Todavia, com o aumento populacional, principalmente nas décadas de 1970 e 1980, o tecido urbano passou a se expandir em direção leste, para além da rodovia, causando problemas de segurança no seu entorno (FIPE, 2012; SILVA, 2017). Ao longo de décadas, diversos projetos e ações foram implantados para amenizar os impactos da rodovia na malha urbana. Dentre os mais importantes, destacam-se os projetos BRVida, BR-Cidade, STAC e Linha Verde. O projeto BR-Vida, proposto em 1991, implantou alguns bolsões de retorno com iluminação e semáforo na tentativa de integrar a rodovia à escala da cidade. Com o seu desenvolvimento, em 1998, o projeto BR-Cidade trouxe o conceito de uma avenida de integração entre as malhas viárias adjacentes à rodovia, por meio de ações como a implantação de redutores de velocidade, transposições em desnível e iluminação na rodovia (FIPE, 2012).

12


Logo em seguida, a parceria com entes federativos possibilitou a proposição do projeto STAC - Sistema de Transporte de Alta Capacidade, com o objetivo de promover a integração metropolitana por meio de um novo eixo de desenvolvimento. O projeto contemplava a implementação de uma avenida com um sistema de transporte de alta capacidade. Todavia, a falta de recursos forçou o município a buscar novas alternativas, levando ao desenvolvimento do projeto Linha Verde, em 2000, o qual contemplava a integração do sistema de transporte BRT10 à rodovia, priorizando a integração metropolitana e intramunicipal, o meio ambiente e redimensionamento da ocupação urbana (FIPE, 2012). Paralelamente, a construção do Contorno Leste, entre 1996 e 1998, foi de fundamental importância para os projetos de integração da rodovia à malha urbana. Sua implantação permitiu o desvio do tráfego pesado e abriu a possibilidade de urbanização de um importante eixo municipal e metropolitano (FIPE, 2012). Nesse sentido, a proposição da Operação Urbana Consorciada da Linha Verde (OUC-LV), objeto de estudo desta pesquisa, possibilitou a estruturação de uma nova fonte de recursos para as obras e uma nova oportunidade de consolidar o processo de transformação que estava acontecendo na região. Assim, a OUC-LV deu continuidade ao processo de implantação do Projeto Linha Verde. De acordo com IPPUC (2016, p. 33) a OUC – LV propunha: “[...] a oferecer uma nova configuração para a cidade, sustentada no planejamento consolidado dos últimos 40 anos, que se baseia na integração do sistema viário, uso e ocupação do solo e o sistema de transportes, sempre mais eficientes, aliado ao desenvolvimento econômico, ao desenvolvimento social e à preservação ambiental”.

A proposta tinha como objeto a transformação da rodovia em um eixo de desenvolvimento e integração metropolitana e intramunicipal por meio da implantação de uma via estrutural trinaria, nos moldes preconizados no Plano Diretor de 1966. Além disso, previa parâmetros de uso e ocupação do solo específicos, permitindo uso misto e maior densificação na região, como já ocorre nos eixos estruturantes da cidade (SILVA, 2017). Assim, parte dos recursos para o desenvolvimento da região seria proveniente da compra de potencial construtivo, por meio da emissão de CEPACs uma vez que as obras já estavam em andamento com recursos obtidos por meio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) (FIPE, 2012) A Operação Urbana Consorciada da Linha Verde apresenta uma área de 20.820.506m² abrangendo 16.886 lotes, distribuídos em 22 bairros e englobando uma população de 82.000 habitantes (IBGE, 2010). A OUC-LV foi dividida em três setores: Norte, Central e Sul (Figura 1). O Trecho Sul teve suas obras concluídas em 2009 e foi financiado com recursos do Banco

10

BRT – Bus Rapid Transport: sistema de transporte coletivo de passageiros que proporciona mobilidade urbana rápida por meio de infraestrutura segregada com prioridade de ultrapassagem, operação rápida e frequente (ITDP, 2018).

13


Interamericano de Desenvolvimento (BID), enquanto o trecho norte ainda encontra-se em obras. (FIPE, 2012). Os setores, por sua vez, dividem-se em diferentes zonas, sendo àquelas lindeiras ao eixo e com previsão de maiores densidades denominada Pólo da Linha Verde (POLO-LV) e Setor Especial da Linha Verde (SE-LV), sendo este último reconhecido como área de influência do primeiro e objeto de estudo desta pesquisa Para melhor compreensão da análise,

a autora

numerou cada um dos SE-LV, conforme ilustra a Figura 2. No SE-LV, pretendeu-se uma ocupação diferenciada de média e alta densidade, com predominância de uso residencial por meio de um coeficiente básico de um. Com a possibilidade de aquisição de potencial construtivo, o coeficiente pode ser majorado até quatro, com altura livre. Também há benefícios para empreendimentos mistos, sendo que edifícios que possuam comércio ou serviços e uso residencial com no mínimo 50% da área construída recebem potencial adicional equivalente a cinco décimos da área do lote (CURITIBA, 2011).

Figura 2: Setor Especial da Linha Verde, no Setor Sul da OUC-LV Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2016)

A aplicação dos critérios de avaliação nos recortes espaciais de análise indica que os setores sofreram uma tênue transformação, a qual não necessariamente segue os parâmetros estabelecidos para a área no desenho da OUC-LV. Ao longo do período de análise, os setores não apresentaram alterações significativas. A estrutura territorial da área analisada apresenta aproximadamente 80% de lotes ocupados, sofrendo uma de apenas 1,7% em relação a lotes

14


ocupados e desocupados (Gráfico 1). Essa ocupação é predominantemente de edificações existentes e algumas novas, construídas após a aprovação da OUC – LV, cuja análise será detalhada na sequência da pesquisa.

Gráfico 1- Evolução da quantidade de lotes prediais e territoriais no SE-LV 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 2012

2014 territorial

2016 predial

Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016).

Além disso, comparativamente ao Setor Sul, os Setores Especiais apresentam maior concentração de usos comerciais, correspondendo à média de 40%, com uma alteração de cerca de 1% ao longo dos anos de análise, o que, em conjunto com a presença de usos residenciais, evidencia o caráter misto dos setores (Gráfico 2).

80%

Gráfico 2 - Evolução dos lotes comerciais e residenciais no SE-LV, no SE Pólo e no Setor Sul

70% 60% 50%

40% 30% 20% 10% 0% 2012

2014

2016

Residencial SE

Residencial SE_Pólo

Residencial Setor Sul

Comercial SE

Comercial SE_Pólo

Comercial Setor Sul

Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016).

Com relação à estrutura fundiária, verifica-se que 70% dos lotes apresentam medidas superiores a 450m², sendo que destes, 20% são maiores que 1000m², demonstrando uma organização territorial estruturada a partir de grandes parcelas. Ao longo do período analisado, percebeu-se uma alteração de cerca de 0,30%, indicando uma estagnação com relação ao parcelamento do solo, conforme apresenta o Gráfico 3.

15


Gráfico 3 - Evolução do tamanho dos lotes no SE-LV 60% 50% 40% 30% 20% 10%

0% 2012

2014 126-360m²

2016

361 - 450m²

451-1000m²

Acima de 1000m²

Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016).

Embora 50% dos lotes existentes nos Setores Especiais apresentam áreas entre 451 a 1000m², notou-se maior transformação nas estruturas fundiárias com dimensões maiores que 1000m², concentradas nos setores SE3, SE4 SE5, situados na porção central do Setor Sul. Na porção norte da LV-Setor Sul percebe-se a presença de estrutura fundiária com lotes menores e mais consolidada, enquanto que ao sul se encontram os lotes de maiores dimensões, portanto passíveis de transformações mais expressivas. Estes lotes acabam atraindo maior interesse de empreendedores ao permitirem à viabilização de grandes empreendimentos imobiliários, visto que cerca de 65% dos Certificados de Vistoria de Conclusão de Obras – CVCO emitidos no Setor Especial, no período de análise, ocorreram em lotes com dimensões maiores que 1000m². Por meio da análise dos CVCOs emitidos na OUC-LV, entre os anos de 2011 e 2015, apenas 3% se encontram nos setores especiais. Destes, apenas 1 foi emitido para comércio e serviço, enquanto 14 foram emitidos para habitação coletiva nos setores SE3 e SE5, todos no ano de 2013, e concentrados em lotes com dimensão acima de 1000m², conforme apresentado no Gráfico 411 e na Figura 3:

16

Gráfico 4 - Quantidade de CVCO emitidos por ano e por dimensão de lotes no Setor Especial

14 12 10 8 6 4 2 0 2011 126-360m²

2012 361-450m²

2013 451-1000m²

2014

2015 Acima de 1000m²

Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016).

11

O resultado pode ter sido influenciado, segundo dados do Banco Central do Brasil, pelo forte crescimento imobiliário ocorrido nos anos anteriores a 2014, que apontam um crescimento anual no financiamento imobiliário, chegando a uma média anual de 52% entre os anos de 2004 e 2012. O reflexo desse crescimento em Curitiba ocorreu com um pico de CVCOs emitidos em 2013. Entre o período de 2009 a 2013 houve um crescimento no número de empreendimentos imobiliários de 85%, que passou a sofrer uma desaceleração a partir de 2013, caindo para um crescimento médio anual de 10% (ADEMI – PR, 2016).

16


Figura 3: Estrutura fundiária e alvarás de Construção emitidos na Linha Verde – Setor Sul, no período de 2012 a 2015. Fonte–: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2013, 2014, 2015)

A partir dessa constatação procedeu-se a análise mais detalhada dos dois setores citados, com a utilização de imagem de satélites e visitas locais, o que possibilitou a identificação da tipologia de empreendimentos imobiliários que foram viabilizados nos setores SE3 e SE5 e seus arredores. Assim, verificou-se que o desenho previsto na proposta da OUC-LV ainda não vem sendo alcançado, pois muitos empreendimentos construídos após sua aprovação encontram-se situados fora dos perímetros do Setor Especial e dos Pólos (Figura 4), setores nos quais seria desejável a concentração do adensamento na região. O setor SE3 e seus arredores apresentam uma estrutura fundiária mais consolidada e, portanto, com poucas transformações significativas. Os empreendimentos lançados neste setor

17


correspondem à habitação de uso coletivo e atividades comerciais. Nas áreas situadas no seu entorno verifica-se maior quantidade de lançamentos imobiliários com menor densidade, como por exemplo, habitação unifamiliar e habitação em série. No SE5, apesar de seu entorno ser constituído prioritariamente de habitação em série, percebe-se que houve uma quantidade maior de empreendimentos construídos devido a estrutura fundiária ser constituída prioritariamente por lotes com dimensões acima de 1000m².

Figura 4: Evolução da ocupação no período de 2012 a 2016 nos setores SE3 E SE5 e seus arredores Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016) e Google Earth (2012, 2014, 2016)

Com relação ao indicador de diversidade, verifica-se que os lançamentos imobiliários realizados no local acabaram criando um efeito inverso ao pretendido. As novas edificações não promoveram uso misto, a despeito das intenções previstas na operação e dos benefícios concedidos para quem os promovesse. A partir da Figura 5, percebe-se que os empreendimentos lançados após 2011 são de uso estritamente residencial ou comercial.

18


Figura 5: Tipologia de uso das edificações no período de 2012 a 2016 nos setores SE3 E SE5 e seus arredores Fonte: Elaborado pela autora com base em IPPUC (2012, 2014, 2016) e Google Earth (2018)

A tipologia construtiva proposta resulta em uma padronização da paisagem (Figura 6), com edificações que não estabelecem relação com a rua e tipologias com características arquitetônicas semelhantes, ao mesmo tempo em que edifícios de habitação coletiva contrastam com as preexistências locais, sem, no entanto, corresponder às densidades previstas na OUC, tendo em vista o potencial construtivo utilizado (Figuras 7 e 8):

Figura 6: Empreendimentos organizados em condomínios fechados e com tipologia homogênea Fonte: Acervo da autora (2018).

19


Figura 7: Empreendimentos exclusivamente residenciais (à esquerda e a direita em segundo plano) e estritamente comerciais (ao centro em primeiro plano) no Setor Especial da Linha Verde – SE3 e seu impacto na paisagem. Fonte: Acervo da autora (2018).

Figura 8: Empreendimento exclusivamente comercial (à esquerda em segundo plano) e condomínio residencial fechado (à direita em segundo plano) no Setor Especial da Linha Verde – SE5. Fonte: Acervo da autora (2018).

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir do estudo realizado constatou-se que o Setor Especial da Linha Verde segue, predominantemente, com a sua dinâmica de comércio e serviços, relacionados à existência da antiga rodovia, de modo que o processo de transformação ainda se demonstra incipiente. A partir das análises realizadas, verificou-se que, neste primeiro momento, a alteração de usos e tipologias construtivas nos Setores Especiais não estão cumprindo a sua vocação prevista para a área de maneira plena. Os empreendimentos de maior porte, ainda que poucos densificaram a área de maneira insuficiente e não favoreceram a diversidade pretendida para a Linha Verde. Acredita-se que fatores internos e externos também possuem certa influência no processo. O ineditismo na utilização do instrumento na cidade, associado à operacionalização da comercialização de CEPACs em leilões podem estar desencorajando a realização de investimento privados na área, os quais se dirigem a locais mais consolidados da cidade, cujo acréscimo de potencial construtivo é possibilitado pela OODC, instrumento há muito utilizado. Quanto aos fatores externos, há que se considerar o contexto econômico, bem como a falta de interesse do mercado uma vez que, Curitiba ainda possui diversas outras áreas com infraestrutura mais consolidada e de interesse para o investimento imobiliário que não demandam contrapartida para que se obtenha maior aproveitamento do terreno, como por exemplo, a estrutural República Argentina e João Gualberto, ambas com infraestrutura consolidada e área disponível para adensamento. Apesar de todos os fatores, ressalta-se que as operações urbanas consorciadas são projetos de longo prazo, portanto a OUC-LV ainda é um processo recente o que pode comprometer a análise de suas transformações.

20


9. REFERÊNCIAS ACIOLY, C.; DAVIDSON, F. Densidade urbana: um instrumento de planejamento e gestão urbana. Rio de Janeiro: Mauad, 1998. Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário no Estado do Paraná (ADEMIPR). Mercado imobiliário de Curitiba registra o menor patamar de entregas em seis anos. Publicado em: 13 mai. 2016. Acesso em: http://www.ademipr.com.br/pesquisa-apartamentosnovos-curitiba-marco-2016/. Acessado em: 15 mai. 2018. ALVIM, Angélica A. T. B.; ABASCAL, Eunice H. S.; MORAES, Luís G. de; Operação Urbana Consorciada e Projeto Urbano em São Paulo: Limites e Desafios. ENANPARQ – Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo. 2011. ARRUDA CÂMARA, Jacintho; SUNDFELD, Carlos Ari. DALLARI, Adilson Abreu. FERRAZ, Sérgio. Plano Diretor. São Paulo: Malheiros. Estatuto da Cidade (comentários à lei federal 10.257/2001). 3ª Ed. Simpósio Temático: Projetos urbanos e a reinvenção do espaço-mundo na cidade contemporânea. 2010. BRASIL (Câmara dos Deputados). Estatuto da Cidade – Guia da implementação por municípios e cidadãos. Câmara dos Deputados. Brasília: Centro de Documentação e Informação. Coordenação de Publicações, 2001.

CURITIBA. Lei Municipal 13.909/2011. Aprova a Operação Urbana Consorciada Linha Verde e estabelece diretrizes urbanísticas para a área de influência da atual Linha Verde (...). Curitiba, Diário Oficial Municipal. DEMPSEY, Nicola; BROWN, Caroline; RAMAN, Shibu; PORTA, Sergio; JENKS, Mike; JONES, Colin; BRAMLEY, Glen. Elements of urban form. Oxford Brookes University. Oxford Institute for Sustainable Development,. Oxford, UK 2010 FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS (FIPE) Estudo de impacto ambiental da Operação Urbana Consorciada Linha Verde – OUC – LV. São Paulo. Janeiro de 2012. Volume I. GADENS, Letícia N. Nota técnica para o cálculo dos indicadores de análise: Indicadores para análise da variável de projeto – Compacidade. Curitiba. 2017. INSTITUTO DE PESQUISA E PLANEJAMENTO DE CURITIBA (IPPUC). Prospecto de Registro da Operação Urbana Consorciada Linha Verde, 2016. Disponível em: < http://www.ippuc.org.br/arquivos/OUC/PROSPECTO/Prospecto_%2023_05_16.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2018. JABAREEN, Yosef R. Sustainable Urban Forms – their typologies, models and concepts. Journal of Planning Education and Research. Association of Collegiate Schools of Planning. 2006 JACOBS, Jane. Morte e vida das grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 1961. LUNGO, Mario. Grandes Proyectos Urbanos: desafios para las ciudades latinoamericanas (Land Lines Article). Lincoln Institute, publicado em outubro de 2002. Disponível em: http://www.lincolninst.edu/pubs/946_Grandes-proyectos-urbanos--Desaf%C3%ADo-paralasciudades-latinoamericanas-. Acesso em: 15/01/18.

21


.________. Grandes proyectos urbanos: una vísion general. In: Lungo, mario (compilador). Grandes proyectos urbanos. San Salvador, El Salvador: UCA Editores, 2004. pp. 15-43 MALERONKA, Camila; FURTADO, Fernanda. A Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC): A experiência de São Paulo na Gestão Pública de Aproveitamentos Únicos. Lincoln Institute of Land Policy. 2013. MALERONKA, Camila. Projeto e gestão na metrópole contemporânea - Um estudo sobre as potencialidades do instrumento ‘operação urbana consorciada’ à luz da experiência paulistana. Universidade de São Paulo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. São Paulo. 2010. _____. Operações urbanas em São Paulo: rumo a uma terceira geração?. 2012. MOREIRA, Antônio Claudio Moreira Lima e; DE AMBROSIS, Clementina; NOGUEIRA FILHO, Dalmo do Valle; AZEVEDO NETTO, Domingo Theodoro de. O solo criado. Estudo sobre o uso do solo que conceitua e fornece elementos às administrações municipais para o controle e melhor aproveitamento do solo. São Paulo, CEPAM, 1975. NETO, Paulo. N.; MOREIRA, Tomás A. Operação Urbana Consorciada da Linha Verde: Limites e oportunidades à luz da gestão social da valorização da terra. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. SP. Cadernos Metrópoles, vol. 15, n. 30, julho-dezembro, 2013. Pp. 583-603. NOBRE, Eduardo A.C. Instrumentos urbanísticos operação urbana. FAUUSP – Departamento de Projeto. (sem data) PORTAS, Nuno. El surgimiento del proyecto urbano. 2003 RIO, Vincente del. Em busca do tempo perdido - O renascimento dos Centros Urbanos. Arquitextos 006. São Paulo. Texto especial 028. Nov. 2000. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp028.asp>. Acesso em: 18 fev. 2018 RUEDA, Salvador. El urbanismo ecológico. Barcelona: Agència d´Ecologia Urbana de Barcelona, s.d. SANTORO, Paula. e CYMBALISTA, Renato. (2004). Introdução à expressão “gestão social da valorização da terra. In: SANTORO, P. (org.). Gestão social da valorização da terra. São Paulo, Instituto Pólis. SILVA, Marcelle B. L. da. A recuperação de mais valias fundiárias e a Operação Urbana Linha Verde, Sessão temática 3: Produção e gestão do espaço urbana, metropolitano e regional. XVII ENANPUR. São Paulo. 2017 SOTTO, Debora. A recuperação de mais-valias urbanísticas como meio de promoção do desenvolvimento sustentável das cidades brasileiras: uma análise jurídica. Tese de Doutorado. São Paulo. PUC-SP. 2015 p. 208-221 SOUZA, N. R. de Planejamento urbano em Curitiba: saber técnico, classificação dos citadinos e partilha da cidade. 2001 Ver. Sociol. Polít., n. 16, pp. 107-122 ULTRAMARI, Clovis.; Grandes Projetos Urbanos no Brasil: conceitos, contextualização e discussão de três casos. 2006 _____Grandes projetos urbanos: conceitos e referenciais. 2007 VAINER, Carlos; OLIVEIRA, Fabricio L. de; JUNIOR, Pedro N. L. Notas metodológicas sobre a análise de grandes projetos urbanos. 2012

22


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.