O SOFRIMENTO DO SILÊNCIO…
Isabel Sousa Mar tins
Bárbara Pimentel Eva Silva Lisa A guiar Unidade de Saúde da Ilha Terceira
IDENTIFICAÇÃO Sexo | Masculino Idade | 81 anos
Etnia| Caucasiano Escolaridade | 1ºciclo Estado Civil | Casado 2 filhos Profissão | Reformado Habitação| Casa própria com boas condições Tipo de família| Alargada Vive com a esposa e um neto de 22 anos
Religião | Católica
ANTECEDENTES PESSOAIS # Hipertensão arterial Medicada | Valsartan 160 mg id Não controlada # Glaucoma com amaurose à esquerda # Diminuição da acuidade visual à direita
Seguimento em consulta de Oftalmologia
# Obstipação crónica # Ex-fumador Sem alergias medicamentosas conhecidas Sem Médico de Família
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D1
SU Anamnese
Exame objetivo
Avaliação analítica
Dor abdominal localizada nos quadrantes superiores
Abdómen volumoso, depressível, doloroso à palpação dos quadrantes direitos, com hepatomegalia
↑ ALT 129 U/L [0 – 41] ↑ LDH 534 U/L [240 – 480] ↑ FA 137 U/L [35 – 129] ↑ GGT 278 U/L [5 – 61]
Enfartamento pósprandial
Obstipação com 3 dias de evolução Sem perda ponderal ou outros sintomas acompanhantes
Ecografia abdominal “Fígado aumentado, de contornos lobulados, com múltiplas lesões sólidas correspondentes a metástases”
Internamento | Esclarecimento de metástases hepáticas
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D16
Internamento Hospitalar Radiografias da bacia e coluna lombar
Sem lesões osteolíticas ou osteoclásticas aparentes Ecografia vesical e prostática Hipertrofia prostática benigna
TC toracoabdominopélvica
Intercorrências
“Volumosa massa tecidular hilar Hipertensão arterial direita que condiciona sistólica de difícil cavalgamento do brônquio controlo principal direito, derrame pleural direito de moderado volume com atelectasia subjacente, adenopatias mediastínicas, suprarenal esquerda correspondente a depósito secundário”
“Dado o estadio avançado da doença e rápida deterioração do estado geral, e de acordo com a opinião da família, não foram realizados exames invasivos para documentar tumor primitivo”
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D16
Alta Hospitalar Neoplasia Oculta Metastizada Medicação
• Fentanilo 50µg sistema transdérmico
Recomendações após a alta “Referenciado aos Cuidados Paliativos Domiciliários”
72/72h
• Nifedipina 60mg 1cp ao jantar
• Indapamida 1,5mg 1cp ao pequeno almoço
• Perindopril 8mg 1cp ao pequeno almoço
• Metoclopramida 10mg 1 cp se naúseas ou vómitos
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários Contato com a principal cuidadora do utente Levantamento de relatórios médicos e de enfermagem Agendada Visita Domiciliária (VD) de Admissão
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D18
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários (ECP) VD de Admissão Motivo Neoplasia Oculta Metastizada
Subjetivo Sem queixas Autónomo nas atividades de vida diária Apoio diário e muito próximo dos filhos, netos e vizinhos Filha é a principal cuidadora
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D18
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários (ECP)
Objetivo
Pele e mucosas hidratadas e descoradas
Sentado na cama
Sem sinais de dificuldade respiratória
Vestuário e postura adequadas
Auscultação Pulmonar | murmúrio vesicular diminuído no hemitórax direito e crepitações na base esquerda
Consciente, colaborante e orientado Conversa pouco Deambula de forma autónoma no domicílio
Abdómen globoso, mole e depressível, doloroso à palpação do quadrante superior direito e hepatomegalia Membros inferiores sem edemas
Utente e esposa desconhecem diagnóstico e seu prognóstico
CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D18
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários Comportamento da principal cuidadora perante a doença do utente Ocultação do diagnóstico e prognóstico ao doente e esposa Responde pelo doente Incentivo a falsas esperanças “Não tarda o pai vai estar a pescar outra vez” Infantilização do doente impedindo a manutenção da autonomia do doente
Principal cuidadora Sexo feminino 53 anos Filha do doente 6ºano de escolaridade Viúva 2 filhos Principal cuidadora do marido que faleceu precocemente com uma neoplasia cerebral
“É melhor não saberem porque vão desanimar.”
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D18
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários
Avaliação
Plano
CARCINOMATOSE (LOCALIZAÇÃO PRIMÁRIA DESCONHECIDA) NE (A79)
Controlo sintomático • Lactulose xarope
CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO
Quebra da conspiração do silêncio Intervenção individual Intervenção familiar
1 a 2 colheres de sopa/dia
Preparação para a morte
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D24
D27
D31
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários VDs Enfermagem
Conflitos familiares Sofrimento dos intervenientes
Reunião Multidisciplinar
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D32
Equipa de Cuidados Paliativos Domiciliários Consulta com a principal cuidadora Utente foi convocada pela Médica da ECP
Subjetivo Preocupação com estado clínico do pai “Sinto que o meu pai está mais abatido”
Confessa já ter tido conversa com a mãe explicando que “a situação do pai é grave e não vai melhorar” Dificuldade em dormir que agravou com a suspensão de medicação ansiolítica por medo de não acordar durante a noite no caso do pai pedir ajuda
Objetivo Labilidade emocional ao falar do pai
Avaliação PROBLEMA POR DOENÇA DE FAMILIAR (Z22)
Plano Reforçada a importância de não alimentar a esperança dos pais, dado o prognóstico reservado do doente Incentivo à manutenção da autonomia parcial do doente
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D37
SU Motivo de Referenciação Agravamento do quadro clínico com dispneia e dor abdominal intensa de difícil controlo em ambulatório Dificuldade da família em lidar com a morte no domicílio
MORTE
HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL D88
Luto Acompanhamento no luto VD Enfermagem Viúva “Em casa, acompanhada por uma vizinha. Emocionada/chorosa, ao receber-me, por relembrar situação final do marido. Agradece o apoio prestado, discurso coerente. Sem alterações anormais do mesmo ou do comportamento.”
OBRIGADA PELA ATENÇÃO
Isabel Sousa Martins | Bárbara Pimentel |Eva Silva | Lisa Aguiar Unidade de Saúde da Ilha Terceira
PARA PENSAR… Porque é que ainda existem casos de conspiração do silêncio? Qual a minha responsabilidade em casos como este? Já contribui para uma conspiração do silêncio? Como me sinto em relação a isso? Posso mudar alguma coisa na minha prática clínica para o evitar? Como proceder para quebrar uma conspiração do silêncio? E quando não há tempo para isso... Como proceder?