Relato de caso multiplas vertentes da dor update2106 veva

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As múltiplas vertentes da dor Marlene Areias| Eva Silva | Lisa Aguiar 4º ano de internato de MGF na Unidade de Saúde da Ilha Terceira

Enquadramento

A dor crónica é um dos principais motivos de consulta em Cuidados de Saúde Primários, facto que está de acordo com a elevada prevalência na população portuguesa. Contudo, a sua importância não está limitada à queixa em si, pois tem um grande impacto na qualidade de vida dos utentes, pelo sofrimento psicológico, isolamento social e incapacidade funcional que provoca. Além disso, é um importante fator causador e de agravamento de outras patologias. Nesse contexto, a dor deixa de ser um sintoma para se tornar numa doença por si só, merecendo uma abordagem diferenciada e multidimensional.

Descrição do caso

• Mulher, 53 anos, caucasiana, divorciada com 4 filhas, empregada doméstica. • Problemas: Lombalgia crónica de causa degenerativa, perturbação depressiva recorrente e problemas socioeconómicos. 1ª consulta

2ª consulta (4 semanas)

S

Traz resultado Tomografia Computorizada (TC) da coluna, por agravamento gradual da lombalgia. • Lombalgia de ritmo misto, sem irradiação e com 4 anos de evolução. Sem melhoria com o esquema terapêutico da consulta da Dor (tramadol e pregabalina). Já fez outros fármacos (paracetamol, hidromorfona e morfina) mas que abandonou por ineficácia ou efeitos secundários. Refere ansiedade, irritabilidade fácil e insónia inicial, decorrentes da dor e da limitação funcional secundária. Não consegue realizar a sua actividade profissional.

O

• Escala numérica da dor (END) : 8 / 10 • Aspeto pouco cuidado, fácies triste, humor deprimido, labilidade emocional e anedonia. • Sem pensamentos de morte estruturados. • END: 6 / 10 • Aparelho musculoesquelético: dor e rigidez à palpação dos • Melhoria do humor e da músculos paravertebrais bilateralmente. labilidade emocional. • TC coluna Lombar: “Lesões degenerativas graves a nível L2L5. Prolapso discal L2-L3. Canal estenótico ósseo em L4-L 5 com aperto do recesso esquerdo podendo haver estiramento radicular e moldagem da cauda equina.”

Consulta de reavaliação. Refere melhoria das queixas álgicas. Sente melhoria da irritabilidade, mais bem disposta. Mantém insónia.

A

• Perturbação depressiva (P76) • Perturbação do sono (P06) • Síndrome da coluna sem irradiação de dor (L84)

• Perturbação depressiva (P76) • Perturbação do sono (P06) • Síndrome da coluna sem irradiação de dor (L84)

P

Suspende tramadol. Inicia tapentadol 25 mg titulado até 50mg bid. Aumenta pregabalina para 150 mg bid. Inicia fluoxetina 20 mg id.

Aumenta tapentadol para 100 mg bid. Inicia mirtazapina 15 mg id. Mantém restante terapêutica. Referenciação à Psicologia.

Discussão

3ª consulta (2 meses)

Consulta de reavaliação. Dor controlada, apenas com agudizações esporádicas. Sente-se mais animada, regularização do sono, com capacidade para desempenho das atividades de vida diária.

• END: 1-2 / 10 • Aspecto cuidado, humor eutímico.

• Perturbação depressiva (P76) • Síndrome da coluna sem irradiação de dor (L84) Mantém esquema terapêutico. Aguarda consulta de Psicologia. Reavaliação em 6 meses.

Este caso retrata a importância da abordagem holística da multidimensionalidade da dor. A utente apresentava, além da sua patologia orgânica de base, vários fatores que influenciavam a vivência da dor, que poderão tornarse um desafio terapêutico. Por um lado, o bem-estar psicológico da doente foi negativamente afetado pela dor, exacerbando os sintomas depressivos e, por outro lado, estes alteraram o limiar sensitivo da dor. A par da terapêutica da dor, a abordagem farmacológica da perturbação depressiva, assim como a psicoterapia foram elementos essenciais para o sucesso terapêutico. O médico de família tem uma posição privilegiada na prestação de cuidados à pessoa como um ser biopsicossocial, entendo-o como um todo, permitindo o estabelecimento de uma relação empática e de confiança que são essenciais no sucesso terapêutico

Bibliografia:


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