Map.Part.PESCA.BABITONGA

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MAPEAMENTO PARTICIPATIVO DOS RECURSOS PESQUEIROS NA ÁREA DE INFLUÊNCIA DO TERMINAL MARÍTIMO MAR AZUL -­‐ PORÇÃO SUL DO EIXO CENTRAL DA BAÍA BABITONGA – Versão Atualizada – Pescadores Participantes da Oficina de Mapeamento Participativo Sr. João Érico Sr. Pedro Paulo Sr. José Sr. Paulo Pesquisadores Facilitadores Fabiano Grecco de Carvalho – Biólogo CRBio-­‐ 63389/03-­‐D ECOMAR; Rede Meros do Brasil Leopoldo Cavaleri Gerhardinger – Oceanógrafo Msc. ECOMAR; Observatório do Litoral Catarinense; Rede Meros do Brasil Mirella Cursino – Bióloga Rede Meros do Brasil Thiago Zagonel Serafini – Oceanógrafo Msc. Universidade Federal do Paraná – doutorando do Programa de Pós Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Instituições apoiadoras ECOMAR – Associação de Estudos Costeiros e Marinhos AMECA – Associação Ecológica Amigos de Carijós Observatório do Litoral Catarinense Rede Meros do Brasil de Pesquisa e Conservação INTRODUÇÃO A Baía da Babitonga está localizada no litoral Norte de Santa Catarina e representa o mais expressivo manguezal na costa sul brasileira, com cerca de 6200ha. Sua lâmina dágua abrange 130km² de (IBAMA, 2007; RODRIGUES et al., 1998). Entre os diversos serviços ambientais prestados por esse ecossistema (ex. proteção da linha de costa e estabilização de manguezais), podemos destacar sua função como área de reprodução e berçário para espécies marinhas de peixes, moluscos e crustáceos importantes para pescarias industriais e artesanais (CEPSUL, 2010) e outras ameaçadas de extição (GERHARDINGER, 2006; IBAMA, 2007; FABIANO, 2009). Em 2007 o Ministério do Meio Ambiente -­‐ MMA, através do programa de Áreas Prioritárias para a Conservação, Utilização Sustentável e Repartição da Biodiversidade Brasileira, classificou a Baía Babitonga como área de Extremamente Alta importância biológica com prioridade de ações para conservação também Extremamente Alta (IBAMA, 2007). Os recursos pesqueiros disponíveis na Baía da Babitonga são diversificados e constituem a base da atividade pesqueira de subsistência e artesanal de pequena escala dos 6 municípios que estão em seu


entorno (RODRIGUES, 2000). RODRIGUES et al. (1998) reporta a existência de 33 comunidades pesqueiras no entorno da baía, 22 delas localizadas em São Francisco do Sul. A ausência de gestão participativa dos recursos pesqueiros na localidade implica na existência de inúmeros conflitos (eg. schork, 2010; Borgonha, 2005). Contudo, FABIANO (2009) descreve a existência de uma ampla rede de relações comerciais relacionadas à atividade pesqueira na baía. O pescado oriundo da Baía Babitonga abastece centros urbanos da região e também é distribuído para restaurantes e peixarias locais, estimulando o setor turístico. Apesar da importância socioecológica de destaque (reconhecida pelo MMA), e da existência de 2 portos (São Francisco do Sul e Itapoá) em operação na proção mais próxima à foz da baía, existem atualmente outros portos em processo de licenciamento ambiental junto ao IBAMA. Dentre estas propostas, este documento concentra-­‐se na análise dos possíveis impactos advindos da instalação do Terminal Marítimo MarAzul. Vale ressaltar que este empreendimento possui uma alternativa locacional, e que a empresa Arcelor Mittal possuia um acordo condicionante de sua instalação onde se comprometeu a utilizar a estrutura do Porto de São Francisco do Sul para o transporte de seus produtos. Em particular, revelamos a limitação do Estudo de Impacto Ambiental no que se refere ao dimensionamento dos impactos diretos e indiretos à pesca artesanal, ao trazer à tona algumas informações sobre as áreas de pesca e ocorrência de alguns recursos pesqueiros. Ressalta-­‐se que este documento é complementar aos outros relatórios técnicos independentes protocolados recentemente (Anexo 1) junto ao IBAMA e Ministério Público Estadual e Federal. MÉTODOS Os resultados aqui apresentados foram organizados a partir da demanda de pescadores artesanais que vivem e sobrevivem dos recursos pesqueiros presentes nas proximidades da área onde o Terminal Portuário Mar Azul está sendo proposto. O conteúdo e delineamento dos polígonos em cada mapa seguiram as indicações de 4 pescadores participantes de uma oficina de mapeamento participativo do Conhecimento Ecológico Local (CEL). O CEL constitui-­‐se de um “corpo” e um “sistema” de compreensões e saber-­‐fazer que surge através do tempo, a partir de uma variedade de experiências e observações individuais e compartilhadas, mediadas pela cultura, considerando fatores ambientais, atributos comportamentais e dinâmica ecológica (DAVIS & WAGNER, 2003). O uso do CEL por cientistas representa uma importante área das investigações em ecologia (BROOK & MCLACHLAN, 2008), e vem gradativamente sendo reconhecido em estudos de ictiologia, gestão pesqueira e conservação da biodiversidade marinha, sendo também um importante componente de abordagens de gestão compartilhada (GERHARDINGER et al., 2009; ALCORN, 2000a; ALCORN, 2000b;). Por sistematizarem de forma rápida, clara e simples a paisagem marinha, a elaboração de mapas temáticos por métodos etnográficos apresenta-­‐se como uma ferramenta poderosa para a co-­‐gestão de recursos naturais e para a integração entre conhecimento científico e local. A realização de mapeamentos da paisagem marinha de maneira participativa é também uma importante ferramenta de envolvimento dos atores locais em processos de tomada-­‐de-­‐decisão e consequente empoderamento das comunidades em processos nos quais são afetadas diretamente (GERHARDINGER et al., 2010). Respondendo à demanda local de pescadores, o relatório aqui apresentado teve como objetivo mapear áreas de pesca na Baía da Babitonga, com ênfase na porção Sul de seu setor principal, que compreende as localidades de Laranjeiras, Praia do Lixo, Paum e Morretes. As atividades se iniciaram com a articulação junto às instituições de pesquisa participantes desta iniciativa e pescadores locais para a


definição do local, número de participantes e data para a realização da oficina. Uma vez contatados os pescadores, o passo seguinte foi a articulação da equipe técnica, composta por dois mediadores e dois anotadores. A oficina foi realizada no dia 14 de abril de 2011 na praia do Lixo, com quatro pescadores de três diferentes localidades (Paum (n=1), Praia do Lixo (n=2) e Laranjeiras (n=1)), e teve como objetivo mapear áreas de uso da Baía Babitonga por pescadores artesanais, bem como épocas e importância de alguns dos recursos capturados (Figura 1). Para tanto, foram posicionadas transparências sobre uma carta náutica (Figura 2) e com marcadores coloridos apontados os diferentes pesqueiros com o máximo de precisão possível. As informações foram posteriormente digitalizadas em mapas temáticos. Este é um relatório preliminar, e espera-­‐se que as informações compiladas sejam inseridas em um Sistema de Informações Geográficas (SIG), possibilitando análises mais elaboradas que poderão vir a ser úteis para processos de gestão na região.

a)

b)

Figura 1: Construção do mapeamento: pescadores locais, e equipe técnica.

Figura 2: Carta náutica n° 1805 utilizada como base para o mapeamento participativo.


RESULTADOS Os participantes da oficina foram pescadores com no mímimo 20 anos de experiência na atividade, alguns dos quais, considerados ‘especialistas’ por um amplo processo de seleção de informantes especialistas realizado na região, pela Rede Meros do Brasil, em 2008. Além das informações demarcadas sobre a carta náutica foram realizadas anotações complementares pela equipe técnica bem como o registro áudiovisual de todo o processo construtivo. Ficou claro que os pescadores da região utilizam diferentes artes de pesca, com alvo em diferentes espécies, de acordo com a sazonalidade de ocorrência das mesmas. Apresentamos neste documento informações oriundas de pescadores residentes na região do entorno direto do TMMA. Porém, ressalta-­‐se que os pesqueiros identificados são também largamente utilizados por pescadores de várias regiões do entorno da Baía Babitonga. A atividade possibilitou a elaboração de sete mapas temáticos iniciais que identificam áreas de uso da Baía da Babitonga para pescarias de camarões com o uso de gerival (Figura 3) e rede de caceio malha 5 (Figura 4), áreas de pescaria de peixes com uso de espinhel e rede fundeada (Figura 5) e rede de caceio (Figura 6), locais de coleta de berbigão (Anomalocardia brasiliana – Figura 7), áreas de captura de linguados (Famílias Achiridae e Paralichthyidae -­‐ Figura 9) além de mapear rotas de migração (gargalo migratório) de peixes na baía e pontos de desova (Figura 10). A ocorrência destas modalidades de pescarias foram descritas no EIA do TMMA, porém, não foram espacializadas. Além do mais, os impactos sobre a atividade da pesca artesanal não foram analisados integrando os efeitos da limitação da área de navegação sobre e o afugentamento de peixes causado pela emissão de ruidos. Também não é considerado o impacto da restrição da navegação de pequenas embarcações/pesca artesanal na bacia de evolução e área de atracamento das barcaças. O EIA não apresenta o dimensionamento das áreas de exclusão de pesca/navegação que a instalação e operação do TMMA (trapiche e áreas de manobra) irá causar. Existe apenas a informação de o dimensionamento dos pesqueiros afetados foi feito em conjunto com a Colônia de Pesca Z-­‐2. Se este documento existe não foi amplamente divulgado e portanto, é desconhecido pela grande maioria dos pescadores. 1. Pesca de camarrões com Gerival O gerival é um petrecho utilizado para a captura do camarão-­‐branco (Litopenaeus schimitti). Essa modalidade de pescaria é realizada em locais com profundidades geralmente não superiores a 5m. A maior parte das capturas correspondem à indivíduos adultos de L. schimitti, porém, juvenis de camarão-­‐rosa (Farfantepenaeus spp.), denominado localmente como camarão-­‐ferrinho, também são capturados em menores quantidades. Com excessão do período de defeso (que vai de outubro a janeiro – Portaria IBAMA nº70/2003), a pescaria é realizada durante todo o ano, com maior intensidade nos meses de fevereiro, abril e março. Na oficina, depois de demarcados os pesqueiros desta modalidade, para cada um deles foi estimado um valor de importância (numa escala de 1 -­‐ pior nota a 5 -­‐ melhor nota) de acordo com seu rendimento em capturas (Figura 3). Ao comparar as estimativas de importância apresentadas aqui com os resultados parciais do projeto “Levantamento e avaliação das populações de Litopenaeus schimitti, Farfantepenaeus paulensis, F. brasiliensis e Xiphopenaeus kroyeri na Baía da Babitonga (SC) e plataforma adjacente”, realizado pelo Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Sudeste e Sul -­‐ CEPSUL em parceria com a Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE (SANTOS, dados não publicados -­‐ ANEXO 2), percebe-­‐se uma


sobreposição dos locais com maior captura do camarão-­‐branco (maior CPUE) com os considerados mais importantes pelos pescadores. A Figura 3 apresenta uma área de exclusão de pesca de 500m no entorno do píer proposto para o TMMA, que se sobrepõe sobre áreas consideradas as mais importantes para a pescaria de gerival, ou seja, principais pesqueiros. É importante ressaltar que a pescaria de gerival é realizada nestes pesqueiros por pescadores de diversas localidades, não apenas os da área de influência direta do empreendimento. Informações coletadas na oficina, bem como outras apresentadas no EIA, relatam o desenvolvimento da pescaria do gerival por dezenas de embarcações diariamente nos meses de maior intensidade. Diversos autores vêm reportando os conflitos existentes na pesca de gerival (BORGONHA, 2005; FABIANO, 2009) e a instalação do TMMA certamente ampliará de maneira significativa estes conflitos, reduzindo a área geral de pesca e aumentando da pressão de pesca em áreas adjascentes.

Figura 3: Os polígonos alaranjados indicam a localização dos principais pesqueiros utilizados para a captura de camarões com o uso de gerival. A numeração indicada sobre os polígonos representa uma estimativa de importância de cada localidade para essa modalidade de pesca, sendo 5 a melhor nota e 1 a pior.

2 . Pesca de Camarão-­‐Branco com Rede-­‐de-­‐Caceio A captura do camarão-­‐branco (Litopenaeus schimitti) com o uso de rede de caceio (malha 5cm) ocorre durante todo o ano. Porém, maior intensidade deste tipo de pescaria é observada nos meses de maio a setembro. A pesca de camarão com rede-­‐de-­‐caceio ocorre da localidade conhecida como Paum até as proximidades da Ilha do Mel, na porção mais interna da baía (Figura 4). Ficou evidente no mapeamento a sobreposição do píer proposto para o TMMA sobre as áreas onde se desenvolve esta arte de pesca, uma das mais rentáveis. Partindo


de um ponto de referência de 20 anos atrás, os pescadores identificam a diminuição da captura de camarões. Atualmente a captura de 10-­‐12kg/dia é considerada uma boa pescaria, enquanto que a 20 anos atrás a referência para uma boa era de 25-­‐30kg/dia. Essa redução pode se intensificar com a sobreposição de áreas de pesca que ocorrerão caso o píer do TMMA venha a ser instalado, com isso, restringindo uma grande área de pesca e aumentando a pressão de pesca em áreas adjascentes. Como o camarão-­‐branco é um dos recursos explorados na baía que possui maior valor econômico, a redução das capturas pode refletir-­‐ se num significativo impacto negativo na sócio-­‐economia da região.

Figura 4: Os polígonos azuis representam os principais locais utilizados para a pescaria de camarão-­‐branco com o uso de redes de caceio (malha 5).

3. Pesca de Espinhel e Rede-­‐Palanqueada A pescaria de espinhel é realizada nas proximidades de ambientes recifais no interior da Baía da Babitonga durante o ano todo (Figura 5), sendo direcionada a diferentes espécies, dependendo da época do ano e da ísca e tamanho dos anzóis utilizados. Esta pescaria é considerada uma das mais tradicionais e antigas pescarias praticadas na Baía da Babitonga (GERHARDINGER et al., 2009). Os principais recursos alvo desta arte de pesca são a garoupa-­‐verdadeira (Epinephelus marginatus), a caranha (Lutjanus cyanopterus), a miraguaia (Pogonias cromis), o bagre-­‐branco (Genidens barbus) e a pescada-­‐amarela (Cynocion acoupa). As mesmas áreas utilizadas na pescaria de espinhél são também utilizadas para pescaria com redes palanqueadas. Nesta pescaria as redes são dispostas verticalmente na coluna dágua e fixas por âncoras podem operar com malhas de diferentes medidas. As principais espécies alvo desta modalidade de pescaria são os robalos (Centropomus spp.), o parú (Chaeptodipterus faber), a corvina (Micropogonias furnieri) e também a miraguaia (P. cromis) e a pescada amarela (C. acoupa). Pode-­‐se observar que existe grande sobreposição da área de navegação restrita com os pesqueiros mais utilizados por pescadores não só da área


de influência direta do TMMA. Caso instalado, o terminal portuário irá praticamente inviabilizar grande parte dos pesqueiros destinados a este tipo de pescaria.

Figura 5: Os polígonos azuis representam os principais locais utilizados para a pescaria com espinhel e redes palanqueadas.

4. Pesca de Peixes com Rede-­‐de-­‐Caceio A pescaria com redes de caceio é relativamente recente na Baía Babitonga, utilizada a menos de 20 anos. Existem dois tipos de pescaria de peixes com rede de caceio, o caceio-­‐de-­‐fundo e o caceio-­‐boiado. A primeira ocorre desde a localidade ‘Morrete’ até as proximidades do Porto de São Francisco do Sul e é realizada (principalmente entre os meses de agosto a outubro) em profundidades que variam de 5 a 12m (Figura 6). A principal espécie alvo desta pescaria é a miraguaia (Pogonias cromis), que é capturada com malhas que variam entre 27 e 30cm. Já a pescaria com rede de caceio-­‐boiado é realizada na mesma região em que o caceio-­‐de-­‐fundo, porém em profundidades menores e tendo como alvo outras espécies de peixes: sororoca (Scomberomorus spp.), gaivira (Oligoplites sp.), robalos (Centropomus spp.) e o bagre-­‐branco (Genidens barbus), dependendo da época do ano. Pode-­‐se observar na Figura 6 que a área de exclusão de pesca em que implicaria a instalação do píer do TMMA afetaria também estas modalidades de pesca que tem importante papel sócioeconômico.


Figura 6: O polígono vermelho representa a área utilizada para a pescarias com redes de caceio-­‐boiada e redes de caceio-­‐de-­‐fundo.

5. Coleta de Berbigão Outro recurso importante cujo uso foi mapeado é o berbigão (Anomalocardia brasiliana). A manutenção das populações deste molusco, assim como o consumo humano da espécie, dependem diretamente da boa qualidade da água, por este ser um organismo filtrador. A coleta dos berbigões é realizada durante o ano todo, por pescadores e pescadoras (Figura 7), sendo uma das principais áreas a foz do rio Olaria e as imediações das ilhas Araújo (Figura 8), devido a estas regiões apresentarem águas com boa qualidade. Tendo como referência um período de 20 anos, os pescadores afirmaram que as áreas próximas ao porto de São Francisco do Sul eram igualmente importantes às demarcadas na Figura 8. Porém, atividades antrópicas como o funcionamento do Porto e o aporte de esgotos, reduziram drásticamente a quantidade dos moluscos na região. Atualmente coletores de diversas comunidades se deslocam para a área de influência direta do TMMA para retirada do molusco, que desapareceu ou teve suas populações acentuadamente reduzidas em outras localidades. Vale ressaltar a importância deste tipo de pescaria no envolvimento da mão-­‐de-­‐obra feminina no setor pesqueiro, fato também não considerado no EIA.


a)

b)

Figura 7: Coletores de berbigão na localidade da praia do Lixo. Registros realizados no mês de abril / 2011. Fotografias: a) Thiago Zagonel b) Ana Paula Cortez.

Figura 8: O polígono vermelho indica áreas de maior abundância de berbigão nas regiões da praia do Lixo e Laranjeiras.

6. Pesca de Linguado Áreas importantes para a captura de linguados (Famílias Achiridae e Paralichthyidae) também foram apontadas pelos pescadores participantes da oficina. Estas áreas caracterizam-­‐se por serem rasas, com fundo lamoso e desprovido de estruturas rochosas. Na Figura 9 pode-­‐se observar a sobreposição de áreas importantes para esta modalidade de pesca (realizada entre os meses de junho e agosto) com a área proposta para a implementação do TMMA.


Figura 9: O polígono amarelo indica áreas de captura de linguados com rede de fundo.

7. Gargalo migratório A emissão de ruídos nas fases de implantação e operação do TMMA, além dos impactos sobre a atividade pesqueira de pequena escala pode também interferir em processos migratórios de peixes para áreas internas da Baía da Babitonga. O EIA classifica como ‘temporário’ o impacto da emissão de ruidos na fase de operação do TMMA. Porém, é impossível dissociar a emissão de ruídos da operação do empreendimento, e portanto, esse impacto deveria ser considerado permanente. Os ruídos sub-­‐aquáticos podem afetar a comunidade de peixes de diferentes maneiras, seja na relação predador-­‐presa ou dificultando processos de comunicação acústica, que podem reduzir o sucesso reprodutivo de algumas espécies (SLABBEKOORN et al., 2010). Espécies da família Sciaenidae como a miraguaia (Pogonias cromis) e a pescada-­‐amarela (Cynocion acoupa) produzem sons característicos, que além de sua função bioecológica, são também utilizados como referência para localização de cardumes por pescadores artesanais. A miraguaia (P. cromis) é uma espécie de relevante importância sócioeconômica e existem evidências de que desovam no interior da Baía da Babitonga. As áreas em vermelho apontadas na Figura 10, segundo os participantes da oficina, representam áreas de desova desta espécie. A hipótese de essas áreas servirem também para o recrutamento da referida espécie suporta-­‐se no relato de capturas de indivíduos juvenis, denominados localmente de ‘curuca’ (indivíduos até 2kg) e ‘burriquete’ (indivíduos de 2 a 7kg) . Esta espécie, assim como a pescada-­‐amarela, utiliza o canal principal para alcançar as regiões internas da Baía da Babitonga para desova (Figura 10). Desta maneira, este canal pode ser considerado um gargalo migratório, que para diversos autores constituem-­‐se em áreas críticas para a conservação da biodiversidade marinha (NORSE & CROWDER, 2005).


A rota utilizada por estas espécies se sobrepõe à área proposta para a implantação do TMMA, empreendimento cuja operação pode impactar negativamente populações destes importantes recursos pesqueiros.

Figura 10: As setas verdes indicam a rota de entrada de peixes para o interior da Baía da Babitonga. Os polígonos vermehos indicam áreas rasas, onde ocorre a desova de espécies como a miraguaia (P. cromis) e a pescada-­‐ amarela (C. acoupa).


CONCLUSÕES -­‐ A caracterização da atividade pesqueira no EIA foi realizada por questionários aplicados com pescadores que residem na área de influência direta do empreendimento. Contudo, é importante registrar que as áreas que serão afetadas caso o empreendimento se instale são utilizadas por muitos pescadores de outras localidades. Este fator confere grande complexidade ao sistema pesqueiro da Baía da Babitonga, e não foi considerado no EIA. -­‐ Planejada para a porção interior da Baía da Babitonga, instalação deste empreendimento levaria cerca de 1,3km ao seu interior problemas ambientais já existentes nos portos operantes. Adicionado a isso, a operação do empreendimento intensificará conflitos existentes no sistema pesqueiro artesanal da região; -­‐ A instalação e operação do TMMA trará impactos negativos diretos sobre uma área de gargalo migratório de recursos pesqueiros extremamente importantes para pesca artesanal realizada por comunidades de dentro e de fora da Baía da Babitonga. Portanto, essa questão deve ser considerada de extrema importância ecológica e socioeconômica, e não foi tratada com a mínima propriedade no EIA; -­‐ A instalação e operação do TMMA produzirá uma diversidade de ruidos que podem prejudicar individualmente ou em escala populacional diversas espécies de peixes. Citamos aqui o caso da miraguaia (Pogonias cromis) e da pescada-­‐amarela (Cynocion acoupa), cujos seus sons específicos tem importantes funções biológicas além de servirem de instrumento para localização de cardumes por pescadores artesanais. -­‐ Grande parte dos pescadores artesanais que serão impactados não conhecem suficientemente a proposta de licenciamento nem o dimensionamento dos impactos do empreendimento. Portanto não possuem um adequado conhecimento sobre a obra de instalação e a operação do TMMA; -­‐ Se instalado, o TMMA trará impactos negativos diretos pela sobreposição de sua área de exclusão de pesca/navegação com pesqueiros importantes para pescadores artesanais de São Francisco do Sul. As existência destas áreas de exclusão de pesca/navegação intensificarão a pressão de pesca em áreas adjascentes, que serão também refletidas em perdas sócioeconômicas. -­‐ A instalação/operação do TMMA trará significativos impactos negativos sobre as pescarias realizadas em sua área de influência direta. Serão afetadas pescarias realizadas com gerival e rede de caceio para camarões, rede de caceio para peixes de diversas espécies, pescarias de espinhel e redes palanqueadas e também a coleta de berbigões. -­‐ O píer proposto para o TMMA passará no meio de áreas de pesca importantes, fazendo com que os pescadores da região necessitem de maior tempo de navegação para desviar do terminal e alcançar seus pesqueiros remanescentes, o que implicará em maior tempo e combustível gasto pelos mesmos.


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SCHORK, G.; MOTTOLA, L.S.; HOSTIM-­‐SILVA, M. 2010. Diagnóstico da pesca amadora embarcada na região de São Francisco do Sul (SC). Revista CEPSUL – Biodiversidade e Conservaçã Marinha, V. 1, 8-­‐17p.


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