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Programa Mulher e Ciência: por mais pluralidade e excelência
Betina Stefanello Lima Analista de ciência e tecnologia do CNPq. Doutora em Ciências Sociais pela Unicamp
Maria Lucia de Santana Braga Analista em C&T no CNPq. Doutora em Sociologia pela UnB
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Leonara de Oliveira Rocha Analista em C&T no CNPq. Mestre em Desenvolvimento Sustentável
Ao longo dos anos, o ambiente da ciência se estabeleceu com o predomínio de cientistas homens. A presença feminina se impôs pelos talentos e esforços de incríveis cientistas mulheres, que vêm conquistando espaço. No entanto, ainda é um desafio para a representatividade das mulheres alcançar postos de prestígio no sistema científico e em todas as áreas do conhecimento, não somente no Brasil. A equidade de gênero na ciência e tecnologia é um problema estrutural, que só pode ser enfrentado com políticas públicas contínuas e adequadas.
O "Programa Mulher e Ciência" é uma iniciativa pioneira no âmbito do governo federal para fomentar a equidade de gênero na ciência e tecnologia. O programa foi implementado em 2005 a partir da articulação da antiga Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM). Esta ação foi organizada em diálogo com a comunidade científica e formatada em um grupo interministerial, do qual o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) era integrante.
Os dois principais objetivos do programa são promover a participação das mulheres no campo das ciências e carreiras acadêmicas e estimular a produção científica e a reflexão acerca das relações de gênero, mulheres e feminismos no país. Estes objetivos são interrelacionados, uma vez que as pesquisas sobre os temas propostos são fundamentais para o combate à desigualdade de gênero, tanto na ciência quanto na sociedade em seu sentido mais amplo.
As primeiras ações do programa incluíram a implementação de chamadas específicas para o fomento de pesquisas sobre os temas supracitados, o lançamento do prêmio anual “Construindo a Igualdade de Gênero” e a realização de encontros intitulados “Pensando Gênero e Ciência”. Ambas as ações, infelizmente, estão suspensas atualmente.
A inserção da perspectiva de gênero na pesquisa científica tem sido uma das iniciativas indicadas para impulsionar a produção do conhecimento de forma plural. O fomento de chamadas específicas sobre gênero impulsionou a pesquisa sobre este tema em diversas áreas do conhecimento: saúde, meio ambiente, violência, dentre outros. Durante os anos de atividade do programa foram implementadas quatro chamadas, tendo sido apoiados 659 projetos de pesquisa, envolvendo um valor aproximado de R$ 21 milhões.
O prêmio “Construindo a Igualdade de Gênero” era voltado para estudantes de ensino médio, da graduação e da pós-graduação. No âmbito do prêmio, concorriam e eram selecionados trabalhos científicos e práticas pedagógicas sobre
igualdade de gênero. Estes trabalhos eram publicados em uma revista específica e os estudantes eram agraciados, como parte da premiação, com bolsas de formação (iniciação científica, mestrado, doutorado), conforme sua etapa acadêmica. O prêmio contribuiu tanto para a formação de pesquisadores no campo de gênero quanto para dar visibilidade a trabalhos inovadores, de qualidade, sobre a temática. Ao todo foram dez edições, com cerca de 29 mil estudantes inscritos.
Foram realizados dois encontros “Pensando Gênero e Ciências”, em 2006 e 2008, com integrantes dos núcleos de gênero das universidades. Com a participação de pesquisadoras renomadas, os encontros promoveram a reflexão sobre o campo de gênero e sobre a promoção da equidade de gênero na ciência e tecnologia. Os eventos produziram recomendações para a consecução dos objetivos do programa, como a implementação da prorrogação de bolsas em função da maternidade.
Em 2013 e 2018 foram lançadas as Chamadas “Meninas e Jovens Fazendo Ciências Exatas, Engenharias e Computação”, visando incentivar o ingresso e a permanência de jovens nas carreiras nestas áreas. Foram aprovados cerca de 444 projetos ao todo, envolvendo o montante aproximado de R$19 milhões. Estas ações impulsionaram a discussão local sobre equidade de gênero e permitiram a aproximação das participantes com o ambiente de pesquisa e universitário, incentivando-as a buscar o ingresso na graduação.
Destacamos as ações de divulgação científica com enfoque em gênero, como a iniciativa "Pioneiras da Ciência", que contribui para a visibilidade de histórias de mulheres na ciência, bem como para a construção de um imaginário social em que as palavras “mulher” e “cientista" convivam em harmonia numa mesma frase. Conheça todas as pesquisadoras já homenageadas.1
1 https://www.gov.br/cnpq/pt-br/acesso-a-informacao/ acoes-e-programas/programas/mulher-e-ciencia/ pioneiras-da-ciencia-1
Também é importante lembrar as diversas ações em benefício da carreira científica das mulheres, como a possibilidade de prorrogação da bolsa e a inserção da licença maternidade no Currículo Lattes. Desse modo, foi reconhecido o impacto da maternidade na permanência e ascensão de mulheres no sistema científico.
O "Programa Mulher e Ciência" visibilizou e tornou possível a ampliação do debate de gênero na ciência e tecnologia, tornando-se um vetor de ações para o fomento da equidade de gênero dentro do CNPq. Além disso, teve um efeito multiplicador em toda a rede de atores do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia.
Os obstáculos à equidade de gênero na ciência e tecnologia são multifatoriais. Para enfrentá-los, precisamos de uma política robusta e multifacetada, que inclua não só ações para inclusão das mulheres na ciência como a própria transformação da ciência, como processo e como produto. É preciso impulsionar a transformação das instituições, de modo a viabilizar a atuação e a progressão de mulheres nas carreiras científicas, revendo assim o padrão androcêntrico da cultura científica. Também é necessário fomentar a produção de um conhecimento plural que inclua a perspectiva de gênero em suas interseccionalidades com outros temas, como raça, etnia e classe.
Ao longo dos 16 anos do programa, ainda não alcançamos a tão almejada equidade de gênero na ciência e tecnologia, mas avançamos em reconhecer este desafio e implementar ações que contribuíram e contribuem para uma ciência mais plural. Conheça mais sobre o Programa em https:// www.gov.br/cnpq/pt-br/acesso-a-informacao/ acoes-e-programas/programas/mulher-e-ciencia/mulher-e-ciencia.