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Pensando o novo Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador
Alexandre Guilherme MottaSarmento Analista em C & T do CNPq. Professor colaborador do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
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Diones dos Santos Lima Vice-presidente executivo da Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro
Linnyer Beatrys Ruiz Aylon Assessora da Pró-reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Presidente da Sociedade Brasileira de Microeletrônica (SBMicro). Bolsista de Produtividade em Pesquisa 1D do CNPq Em junho de 2021 foi promulgada a Lei Complementar nº 182/20211 que, formalmente, institui o Marco Legal das startups e do empreendedorismo inovador e que, junto com a Lei no 13.243, de 11/01/20162, pretendem estruturar o apoio às Empresas de Bases Tecnológicas (EBTs), marcadamente as startups.
Essas empresas são aquelas que têm um produto ou projeto tecnológico e com potencial de mercado que se soma ao potencial empreendedor daqueles que colocarão o negócio em prática.
É importante notar que uma startup só existe de fato se seu produto é uma inovação. Inovação empresarial, muitas vezes, é considerada pelo senso comum apenas como incremento tecnológico na produção ou no produto que irá ser comercializado. Entretanto, a inovação pode ir além disso. Pode-se pensar nos processos de modernização, adequação ou melhoramento de tecnologias, mas também nas formas de gestão de empresas e de pessoal, em métodos ou recursos que incrementem a qualidade e competitividade, incentivem melhores relações de trabalho. Podemos considerar como inovadores processos que levem à desconcentração de renda, a benefícios sociais para os públicos interno e externo da empresa, ao incremento da distribuição do conhecimento gerado em empresas, ou em projetos onde essas sejam parceiras.
De acordo com os economistas Cassiolato3 e Lastres4, em artigo publicado em 20055, a inovação ocorre quando um produto ou serviço é aceito pelo mercado. A determinação do que é ou não inovação é sua aceitação pelo mercado consumidor. A inovação pode ser um produto ou um serviço: vai desde um hardware, como um sensor utilizado para diagnóstico de patologias, a uma metodologia para aferição de percepção de produtos no mercado, podendo desenvolver produtos materiais ou produtos intangíveis, como serviços e ideias que agreguem usabilidade e atendam à necessidade do mercado, por exemplo.
Dentre os produtos intangíveis, podemos incluir a análise das formas novas e mais eficientes de organizar e gerir o trabalho nas empresas, os investimentos constantes em educação, capacitação e qualificação dos trabalhadores, a elaboração e desenvolvimento de formas originais de relações capital, produção e trabalho.
A Lei 182/2021 vem com o objetivo de diminuir a já famosa burocracia para os empreendedores, reduzindo a quantidade de documentos e o tempo para criação de novas empresas. Segundo o secretário especial de Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia (Sepec/ME), Carlos Alexandre Da Costa, PhD em economia, durante evento transmitido ao vivo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em comemoração à entrada em vigor da lei6, “o marco é um grito de liberdade aos nossos empreendedores, que abrem mão, muitas vezes, de um emprego confortável e do convívio com a família”. Da Costa acredita que “o que eles mais querem é a liberdade para transformar nosso país. O novo Brasil é um país inovador, livre, que gera emprego, que transforma com base no talento dos empreendedores.”
Os empreendedores de startups têm sempre uma espada sobre a cabeça, a famosa janela de mercado, ou seja, o tempo que vai da criação, “prototipação”, teste, validação, colocação no mercado e o tempo em que gera divisas para a empresa maximizar seus lucros. As etapas podem mudar conforme o produto ou serviço, mas a primeira e última etapas – criação e geração de lucros - são constantes. As janelas de mercado de produtos tecnológicos e inovadores diminuem a cada dia, no mercado global e competitivo que temos hoje. Por exemplo, a janela de mercado para tecnologias da informação e comunicação é de apenas oito meses, como afirmam MOTTA7 e MAIA8 em artigo publicado em 20169 .
Diversos programas lançados no Brasil vêm contribuindo com o ecossistema de startups. Programas têm sido lançados pelos governos federal, estaduais e por diversas organizações sociais (OS), organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) e pelo sistema S10. São exemplos disso a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e a Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex). Boa parte desses programas tem participação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), como o Programa StartUp Brasil11, o programa de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas com Pesquisador na Empresa (RHAE)12, o programa de empreendimentos e soluções de base tecnológica na área de grafeno13 e o Programa Conecta SUB14 .
O Brasil entra um pouco atrasado nessa busca pela estruturação legal das formas de apoio ao ecossistema de startups, mas mesmo sem o Marco Legal as ações por este tipo de EBT já vem ocorrendo desde a década de 80 do século passado.
Mas em que o Marco Legal muda ou aperfeiçoa a legislação?
• Ele facilita, reduz a burocracia e diminui as exigências para startups participarem de chamadas públicas, permitindo que empresas com pouco capital social ofereçam apenas garantias compatíveis com seu tamanho, por exemplo. • Serviços ou produtos com maior grau tecnológico ou de inovação dessas empresas podem apresentar preços mais altos que os determinados em uma licitação; assim, é dado um incentivo para que boas ideias sejam melhor valoradas e facilita a sua compra por empresas estatais. • Permite que investidores aportem recursos nas empresas sem que, necessariamente, se tornem sócios ou que os recursos sejam parte do capital social, acertando por contrato a remuneração do investimento nas modalidades previstas na lei. • Empresas que “possuem obrigações de investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação, decorrentes de outorgas ou de
delegações firmadas por meio de agências reguladoras” poderão investir em startups por meio de formas diferentes das previamente existentes na legislação, como capital-semente, investidores-anjo, venture-capital, etc. • A administração pública poderá retirar exigências para startups, tanto na sua criação com no seu funcionamento, dentro dos limites legais e de suas competências.
É importante destacar que neste novo Marco Legal não passou despercebida a necessidade do investimento em C&T para que se alcance a efetividade das startups e da inovação. Como nem sempre estas empresas dispõem de recursos humanos com formação superior elevada o bastante para desenvolver pesquisas na própria empresa, há a necessidade de se encontrar parcerias, de forma a diminuir custos e aumentar a eficiência.
Ainda que, por vezes, pareça anacrônica a discussão da legislação completa que dá suporte ao Marco Legal, há, em nosso entender, um reforço do modelo de tripla hélice15, em que se coloca, em pé de igualdade, a importância da atuação do governo, das empresas e dos centros de pesquisa (universidade e instituições de pesquisa) para a inovação e a efetividades das startups. Este modelo poderia facilitar a análise sobre a forma de atuação conjunta dos três setores, fortalecendo a ideia de que a inovação é o resultado da pesquisa tecnológica, investimento de recursos e da ação do Estado. tO que se espera de tais medidas é uma aceleração do crescimento do ecossistema de startups e sua dinamização. Com os sucessos logrados por várias ações e políticas públicas, esperamos que uma legislação mais focada traga o crescimento de startups exitosas. Para tanto, é fundamental que mais investimentos privados, nacionais ou estrangeiros, venham a somar-se aos que o Estado já tem feito. Podemos citar como exemplo o grande afluxo de recursos angariados pelo Programa Start-Up Brasil e seus spin-off, como o Programa Conecta SUB, que já receberam aportes privados dezenas de vezes maiores que o aporte público. Links
1 A Lei no 182/2021 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/lcp/Lcp182.htm) altera a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. 2 http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato20152018/2016/Lei/L13243.htm 3 Jose Eduardo Cassiolato é economista, professor da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diretor do Centro de Altos Estudos Brasil Século XXI e tem doutorado pela Universidade de Sussex, Inglaterra. 4 Helena Maria Martins Lastres é economista, professora da UFRJ e tem doutorado em desenvolvimento e política de CT&I pela Universidade de Sussex, Inglaterra. 5 CASSIOLATO, J. E.; LASTRES, H. M. M. Sistemas de inovação e desenvolvimento: as implicações de política
SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, Fund. SEADEv. 19, n. 1, p. 34-45, jan./mar 2005. Disponível em https://www. scielo.br/j/spp/a/9V95npkxV66Yg8vPJTpHfYh/?lang=pt&format=pdf 6 https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2021/08/lei-complementar-que-estabelece-marco-legal-das-startups-entra-em-vigor-nesta-terca-feira-31 7 Alexandre Guilherme Motta-Sarmento foi apresentado como coautor deste artigo (*). 8 Jackson Max Furtunato Maia é doutorado em física pela
Universidade de São Paulo e analista em C&T Sênior do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). 9 MOTTA-SARMENTO, A. G; MAIA, J. M. F. O programa
CI-Brasil 1 como política pública de PD&I e de formação e fixação de recursos humanos. Revista Parcerias Estratégicas, CGEE, Brasília, v. 19, no 39, p. 131-142, jul/dez 2014. Disponível em http://seer.cgee.org.br/index.php/ parcerias_estrategicas/article/viewFile/746/684 10 https://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/sistema-s 11 https://www.gov.br/startuppoint/pt-br/programas/ startup-brasil 12 https://www.gov.br/cnpq/pt-br/acesso-a-informacao/ acoes-e-programas/programas/rhae 13 https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/noticias/2021/06/ministerio-apresenta-resultados-da-chamada-para-empreendimentos-na-area-de-grafeno 14 https://www.gov.br/startuppoint/pt-br/programas/conecta-startup-brasil 15 ETZKOWITZ, H. and LEYDESDORFF, L. “The Triple Helix as a model for innovation studies”, SCIENCE AND PU-
BLIC POLICY, Surrey – UK, volume 25, number 3, 1998.
Disponível em https://www.academia.edu/49482075/
The_triple_helix_as_a_model_for_innovation_studies
Café da manhã com frutos – José Sabino, Uniderp. Segundo lugar no VI Prêmio de Fotografia, Ciência & Arte, edição 2016. A piraputanga, Brycon hylarii, é uma espécie de peixe onívora, com tendência à frugivoria. Nos rios de Bonito (MS), esses peixes alimentam-se regularmente de frutos de Ficus sp. e atuam como dispersores potenciais dessas plantas. Uma das linhas de pesquisa do Projeto Peixes de Bonito investiga as relações tróficas dos peixes e as divulga para os turistas, moradores e gestores da região. Nesse sentido, o projeto evidencia como os peixes são provedores de serviços ambientais e culturais, no escopo do ecoturismo. Com a divulgação das pesquisas contribuímos ainda para a percepção e valoração cultural desses elementos da biota brasileira.