RODRIGO BODÃO
devaneios à deriv
de um poeta a
Classificar autores e sua arte é sempre uma tarefa ingrata e, não raro, malsucedida. Rodrigo Bodão, no entanto, já facilitou o trabalho de leitores, críticos e editores. Ele se define como um poeta de calçada. Numa alusão a João Nogueira, que se dizia sambista de calçada, Bodão diz tudo o que é preciso saber sobre ele e sua poesia de antemão. A poesia de Rodrigo Bodão é da calçada porque é de lá que melhor se vê a rua. É isso que os leitores encontrarão neste livro, apesar dele não fazer justiça ao poeta nem a seus versos. O papel não dá conta de sua poesia. O livro cerrado na estante tampouco. É uma poesia que transborda nas ruas, nos bares, no samba, na lábia dos notívagos, no andar da moça. Razão pela qual este livro nunca poderá ser capaz de apreendê-la. A menos que o distinto leitor faça justiça e leve esses versos para onde lhes é de direito. De preferência, para um boteco e ao som de um batuque.
Copyright © Rodrigo Bodão. Todos os direitos desta edição reservados à MV Serviços e Editora Ltda. ilustrações
Felipe Reis
Bodão, Rodrigo 22 devaneios de um poeta à deriva / Rodrigo Bodão ; ilustrador: Felipe Reis. – Rio de Janeiro : Mórula Editorial, 2013. 80 p. : 19 cm ISBN: 978-85-65679-06-0 1. Poesia brasileira. I. Reis, Felipe. II. Título. CDD: B869.1
R. Teotonio Regadas 26, 904 – Lapa – Rio de Janeiro www.morula.com.br contato@morula.com.br
RODRIGO BODÃO
devaneios de um poetava à deri
para Érica minha deriva mais intensa
no meio do caminho tinha uma pedra e essa pedra era eu cansado da vida cansado da estrada cansado de mim cansado e sozinho negando o caminho apressando seu fim preso numa falsa liberdade fechado num torpor voluntรกrio 7
perdido num vacilante alheamento entregue à insipidez frenética de salivas orgias e anestésicos triviais estirado numa paz falsa e absurda sob um manto de silêncios e suspiros o abraço encharcado da chuva no sol fez carnaval comigo e acendeu meus olhos num desfile de novos sentidos desde então é que já não sou pedra renasceu minha verve e desejo fecundado por orgasmos e beijos os meus versos encontraram pernas no orvalho e seu doce lampejo
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e Ê assim que enfim hoje vejo — apesar das retinas fatigadas apesar das dores dos porres das lågrimas apesar desse relutante debochado insolente descarado e atrevido medo mesquinho apesar de tudo e todas minhas antigas cantilenas o quanto estou ainda apenas no meio do caminho.
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pai nosso ou o que quer que seja onde quer que esteja aqui ou no cĂŠu apaziguado me sinto apesar do ceticismo ao pronunciar teu nome minha voz faz-se um reino onde tento aceitar tudo aquilo que nĂŁo depende da minha vontade
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nessa terra perdido ao léu... os vãos erros nossos de todo dia bem sei que estarão também por aí hoje apesar de medir as palavras e ofensas sempre no final acabamos ofendendo a quem não queríamos ter ofendido bem sei que me é inevitável cair em tentação mas não faço por mal tá bem?
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déjà vu
METACANSAÇO
Niezstche é tão nítido quanto Kant desencanta o mito não omite o que Kierkegaard quer que eu guarde Hume perdeu o rumo Freud não fode Locke não tranca e Hobbes não rouba nem toma o Dilthey pelo não dito Erasmo veio do marasmo e a utopia de More demorou já descartei Descartes nem Foucault ficou
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Aristóteles leva daqui teus vários totens cansei-me da contemplação que contêm Platão Sócrates não dês-me o daimon dá-me o santo dá-me basta chega de filosofia eu quero a Sofia Loren ou não rompi com essa vã sabedoria sempre procurando o sim e sempre esbarrando no não chega de razão chega de agonia sai Rodrigo entra Bodão chega de buscar a verdade dia após dia: com Tales não me meto mais não. 64
1ª edição abril 2013 impressão rotaplan papel miolo pólen bold 90g/m2 papel capa cartão supremo 300g/m2 tipografia clifford
MATHEUS ACCORSI
Rodrigo Bodão é poeta, letrista de sambas e ladainhas, rubro-negro, batuqueiro, psicólogo e pesquisador. Em 2002 lançou o livro "Comunhão e outros poemas", uma produção independente.
ISBN 978856567906-0
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